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2004
CÓDIGO CIVIL PORTUGUÊS
DECRETO-LEI Nº 47 344,
de 25 de Novembro de 1966
Usando da faculdade conferida pela 1ª parte do nº 2º do artigo 109º da
Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1º (Aprovação do Código Civil)
É aprovado o Código Civil que faz parte do presente decreto-lei.
Artigo 2º (Começo de vigência)
1. O Código Civil entra em vigor no continente e ilhas adjacentes no dia 1
de Junho de 1967, à excepção do disposto nos artigos 1841º a 1850º, que
começará a vigorar somente em 1 de Janeiro de 1968.
2. O código não é, porém, aplicável às acções que estejam pendentes nos
tribunais no dia da sua entrada em vigor, salvo o disposto nos artigos 17º e
21º do presente decreto-lei.
Artigo 3º (Revogação do direito anterior)
Desde que principie a vigorar o novo Código Civil, fica revogada toda a
legislação civil relativa às matérias que esse diploma abrange, com ressalva da
legislação especial a que se faça expressa referência.
Artigo 4º (Remissões para o Código de 1867)
Todas as remissões feitas em diplomas legislativos para o Código Civil de
1867 consideram-se feitas para as disposições correspondentes do novo código.
Artigo 5º (Aplicação no tempo)
A aplicação das disposições do novo código a factos passados fica
subordinada às regras do artigo 12º do mesmo diploma, com as modificações e os
esclarecimentos constantes dos artigos seguintes.
Artigo 6º (Pessoas colectivas)
As disposições dos artigos 157º a 194º do novo Código Civil não prejudicam
as normas de direito público contidas em leis administrativas.
Artigo 7º (Interdições)
Os dementes, surdos-mudos ou pródigos que tenham sido total ou parcialmente
interditos do exercício de direitos, ou venham a sê-lo em acções pendentes,
mantêm o grau de incapacidade que lhes tiver sido ou vier a ser fixado na
sentença ou que resultar da lei anterior.
Artigo 8º (Privilégios creditórios e hipotecas legais)
1. Não são reconhecidos para o futuro, salvo em acções pendentes, os
privilégios e hipotecas legais que não sejam concedidos no novo Código Civil,
mesmo quando conferidos em legislação especial.
2. Exceptuam-se os privilégios e hipotecas legais concedidos ao Estado ou a
outras pessoas colectivas públicas, quando se não destinem à garantia de
débitos fiscais.
Artigo 9º (Sociedades universais e familiares)
Às sociedades universais e familiares constituídas até 31 de Maio de 1967
serão aplicáveis, até à sua extinção, respectivamente, as disposições dos
artigos 1243º a 1248º e 1281º a 1297º do Código Civil de 1867.
Artigo 10º (Arrendamentos em Lisboa e Porto)
Enquanto não for revista a situação criada em Lisboa e Porto pela suspensão
das avaliações fiscais para o efeito da actualização de rendas dos prédios
destinados a habitação, mantém-se o regime excepcional da Lei nº 2030, de 22 de
Junho de 1948, quanto a esses arrendamentos.
Artigo 11º (Parceria agrícola)
Ao contrato de parceria agrícola são aplicáveis, para o futuro, as
disposições que regulam o arrendamento rural.
Artigo 12º (Foros do Estado)
Na determinação do quantitativo do laudémio nos foros do Estado, para
efeitos do disposto no artigo 1517º do novo Código Civil, atender-se-á ao valor
dos respectivos prédios que resulte da matriz.
Artigo 13º (Anulação do casamento)
1. Os casamentos civis celebrados até 31 de Maio de 1967 não podem ser
declarados nulos ou anulados, se para tal não houver fundamento reconhecido
tanto pela lei antiga como pela nova lei civil, a não ser que já esteja
pendente, naquela data, a respectiva acção.
2. O disposto nos artigos 1639º a 1646º do novo código é aplicável às
acções que forem intentadas depois de 31 de Maio de 1967, sem prejuízo do que,
relativamente aos prazos, prescreve o artigo 297º do mesmo diploma.
Artigo 14º (Efeitos do casamento )
O disposto nos artigos 1671º a 1697º do novo código é aplicável aos
casamentos celebrados até 31 de Maio de 1967, mas em caso algum serão anulados
os actos praticados pelos cônjuges na vigência da lei antiga, se em face desta
não estiverem viciados.
Artigo 15º (Regime de bens)
O preceituado nos artigos 1717º a 1752º só é aplicável aos casamentos
celebrados até 31 de Maio de 1967 na medida em que for considerado como
interpretativo do direito vigente, salvo pelo que respeita ao nº 2 do artigo
1739º.
Artigo 16º (Doações para casamento e entre casados. Separação e divórcio)
1. Sem prejuízo da regra estabelecida no nº 2 do artigo 2º deste
decreto-lei, são aplicáveis aos casamentos celebrados até 31 de Maio de 1967 as
disposições do novo Código Civil relativas à caducidade das doações para
casamento, às doações entre casados, à separação dos cônjuges ou dos seus bens
e ao divórcio.
2. Não pode, no entanto, ser decretada a separação judicial de pessoas e
bens ou o divórcio de cônjuges casados até 31 de Maio de 1967 com fundamento em
facto que não seja relevante segundo a lei vigente à data da sua verificação.
Artigo 17º (Conversão da separação em divórcio)
O disposto no artigo 1793º é aplicável nas acções pendentes e nos processos
findos à data da entrada em vigor do novo Código Civil.
Artigo 18º (Impugnação da legitimidade)
1. Até 31 de Outubro de 1967 pode o marido da mãe intentar acção de
impugnação da paternidade, com fundamento em qualquer dos factos referidos nas
alíneas c) e d) do artigo 1817º do novo Código Civil, relativamente ao filho
nascido antes da entrada em vigor deste diploma, com prejuízo do disposto no
artigo 1818º.
2. Dentro do mesmo prazo serão recebidos nos tribunais de menores os
requerimentos a que se refere o artigo 1820º, seguindo-se os demais termos da
impugnação oficiosa, desde que o filho tenha menos de catorze anos de idade à
data da apresentação do requerimento.
Artigo 19º (Acções de investigação de maternidade ou paternidade ilegítima)
O facto de se ter esgotado o período a que se refere o nº 1 do artigo 1854º
não impede que as acções de investigação de maternidade ou paternidade
ilegítima sejam propostas até 31 de Maio de 1968, desde que não tenha caducado
antes, em face da legislação anterior, o direito de as propor.
Artigo 20º (Filhos adulterinos)
Os assentos secretos de perfilhação de filhos adulterinos, validamente
lavrados ao abrigo da legislação vigente, tornar-se-ão públicos mediante
averbamento oficioso, sempre que sejam passadas certidões do respectivo registo
de nascimento.
Artigo 21º (Tutela e curatela)
As disposições do novo Código Civil relativas à tutela e à curatela são
aplicáveis às tutelas e curatelas instauradas até 31 de Maio de 1967; porém, os
tutores e os curadores já nomeados manter-se-ão nos seus cargos enquanto deles
não se escusarem ou enquanto não forem removidos ou exonerados.
Artigo 22º (Declaração de nulidade ou anulação de testamento ou de
disposições testamentárias)
Os testamentos anteriores a 31 de Maio de 1967 e as disposições
testamentárias neles contidas só podem ser declarados nulos ou anulados, por
vício substancial ou de forma, se o respectivo fundamento for também
reconhecido pelo novo Código Civil, salvo se a acção já estiver pendente
naquela data.
Artigo 23º (Testamentaria)
As atribuições do testamenteiro são as que lhe forem fixadas pela lei
vigente à data da feitura do testamento.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 25 de Novembro de 1966. - AMÉRICO DEUS
RODRIGUES TOMAZ - António de Oliveira Salazar - António Jorge Martins da Mota
Veiga - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de
Matos Antunes Varela - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Joaquim da Luz Cunha -
Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira -
Eduardo de Arantes e Oliveira - Joaquim Moreira da Silva Cunha - Inocêncio
Galvão Teles - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Carlos
Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Francisco Pereira
Neto de Carvalho.
Para ser presente à Assembleia Nacional.
CÓDIGO CIVIL
LIVRO I
PARTE GERAL
TÍTULO I
DAS LEIS, SUA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO
CAPÍTULO I
Fontes do direito
ARTIGO 1º
(Fontes imediatas)
1. São fontes imediatas do direito as leis e as normas corporativas.
2. Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos
estaduais competentes; são normas corporativas as regras ditadas pelos
organismos representativos das diferentes categorias morais, culturais,
económicas ou profissionais, no domínio das suas atribuições, bem como os
respectivos estatutos e regulamentos internos.
3. As normas corporativas não podem contrariar as disposições legais de
carácter imperativo.
ARTIGO 2º *
(Assentos)
Nos casos declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de
assentos, doutrina com força obrigatória geral.
* (Revogado pelo Dec.-Lei 329-A/95, de 12-12)
ARTIGO 3º
(Valor jurídico dos usos)
1. Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são
juridicamente atendíveis quando a lei o determine.
2. As normas corporativas prevalecem sobre os usos.
ARTIGO 4º
(Valor da equidade)
Os tribunais só podem resolver segundo a equidade:
a) Quando haja disposição legal que o permita;
b) Quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja
indisponível;
c) Quando as partes tenham previamente convencionado o recurso à equidade,
nos termos aplicáveis à cláusula compromissória.
CAPÍTULO II
Vigência, interpretação e aplicação das leis
ARTIGO 5º
(Começo da vigência da lei)
1. A lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial.
2. Entre a publicação e a vigência da lei decorrerá o tempo que a própria
lei fixar ou, na falta de fixação, o que for determinado em legislação
especial.
ARTIGO 6º
(Ignorância ou má interpretação da lei)
A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu
cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.
ARTIGO 7º
(Cessação da vigência da lei)
1. Quando se não destine a ter vigência temporária, a lei só deixa de
vigorar se for revogada por outra lei.
2. A revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade
entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a
nova lei regular toda a matéria da lei anterior.
3. A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção
inequívoca do legislador.
4. A revogação da lei revogatória não importa o renascimento da lei que
esta revogara.
ARTIGO 8º
(Obrigação de julgar e dever de obediência à lei)
1. O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou
obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio.
2. O dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser
injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo.
3. Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os
casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e
aplicação uniformes do direito.
ARTIGO 9º
(Interpretação da lei)
1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a
partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade
do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as
condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento
legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal,
ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o
legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu
pensamento em termos adequados.
ARTIGO 10º
(Integração das lacunas da lei)
1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável
aos casos análogos.
2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas
da regulamentação do caso previsto na lei.
3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o
próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do
sistema.
ARTIGO 11º
(Normas excepcionais)
As normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem
interpretação extensiva.
ARTIGO 12º
(Aplicação das leis no tempo.Princípio geral)
1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia
retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos
factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal
de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida,
que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo
de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem,
entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que
subsistam à data da sua entrada em vigor.
ARTIGO 13º
(Aplicação das leis no tempo.Leis interpretativas)
1. A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos,
porém, os efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença
passada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de
análoga natureza.
2. A desistência e a confissão não homologadas pelo tribunal podem ser
revogadas pelo desistente ou confitente a quem a lei interpretativa for
favorável.
CAPÍTULO III
Direitos dos estrangeiros e conflitos de leis
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 14º
(Condição jurídica dos estrangeiros)
1. Os estrangeiros são equiparados aos nacionais quanto ao gozo de direitos
civis, salvo disposição legal em contrário.
2. Não são, porém, reconhecidos aos estrangeiros os direitos que, sendo
atribuídos pelo respectivo Estado aos seus nacionais, o não sejam aos
portugueses em igualdade de circunstâncias.
ARTIGO 15º
(Qualificações)
A competência atribuída a uma lei abrange somente as normas que, pelo seu
conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado
na regra de conflitos.
ARTIGO 16º
(Referência à lei estrangeira. Princípio geral)
A referência das normas de conflitos a qualquer lei estrangeira determina
apenas, na falta de preceito em contrário, a aplicação do direito interno dessa
lei.
ARTIGO 17º
(Reenvio para a lei de um terceiro Estado)
1. Se, porém, o direito internacional privado da lei referida pela norma de
conflitos portuguesa remeter para outra legislação e esta se considerar
competente para regular o caso, é o direito interno desta legislação que deve
ser aplicado.
2. Cessa o disposto no número anterior, se a lei referida pela norma de
conflitos portuguesa for a lei pessoal e o interessado residir habitualmente em
território português ou em país cujas normas de conflitos considerem competente
o direito interno do Estado da sua nacionalidade.
3. Ficam, todavia, unicamente sujeitos à regra do nº 1 os casos da tutela e
curatela, relações patrimoniais entre os cônjuges, poder paternal, relações
entre adoptante e adoptado e sucessão por morte, se a lei nacional indicada
pela norma de conflitos devolver para a lei da situação dos bens imóveis e esta
se considerar competente.
ARTIGO 18º
(Reenvio para a lei portuguesa)
1. Se o direito internacional privado da lei designada pela norma de
conflitos devolver para o direito interno português, é este o direito
aplicável.
2. Quando, porém, se trate de matéria compreendida no estatuto pessoal, a
lei portuguesa só é aplicável se o interessado tiver em território português a
sua residência habitual ou se a lei do país desta residência considerar
igualmente competente o direito interno português.
ARTIGO 19º
(Casos em que não é admitido o reenvio)
1. Cessa o disposto nos dois artigos anteriores, quando da aplicação deles
resulte a invalidade ou ineficácia de um negócio jurídico que seria válido ou
eficaz segundo a regra fixada no artigo 16º, ou a ilegitimidade de um estado
que de outro modo seria legítimo.
2. Cessa igualmente o disposto nos mesmos artigos, se a lei estrangeira
tiver sido designada pelos interessados, nos casos em que a designação é
permitida.
ARTIGO 20º
(Ordenamentos jurídicos plurilegislativos)
1. Quando, em razão da nacionalidade de certa pessoa, for competente a lei
de um Estado em que coexistam diferentes sistemas legislativos locais, é o
direito interno desse Estado que fixa em cada caso o sistema aplicável.
2. Na falta de normas de direito interlocal, recorre-se ao direito
internacional privado do mesmo Estado; e, se este não bastar, considera-se como
lei pessoal do interessado a lei da sua residência habitual.
3. Se a legislação competente constituir uma ordem jurídica
territorialmente unitária, mas nela vigorarem diversos sistemas de normas para
diferentes categorias de pessoas, observar-se-á sempre o estabelecido nessa
legislação quanto ao conflito de sistemas.
ARTIGO 21º
(Fraude à lei)
Na aplicação das normas de conflitos são irrelevantes as situações de facto
ou de direito criadas com o intuito fraudulento de evitar a aplicabilidade da
lei que, noutras circunstâncias, seria competente.
ARTIGO 22º
(Ordem pública)
1. Não são aplicáveis os preceitos da lei estrangeira indicados pela norma
de conflitos, quando essa aplicação envolva ofensa dos princípios fundamentais
da ordem pública internacional do Estado português.
2. São aplicáveis, neste caso, as normas mais apropriadas da legislação
estrangeira competente ou, subsidiariamente, as regras do direito interno
português.
ARTIGO 23º
(Interpretação e averiguação do direito estrangeiro)
1. A lei estrangeira é interpretada dentro do sistema a que pertence e de
acordo com as regras interpretativas nele fixadas.
2. Na impossibilidade de averiguar o conteúdo da lei estrangeira aplicável,
recorrer-se-á à lei que for subsidiariamente competente, devendo adoptar-se
igual procedimento sempre que não for possível determinar os elementos de facto
ou de direito de que dependa a designação da lei aplicável.
ARTIGO 24º
(Actos realizados a bordo)
1. Aos actos realizados a bordo de navios ou aeronaves, fora dos portos ou
aeródromos, é aplicável a lei do lugar da respectiva matrícula, sempre que for
competente a lei territorial.
2. Os navios e aeronaves militares consideram-se como parte do território
do Estado a que pertencem.
SECÇÃO II
Normas de conflitos
SUBSECÇÃO I
Âmbito e determinação da lei pessoal
ARTIGO 25º
(Âmbito da lei pessoal)
O estado dos indivíduos, a capacidade das pessoas, as relações de família e
as sucessões por morte são regulados pela lei pessoal dos respectivos sujeitos,
salvas as restrições estabelecidas na presente secção.
ARTIGO 26º
(Início e termo da personalidade jurídica)
1. O início e termo da personalidade jurídica são fixados igualmente pela
lei pessoal de cada indivíduo.
2. Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra
pessoa e estas tiverem leis pessoais diferentes, se as presunções de
sobrevivência dessas leis forem inconciliáveis, é aplicável o disposto no nº 2
do artigo 68º.
ARTIGO 27º
(Direitos de personalidade)
1. Aos direitos de personalidade, no que respeita à sua existência e tutela
e às restrições impostas ao seu exercício, é também aplicável a lei pessoal.
2. O estrangeiro ou apátrida não goza, porém, de qualquer forma de tutela
jurídica que não seja reconhecida na lei portuguesa.
ARTIGO 28º
(Desvios quanto às consequências da incapacidade)
1. O negócio jurídico celebrado em Portugal por pessoa que seja incapaz
segundo a lei pessoal competente não pode ser anulado com fundamento na
incapacidade no caso de a lei interna portuguesa, se fosse aplicável,
considerar essa pessoa como capaz.
2. Esta excepção cessa, quando a outra parte tinha conhecimento da
incapacidade, ou quando o negócio jurídico for unilateral, pertencer ao domínio
do direito da família ou das sucessões ou respeitar à disposição de imóveis
situados no estrangeiro.
3. Se o negócio jurídico for celebrado pelo incapaz em país estrangeiro,
será observada a lei desse país, que consagrar regras idênticas às fixadas nos
números anteriores.
ARTIGO 29º
(Maioridade)
A mudança da lei pessoal não prejudica a maioridade adquirida segundo a lei
pessoal anterior.
ARTIGO 30º
(Tutela e institutos análogos)
À tutela e institutos análogos de protecção aos incapazes é aplicável a lei
pessoal do incapaz.
ARTIGO 31º
(Determinação da lei pessoal)
1. A lei pessoal é a da nacionalidade do indivíduo.
2. São, porém, reconhecidos em Portugal os negócios jurídicos celebrados no
país da residência habitual do declarante, em conformidade com a lei desse
país, desde que esta se considere competente.
ARTIGO 32º
(Apátridas)
1. A lei pessoal do apátrida é a do lugar onde ele tiver a sua residência
habitual ou, sendo menor ou interdito, o seu domicílio legal.
2. Na falta de residência habitual, é aplicável o disposto no nº 2 do
artigo 82º.
ARTIGO 33º
(Pessoas colectivas)
1. A pessoa colectiva tem como lei pessoal a lei do Estado onde se encontra
situada a sede principal e efectiva da sua administração.
2. À lei pessoal compete especialmente regular: a capacidade da pessoa
colectiva; a constitutição, funcionamento e competência dos seus órgãos; os
modos de aquisição e perda da qualidade de associado e os correspondentes
direitos e deveres; a responsabilidade da pessoa colectiva, bem como a dos
respectivos órgãos e membros, perante terceiros; a transformação, dissolução e
extinção da pessoa colectiva.
3. A transferência, de um Estado para outro, da sede da pessoa colectiva
não extingue a personalidade jurídica desta, se nisso convierem as leis de uma
e outra sede.
4. A fusão de entidades com lei pessoal diferente é apreciada em face de
ambas as leis pessoais.
ARTIGO 34º
(Pessoas colectivas internacionais)
A lei pessoal das pessoas colectivas internacionais é a designada na
convenção que as criou ou nos respectivos estatutos e, na falta de designação,
a do país onde estiver a sede principal.
SUBSECÇÃO II
Lei reguladora dos negócios jurídicos
ARTIGO 35º
(Declaração negocial)
1. A perfeição, interpretação e integração da declaração negocial são
reguladas pela lei aplicável à substância do negócio, a qual é igualmente
aplicável à falta e vícios da vontade.
2. O valor de um comportamento como declaração negocial é determinado pela
lei da residência habitual comum do declarante e do destinatário e, na falta
desta, pela lei do lugar onde o comportamento de verificou.
3. O valor do silêncio como meio declaratório é igualmente determinado pela
lei da residência habitual comum e, na falta desta, pela lei do lugar onde a
proposta foi recebida.
ARTIGO 36º
(Forma da declaração)
1. A forma da declaração negocial é regulada pela lei aplicável à
substância do negócio; é, porém, suficiente a observância da lei em vigor no
lugar em que é feita a declaração, salvo se a lei reguladora da substância do
negócio exigir, sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de
determinada forma, ainda que o negócio seja celebrado no estrangeiro.
2. A declaração negocial é ainda formalmente válida se, em vez da forma
prescrita na lei local, tiver sido observada a forma prescrita pelo Estado para
que remete a norma de conflitos daquela lei, sem prejuízo do disposto na última
parte do número anterior.
ARTIGO 37º
(Representação legal)
A representação legal está sujeita à lei reguladora da relação jurídica de
que nasce o poder representativo.
ARTIGO 38º
(Representação orgânica)
A representação da pessoa colectiva por intermédio dos seus órgãos é
regulada pela respectiva lei pessoal.
ARTIGO 39º
(Representação voluntária)
1. A representação voluntária é regulada, quanto à existência, extensão,
modificação, efeitos e extinção dos poderes representativos, pela lei do Estado
em que os poderes são exercidos.
2. Porém, se o representante exercer os poderes representativos em país
diferente daquele que o representado indicou e o facto for conhecido do
terceiro com quem contrate, é aplicável a lei do país da residência habitual do
representado.
3. Se o representante exercer profissionalmente a representação e o facto
for conhecido do terceiro contratante, é aplicável a lei do domicílio
profissional.
4. Quando a representação se refira à disposição ou administração de bens
imóveis, é aplicável a lei do país da situação desses bens.
ARTIGO 40º
(Prescrição e caducidade)
A prescrição e a caducidade são reguladas pela lei aplicável ao direito a
que uma ou outra se refere.
SUBSECÇÃO III
Lei reguladora das obrigações
ARTIGO 41º
(Obrigações provenientes de negócios jurídicos)
1. As obrigações provenientes de negócio jurídico, assim como a própria
substância dele, são reguladas pela lei que os respectivos sujeitos tiverem
designado ou houverem tido em vista.
2. A designação ou referência das partes só pode, todavia, recair sobre lei
cuja aplicabilidade corresponda a um interesse sério dos declarantes ou esteja
em conexão com algum dos elementos do negócio jurídico atendíveis no domínio do
direito internacional privado.
ARTIGO 42º
(Critério supletivo)
1. Na falta de determinação da lei competente, atende-se, nos negócios
jurídicos unilaterais, à lei da residência habitual do declarante e, nos
contratos, à lei da residência habitual comum das partes.
2. Na falta de residência comum, é aplicável, nos contratos gratuitos, a
lei da residência habitual daquele que atribui o benefício e, nos restantes
contratos, a lei do lugar da celebração.
ARTIGO 43º
(Gestão de negócios)
À gestão de negócios é aplicável a lei do lugar em que decorre a principal
actividade do gestor.
ARTIGO 44º
(Enriquecimento sem causa)
O enriquecimento sem causa é regulado pela lei com base na qual se
verificou a transferência do valor patrimonial a favor do enriquecido.
ARTIGO 45º
(Responsabilidade extracontratual)
1. A responsabilidade extracontratual fundada, quer em acto ilícito, quer
no risco ou em qualquer conduta lícita, é regulada pela lei do Estado onde
decorreu a principal actividade causadora do prejuízo; em caso de
responsabilidade por omissão, é aplicável a lei do lugar onde o responsável
deveria ter agido.
2. Se a lei do Estado onde se produziu o efeito lesivo considerar
responsável o agente, mas não o considerar como tal a lei do país onde decorreu
a sua actividade, é aplicável a primeira lei, desde que o agente devesse prever
a produção de um dano, naquele país, como consequência do seu acto ou omissão.
3. Se, porém, o agente e o lesado tiverem a mesma nacionalidade ou, na
falta dela, a mesma residência habitual, e se encontrarem ocasionalmente em
país estrangeiro, a lei aplicável será a da nacionalidade ou a da residência
comum, sem prejuízo das disposições do Estado local que devam ser aplicadas
indistintamente a todas as pessoas.
SUBSECÇÃO IV
Lei reguladora das coisas
ARTIGO 46º
(Direitos reais)
1. O regime da posse, propriedade e demais direitos reais, é definido pela
lei do Estado em cujo território as coisas se encontrem situadas.
2. Em tudo quanto respeita à constituição ou transferência de direitos
reais sobre coisas em trânsito, são estas havidas como situadas no país do
destino.
3. A constituição e transferência de direitos sobre os meios de transportes
submetidos a um regime de matrícula são reguladas pela lei do país onde a
matrícula tiver sido efectuada.
ARTIGO 47º
(Capacidade para constituir direitos reais sobre coisas imóveis ou dispor
deles)
É igualmente definida pela lei da situação da coisa a capacidade para
constituir direitos reais sobre coisas imóveis ou para dispor deles, desde que
essa lei assim o determine; de contrário, é aplicável a lei pessoal.
ARTIGO 48º
(Propriedade intelectual)
1. Os direitos de autor são regulados pela lei do lugar da primeira
publicação da obra e, não estando esta publicada, pela lei pessoal do autor,
sem prejuízo do disposto em legislação especial.
2. A propriedade industrial é regulada pela lei do país da sua criação.
SUBSECÇÃO V
Lei reguladora das relações de família
ARTIGO 49º
(Capacidade para contrair casamento ou celebrar convenções antenupciais)
A capacidade para contrair casamento ou celebrar a convenção antenupcial é
regulada, em relação a cada nubente, pela respectiva lei pessoal, à qual
compete ainda definir o regime da falta e dos vícios da vontade dos
contraentes.
ARTIGO 50º
(Forma do casamento)
A forma do casamento é regulada pela lei do Estado em que o acto é
celebrado, salvo o disposto no artigo seguinte.
ARTIGO 51º
(Desvios)
1. O casamento de dois estrangeiros em Portugal pode ser celebrado segundo
a forma prescrita na lei nacional de qualquer dos contraentes, perante os
respectivos agentes diplomáticos ou consulares, desde que igual competência
seja reconhecida por essa lei aos agentes diplomáticos e consulares
portugueses.
2. O casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e
estrangeiro pode ser celebrado perante o agente diplomático ou consular do
Estado português ou perante os ministros do culto católico; em qualquer caso, o
casamento deve ser precedido do processo de publicações, organizado pela
entidade competente, a menos que ele seja dispensado nos termos do artigo
1599º.
3. O casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e
estrangeiro, em harmonia com as leis canónicas, é havido como casamento
católico, seja qual for a forma legal da celebração do acto segundo a lei
local, e à sua transcrição servirá de base o assento do registo paroquial.
ARTIGO 52º
(Relações entre os cônjuges)
1. Salvo o disposto no artigo seguinte, as relações entre os cônjuges são
reguladas pela lei nacional comum.
2. Não tendo os cônjuges a mesma nacionalidade, é aplicável a lei da sua
residência habitual comum e, na falta desta, a lei do país com o qual a vida
familiar se ache mais estreitamente conexa.
(Redacção do Dec.-Lei 497/77, de 25-11)
ARTIGO 53º
(Convenções antenupciais e regime de bens)
1. A substância e efeitos das convenções antenupciais e do regime de bens,
legal ou convencional, são definidos pela lei nacional dos nubentes ao tempo da
celebração do casamento.
2. Não tendo os nubentes a mesma nacionalidade é aplicável a lei da sua
residência habitual comum à data do casamento e, se esta faltar também, a lei
da primeira residência conjugal.
3. Se for estrangeira a lei aplicável e um dos nubentes tiver a sua
residência habitual em território português, pode ser convencionado um dos
regimes admitidos neste código.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 54º
(Modificações do regime de bens)
1. Aos cônjuges é permitido modificar o regime de bens, legal ou
convencional, se a tal forem autorizados pela lei competente nos termos do
artigo 52º.
2. A nova convenção em caso nenhum terá efeito retroactivo em prejuízo de
terceiro.
ARTIGO 55º
(Separação judicial de pessoas e bens e divórcio)
1. À separação judicial de pessoas e bens e ao divórcio é aplicável o
disposto no artigo 52º.
2. Se, porém, na constância do matrimónio houver mudança da lei competente,
só pode fundamentar a separação ou o divórcio algum facto relevante ao tempo da
sua verificação.
ARTIGO 56º
(Constituição da filiação)
1. À constituição da filiação é aplicável a lei pessoal do progenitor à
data do estabelecimento da relação.
2. Tratando-se de filho de mulher casada, a constituição da filiação
relativamente ao pai é regulada pela lei nacional comum da mãe e do marido; na
falta desta, é aplicável a lei da residência habitual comum dos cônjuges e, se
esta também faltar, a lei pessoal do filho.
3. Para os efeitos do número anterior, atender-se-á ao momento do
nascimento do filho ou ao momento da dissolução do casamento, se for anterior
ao nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 57º
(Relações entre pais e filhos)
1. As relações entre pais e filhos são reguladas pela lei nacional comum
dos pais e, na falta desta, pela lei da sua residência habitual comum; se os
pais residirem habitualmente em Estados diferentes, é aplicável a lei pessoal
do filho.
2. Se a filiação apenas se achar estabelecida relativamente a um dos
progenitores, aplica-se a lei pessoal deste; se um dos progenitores tiver
falecido, é competente a lei pessoal do sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 58º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 59º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 60º
(Filiação adoptiva)
1. À constituição da filiação adoptiva é aplicável a lei pessoal do
adoptante, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2. Se a adopção for realizada por marido e mulher ou o adoptando for filho
do cônjuge do adoptante, é competente a lei nacional comum dos cônjuges e, na
falta desta, a lei da sua residência habitual comum; se também esta faltar,
será aplicável a lei do país com o qual a vida familiar dos adoptantes se ache
mais estreitamente conexa.
3. As relações entre adoptante e adoptado, e entre este e a família de
origem, estão sujeitas à lei pessoal do adoptante; no caso previsto no número
anterior é aplicável o disposto no artigo 57º.
4. Se a lei competente para regular as relações entre o adoptando e os seus
progenitores não conhecer o instituto da adopção, ou não o admitir em relação a
quem se encontre na situação familiar do adoptando, a adopção não é permitida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 61º
(Requisitos especiais da perfilhação ou adopção)
1. Se, como requisito da perfilhação ou adopção, a lei pessoal do
perfilhando ou adoptando exigir o consentimento deste, será a exigência
respeitada.
2. Será igualmente respeitada a exigência do consentimento de terceiro a
quem o interessado esteja ligado por qualquer relação jurídica de natureza
familiar ou tutelar, se porvier da lei reguladora desta relação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO VI
Lei reguladora das sucessões
ARTIGO 62º
(Lei competente)
A sucessão por morte é regulada pela lei pessoal do autor da sucessão ao
tempo do falecimento deste, competindo-lhe também definir os poderes do
administrador da herança e do executor testamentário.
ARTIGO 63º
(Capacidade de disposição)
1. A capacidade para fazer, modificar ou revogar uma disposição por morte,
bem como as exigências da forma especial das disposições por virtude da idade
do disponente, são reguladas pela lei pessoal do autor ao tempo da declaração.
2. Aquele que, depois de ter feito a disposição, adquirir nova lei pessoal
conserva a capacidade necessária para revogar a disposição nos termos da lei
anterior.
ARTIGO 64º
(Interpretação das disposições; falta e vícios da vontade)
É a lei pessoal do autor da herança ao tempo da declaração que regula:
a) A interpretação das respectivas cláusulas e disposições, salvo se houver
referência expressa ou implícita a outra lei;
b) A falta e vícios da vontade;
c) A admissibilidade de testamentos de mão comum ou de pactos sucessórios,
sem prejuízo, quanto a estes, do disposto no artigo 53º.
ARTIGO 65º
(Forma)
1. As disposições por morte, bem como a sua revogação ou modificação, serão
válidas, quanto à forma, se corresponderem às prescrições da lei do lugar onde
o acto for celebrado, ou às da lei pessoal do autor da herança, quer no momento
da declaração, quer no momento da morte, ou ainda às prescrições da lei para
que remeta a norma de conflitos da lei local.
2. Se, porém, a lei pessoal do autor da herança no momento da declaração
exigir, sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de determinada forma,
ainda que o acto seja praticado no estrangeiro, será a exigência respeitada.
TÍTULO II
DAS RELAÇÕES JURÍDICAS
SUBTÍTULO I
DAS PESSOAS
CAPÍTULO I
Pessoas singulares
SECÇÃO I
Personalidade e capacidade jurídica
ARTIGO 66º
(Começo da personalidade)
1. A personalidade adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.
2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu
nascimento.
ARTIGO 67º
(Capacidade jurídica)
As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo
disposição legal em contrário; nisto consiste a sua capacidade jurídica.
ARTIGO 68º
(Termo da personalidade)
1. A personalidade cessa com a morte.
2. Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra
pessoa, presume-se, em caso de dúvida, que uma e outra faleceram ao mesmo
tempo.
3. Tem-se por falecida a pessoa cujo cadáver não foi encontrado ou
reconhecido, quando o desaparecimento se tiver dado em circunstâncias que não
permitam duvidar da morte dela.
ARTIGO 69º
(Renúncia à capacidade jurídica)
Ninguém pode renunciar, no todo ou em parte, à sua capacidade jurídica.
SECÇÃO II
Direitos de personalidade
ARTIGO 70º
(Tutela geral da personalidade)
1. A lei protege os indíviduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de
ofensa à sua personalidade física ou moral.
2. Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa
ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias
do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da
ofensa já cometida.
ARTIGO 71º
(Ofensa a pessoas já falecidas)
1. Os direitos de personalidade gozam igualmente de protecção depois da
morte do respectivo titular.
2. Tem legitimidade, neste caso, para requerer as providências previstas no
nº 2 do artigo anterior o cônjuge sobrevivo ou qualquer descendente,
ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido.
3. Se a ilicitude da ofensa resultar da falta de consentimento, só as
pessoas que o deveriam prestar têm legitimidade, conjunta ou separadamente,
para requerer as providências a que o número anterior se refere.
ARTIGO 72º
(Direito ao nome)
1. Toda a pessoa tem direito a usar o seu nome, completo ou abreviado, e a
opor-se a que outrem o use ilicitamente para sua identificação ou outros fins.
2. O titular do nome não pode, todavia, especialmente no exercício de uma
actividade profissional, usá-lo de modo a prejudicar os interesses de quem
tiver nome total ou parcialmente idêntico; nestes casos, o tribunal decretará
as providências que, segundo juízos de equidade, melhor conciliem os interesse
em conflito.
ARTIGO 73º
(Legitimidade)
As acções relativas à defesa do nome podem ser exercidas não só pelo
respectivo titular, como, depois da morte dele pelas pessoas referidas no
número 2 do artigo 71º
ARTIGO 74º
(Pseudónimo)
O pseudónimo, quando tenha notoriedade, goza da protecção conferida ao
próprio nome.
ARTIGO 75º
(Cartas-missivas confidenciais)
1. O destinatário de carta-missiva de natureza confidencial deve guardar
reserva sobre o seu conteúdo, não lhe sendo lícito aproveitar os elementos de
informação que ela tenha levado ao seu conhecimento.
2. Morto o destinatário, pode a restituição da carta confidencial ser
ordenada pelo tribunal, a requerimento do autor dela ou, se este já tiver
falecido, das pessoas indicadas no nº 2 do artigo 71º; pode também ser ordenada
a destruição da carta, o seu depósito em mão de pessoa idónea ou qualquer outra
medida apropriada.
ARTIGO 76º
(Publicação de cartas confidenciais)
1. As cartas-missivas confidenciais só podem ser publicadas com o consentimento
do seu autor ou com o suprimento judicial desse consentimento; mas não há lugar
ao suprimento quando se trate de utilizar as cartas como documento literário,
histórico ou biográfico.
2. Depois da morte do autor, a autorização compete às pessoas designadas no
nº 2 do artigo 71º, segundo a ordem nele indicada.
ARTIGO 77º
(Memórias familiares e outros escritos confidenciais)
O disposto no artigo anterior é aplicável, com as necessárias adaptações,
às memórias familiares e pessoais e a outros escritos que tenham carácter
confidencial ou se refiram à intimidade da vida privada.
ARTIGO 78º
(Cartas-missivas não confidenciais)
O destinatário de carta não confidencial só pode usar dela em termos que
não contrariem a expectativa do autor.
ARTIGO 79º
(Direito à imagem)
1. O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no
comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a
autorização compete às pessoas designadas no nº 2 do artigo 71º, segundo a
ordem nele indicada.
2. Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o
justifiquem a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou
de justiça, finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a
reprodução da imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de
interesse público ou que hajam decorrido publicamente.
3. O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no
comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples
decoro da pessoa retratada.
ARTIGO 80º
(Direito à reserva sobre a intimidade da vida privada)
1. Todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de
outrem.
2. A extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e a
condição das pessoas.
ARTIGO 81º
(Limitação voluntária dos direitos de personalidade)
1. Toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é
nula, se for contrária aos princípios da ordem pública.
2. A limitação voluntária, quando legal, é sempre revogável, ainda que com
obrigação de indemnizar os prejuízos causados às legítimas expectativas da
outra parte.
SECÇÃO III
Domicílio
ARTIGO 82º
(Domicílio voluntário geral)
1. A pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual; se residir
alternadamente em diversos lugares, tem-se por domiciliada em qualquer deles.
2. Na falta de residência habitual, considera-se domiciliada no lugar da
sua residência ocasional ou, se esta não puder ser determinada, no lugar onde
se encontrar.
ARTIGO 83º
(Domicílio profissional)
1. A pessoa que exerce uma profissão tem, quanto às relações a que esta se
refere, domicílio profissional no lugar onde a profissão é exercida.
2. Se exercer a profissão em lugares diversos, cada um deles constitui
domicílio para as relações que lhe correspondem.
ARTIGO 84º
(Domicílio electivo)
É permitido estipular domicílio particular para determinados negócios,
contanto que a estipulação seja reduzida a escrito.
ARTIGO 85º
(Domicílio legal dos menores e interditos)
1. O menor tem domicílio no lugar da residência da família; se ela não
existir, tem por domicílio o do progenitor a cuja guarda estiver.
2. O domicílio do menor que em virtude de decisão judicial foi confiado a
terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência é o do progenitor
que exerce o poder paternal.
3. O domicílio do menor sujeito a tutela e do interdito é o do respectivo
tutor.
4. Quando tenha sido instituído o regime de administração de bens, o
domicílio do menor ou do interdito é o do administrador, nas relações a que
essa administração se refere.
5. Não são aplicáveis as regras dos números anteriores se delas resultar
que o menor ou interdito não tem domicílio em território nacional.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 86º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 87º
(Domicílio legal dos empregados públicos)
1. Os empregados públicos, civis ou militares, quando haja lugar certo para
o exercício dos seus empregos, têm nele domicílio necessário, sem prejuízo do
seu domicílio voluntário no lugar da residência habitual.
2. O domicílio necessário é determinado pela posse do cargo ou pelo
exercício das respectivas funções.
ARTIGO 88º
(Domicílio legal dos agentes diplomáticos portugueses)
Os agentes diplomáticos portugueses, quando invoquem extraterritorialidade,
consideram-se domiciliados em Lisboa.
SECÇÃO IV
Ausência
SUBSECÇÃO I
Curadoria provisória
ARTIGO 89º
(Nomeação de curador provisório)
1. Quando haja necessidade de prover acerca da administração dos bens de
quem desapareceu sem que dele se saiba parte e sem ter deixado representante
legal ou procurador, deve o tribunal nomear-lhe curador provisório.
2. Deve igualmente ser nomeado curador ao ausente, se o procurador não
quiser ou não puder exercer as suas funções.
3. Pode ser designado para certos negócios, sempre que as circunstâncias o
exijam, um curador especial.
ARTIGO 90º
(Providências cautelares)
A possibilidade de nomeação do curador provisório não obsta às providências
cautelares que se mostrem indispensáveis em relação a quaisquer bens do ausente.
ARTIGO 91º
(Legitimidade)
A curadoria provisória e as providências cautelares a que se refere o
artigo anterior podem ser requeridas pelo Ministério Público ou por qualquer
interessado.
ARTIGO 92º
(A quem deve ser deferida a curadoria provisória)
1. O curador provisório será escolhido de entre as pessoas seguintes: o
cônjuge do ausente, algum ou alguns dos herdeiros presumidos, ou algum ou
alguns dos interessados na conservação dos bens.
2. Havendo conflito de interesses entre o ausente e o curador ou entre o
ausente e o cônjuge, ascendentes ou descendentes do curador, deve ser designado
um curador especial, nos termos do número 3 do artigo 89º.
ARTIGO 93º
(Relação dos bens e caução)
1. Os bens do ausente serão relacionados e só depois entregues ao curador
provisório, ao qual será fixada caução pelo tribunal.
2. Em caso de urgência, pode ser autorizada a entrega dos bens antes de
estes serem relacionados ou de o curador prestar a caução exigida.
3. Se o curador não prestar a caução, será nomeado outro em lugar dele.
ARTIGO 94º
(Direitos e obrigações do curador provisório)
1. O curador fica sujeito ao regime do mandato geral em tudo o que não
contrariar as disposições desta subsecção.
2. Compete ao curador provisório requerer os procedimentos cautelares necessários
e intentar as acções que não possam ser retardadas sem prejuízo dos interesses
do ausente; cabe-lhe ainda representar o ausente em todas as acções contra este
propostas.
3. Só com autorização judicial pode o curador alienar ou onerar bens
imóveis, objectos preciosos, títulos de crédito, estabelecimentos comerciais e
quaisquer outros bens cuja alienação ou oneração não constitua acto de
administração.
4. A autorização judicial só será concedida quando o acto se justifique
para evitar a deterioração ou ruína dos bens, solver dívidas do ausente,
custear benfeitorias necessárias ou úteis ou ocorrer a outra necessidade
urgente.
ARTIGO 95º
(Prestação de contas)
1. O curador provisório deve prestar contas do seu mandato perante o
tribunal, anualmente ou quando este o exigir.
2. Deferida a curadoria definitiva nos termos da subsecção seguinte, as
contas do curador provisório são prestadas aos curadores definitivos.
ARTIGO 96º
(Remuneração do curador)
O curador haverá dez por cento da receita líquida que realizar.
ARTIGO 97º
(Substituição do curador provisório)
O curador pode ser substituído, a requerimento do Ministério Público ou de
qualquer interessado, logo que se mostre inconveniente a sua permanência no
cargo.
ARTIGO 98º
(Termo da curadoria)
A curadoria provisória termina:
a) Pelo regresso do ausente;
b) Se o ausente providenciar acerca da administração dos bens;
c) Pela comparência de pessoa que legalmente represente o ausente ou de
procurador bastante;
d) Pela entrega dos bens aos curadores definitivos ou ao cabeça-de-casal,
nos termos do artigo 103º;
e) Pela certeza da morte do ausente.
SUBSECÇÃO I
Curadoria definitiva
ARTIGO 99º
(Justificação da ausência)
Decorridos dois anos sem se saber do ausente, se este não tiver deixado
representante legal nem procurador bastante, ou cinco anos, no caso contrário,
pode o Ministério Público ou algum dos interessados requerer a justificação da
ausência.
ARTIGO 100º
(Legitimidade)
São interessados na justificação da ausência o cônjuge não separado
judicialmente de pessoas e bens, os herdeiros do ausente e todos os que tiverem
sobre os bens do ausente direito dependente da condição da sua morte.
ARTIGO 101º
(Abertura de testamentos)
Justificada a ausência, o tribunal requisitará certidões dos testamentos
públicos e mandará proceder à abertura dos testamentos cerrados que existirem,
a fim de serem tomados em conta na partilha e no deferimento da curadoria
definitiva.
ARTIGO 102º
(Entrega de bens aos legatários e outros interessados)
Os legatários, como todos aqueles que por morte do ausente teriam direito a
bens determinados, podem requerer, logo que a ausência esteja justificada,
independentemente da partilha, que esses bens lhes sejam entregues.
ARTIGO 103º
(Entrega dos bens aos herdeiros)
1. A entrega dos bens aos herdeiros do ausente à data das últimas notícias,
ou aos herdeiros dos que depois tiverem falecido, só tem lugar depois da
partilha.
2. Enquanto não forem entregues os bens, a administração deles pertence ao
cabeça-de-casal, designado nos termos dos artigos 2080º e seguintes.
ARTIGO 104º
(Curadores definitivos)
Os herdeiros e demais interessados a quem tenham sido entregues os bens do
ausente são havidos como curadores definitivos.
ARTIGO 105º
(Aparecimento de novos interessados)
Se, depois de nomeados os curadores definitivos, aparecer herdeiro ou
interessado que, em relação à data das últimas notícias do ausente, deva
excluir algum deles ou haja de concorrer à sucessão, ser-lhe-ão entregues os
bens nos termos dos artigos anteriores.
ARTIGO 106º
(Exigibilidade de obrigações)
A exigibilidade das obrigações que se extinguiriam pela morte do ausente
fica suspensa.
ARTIGO 107º
(Caução)
1. O tribunal pode exigir caução aos curadores definitivos ou a algum ou
alguns deles, tendo em conta a espécie e valor dos bens e rendimentos que
eventualmente hajam de restituir.
2. Enquanto não prestar a caução fixada, o curador está impedido de receber
os bens; estes são entregues, até ao termo da curadoria ou até à prestação da
caução, a outro herdeiro ou interessado, que ocupará, em relação a eles, a
posição de curador definitivo.
ARTIGO 108º
(Ausente casado)
Se o ausente for casado, pode o cônjuge não separado judicialmente de
pessoas e bens requerer inventário e partilha, no seguimento do processo de
justificação da ausência, e exigir os alimentos a que tiver direito.
ARTIGO 109º
(Aceitação e repúdio da sucessão; disposição dos direitos sucessórios)
1. Justificada a ausência, é admitido o repúdio da sucessão do ausente ou a
disposição dos respectivos direitos sucessórios.
2. A eficácia do repúdio ou da disposição, assim como a aceitação da
herança ou de legados, ficam, todavia, sujeitas à condição resolutiva da
sobrevivência do ausente.
ARTIGO 110º
(Direitos e obrigações dos curadores definitivos e demais interessados)
Aos curadores definitivos a quem os bens hajam sido entregues é aplicável o
disposto no artigo 94º, ficando extintos os poderes que anteriormente hajam
sido conferidos pelo ausente em relação aos mesmos bens.
ARTIGO 111º
(Fruição dos bens)
1. Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge que sejam nomeados curadores
definitivos têm direito, a contar da entrega dos bens, à totalidade dos frutos
percebidos.
2. Os curadores definitivos não abrangidos pelo número anterior devem
reservar para o ausente um terço dos rendimentos líquidos dos bens que
administrem.
ARTIGO 112º
(Termo da curadoria definitiva)
A curadoria definitiva termina:
a) Pelo regresso do ausente;
b) Pela notícia da sua existência e do lugar onde reside;
c) Pela certeza da sua morte;
d) Pela declaração de morte presumida.
ARTIGO 113º
(Restituição dos bens ao ausente)
1. Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do artigo anterior, os bens do
ausente ser-lhe-ão entregues logo que ele o requeira.
2. Enquanto não for requerida a entrega, mantém-se o regime da curadoria
nos termos desta subsecção.
SUBSECÇÃO III
Morte presumida
ARTIGO 114º
(Requisitos)
1. Decorridos dez anos sobre a data das últimas notícias, ou passados cinco
anos, se entretanto o ausente houver completado oitenta anos de idade, podem os
interessados a que se refere o artigo 100º requerer a declaração de morte
presumida.
2. A declaração de morte presumida não será proferida antes de haverem
decorrido cinco anos sobre a data em que o ausente, se fosse vivo, atingiria a
maioridade.
3. A declaração de morte presumida do ausente não depende de prévia
instalação da curadoria provisória ou definitiva e referir-se-á ao fim do dia
das últimas notícias que dele houve.
ARTIGO 115º
(Efeitos)
A declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos que a morte, mas
não dissolve o casamento, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 116º
(Novo casamento do cônjuge do ausente)
O cônjuge do ausente casado civilmente pode contrair novo casamento; neste
caso, se o ausente regressar, ou houver notícia de que era vivo quando foram
celebradas as novas núpcias, considera-se o primeiro matrimónio dissolvido por
divórcio à data da declaração de morte presumida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 117º
(Entrega dos bens)
A entrega dos bens aos sucessores do ausente é feita nos termos dos artigos
101º e seguintes, com as necessárias adaptações, mas não há lugar a caução; se
esta tiver sido prestada, pode ser levantada.
ARTIGO 118º
(Óbito em data diversa)
1. Quando se prove que o ausente morreu em data diversa da fixada na
sentença de declaração de morte presumida, o direito à herança compete aos que
naquela data lhe deveriam suceder, sem prejuízo das regras da usucapião.
2. Os sucessores de novo designados gozam apenas, em relação aos antigos,
dos direitos que no artigo seguinte são atribuídos ao ausente.
ARTIGO 119º
(Regresso do ausente)
1. Se o ausente regressar ou dele houver notícias, ser-lhe-á devolvido o
património no estado em que se encontrar, com o preço dos bens alienados ou com
os bens directamente sub-rogados, e bem assim com os bens adquiridos mediante o
preço dos alienados, quando no título de aquisição se declare expressamente a
proveniência do dinheiro.
2. Havendo má-fé dos sucessores, o ausente tem direito a ser indemnizado do
prejuízo sofrido.
3. A má-fé, neste caso, consiste no conhecimento de que o ausente
sobreviveu à data da morte presumida.
SUBSECÇÃO IV
Direitos eventuais do ausente
ARTIGO 120º
(Direitos que sobrevierem ao ausente)
Os direitos que eventualmente sobrevierem ao ausente desde que desapareceu
sem dele haver notícias e que sejam dependentes da condição da sua existência
passam às pessoas que seriam chamadas à titularidade deles se o ausente fosse
falecido.
ARTIGO 121º
(Curadoria provisória e definitiva)
1. O disposto no artigo anterior não altera o regime da curadoria
provisória, à qual ficam sujeitos os direitos nele referidos.
2. Instaurada a curadoria definitiva, são havidos como curadores
definitivos, para todos os efeitos legais, aqueles que seriam chamados à
titularidade dos direitos nos termos do mesmo artigo.
SECÇÃO V
Incapacidades
SUBSECÇÃO I
Condição jurídica dos menores
ARTIGO 122º
(Menores)
É menor quem não tiver ainda completado dezoito anos de idade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 123º
(Incapacidade dos menores)
Salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o
exercício de direitos.
ARTIGO 124º
(Suprimento da incapacidade dos menores)
A incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal e,
subsidiariamente, pela tutela, conforme se dispõe nos lugares respectivos.
ARTIGO 125º
(Anulabilidade dos actos dos menores)
1. Sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 287º, os negócios jurídicos
celebrados pelo menor podem ser anulados:
a) A requerimento, conforme os casos, do progenitor que exerça o poder
paternal, do tutor ou do administrador de bens, desde que a acção seja proposta
no prazo de um ano a contar do conhecimento que o requerente haja tido do
negócio impugnado, mas nunca depois de o menor atingir a maioridade ou ser
emancipado, salvo o disposto no artigo 131º;
b) A requerimento do próprio menor, no prazo de um ano a contar da sua
maioridade ou emancipação;
c) A requerimento de qualquer herdeiro do menor, no prazo de um ano a
contar da morte deste, ocorrida antes de expirar o prazo referido na alínea
anterior.
2. A anulabilidade é sanável mediante confirmação do menor depois de
atingir a maioridade ou ser emancipado, ou por confirmação do progenitor que
exerça o poder paternal, tutor ou administrador de bens, tratando-se de acto
que algum deles pudesse celebrar como representante do menor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 126º
(Dolo do menor)
Não tem o direito de invocar a anulabilidade o menor que para praticar o
acto tenha usado de dolo com o fim de se fazer passar por maior ou emancipado.
ARTIGO 127º
(Excepções à incapacidade dos menores)
1. São excepcionalmente válidos, além de outros previstos na lei:
a) Os actos de administração ou disposição de bens que o maior de dezasseis
anos haja adquirido por seu trabalho;
b) Os negócios jurídicos próprios da vida corrente do menor que, estando ao
alcance da sua capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposições de
bens, de pequena importância;
c) Os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que o menor
tenha sido autorizado a exercer, ou os praticados no exercício dessa profissão,
arte ou ofício.
2. Pelos actos relativos à profissão, arte ou ofício do menor e pelos actos
praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício só respondem os bens de
que o menor tiver a livre disposição.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 128º
(Dever de obediência)
Em tudo o quanto não seja ilícito ou imoral, devem os menores não
emancipados obedecer a seus pais ou tutor e cumprir os seus preceitos.
ARTIGO 129º
(Termo da incapacidade dos menores)
A incapacidade dos menores termina quando eles atingem a maioridade ou são
emancipados, salvas as restrições da lei.
SUBSECÇÃO II
Maioridade e emancipação
ARTIGO 130º
(Efeitos da maioridade)
Aquele que perfizer dezoito anos de idade adquire plena capacidade de
exercício de direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos
seus bens.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 131º
(Pendência da acção de interdição ou inabilitação)
Estando, porém, pendente contra o menor, ao atingir a maioridade, acção de
interdição ou inabilitação, manter-se-á o poder paternal ou a tutela até ao
trânsito em julgado da respectiva sentença.
ARTIGO 132º
(Emancipação)
O menor é, de pleno direito, emancipado pelo casamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 133º
(Efeitos da emancipação)
A emancipação atribui ao menor plena capacidade de exercício de direitos,
habilitando-o a reger a sua pessoa e a dispor livremente dos seus bens como se
fosse maior, salvo o disposto no artigo 1649º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 134º A 137º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO III
Interdições
ARTIGO 138º
(Pessoas sujeitas a interdição)
1. Podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que
por anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de
governar suas pessoas e bens.
2. As interdições são aplicáveis a maiores; mas podem ser requeridas e
decretadas dentro do ano anterior à maioridade, para produzirem os seus efeitos
a partir do dia em que o menor se torne maior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 139º
(Capacidade do interdito e regime da interdição)
Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, o interdito é equiparado ao
menor, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que
regulam a incapacidade por menoridade e fixam os meios de suprir o poder
paternal.
ARTIGO 140º
(Competência dos tribunais comuns)
Pertence ao tribunal por onde corre o processo de interdição a competência
atribuída ao tribunal de menores nas disposições que regulam o suprimento do
poder paternal.
ARTIGO 141º
(Legitimidade)
1. A interdição pode ser requerida pelo cônjuge do interditando, pelo tutor
ou curador deste, por qualquer parente sucessível ou pelo Ministério Público.
2. Se o interditando estiver sob o poder paternal, só têm legitimidade para
requerer a interdição os progenitores que exercerem aquele poder e o Ministério
Público.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 142º
(Providências provisórias)
1. Em qualquer altura do processo pode ser nomeado um tutor provisório que
celebre em nome do interditando, com autorização do tribunal, os actos cujo
adiamento possa causar-lhe prejuízo.
2. Pode também ser decretada a interdição provisória, se houver necessidade
urgente de providenciar quanto à pessoa e bens do interditando.
ARTIGO 143º
(A quem incumbe a tutela)
1. A tutela é deferida pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge do interdito, salvo se estiver separado judicialmente de
pessoas e bens ou separado de facto por culpa sua, ou se for por outra causa
legalmente incapaz;
b) À pessoa designada pelos pais ou pelo progenitor que exercer o poder
paternal, em testamento ou documento autêntico ou autenticado;
c) A qualquer dos progenitores do interdito que, de acordo com o interesse
deste, o tribunal designar;
d) Aos filhos maiores, preferindo o mais velho, salvo se o tribunal, ouvido
o conselho de família, entender que algum dos outros dá maiores garantias de
bom desempenho do cargo.
2. Quando não seja possível ou razões ponderosas desaconselham o
deferimento da tutela nos termos do número anterior, cabe ao tribunal designar
tutor, ouvido o conselho de família.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 144º
(Exercício do poder paternal)
Recaindo a tutela no pai ou na mãe, exercem estes o poder paternal como se
dispõe nos artigos 1878º e seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 145º
(Dever especial de tutor)
O tutor deve cuidar especialmente da saúde do interdito, podendo para esse
efeito alienar os bens deste, obtida a necessária autorização judicial.
ARTIGO 146º
(Escusa da tutela e
exoneração do tutor)
1. O cônjuge do interdito,
bem como os descendentes ou ascendentes deste, não podem escusar-se da tutela,
nem ser dela exonerados, salvo se tiver havido violação do disposto no artigo
143º.
2. Os descendentes do
interdito podem, contudo, ser exonerados a seu pedido ao fim de cinco anos, se
existirem outros dependentes igualmente idóneos para o exercício do cargo.
ARTIGO 147º
(Publicidade da
interdição)
À sentença de interdição
definitiva é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos
1920º-B e 1920º-C.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 148º
(Actos do interdito posteriores
ao registo da sentença)
São anuláveis os negócios
jurídicos celebrados pelo interdito depois do registo da sentença de interdição
definitiva.
ARTIGO 149º
(Actos praticados no
decurso da acção)
1. São igualmente anuláveis
os negócios jurídicos celebrados pelo incapaz depois de anunciada a proposição
da acção nos termos da lei de processo, contanto qua a interdição venha a ser
definitivamente decretada e se mostre que o negócio causou prejuízo ao
interdito.
2. O prazo dentro do qual a
acção de anulação deve ser proposta só começa a contar-se a partir do registo
da sentença.
ARTIGO 150º
(Actos anteriores à
publicidade da acção)
Aos negócios celebrados
pelo incapaz antes de anunciada a proposição da acção é aplicável o disposto
acerca da incapacidade acidental.
ARTIGO 151º
(Levantamento da
interdição)
Cessando a causa que
determinou a interdição, pode esta ser levantada a requerimento do próprio
interdito ou das pessoas mencionadas no nº 1 do artigo 141º.
SUBSECÇÃO IV
Inabilitações
Artigo 152º
(Pessoas sujeitas a
inabilitação)
Podem ser inabilitados os
indivíduos cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira, embora de carácter
permanente, não seja de tal modo grave que justifique a sua interdição, assim
como aqueles que, pela sua habitual prodigalidade ou pelo uso de bebidas
alcoólicas ou de estupefacientes, se mostrem incapazes de reger
convenientemente o seu património.
Artigo 153º
(Suprimento da
inabilidade)
1. Os inabilitados são
assistidos por um curador, a cuja autorização estão sujeitos os actos de
disposição de bens entre vivos e todos os que, em atenção às circunstâncias de
cada caso, forem especificados na sentença.
2. A autorização do curador
pode ser judicialmente suprida.
ARTIGO 154º
(Administração dos bens
do inabilitado)
1. A administração do
património do inabilitado pode ser entregue pelo tribunal, no todo ou em parte,
ao curador.
2. Neste caso, haverá lugar
à constituição do conselho de família e designação do vogal que, como
subcurador exerça as funções que na tutela cabem ao protutor.
3. O curador deve prestar
contas da sua administração.
ARTIGO 155º
(Levantamento da
inabilitação)
Quando a inabilitação tiver
por causa a prodigalidade ou o abuso de bebidas alcoólicas ou de
estupefacientes, o seu levantamento não será deferido antes que decorram cinco
anos sobre o trânsito em julgado da sentença que a decretou ou da decisão que
haja desatendido um pedido anterior.
ARTIGO 156º
(Regime supletivo)
Em tudo quanto se não ache
especialmente regulado nesta subsecção é aplicável à inabilitação, com as
necessárias adaptações, o regime das interdições.
CAPÍTULO II
Pessoas colectivas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 157º
(Campo de aplicação)
As disposições do presente
capítulo são aplicáveis às associações que não tenham por fim o lucro económico
dos associados, às fundações de interesse social, e ainda às sociedades, quando
a analogia das situações o justifique.
ARTIGO 158º
(Aquisição da
personalidade)
1. As associações
constituídas por escritura pública, com as especificações referidas no nº 1 do
artigo 167º, gozam de personalidade jurídica.
2. As fundações adquirem
personalidade jurídica pelo reconhecimento, o qual é individual e da
competência da autoridade administrativa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 158º-A
(Nulidade do acto de
constituição ou instituição)
É aplicável à constituição
de pessoas colectivas o disposto no artigo 280º, devendo o Ministério Público
promover a declaração judicial da nulidade.
(Aditado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 159º
(Sede)
A sede da pessoa colectiva
é a que os respectivos estatutos fixarem ou, na falta de designação
estatutária, o lugar em que funciona normalmente a administração principal.
ARTIGO 160º
(Capacidade)
1. A capacidade das pessoas
colectivas abrange todos os direitos e obrigações necessários ou convenientes à
prossecução dos seus fins.
2. Exceptuam-se os direitos
e obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis da personalidade
singular.
ARTIGO 161º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 162º
(Órgãos)
Os estatutos da pessoa
colectiva designarão os respectivos órgãos, entre os quais haverá um órgão
colegial de administração e um conselho fiscal, ambos eles constituídos por um
número ímpar de titulares, dos quais um será o presidente.
ARTIGO 163º
(Representação)
1. A representação da
pessoa colectiva, em juízo e fora dele, cabe a quem os estatutos determinarem
ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for
designado.
2. A designação de
representantes por parte da administração só é oponível a terceiros quando se
prove que estes a conheciam.
ARTIGO 164º
(Obrigações e
responsabilidade dos titulares dos órgãos da pessoa colectiva)
1. As obrigações e a
responsabilidade dos titulares dos órgãos das pessoas colectivas para com estas
são definidas nos respectivos estatutos, aplicando-se, na falta de disposições
estatutárias, as regras do mandato com as necessárias adaptações.
2. Os membros dos corpos
gerentes não podem abster-se de votar nas deliberações tomadas em reuniões a
que estejam presentes, e são responsáveis pelos prejuízos delas decorrentes,
salvo se houverem manifestado a sua discordância.
ARTIGO 165º
(Responsabilidade civil
das pessoas colectivas)
As pessoas colectivas
respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes
ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou
omissões dos seus comissários.
ARTIGO 166º
(Destino dos bens no
caso de extinção)
1. Extinta a pessoa
colectiva, se existirem bens que lhe tenham sido doados ou deixados com
qualquer encargo ou que estejam afectados a um certo fim, o tribunal, a
requerimento do Ministério Público, dos liquidatários, de qualquer associado ou
interessado, ou ainda de herdeiros do doador ou do autor da deixa
testamentária, atribuí-los-á, com o mesmo encargo ou afectação, a outra pessoa
colectiva.
2. Os bens não abrangidos
pelo número anterior têm o destino que lhes for fixado pelos estatutos ou por
deliberação dos associados, sem prejuízo do disposto em leis especiais; na
falta de fixação ou de lei especial, o tribunal, a requerimento do Ministério
Público, dos liquidatários, ou de qualquer associado ou interessado,
determinará que sejam atribuídos a outra pessoa colectiva ou ao Estado,
assegurando, tanto quanto possível, a realização dos fins da pessoa extinta.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Associações
ARTIGO 167º
(Acto de constituição e
estatutos)
1. O acto de constituição
da associação especificará os bens ou serviços com que os associados concorrem
para o património social, a denominação, fim e sede da pessoa colectiva, a
forma do seu funcionamento, assim como a sua duração, quando a associação se
não constitua por tempo indeterminado.
2. Os estatutos podem
especificar ainda os direitos e obrigações dos associados, as condições da sua
admissão, saída e exclusão, bem como os termos da extinção da pessoa colectiva
e consequente devolução do seu património.
ARTIGO 168º
(Forma e publicidade)
1. O acto de constituição
da associação, os estatutos e as suas alterações devem constar de escritura
pública.
2. O notário deve,
oficiosamente, a expensas da associação, comunicar a constituição e estatutos,
bem como as alterações destes, à autoridade administrativa e ao Ministério
Público e remeter ao jornal oficial um extracto para publicação.
3. O acto de constituição,
os estatutos e as suas alterações não produzem efeitos em relação a terceiros,
enquanto não forem publicados nos termos do número anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 169º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 170º
(Titulares dos órgãos da
associação e revogação dos seus poderes)
1. É a assembleia geral que
elege os titulares dos órgãos da associação, sempre que os estatutos não
estabeleçam outro processo de escolha.
2. As funções dos titulares
eleitos ou designados são revogáveis, mas a revogação não prejudica os direitos
fundados no acto de constituição.
3. O direito de revogação
pode ser condicionado pelos estatutos à existência de justa causa.
ARTIGO 171º
(Convocação e
funcionamento do órgão da administração e do conselho fiscal)
1. O órgão da administração
e o conselho fiscal são convocados pelos respectivos presidentes e só podem
deliberar com a presença da maioria dos seus titulares.
2. Salvo disposição legal
ou estatutária em contrário, as deliberações são tomadas por maioria de votos
dos titulares presentes, tendo o presidente, além do seu voto, direito a voto
de desempate.
ARTIGO 172º
(Competência da
assembleia geral)
1. Competem à assembleia
geral todas as deliberações não compreendidas nas atribuições legais ou
estatutárias de outros órgãos da pessoa colectiva.
2. São, necessariamente, da
competência da assembleia geral a destituição dos titulares dos órgãos da
associação, a aprovação do balanço, a alteração dos estatutos, a extinção da
associação e a autorização para esta demandar os administradores por factos
praticados no exercício do cargo.
ARTIGO 173º
(Convocação da
assembleia)
1. A assembleia geral deve
ser convocada pela administração nas circunstâncias fixadas pelos estatutos e,
em qualquer caso, uma vez em cada ano para aprovação do balanço.
2. A assembleia será ainda
convocada sempre que a convocação seja requerida, com um fim legítimo, por um
conjunto de associados não inferior à quinta parte da sua totalidade, se outro
número não for estabelecido nos estatutos.
3. Se a administração não
convocar a assembleia nos casos em que deve fazê-lo, a qualquer associado é
lícito efectuar a convocação.
ARTIGO 174º
(Forma de convocação)
1. A assembleia geral é
convocada por meio de aviso postal, expedido para cada um dos associados com a
antecedência mínima de oito dias; no aviso indicar-se-á o dia, hora e local da
reunião e a respectiva ordem do dia.
2. São anuláveis as
deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia, salvo se todos os
associados comparecerem à reunião e todos concordarem com o aditamento.
3. A comparência de todos
os associados sanciona quaisquer irregularidades da convocação, desde que
nenhum deles se oponha à realização da assembleia.
ARTIGO 175º
(Funcionamento)
1. A assembleia não pode
deliberar, em primeira convocação, sem a presença de metade, pelo menos, dos
seus associados.
2. Salvo o disposto nos
números seguintes, as deliberações são tomadas por maioria absoluta dos
associados presentes.
3. As deliberações sobre
alterações dos estatutos exigem o voto favorável de três quartos do número dos
associados presentes.
4. As deliberações sobre a
dissolução ou prorrogação da pessoa colectiva requerem o voto favorável de três
quartos do número de todos os associados.
5. Os estatutos podem
exigir um número de votos superior ao fixado nas regras anteriores.
ARTIGO 176º
(Privação do direito de
voto)
1. O associado não pode
votar, por si ou como representante de outrem, nas matérias em que haja
conflito de interesses entre a associação e ele, seu cônjuge, ascendentes ou
descendentes.
2. As deliberações tomadas
com infracção do disposto no número anterior são anuláveis se o voto do
associado impedido for essencial à existência da maioria necessária.
ARTIGO 177º
(Deliberações contrárias
à lei ou aos estatutos)
As deliberações da
assembleia geral contrárias à lei ou aos estatutos, seja pelo seu objecto, seja
por virtude de irregularidades havidas na convocação dos associados ou no
funcionamento da assembleia, são anuláveis.
ARTIGO 178º
(Regime da
anulabilidade)
1. A anulabilidade prevista
nos artigos anteriores pode ser arguida, dentro do prazo de seis meses, pelo
órgão da administração ou por qualquer associado que não tenha votado a
deliberação.
2. Tratando-se de associado
que não foi convocado regularmente para a reunião da assembleia, o prazo só
começa a correr a partir da data em que ele teve conhecimento da deliberação.
ARTIGO 179º
(Protecção dos direitos
de terceiro)
A anulação das deliberações
da assembleia não prejudica os direitos que terceiro de boa fé haja adquirido
em execução das deliberações anuladas.
ARTIGO 180º
(Natureza pessoal da
qualidade de associado)
Salvo disposição
estatutária em contrário, a qualidade de associado não é transmissível, quer
por acto entre vivos, quer por sucessão; o associado não pode incumbir outrem
de exercer os seus direitos pessoais.
ARTIGO 181º
(Efeitos da saída ou
exclusão)
O associado que por
qualquer forma deixar de pertencer à associação não tem o direito de repetir as
quotizações que haja pago e perde o direito ao património social, sem prejuízo
da sua responsabilidade por todas as prestações relativas ao tempo em que foi
membro da associação.
ARTIGO 182º
(Causas de extinção)
1. As associações
extinguem-se:
a) Por deliberação da
assembleia geral;
b) Pelo decurso do prazo,
se tiverem sido constituídas temporariamente;
c) Pela verificação de
qualquer outra causa extintiva prevista no acto de constituição ou nos
estatutos;
d) Pelo falecimento ou
desaparecimento de todos os associados;
e) Por decisão judicial que
declare a sua insolvência.
2. As associações
extinguem-se ainda por decisão judicial:
a) Quando o seu fim se
tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b) Quando o seu fim real
não coincida com o fim expresso no acto de constituição ou nos estatutos;
c) Quando o seu fim seja
sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou imorais;
d) Quando a sua existência
se torne contrária à ordem pública.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 183º
(Declaração da extinção)
1. Nos casos previstos nas
alíneas b) e c) do nº 1 do artigo anterior, a extinção só se produzirá se, nos
trinta dias subsequentes à data em que devia operar-se, a assembleia geral não
decidir a prorrogação da associação ou a modificação dos estatutos.
2. Nos casos previstos no
nº 2 do artigo precedente, a declaração da extinção pode ser pedida em juízo
pelo Ministério Público ou por qualquer interessado.
3. A extinção por virtude
da declaração de insolvência dá-se em consequência da própria declaração.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 184º
(Efeitos da extinção)
1. Extinta a associação, os
poderes dos seus órgãos ficam limitados à prática dos actos meramente
conservatórios e dos necessários, quer à liquidação do património social, quer
à ultimação dos negócios pendentes; pelos actos restantes e pelos danos que
deles advenham à associação respondem solidariamente os administradores que os
praticarem.
2. Pelas obrigações que os
administradores contraírem, a associação só responde perante terceiros se estes
estavam de boa fé e à extinção não tiver sido dada a devida publicidade.
SECÇÃO III
Fundações
ARTIGO 185º
(Instituição e sua
revogação)
1. As fundações podem ser
instituídas por acto entre vivos ou por testamento, valendo como aceitação dos
bens a elas destinados, num caso ou noutro, o reconhecimento respectivo.
2. O reconhecimento pode
ser requerido pelo instituidor, seus herdeiros ou executores testamentários, ou
ser oficiosamente promovido pela autoridade competente.
3. A instituição por actos
entre vivos deve constar de escritura pública e torna-se irrevogável logo que
seja requerido o reconhecimento ou principie o respectivo processo oficioso.
4. Aos herdeiros do
instituidor não é permitido revogar a instituição, sem prejuízo do disposto acerca
da sucessão legitimária.
5. Ao acto de instituição
da fundação, quando conste de escritura pública, bem como, em qualquer caso,
aos estatutos e suas alterações, é aplicável o disposto na parte final do
artigo 168º.
ARTIGO 186º
(Acto de instituição e
estatutos)
1. No acto de instituição
deve o instituidor indicar o fim da fundação e especificar os bens que lhe são
destinados.
2. No acto de instituição
ou nos estatutos pode o instituidor providenciar ainda sobre a sede,
organização e funcionamento da fundação, regular os termos da sua transformação
ou extinção e fixar o destino dos respectivos bens.
ARTIGO 187º
(Estatutos lavrados por
pessoa diversa do instituidor)
1. Na falta de estatutos
lavrados pelo instituidor ou na insuficiência deles, constando a instituição de
testamento, é aos executadores deste que compete elaborá-los ou completá-los.
2. A elaboração total ou
parcial dos estatutos incumbe à própria autoridade competente para o
reconhecimento da fundação, quando o instituidor os não tenha feito e a
instituição não conste de testamento, ou quando os executores testamentários os
não lavrem dentro do ano posterior à abertura da sucessão.
3. Na elaboração dos
estatutos ter-se-á em conta, na medida do possível, a vontade real ou
presumível do fundador.
ARTIGO 188º
(Reconhecimento)
1. Não será reconhecida a
fundação cujo fim não for considerado de interesse social pela entidade
competente.
2. Será igualmente negado o
reconhecimento, quando os bens afectados à fundação se mostrem insuficientes
para a prossecução do fim visado e não haja fundadas expectativas de suprimento
da insuficiência.
3. Negado o reconhecimento
por insuficiência do património, fica a instituição sem efeito, se o
institutidor for vivo; mas, se já houver falecido, serão os bens entregues a
uma associação ou fundação de fins análogos, que a entidade competente
designar, salvo disposição do instituidor em contrário.
ARTIGO 189º
(Modificação dos
estatutos)
Os estatutos da fundação
podem a todo o tempo ser modificados pela autoridade competente para o
reconhecimento, sob proposta da respectiva administração, contanto que não haja
alteração essencial do fim da instituição e se não contrarie a vontade do
fundador.
ARTIGO 190º
(Transformação)
1. Ouvida a administração,
e também o fundador, se for vivo, a entidade competente para o reconhecimento
pode atribuir à fundação um fim diferente:
a) Quando tiver sido
inteiramente preenchido o fim para que foi instituída ou este se tiver tornado
impossível;
b) Quando o fim da
instituição deixar de revestir interesse social;
c) Quando o património se
tornar insuficiente para a realização do fim previsto.
2. O novo fim deve
aproximar-se, no que for possível, do fim fixado pelo fundador.
3. Não há lugar à mudança
de fim, se o acto de instituição prescrever a extinção da fundação.
ARTIGO 191º
(Encargo prejudicial aos
fins da fundação)
1. Estando o património da
fundação onerado com encargos cujo cumprimento impossibilite ou dificulte
gravemente o preenchimento do fim institucional, pode a entidade competente
para o reconhecimento sob proposta da administração, suprimir, reduzir ou
comutar esses encargos, ouvido o fundador, se for vivo.
2. Se, porém, o encargo
tiver sido motivo essencial da instituição, pode a mesma entidade considerar o
seu cumprimento como fim da fundação, ou incorporar a fundação noutra pessoa
colectiva capaz de satisfazer o encargo à custa do património incorporado, sem
prejuízo dos seus próprios fins.
ARTIGO 192º
(Causas de extinção)
1. As fundações
extinguem-se:
a) Pelo decurso do prazo,
se tiverem sido constituídas temporariamente;
b) Pela verificação de
qualquer outra causa extintiva prevista no acto de instituição;
c) Por decisão judicial que
declare a sua insolvência.
2. As fundações podem ainda
ser extintas pela entidade competente para o reconhecimento:
a) Quando o seu fim se
tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b) Quando o seu fim real
não coincida com o fim expresso no acto de instituição;
c) Quando o seu fim seja
sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou imorais;
d) Quando a sua existência
se torne contrária à ordem pública.
ARTIGO 193º
(Declaração da extinção)
Quando ocorra alguma das
causas extintivas previstas no nº 1 do artigo anterior, a administração da
fundação comunicará o facto à autoridade competente para o reconhecimento, a
fim de esta declarar a extinção e tomar as providências que julgue convenientes
para a liquidação do património.
ARTIGO 194º
(Efeitos da extinção)
Extinta a fundação, na
falta de providências especiais em contrário tomadas pela autoridade competente,
é aplicável o disposto no artigo 184º.
CAPÍTULO III
Associações sem
personalidade jurídica e comissões especiais
ARTIGO 195º
(Organização e
administração)
1. À organização interna e
administração das associações sem personalidade jurídica são aplicáveis as
regras estabelecidas pelos associados e, na sua falta, as disposições legais
relativas às associações, exceptuadas as que pressupõem a personalidade destas.
2. As limitações impostas
aos poderes normais dos administradores só são oponíveis a terceiro quando este
as conhecia ou devia conhecer.
3. À saída dos associados é
aplicável o disposto no artigo 181º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 196º
(Fundo comum das
associações)
1. As contribuições dos
associados e os bens com elas adquiridos constituem o fundo comum da
associação.
2. Enquanto a associação
subsistir, nenhum associado pode exigir a divisão do fundo comum e nenhum
credor dos associados tem o direito de o fazer excutir.
ARTIGO 197º
(Liberalidades)
1. As liberalidades em
favor de associações sem personalidade jurídica consideram-se feitas aos
respectivos associados, nessa qualidade, salvo se o autor tiver condicionado a
deixa ou doação à aquisição da personalidade jurídica; neste caso, se tal
aquisição se não verificar dentro do prazo de um ano, fica a disposição sem
efeito.
2. Os bens deixados ou
doados à associação sem personalidade jurídica acrescem ao fundo comum,
independentemente de outro acto de transmissão.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 198º
(Responsabilidade por
dívidas)
1. Pelas obrigações
validamente assumidas em nome da associação responde o fundo comum e, na falta
ou insuficiência deste, o património daquele que as tiver contraído; sendo o
acto praticado por mais de uma pessoa, respondem todas solidariamente.
2. Na falta ou
insuficiência do fundo comum e do património dos associados directamente
responsáveis, têm os credores acção contra os restantes associados, que
respondem proporcionalmente à sua entrada para o fundo comum.
3. A representação em juízo
do fundo comum cabe àqueles que tiverem assumido a obrigação.
ARTIGO 199º
(Comissões especiais)
As comissões constituídas
para realizar qualquer plano de socorro ou beneficiência, ou promover a
execução de obras públicas, monumentos, festivais, exposições, festejos e actos
semelhantes, se não pedirem o reconhecimento da personalidade da associação ou
não a obtiverem, ficam sujeitas, na falta de lei em contário, às disposições
subsequentes.
ARTIGO 200º
(Responsabilidade dos
organizadores e administradores)
1. Os membros da comissão e
os encarregados de administrar os seus fundos são pessoal e solidariamente
responsáveis pela conservação dos fundos recolhidos e pela sua afectação ao fim
anunciado.
2. Os membros da comissão
respondem ainda, pessoal e solidariamente, pelas obrigações contraídas em nome
dela.
3. Os subscritores só podem
exigir o valor que tiverem subscrito quando se não cumpra, por qualquer motivo,
o fim para que a comissão foi constituída.
ARTIGO 201º
(Aplicação dos bens a
outro fim)
1. Se os fundos angariados
forem insuficientes para o fim anunciado, ou este se mostrar impossível, ou
restar algum saldo depois de satisfeito o fim da comissão, os bens terão a
aplicação prevista no acto constitutivo da comissão ou no programa anunciado.
2. Se nenhuma aplicação
tiver sido prevista e a comissão não quiser aplicar os bens a um fim análogo,
cabe à autoridade administrativa prover sobre o seu destino, respeitando na
medida do possível a intenção dos subscritores.
SUBTÍTULO II
Das coisas
ARTIGO 202º
(Noção)
1. Diz-se coisa tudo aquilo
que pode ser objecto de relações jurídicas.
2. Consideram-se, porém,
fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos
privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por
sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual.
ARTIGO 203º
(Classificação das
coisas)
As coisas são imóveis ou
móveis, simples ou compostas, fungíveis ou não fungíveis, consumíveis ou não
consumíveis, divisíveis ou indivisíveis, principais ou acessórias, presentes ou
futuras.
ARTIGO 204º
(Coisas imóveis)
1. São coisas imóveis:
a) Os prédios rústicos e
urbanos;
b) As águas;
c) As árvores, os arbustos
e os frutos naturais, enquanto estiverem ligados ao solo;
d) Os direitos inerentes
aos imóveis mencionados nas alíneas anteriores;
e) As partes integrantes
dos prédios rústicos e urbanos.
2. Entende-se por prédio
rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não
tenham autonomia económica, e por prédio urbano qualquer edifício incorporado
no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro.
3. É parte integrante toda
a coisa móvel ligada materialmente ao prédio com carácter de permanência.
ARTIGO 205º
(Coisas móveis)
1. São móveis todas as
coisas não compreendidas no artigo anterior.
2. Às coisas móveis
sujeitas a registo público é aplicável o regime das coisas móveis em tudo o que
não seja especialmente regulado.
ARTIGO 206º
(Coisas compostas)
1. É havida como coisa
composta, ou universalidade de facto, a pluralidade de coisas móveis que,
pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário.
2. As coisas singulares que
constituem a universalidade podem ser objecto de relações jurídicas próprias.
ARTIGO 207º
(Coisas fungíveis)
São fungíveis as coisas que
se determinam pelo seu género, qualidade e quantidade, quando constituam
objecto de relações jurídicas.
ARTIGO 208º
(Coisas consumíveis)
São consumíveis as coisas
cujo uso regular importa a sua destruição ou a sua alienação.
ARTIGO 209º
(Coisas divisíveis)
São divisíveis as coisas
que podem ser fraccionadas sem alteração da sua substância, diminuição de valor
ou prejuízo para o uso a que se destinam.
ARTIGO 210º
(Coisas acessórias)
1. São coisas acessórias,
ou pertenças, as coisas móveis que, não constituindo partes integrantes, estão afectadas
por forma duradoura ao serviço ou ornamentação de uma outra.
2. Os negócios jurídicos
que têm por objecto a coisa principal não abrangem, salvo declaração em
contrário, as coisas acessórias.
ARTIGO 211º
(Coisas futuras)
São coisas futuras as que não
estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da
declaração negocial.
ARTIGO 212º
(Frutos)
1. Diz-se fruto de uma
coisa tudo o que ela produz periodicamente, sem prejuízo da sua substância.
2. Os frutos são naturais
ou civis; dizem-se naturais os que provêm directamente da coisa, e civis as
rendas ou interesses que a coisa produz em consequência de uma relação
jurídica.
3. Consideram-se frutos das
universalidades de animais as crias não destinadas à substituição das cabeças
que por qualquer causa vierem a faltar, os despojos, e todos os proventos
auferidos, ainda que a título eventual.
ARTIGO 213º
(Partilha dos frutos)
1. Os que têm direito aos
frutos naturais até um momento determinado, ou a partir de certo momento, fazem
seus todos os frutos percebidos durante a vigência do seu direito.
2. Quanto a frutos civis, a
partilha faz-se proporcionalmente à duração do direito.
ARTIGO 214º
(Frutos colhidos
prematuramente)
Quem colher prematuramente
frutos naturais é obrigado a restituí-los, se vier a extinguir-se o seu direito
antes da época normal das colheitas.
ARTIGO 215º
(Restituição de frutos)
1. Quem for obrigado por
lei à restituição de frutos percebidos tem direito a ser indemnizado das
despesas de cultura, sementes e matérias-primas e dos restantes encargos de
produção e colheita, desde que não sejam superiores ao valor desses frutos.
2. Quando se trate de
frutos pendentes, o que é obrigado à entrega da coisa não tem direito a
qualquer indemnização, salvo nos casos especialmente previstos na lei.
ARTIGO 216º
(Benfeitorias)
1. Consideram-se
benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa.
2. As benfeitorias são
necessárias, úteis ou voluptuárias.
3. São benfeitorias
necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da
coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe
aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para
a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do
benfeitorizante.
SUBTÍTULO III
DOS FACTOS JURÍDICOS
CAPÍTULO I
Negócio jurídico
SECÇÃO I
Declaração negocial
SUBSECÇÃO I
Modalidades da
declaração
ARTIGO 217º
(Declaração expressa e
declaração tácita)
1. A declaração negocial
pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou
qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se
deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.
2. O carácter formal da
declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha
sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.
ARTIGO 218º
(O silêncio como meio
declarativo)
O silêncio vale como
declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou
convenção.
SUBSECÇÃO II
Forma
ARTIGO 219º
(Liberdade de forma)
A validade da declaração
negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a
exigir.
ARTIGO 220º
(Inobservância da forma
legal)
A declaração negocial que
careça da forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção
especialmente prevista na lei.
ARTIGO 221º
(Âmbito da forma legal)
1. As estipulações verbais
acessórias anteriores ao documento legalmente exigido para a declaração
negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante
da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à vontade do autor
da declaração.
2. As estipulações
posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal prescrita para a
declaração se as razões da exigência especial da lei lhe forem aplicáveis.
ARTIGO 222º
(Âmbito da forma
voluntária)
1. Se a forma escrita não
for exigida por lei, mas tiver sido adoptada pelo autor da declaração, as
estipulações verbais acessórias anteriores ao escrito, ou contemporâneas dele,
são válidas, quando se mostre que correspondem à vontade do declarante e a lei
as não sujeite à forma escrita.
2. As estipulações verbais
posteriores ao documento são válidas, excepto se, para o efeito, a lei exigir a
forma escrita.
ARTIGO 223º
(Forma convencional)
1. Podem as partes
estipular uma forma especial para a declaração; presume-se, neste caso, que as
partes se não querem vincular senão pela forma convencionada.
2. Se, porém, a forma só
for convencionada depois de o negócio estar concluído ou no momento da sua
conclusão, e houver fundamento para admitir que as partes se quiseram vincular
desde logo, presume-se que a convenção teve em vista a consolidação do negócio,
ou qualquer outro efeito, mas não a sua substituição.
SUBSECÇÃO III
Perfeição da declaração
negocial
ARTIGO 224º
(Eficácia da declaração
negocial)
1. A declaração negocial
que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele
conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma
adequada.
2. É também considerada
eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele
oportunamente recebida.
3. A declaração recebida
pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é
ineficaz.
ARTIGO 225º
(Anúncio público da
declaração)
A declaração pode ser feita
mediante anúncio publicado num dos jornais da residência do declarante, quando
se dirija a pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja por aquele ignorado.
ARTIGO 226º
(Morte, incapacidade ou
indisponibilidade superveniente)
1. A morte ou incapacidade
do declarante, posterior à emissão da declaração, não prejudica a eficácia
desta, salvo se o contrário resultar da própria declaração.
2. A declaração é ineficaz,
se o declarante, enquanto o destinatário não a receber ou dela não tiver
conhecimento, perder o poder de disposição do direito a que ela se refere.
ARTIGO 227º
(Culpa na formação dos
contratos)
1. Quem negoceia com outrem
para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação
dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos
que culposamente causar à outra parte.
2. A responsabilidade
prescreve nos termos do artigo 498º.
ARTIGO 228º
(Duração da proposta
contratual)
1. A proposta do contrato
obriga o proponente nos termos seguintes:
a) Se for fixado pelo
proponente ou convencionado pelas partes um prazo para a aceitação, a proposta
mantém-se até o prazo findar;
b) Se não for fixado prazo,
mas o proponente pedir resposta imediata, a proposta mantém-se até que, em
condições normais, esta e a aceitação cheguem ao seu destino;
c) Se não for fixado prazo
e a proposta for feita a pessoa ausente ou, por escrito, a pessoa presente,
manter-se-á até cinco dias depois do prazo que resulta do preceituado na alínea
precedente.
2. O disposto no número
anterior não prejudica o direito de revogação da proposta nos termos em que a
revogação é admitida no artigo 230º.
ARTIGO 229º
(Recepção tardia)
1. Se o proponente receber
a aceitação tardiamente, mas não tiver razões para admitir que ela foi expedida
fora do tempo, deve avisar imediatamente o aceitante de que o contrato se não
concluiu, sob pena de responder pelo prejuízo havido.
2. O proponente pode,
todavia, considerar eficaz a resposta tardia, desde que ela tenha sido expedida
em tempo oportuno; em qualquer outro caso, a formação do contrato depende de
nova proposta e nova aceitação.
ARTIGO 230º
(Irrevogabilidade da
proposta)
1. Salvo declaração em
contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo destinatário
ou de ser dele conhecida.
2. Se, porém, ao mesmo
tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retractação do
proponente ou tiver por outro meio conhecimento dela, fica a proposta sem
efeito.
3. A revogação da proposta,
quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja feita na forma da oferta
ou em forma equivalente.
ARTIGO 231º
(Morte ou incapacidade
do proponente ou do destinatário)
1. Não obsta à conclusão do
contrato a morte ou incapacidade do proponente, excepto se houver fundamento
para presumir que outra teria sido a sua vontade.
2. A morte ou incapacidade
do destinatário determina a ineficácia da proposta.
ARTIGO 232º
(Âmbito do acordo de
vontades)
O contrato não fica
concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre
as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.
ARTIGO 233º
(Aceitação com
modificações)
A aceitação com
aditamentos, limitações ou outras modificações importa a rejeição da proposta;
mas, se a modificação for suficientemente precisa, equivale a nova proposta,
contanto que outro sentido não resulte da declaração.
Artigo 234º
(Dispensa da declaração
de aceitação)
Qaundo a proposta, a
própria natureza ou circunstâncias do negócio, ou os usos tornem dispensável a
declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da
outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta.
Artigo 235º
(Revogação da aceitação
ou da rejeição)
1. Se o destinatário
rejeitar a proposta, mas depois a aceitar, prevalece a aceitação, desde que
esta chegue ao poder do proponente, ou seja dele conhecida, ao mesmo tempo que
a rejeição, ou antes dela.
2. A aceitação pode ser
revogada mediante declaração que ao mesmo tempo, ou antes dela, chegue ao poder
do proponente ou seja dele conhecida.
SUBSECÇÃO IV
Interpretação e
integração
ARTIGO 236º
(Sentido normal da
declaração)
1. A declaração negocial
vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real
declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não
puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o
declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale
a declaração emitida.
ARTIGO 237º
(Casos duvidosos)
Em caso de dúvida sobre o
sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para
o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das
prestações.
ARTIGO 238º
(Negócios formais)
1. Nos negócios formais não
pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência
no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
2. Esse sentido pode,
todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e as razões
determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade.
ARTIGO 239º
(Integração)
Na falta de disposição
especial, a declaração negocial deve ser integrada de harmonia com a vontade
que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo
com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por eles imposta.
SUBSECÇÃO V
Falta e vícios da
vontade
ARTIGO 240º
(Simulação)
1. Se, por acordo entre
declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver
divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o
negócio diz-se simulado.
2. O negócio simulado é
nulo.
ARTIGO 241º
(Simulação relativa)
1. Quando sob o negócio
simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o
regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a
sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado.
2. Se, porém, o negócio
dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma
exigida por lei.
ARTIGO 242º
(Legitimidade para
arguir a simulação)
1. Sem prejuízo do disposto
no artigo 286º, a nulidade do negócio simulado pode ser arguida pelos próprios
simuladores entre si, ainda que a simulação seja fraudulenta.
2. A nulidade pode também
ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam agir em vida do autor
da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os
prejudicar.
ARTIGO 243º
(Inoponibilidade da
simulação a terceiros de boa fé)
1. A nulidade proveniente
da simulação não pode ser arguida pelo simulador contra terceiro de boa fé.
2. A boa fé consiste na
ignorância da simulação ao tempo em que foram constituídos os respectivos
direitos.
3. Considera-se sempre de
má fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da acção de
simulação, quando a este haja lugar.
ARTIGO 244º
(Reserva mental)
1. Há reserva mental,
sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade real com o intuito de
enganar o declaratário.
2. A reserva não prejudica
a validade da declaração, excepto se for conhecida do declaratário; neste caso,
a reserva tem os efeitos da simulação.
ARTIGO 245º
(Declarações não sérias)
1. A declaração não séria,
feita na expectativa de que a falta de seriedade não seja desconhecida, carece
de qualquer efeito.
2. Se, porém, a declaração
for feita em circunstâncias que induzam o declaratário a aceitar
justificadamente a sua seriedade, tem ele o direito de ser indemnizado pelo
prejuízo que sofrer.
ARTIGO 246º
(Falta de consciência da
declaração e coacção física)
A declaração não produz
qualquer efeito, se o declarante não tiver a consciência de fazer uma
declaração negocial ou for coagido pela força física a emiti-la; mas, se a
falta de consciência da declaração foi devida a culpa, fica o declarante
obrigado a indemnizar o declaratário.
ARTIGO 247º
(Erro na declaração)
Quando, em virtude de erro,
a vontade declarada não corresponda à vontade real do autor, a declaração
negocial é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar
a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro.
ARTIGO 248º
(Validação do negócio)
A anulabilidade fundada em
erro na declaração não procede, se o declaratário aceitar o negócio como o
declarante o queria.
ARTIGO 249º
(Erro de cálculo ou de
escrita)
O simples erro de cálculo
ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das
circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá o direito à rectificação
desta.
ARTIGO 250º
(Erro na trasmissão da
declaração)
1. A declaração negocial
inexactamente transmitida por quem seja incumbido da transmissão pode ser
anulada nos termos do artigo 247º.
2. Quando, porém, a
inexactidão for devida a dolo do intermediário, a declaração é sempre anulável.
ARTIGO 251º
(Erro sobre a pessoa ou
sobre o objecto do negócio)
O erro que atinja os
motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa do declaratário ou
ao objecto do negócio, torna este anulável nos termos do artigo 247º.
ARTIGO 252º
(Erro sobre os motivos)
1. O erro que recaia nos
motivos determinantes da vontade, mas se não refira à pessoa do declaratário
nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes houverem
reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo.
2. Se, porém, recair sobre
as circunstâncias que constituem a base do negócio, é aplicável ao erro do
declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por
alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio foi
concluído.
ARTIGO 253º
(Dolo)
1. Entende-se por dolo
qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou
consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a
dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante.
2. Não constituem dolo
ilícito as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos segundo as
concepções dominantes no comércio jurídico, nem a dissimulação do erro, quando
nenhum dever de elucidar o declarante resulte da lei, de estipulação negocial
ou daquelas concepções.
ARTIGO 254º
(Efeitos do dolo)
1. O declarante cuja
vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a declaração; a
anulabilidade não é excluída pelo facto de o dolo ser bilateral.
2. Quando o dolo provier de
terceiro, a declaração só é anulável se o destinatário tinha ou devia ter
conhecimento dele; mas, se alguém tiver adquirido directamente algum direito
por virtude da declaração, esta é anulável em relação ao beneficiário, se tiver
sido ele o autor do dolo ou se o conhecia ou devia ter conhecido.
ARTIGO 255º
(Coacção moral)
1. Diz-se feita sob coacção
moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o
declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração.
2. A ameaça tanto pode
respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro.
3. Não constitui coacção a
ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial.
ARTIGO 256º
(Efeitos da coacção)
A declaração negocial
extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha de terceiro; neste
caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua
consumação.
ARTIGO 257º
(Incapacidade acidental)
1. A declaração negocial
feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava acidentalmente
incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua
vontade é anulável, desde que o facto seja notório ou conhecido do
declaratário.
2. O facto é notório,
quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar.
SUBSECÇÃO VI
Representação
DIVISÃO I
Princípios gerais
ARTIGO 258º
(Efeitos da
representação)
O negócio jurídico
realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes
que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.
ARTIGO 259º
(Falta ou vícios da
vontade e estados subjectivos relevantes)
1. À excepção dos elementos
em que tenha sido decisiva a vontade do representado, é na pessoa do
representante que deve verificar-se, para efeitos de nulidade ou anulabilidade
da declaração, a falta ou vício da vontade, bem como o conhecimento ou
ignorância dos factos que podem influir nos efeitos do negócio.
2. Ao representado de má fé
não aproveita a boa fé do representante.
ARTIGO 260º
(Justificação dos
poderes do representante)
1. Se uma pessoa dirigir em
nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante,
dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração
não produzir efeitos.
2. Se os poderes de
representação constarem de documento, pode o terceiro exigir uma cópia dele
assinada pelo representante.
ARTIGO 261º
(Negócio consigo mesmo)
1. É anulável o negócio
celebrado pelo representante consigo mesmo, seja em nome próprio, seja em
representação de terceiro, a não ser que o representado tenha especificadamente
consentido na celebração, ou que o negócio excluía por sua natureza a
possibilidade de um conflito de interesses.
2. Considera-se celebrado
pelo representante, para o efeito do número precedente, o negócio realizado por
aquele em quem tiverem sido substabelecidos os poderes de representação.
DIVISÃO II
Representação voluntária
ARTIGO 262º
(Procuração)
1. Diz-se procuração o acto
pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos.
2. Salvo disposição legal
em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o
procurador deva realizar.
ARTIGO 263º
(Capacidade do
procurador)
O procurador não necessita
de ter mais do que a capacidade de entender e querer exigida pela natureza do
negócio que haja de efectuar.
ARTIGO 264º
(Substituição do
procurador)
1. O procurador só pode
fazer-se substituir por outrem se o representado o permitir ou se a faculdade
de substituição resultar do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que a
determina.
2. A substituição não
envolve exclusão do procurador primitivo, salvo declaração em contrário.
3. Sendo autorizada a
substituição, o procurador só é responsável para com o representado se tiver
agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu.
4. O procurador pode
servir-se de auxiliares na execução da procuração, se outra coisa não resultar
do negócio ou da natureza do acto que haja de praticar.
ARTIGO 265º
(Extinção da procuração)
1. A procuração extingue-se
quando o procurador a ela renuncia, ou quando cessa a relação jurídica que lhe
serve de base, excepto se outra for, neste caso, a vontade do representado.
2. A procuração é
livremente revogável pelo representado, não obstante convenção em contrário ou
renúncia ao direito de revogação.
3. Mas, se a procuração
tiver sido conferida também no interesse do procurador ou de terceiro, não pode
ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.
ARTIGO 266º
(Protecção de terceiros)
1. As modificações e a
revogação da procuração devem ser levadas ao conhecimento de terceiros por
meios idóneos, sob pena de lhes não serem oponíveis senão quando se mostre que
delas tinham conhecimento no momento da conclusão do negócio.
2. As restantes causas
extintivas da procuração não podem ser opostas a terceiro que sem culpa, as
tenha ignorado.
ARTIGO 267º
(Restituição do
documento da representação)
1. O representante deve
restituir o documento de onde constem os seus poderes, logo que a procuração
tiver caducado.
2. O representante não goza
do direito de retenção do documento.
ARTIGO 268º
(Representação sem
poderes)
1. O negócio que uma
pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de outrem é ineficaz em
relação a este, se não for por ele ratificado.
2. A ratificação está
sujeita à forma exigida para a procuração e tem eficácia retroactiva, sem
prejuízo dos direitos de terceiro.
3. Considera-se negada a ratificação,
se não for feita dentro do prazo que a outra parte fixar para o efeito.
4. Enquanto o negócio não
for ratificado, tem a outra parte a faculdade de o revogar ou rejeitar, salvo
se, no momento da conclusão, conhecia a falta de poderes do representante.
ARTIGO 269º
(Abuso da representação)
O disposto no artigo
anterior é aplicável ao caso de o representante ter abusado dos seus poderes,
se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso.
SUBSECÇÃO VII
Condição e termo
ARTIGO 270º
(Noção de condição)
As partes podem subordinar
a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico
ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo,
resolutiva.
ARTIGO 271º
(Condições ilícitas ou
impossíveis)
1. É nulo o negócio
jurídico subordinado a uma condição contrária à lei ou à ordem pública, ou
ofensiva dos bons costumes.
2. É igualmente nulo o
negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente
impossível; se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita.
ARTIGO 272º
(Pendência da condição)
Aquele que contrair uma
obrigação ou alienar um direito sob condição suspensiva, ou adquirir um direito
sob condição resolutiva, deve agir, na pendência da condição, segundo os
ditames da boa fé, por forma que não comprometa a integridade do direito da
outra parte.
ARTIGO 273º
(Pendência da condição:
actos conservatórios)
Na pendência da condição
suspensiva, o adquirente do direito pode praticar actos conservatórios, e
igualmente os pode realizar, na pendência da condição resolutiva, o devedor ou
o alienante condicional.
ARTIGO 274º
(Pendência da condição:
actos dispositivos)
1. Os actos de disposição
dos bens ou direitos que constituem objecto do negócio condicional, realizados
na pendência da condição, ficam sujeitos à eficácia ou ineficácia do próprio
negócio, salvo estipulação em contrário.
2. Se houver lugar à
restituição do que tiver sido alienado, é aplicável, directamente ou por
analogia, o disposto nos artigos 1269º e seguintes em relação ao possuidor de
boa fé.
ARTIGO 275º
(Verificação e não
verificação da condição)
1. A certeza de que a
condição se não pode verificar equivale à sua não verificação.
2. Se a verificação da
condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica,
tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem
aproveita, considera-se como não verificada.
ARTIGO 276º
(Retroactividade da
condição)
Os efeitos do preenchimento
da condição retrotraem-se à data da conclusão do negócio, a não ser que, pela
vontade das partes ou pela natureza do acto, hajam de ser reportados a outro
momento.
ARTIGO 277º
(Não retroactividade)
1. Sendo a condição
resolutiva aposta a um contrato de execução continuada ou periódica, é
aplicável o disposto no nº 2 do art. 434º.
2. O preenchimento da
condição não prejudica a validade dos actos de administração ordinária
realizados, enquanto a condição estiver pendente, pela parte a quem incumbir o
exercício do direito.
3. À aquisição de frutos
pela parte a que se refere o número anterior são aplicáveis as disposições
relativas à aquisição de frutos pelo possuidor de boa fé.
ARTIGO 278º
(Termo)
Se for estipulado que os
efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento, é
aplicável à estipulação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos
272º e 273º.
ARTIGO 279º
(Cômputo do termo)
À fixação do termo são
aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras:
a) Se o termo se referir ao
princípio, meio ou fim do mês, entende-se como tal, respectivamente, o primeiro
dia, o dia 15 e o último dia do mês; se for fixado no princípio, meio ou fim do
ano, entende-se, respectivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de Junho e o
dia 31 de Dezembro;
b) Na contagem de qualquer
prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer
o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
c) O prazo fixado em
semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que
corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no
último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse
mês;
d) É havido,
respectivamente, como prazo de uma ou duas semanas o designado por oito ou
quinze dias, sendo havido como prazo de um ou dois dias o designado por 24 ou
48 horas;
e) O prazo que termine em
domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e
dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo
tiver de ser praticado em juízo.
SECÇÃO II
Objecto negocial.
Negócios usurários
ARTIGO 280º
(Requisitos do objecto
negocial)
1. É nulo o negócio
jurídico cujo objecto seja física ou legamente impossível, contrário à lei ou
indeterminável.
2. É nulo o negócio
contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes.
ARTIGO 281º
(Fim contrário à lei ou
à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes)
Se apenas o fim do negócio
jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes,
o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes.
ARTIGO 282º
(Negócios usurários)
1. É anulável, por usura, o
negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade,
inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de
outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de
benefícios excessivos ou injustificados.
2. Fica ressalvado o regime
especial estabelecido nos artigos 559º-A e 1146º.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
ARTIGO 283º
(Modificação dos
negócios usurários)
1. Em lugar da anulação, o
lesado pode requerer a modificação do negócio segundos juízos de equidade.
2. Requerida a anulação, a
parte contrária tem a faculdade de opor-se ao pedido, declarando aceitar a
modificação do negócio nos termos do número anterior.
ARTIGO 284º
(Usura criminosa)
Quando o negócio usurário
constituir crime, o prazo para o exercício do direito de anulação ou
modificação não termina enquanto o crime não prescrever; e, se a
responsabilidade criminal se extinguir por causa diferente da prescrição ou no
juízo penal for proferida sentença que transite em julgado, aquele prazo
conta-se da data da extinção da responsabilidade criminal ou daquela em que a
sentença transitar em julgado, salvo se houver de contar-se a partir de momento
posterior, por força do disposto no nº 1 do artigo 287º.
SECÇÃO III
Nulidade e anulabilidade
do negócio jurídico
ARTIGO 285º
(Disposição geral)
Na falta de regime
especial, são aplicáveis à nulidade e à anulabilidade do negócio jurídico as
disposições dos artigos subsequentes.
ARTIGO 286º
(Nulidade)
A nulidade é invocável a
todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo
tribunal.
ARTIGO 287º
(Anulabilidade)
1. Só têm legitimidade para
arguir a anulabilidade as pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, e só
dentro do ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento.
2. Enquanto, porém, o
negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência
de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção.
ARTIGO 288º
(Confirmação)
1. A anulabilidade é
sanável mediante confirmação.
2. A confirmação compete à
pessoa a quem pertencer o direito de anulação, e só é eficaz quando for
posterior à cessação do vício que serve de fundamento à anulabilidade e o seu autor
tiver conhecimento do vício e do direito à anulação.
3. A confirmação pode ser
expressa ou tácita e não depende de forma especial.
4. A confirmação tem
eficácia retroactiva, mesmo em relação a terceiro.
ARTIGO 289º
(Efeitos da declaração
de nulidade e da anulação)
1. Tanto a declaração de
nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser
restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não
for possível, o valor correspondente.
2. Tendo alguma das partes
alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, e não podendo tornar-se
efectiva contra o alienante a restituição do valor dela, fica o adquirente
obrigado em lugar daquele, mas só na medida do seu enriquecimento.
3. É aplicável em qualquer
dos casos previstos nos números anteriores, directamente ou por analogia, o
disposto nos artigos 1269º e seguintes.
ARTIGO 290º
(Momento da restituição)
As obrigações recíprocas de
restituição que incumbem às partes por força da nulidade ou anulação do negócio
devem ser cumpridas simultaneamente, sendo extensivas ao caso, na parte
aplicável, as normas relativas à excepção de não cumprimento do contrato.
ARTIGO 291º
(Inoponibilidade da
nulidade e da anulação)
1. A declaração de nulidade
ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis, ou a bens móveis
sujeitos a registo, não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens,
a título oneroso, por terceiro de boa fé, se o registo da aquisição for
anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação ou ao registo do acordo
entre as partes acerca da invalidade do negócio.
2. Os direitos de terceiro
não são, todavia, reconhecidos, se a acção for proposta e registada dentro dos
três anos posteriores à conclusão do negócio.
3. É considerado de boa fé
o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia, sem culpa, o
vício do negócio nulo ou anulável.
ARTIGO 292º
(Redução)
A nulidade ou anulação
parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se mostre
que este não teria sido concluído sem a parte viciada.
ARTIGO 293º
(Conversão)
O negócio nulo ou anulado
pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha
os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido
pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a
invalidade.
ARTIGO 294º
(Negócios celebrados
contra a lei)
Os negócios celebrados
contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em
que outra solução resulte da lei.
CAPÍTULO II
Actos jurídicos
ARTIGO 295º
(Disposições
reguladoras)
Aos actos jurídicos que não
sejam negócios jurídicos são aplicáveis, na medida em que a analogia das
situações o justifique, as disposições do capítulo precedente.
CAPÍTULO III
O tempo e a sua
repercussão nas relações jurídicas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 296º
(Contagem dos prazos)
As regras constantes do
artigo 279º são aplicáveis, na falta de disposição especial em contrário, aos
prazos e termos fixados por lei, pelos tribunais ou por qualquer outra
autoridade.
ARTIGO 297º
(Alteração de prazos)
1. A lei que estabelecer,
para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é
também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta
a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga,
falte menos tempo para o prazo se completar.
2. A lei que fixar um prazo
mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso, mas
computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial.
3. A doutrina dos números
anteriores é extensiva, na parte aplicável, aos prazos fixados pelos tribunais
ou por qualquer autoridade.
ARTIGO 298º
(Prescrição, caducidade
e não uso do direito)
1. Estão sujeitos a
prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na
lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos
de prescrição.
2. Quando, por força da lei
ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo,
são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira
expressamente à prescrição.
3. Os direitos de
propriedade, usufruto, uso e habitação, enfiteuse, superfície e servidão não
prescrevem, mas podem extinguir-se pelo não uso nos casos especialmente previstos
na lei, sendo aplicáveis nesses casos, na falta de disposição em contrário, as
regras da caducidade.
ARTIGO 299º
(Alteração da
qualificação)
1. Se a lei considerar de
caducidade um prazo que a lei anterior tratava como prescricional, ou se, ao
contrário, considerar como prazo de prescrição o que a lei antiga tratava como
caso de caducidade, a nova qualificação é também aplicável aos prazos em curso.
2. No primeiro caso, porém,
se a prescrição estiver suspensa ou tiver sido interrompida no domínio da lei
antiga, nem a suspensão nem a interrupção serão atingidas pela aplicação da
nova lei; no segundo, o prazo passa a ser susceptível de suspensão e
interrupção nos termos gerais da prescrição.
SECÇÃO II
Prescrição
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 300º
(Inderrogabilidade do
regime da prescrição)
São nulos os negócios
jurídicos destinados a modificar os prazos legais da prescrição ou a facilitar
ou dificultar por outro modo as condições em que a prescrição opera os seus
efeitos.
ARTIGO 301º
(A quem aproveita a
prescrição)
A prescrição aproveita a
todos os que dela possam tirar benefício, sem excepção dos incapazes.
ARTIGO 302º
(Renúncia da prescrição)
1. A renúncia da prescrição
só é admitida depois de haver decorrido o prazo prescricional.
2. A renúncia pode ser
tácita e não necessita de ser aceita pelo beneficiário.
3. Só tem legitimidade para
renunciar à prescrição quem puder dispor do benefício que a prescrição tenha
criado.
ARTIGO 303º
(Invocação da
prescrição)
O tribunal não pode suprir,
de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada,
judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu
representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público.
ARTIGO 304º
(Efeitos da prescrição)
1. Completada a prescrição,
tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se
opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
2. Não pode, contudo, ser
repetida a prestação realizada espontaneamente em cumprimento de uma obrigação
prescrita, ainda quando feita com ignorância da prescrição; este regime é
aplicável a quaisquer formas de satisfação do direito prescrito, bem como ao
seu reconhecimento ou à prestação de garantias.
3. No caso de venda com
reserva de propriedade até ao pagamento do preço, se prescrever o crédito do
preço, pode o vendedor, não obstante a prescrição, exigir a restituição da
coisa quando o preço não seja pago.
ARTIGO 305º
(Oponibilidade da
prescrição por terceiros)
1. A prescrição é invocável
pelos credores e por terceiros com legítimo interesse na sua declaração, ainda
que o devedor a ela tenha renunciado.
2. Se, porém, o devedor
tiver renunciado, a prescrição só pode ser invocada pelos credores desde que se
verifiquem os requisitos exigidos para a impugnação pauliana.
3. Se, demandado o devedor,
este não alegar a prescrição e for condenado, o caso julgado não afecta o
direito reconhecido aos seus credores.
ARTIGO 306º
(Início do curso da
prescrição)
1. O prazo da prescrição
começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário
da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a
interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da prescrição.
2. A prescrição de direitos
sujeitos a condição suspensiva ou termo inicial só começa depois de a condição
se verificar ou o termo se vencer.
3. Se for estipulado que o
devedor cumprirá quando puder, ou o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, a
prescrição só começa a correr depois da morte dele.
4. Se a dívida for
ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja lícito promover
a liquidação; promovida a liquidação, a prescrição do resultado líquido começa
a correr desde que seja feito o seu apuramento por acordo ou sentença passada
em julgado.
ARTIGO 307º
(Prestações periódicas)
Tratando-se de renda
perpétua ou vitalícia ou de outras prestações periódicas análogas, a prescrição
do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação
que não for paga.
ARTIGO 308º
(Transmissão)
1. Depois de iniciada, a
prescrição continua a correr, ainda que o direito passe para novo titular.
2. Se a dívida for assumida
por terceiro, a prescrição continua a correr em benefício dele, a não ser que a
assunção importe reconhecimento interruptivo da prescrição.
SUBSECÇÃO II
Prazos da prescrição
ARTIGO 309º
(Prazo ordinário)
O prazo ordinário da
prescrição é de vinte anos.
ARTIGO 310º
(Prescrição de cinco
anos)
Prescrevem no prazo de
cinco anos:
a) As anuidades de rendas
perpétuas ou vitalícias;
b) As rendas e alugueres
devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez;
c) Os foros;
d) Os juros convencionais
ou legais, ainda que ilíquidos, e os dividendos das sociedades;
e) As quotas de amortização
do capital pagáveis com os juros;
f) As pensões alimentícias
vencidas;
g) Quaisquer outras
prestações periodicamente renováveis.
ARTIGO 311º
(Direitos reconhecidos
em sentença ou título executivo)
1. O direito para cuja
prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que
o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em
julgado que o reconheça, ou outro título executivo.
2. Quando, porém, a
sentença ou outro título se referir a prestações ainda não devidas, a
prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo.
SUBSECÇÃO III
Prescrições presuntivas
ARTIGO 312º
(Fundamento das
prescrições presuntivas)
As prescrições de que trata
a presente subsecção fundam-se na presunção de cumprimento.
ARTIGO 313º
(Confissão do devedor)
1. A presunção de
cumprimento pelo decurso do prazo só pode ser ilidida por confissão do devedor
originário ou daquele a quem a dívida tiver sido transmitida por sucessão.
2. A confissão
extrajudicial só releva quando for realizada por escrito.
ARTIGO 314º
(Confissão tácita)
Considera-se confessada a
dívida se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento no tribunal, ou
praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento.
ARTIGO 315º
(Aplicação das regras
gerais)
As obrigações sujeitas a
prescrição presuntiva estão subordinadas, nos termos gerais, às regras da
prescrição ordinária.
ARTIGO 316º
(Prescrição de seis
meses)
Prescrevem no prazo de seis
meses os créditos de estabelecimentos de alojamento, comidas ou bebidas, pelo
alojamento, comidas ou bebidas que forneçam, sem prejuízo do disposto na alínea
a) do artigo seguinte.
ARTIGO 317º
(Prescrição de dois
anos)
Prescrevem no prazo de dois
anos:
a) Os créditos dos
estabelecimentos que forneçam alojamento, ou alojamento e alimentação, a
estudantes, bem como os créditos dos estabelecimentos de ensino, educação,
assistência ou tratamento, relativamente aos serviços prestados;
b) Os créditos dos
comerciantes pelos objectos vendidos a quem não seja comerciante ou os não
destine ao seu comércio, e bem assim os créditos daqueles que exerçam
profissionalmente uma indústria, pelo fornecimento de mercadorias ou produtos,
execução de trabalhos ou gestão de negócios alheios, incluindo as despesas que
hajam efectuado, a menos que a prestação se destine ao exercício industrial do
devedor;
c) Os créditos pelos
serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das
despesas correspondentes.
SUBSECÇÃO IV
Suspensão da prescrição
ARTIGO 318º
(Causas bilaterais da
suspensão)
A prescrição não começa nem
corre:
a) Entre os cônjuges, ainda
que separados judicialmente de pessoas e bens;
b) Entre quem exerça o
poder paternal e as pessoas a ele sujeitas, entre o tutor e o tutelado ou entre
o curador e o curatelado;
c) Entre as pessoas cujos
bens estejam sujeitos, por lei ou por determinação judicial ou de terceiro, à
administração de outrem e aquelas que exercem a administração, até serem
aprovadas as contas finais;
d) Entre as pessoas
colectivas e os respectivos administradores, relativamente à responsabilidade
destes pelo exercício dos seus cargos, enquanto neles se mantiverem;
e) Entre quem presta o
trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar;
f) Enquanto o devedor for
usufrutuário do crédito ou tiver direito de penhor sobre ele.
ARTIGO 319º
(Suspensão a favor de
militares e pessoas adstritas às forças militares)
A prescrição não começa nem
corre contra militares em serviço, durante o tempo de guerra ou mobilização,
dentro ou fora do País, ou contra as pessoas que estejam, por motivo de
serviço, adstritas às forças militares.
ARTIGO 320º
(Suspensão a favor de
menores, interditos ou inabilitados)
1. A prescrição não começa
nem corre contra menores enquanto não tiverem quem os represente ou administre
seus bens, salvo se respeitar a actos para os quais o menor tenha capacidade;
e, ainda que o menor tenha representante legal ou quem administre os seus bens,
a prescrição contra ele não se completa sem ter decorrido um ano a partir do
termo da incapacidade.
2. Tratando-se de
prescrições presuntivas, a prescrição não se suspende, mas não se completa sem
ter decorrido um ano sobre a data em que o menor passou a ter representante
legal ou administrador dos seus bens ou adquiriu plena capacidade.
3. O disposto nos números
anteriores é aplicável aos interditos e inabilitados que não tenham capacidade
para exercer o seu direito, com a diferença de que a incapacidade se considera
finda, caso não tenha cessado antes, passados três anos sobre o termo do prazo
que seria aplicável se a suspensão se não houvesse verificado.
ARTIGO 321º
(Suspensão por motivo de
força maior ou dolo do obrigado)
1. A prescrição suspende-se
durante o tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito,
por motivo de força maior, no decurso dos últimos três meses do prazo.
2. Se o titular não tiver
exercido o seu direito em consequência de dolo do obrigado, é aplicável o
disposto no número anterior.
ARTIGO 322º
(Prescrição dos direitos
da herança ou contra ela)
A prescrição de direitos da
herança ou contra ela não se completa antes de decorridos seis meses depois de
haver pessoa por quem ou contra quem os direitos possam ser invocados.
SUBSECÇÃO V
Interrupção da
prescrição
ARTIGO 323º
(Interrupção promovida
pelo titular)
1. A prescrição
interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que
exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual
for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou
notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por
causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo
que decorram os cinco dias.
3. A anulação da citação ou
notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
4. É equiparado à citação
ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo
qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido.
ARTIGO 324º
(Compromisso arbitral)
1. O compromisso arbitral
interrompe a prescrição relativamente ao direito que se pretende tornar
efectivo.
2. Havendo cláusula
compromissória ou sendo o julgamento arbitral determinado por lei, a prescrição
considera-se interrompida quando se verifique algum dos casos previstos no
artigo anterior.
ARTIGO 325º
(Reconhecimento)
1. A prescrição é ainda
interrompida pelo reconhecimento do direito, efectuado perante o respectivo
titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.
2. O reconhecimento tácito
só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam.
ARTIGO 326º
(Efeitos da interrupção)
1. A interrupção inutiliza
para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo
prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do
artigo seguinte.
2. A nova prescrição está
sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311º.
ARTIGO 327º
(Duração da interrupção)
1. Se a interrupção
resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso
arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em
julgado a decisão que puser termo ao processo.
2. Quando, porém, se
verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada
deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional
começa a correr logo após o acto interruptivo.
3. Se, por motivo
processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da
instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição
tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em
julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso,
não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.
SECÇÃO III
Caducidade
ARTIGO 328º
(Suspensão e
interrupção)
O prazo de caducidade não
se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.
ARTIGO 329º
(Começo do prazo)
O prazo de caducidade, se a
lei não fixar outra data, começa a correr no momento em que o direito puder
legalmente ser exercido.
ARTIGO 330º
(Estipulações válidas
sobre a caducidade)
1. São válidos os negócios
pelos quais se criem casos especiais de caducidade, se modifique o regime legal
desta ou se renuncie a ela, contanto que não se trate de matéria subtraída à
disponibilidade das partes ou de fraude às regras legais da prescrição.
2. São aplicáveis aos casos
convencionais de caducidade, na dúvida acerca da vontade dos contraentes, as
disposições relativas à suspensão da prescrição.
ARTIGO 331º
(Causas impeditivas da
caducidade)
1. Só impede a caducidade a
prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou
convenção atribua efeito impeditivo.
2. Quando, porém, se trate
de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível,
impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra
quem deva ser exercido.
ARTIGO 332º
(Absolvição e
interrupção da instância e ineficácia do compromisso arbitral)
1. Quando a caducidade se
referir ao direito de propor certa acção em juízo e esta tiver sido
tempestivamente proposta, é aplicável o disposto no nº 3 do artigo 327º; mas,
se o prazo fixado para a caducidade for inferior a dois meses, é substituido
por ele o designado nesse preceito.
2. Nos casos previstos na
primeira parte do artigo anterior, se a instância se tiver interrompido, não se
conta para efeitos de caducidade o prazo decorrido entre a proposição da acção
e a interrupção da instância.
ARTIGO 333º
(Apreciação oficiosa da
caducidade)
1. A caducidade é apreciada
oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se
for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.
2. Se for estabelecida em
matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o
disposto no artigo 303º.
SUBTÍTULO IV
DO EXERCÍCIO E TUTELA
DOS DIREITOS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 334º
(Abuso do direito)
É ilegítimo o exercício de
um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa
fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
ARTIGO 335º
(Colisão de direitos)
1. Havendo colisão de
direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do
necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior
detrimento para qualquer das partes.
2. Se os direitos forem
desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior.
ARTIGO 336º
(Acção directa)
1. É lícito o recurso à
força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito, quando a acção
directa for indispensável, pela impossibilidade de recorrer em tempo útil aos
meios coercivos normais, para evitar a inutilização prática desse direito,
contanto que o agente não exceda o que for necessário para evitar o prejuízo.
2. A acção directa pode
consistir na apropriação, destruição ou deterioração de uma coisa,na eliminação
da resistência irregularmente oposta ao exercício do direito, ou noutro acto
análogo.
3. A acção directa não é
lícita, quando sacrifique interesses superiores aos que o agente visa realizar
ou assegurar.
ARTIGO 337º
(Legítima defesa)
1. Considera-se justificado
o acto destinado a afastar qualquer agressão actual e contrária à lei contra a
pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde que não seja possível
fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo acto não seja
manifestamente superior ao que pode resultar da agressão.
2. O acto considera-se
igualmente justificado, ainda que haja excesso de legítima defesa, se o excesso
for devido a perturbação ou medo não culposo do agente.
ARTIGO 338º
(Erro acerca dos
pressupostos da acção directa ou da legítima defesa)
Se o titular do direito
agir na suposição errónea de se verificarem os pressupostos que justificam a
acção directa ou a legítima defesa, é obrigado a indemnizar o prejuízo causado,
salvo se o erro for desculpável.
ARTIGO 339º
(Estado de necessidade)
1. É lícita a acção daquele
que destruir ou danificar coisa alheia com o fim de remover o perigo actual de
um dano manifestamente superior, quer do agente, quer de terceiro.
2. O autor da destruição ou
do dano é, todavia, obrigado a indemnizar o lesado pelo prejuízo sofrido, se o
perigo for provocado por sua culpa exclusiva; em qualquer outro caso, o
tribunal pode fixar uma indemnização equitativa e condenar nela não só o
agente, como aqueles que tiraram proveito do acto ou contribuíram para o estado
de necessidade.
ARTIGO 340º
(Consentimento do
lesado)
1. O acto lesivo dos
direitos de outrem é lícito, desde que este tenha consentido na lesão.
2. O consentimento do
lesado não exclui, porém, a ilicitude do acto, quando este for contrário a uma
proibição legal ou aos bons costumes.
3. Tem-se por consentida a
lesão, quando esta se deu no interesse do lesado e de acordo com a sua vontade
presumível.
CAPÍTULO II
Provas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 341º
(Função das provas)
As provas têm por função a
demonstração da realidade dos factos.
ARTIGO 342º
(Ónus da prova)
1. Àquele que invocar um
direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
2. A prova dos factos
impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele
contra quem a invocação é feita.
3. Em caso de dúvida, os
factos devem ser considerados como constitutivos do direito.
ARTIGO 343º
(Ónus da prova em casos
especiais)
1. Nas acções de simples
apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos
constitutivos do direito que se arroga.
2. Nas acções que devam ser
propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento
de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se
outra for a solução especialmente consignada na lei.
3. Se o direito invocado
pelo autor estiver sujeito a condição suspensiva ou a termo inicial, cabe-lhe a
prova de que a condição se verificou ou o termo se venceu; se o direito estiver
sujeito a condição resolutiva ou a termo final, cabe ao réu provar a
verificação da condição ou o vencimento do prazo.
ARTIGO 344º
(Inversão do ónus da
prova)
1. As regras dos artigos
anteriores invertem-se, quando haja presunção legal, dispensa ou liberação do
ónus da prova, ou convenção válida nesse sentido, e, de um modo geral, sempre
que a lei o determine.
2. Há também inversão do
ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a
prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande
especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações.
ARTIGO 345º
(Convenções sobre as
provas)
1. É nula a convenção que
inverta o ónus da prova, quando se trate de direito indisponível ou a inversão
torne excessivamente difícil a uma das partes o exercício do direito.
2. É nula, nas mesmas
condições, a convenção que excluir algum meio legal de prova ou admitir um meio
de prova diverso dos legais; mas, se as determinações legais quanto à prova
tiverem por fundamento razões de ordem pública, a convenção é nula em quaisquer
circunstâncias.
ARTIGO 346º
(Contraprova)
Salvo o disposto no artigo
seguinte, à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus
probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos
factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida
contra a parte onerada com a prova.
ARTIGO 347º
(Modo de contrariar a
prova legal plena)
A prova legal plena só pode
ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que
dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições especialmente determinadas
na lei.
ARTIGO 348º
(Direito
consuetudinário, local, ou estrangeiro)
1. Àquele que invocar
direito consuetudinário, local ou estrangeiro, compete fazer a prova da sua
existência e conteúdo; mas o tribunal deve procurar, oficiosamente, obter o
respectivo conhecimento.
2. O conhecimento oficioso
incumbe também ao tribunal, sempre que este tenha de decidir com base no
direito consuetudinário, local ou estrangeiro, e nenhuma das partes o tenha
invocado, ou a parte contrária tenha reconhecido a sua existência e conteúdo ou
não haja deduzido oposição.
3. Na impossibilidade de
determinar o conteúdo do direito aplicável, o tribunal recorrerá às regras do
direito comum português.
SECÇÃO II
Presunções
ARTIGO 349º
(Noção)
Presunções são as ilações
que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto
desconhecido.
ARTIGO 350º
(Presunções legais)
1. Quem tem a seu favor a
presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz.
2. As presunções legais
podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em
que a lei o proibir.
ARTIGO 351º
(Presunções judiciais)
As presunções judiciais só
são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.
SECÇÃO III
Confissão
ARTIGO 352º
(Noção)
Confissão é o
reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável
e favorece a parte contrária.
ARTIGO 353º
(Capacidade e
legitimação)
1. A confissão só é eficaz
quando feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o
facto confessado se refira.
2. A confissão feita pelo
litisconsorte é eficaz, se o litisconsócio for voluntário, embora o seu efeito
se restrinja ao interesse do confitente; mas não o é, se o litisconsórcio for
necessário.
3. A confissão feita por um
substituto processual não é eficaz contra o substituído.
ARTIGO 354º
(Inadmissibilidade da
confissão)
A confissão não faz prova
contra o confitente:
a) Se for declarada
insuficiente por lei ou recair sobre facto cujo reconhecimento ou investigação
a lei proíba;
b) Se recair sobre factos
relativos a direitos indisponíveis;
c) Se o facto confessado
for impossível ou notoriamente inexistente.
ARTIGO 355º
(Modalidades)
1. A confissão pode ser
judicial ou extrajudicial.
2. Confissão judicial é a
feita em juízo, competente ou não, mesmo quando arbitral, e ainda que o
processo seja de jurisdição voluntária.
3. A confissão feita num
processo só vale como judicial nesse processo; a realizada em qualquer
procedimento preliminar ou incidental só vale como confissão judicial na acção
correspondente.
4. Confissão extrajudicial
é a feita por algum modo diferente da confissão judicial.
ARTIGO 356º
(Formas da confissão
judicial)
1. A confissão judicial
espontânea pode ser feita nos articulados, segundo as prescrições da lei
processual, ou em qualquer outro acto do processo, firmado pela parte
pessoalmente ou por procurador especialmente autorizado.
2. A confissão judicial
provocada pode ser feita em depoimento de parte ou em prestação de informações
ou esclarecimentos ao tribunal.
ARTIGO 357º
(Declaração confessória)
1. A declaração confessória
deve ser inequívoca, salvo se a lei o dispensar.
2. Se for ordenado o
depoimento de parte ou o comparecimento desta para prestação de informações ou
esclarecimento, mas ela não comparecer ou se recusar a depor ou a prestar as
informações ou esclarecimentos, sem provar justo impedimento, ou responder que
não se recorda ou nada sabe, o tribunal apreciará livremente o valor da conduta
da parte para efeitos probatórios.
ARTIGO 358º
(Força probatória da
confissão)
1. A confissão judicial
escrita tem força probatória plena contra o confitente.
2. A confissão
extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos
termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a
quem a represente, tem força probatória plena.
3. A confissão
extrajudicial não constante de documento não pode ser provada por testemunhas
nos casos em que não é admitida a prova testemunhal; quando esta seja admitida,
a força probatória da confissão é livremente apreciada pelo tribunal.
4. A confissão judicial que
não seja escrita e a confissão extrajudicial feita a terceiro ou contida em
testamento são apreciadas livremente pelo tribunal.
ARTIGO 359º
(Nulidade e
anulabilidade da confissão)
1. A confissão, judicial ou
extrajudicial, pode ser declarada nula ou anulada, nos termos gerais, por falta
ou vícios da vontade, mesmo depois do trânsito em julgado da decisão, se ainda
não tiver caducado o direito de pedir a sua anulação.
2. O erro, desde que seja
essencial, não tem de satisfazer aos requisitos exigidos para a anulação dos
negócios jurídicos.
ARTIGO 360º
(Indivisibilidade da
confissão)
Se a declaração
confessória, judicial ou extrajudicial, for acompanhada da narração de outros
factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do facto confessado ou
a modificar ou extinguir os seus efeitos, a parte que dela quiser aproveitar-se
como prova plena tem de aceitar também como verdadeiros os outros factos ou
circunstâncias, salvo se provar a sua inexactidão.
ARTIGO 361º
(Valor do reconhecimento
não confessório)
O reconhecimento de factos
desfavoráveis, que não possa valer como confissão, vale como elemento
probatório que o tribunal apreciará livremente.
SECÇÃO IV
Prova documental
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 362º
(Noção)
Prova documental é a que
resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem
com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto.
ARTIGO 363º
(Modalidades dos
documentos escritos)
1. Os documentos escritos
podem ser autênticos ou particulares.
2. Autênticos são os
documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos
limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividades que lhe é
atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; todos
os outros documentos são particulares.
3. Os documentos
particulares são havidos por autenticados, quando confirmados pelas partes,
perante notário, nos termos prescritos nas leis notariais.
ARTIGO 364º
(Exigência legal de
documento escrito)
1. Quando a lei exigir,
como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou
particular, não pode este ser subtituído por outro meio de prova ou por outro
documento que não seja de força probatória superior.
2. Se, porém, resultar
claramente da lei que o documento é exigido apenas para prova da declaração,
pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial,
contanto que, neste último caso, a confissão conste de documento de igual ou
superior valor probatório.
ARTIGO 365º
(Documentos passados em
país estrangeiro)
1. Os documentos autênticos
ou particulares passados em país estrangeiro, na conformidade da respectiva
lei, fazem prova como o fariam os documentos da mesma natureza exarados em
Portugal.
2. Se o documento não
estiver legalizado, nos termos da lei processual, e houver fundadas dúvidas
acerca da sua autenticidade ou da autenticidade do reconhecimento, pode ser
exigida a sua legalização.
ARTIGO 366º
(Falta de requisitos
legais)
A força probatória do
documento escrito a que falte algum dos requisitos exigidos na lei é apreciada
livremente pelo tribunal.
ARTIGO 367º
(Reforma de documentos
escritos)
Podem ser reformados
judicialmente os documentos escritos que por qualquer modo tiverem
desaparecido.
ARTIGO 368º
(Reproduções mecânicas)
As reproduções fotográficas
ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um modo geral, quaisquer
outras reproduções mêcanicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos
factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os documentos são
apresentados não impugnar a sua exactidão.
SUBSECÇÃO II
Documentos autênticos
ARTIGO 369º
(Competência da
autoridade ou oficial público)
1. O documento só é
autêntico quando a autoridade ou oficial público que o exara for competente, em
razão da matéria e do lugar, e não estiver legalmente impedido de o lavrar.
2. Considera-se, porém,
exarado por autoridade ou oficial público competente o documento lavrado por
quem exerça publicamente as respectivas funções, a não ser que os
intervenientes ou beneficiários conhecessem, no momento da sua feitura, a falsa
qualidade da autoridade ou oficial público, a sua incompetência ou a
irregularidade da sua investidura.
ARTIGO 370º
(Autenticidade)
1. Presume-se que o
documento provém da autoridade ou oficial público a quem é atribuído, quando
estiver subscrito pelo autor com assinatura reconhecida por notário ou com o
selo do respectivo serviço.
2. A presunção de
autenticidade pode ser ilidida mediante prova em contrário, e pode ser excluída
oficiosamente pelo tribunal quando seja manifesta pelos sinais exteriores do
documento a sua falta de autenticidade; em caso de dúvida, pode ser ouvida a
autoridade ou oficial público a quem o documento é atribuído.
3. Quando o documento for
anterior ao século XVIII, a sua autenticidade será estabelecida por meio de
exame feito na Torre do Tombo, desde que seja contestada ou posta em dúvida por
alguma das partes ou pela entidade a quem o documento for apresentado.
ARTIGO 371º
(Força probatória)
1. Os documentos autênticos
fazem prova plena dos factos que referem como praticados pelo autoridade ou
oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com
base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do
documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador.
2. Se o documento contiver
palavras emendadas, truncadas ou escritas sobre rasuras ou entrelinhas, sem a
devida ressalva, determinará o julgador livremente a medida em que os vícios
externos do documentos excluem ou reduzem a sua força probatória.
ARTIGO 372º
(Falsidade)
1. A força probatória dos
documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade.
2. O documento é falso,
quando nele se atesta como tendo sido objecto da percepção da autoridade ou
oficial público qualquer facto que na realidade se não verificou, ou como tendo
sido praticado pela entidade responsável qualquer acto que na realidade o não
foi.
3. Se a falsidade for
evidente em face dos sinais exteriores do documento, pode o tribunal,
oficiosamente, declará-lo falso.
SUBSECÇÃO III
Documentos particulares
ARTIGO 373º
(Assinatura)
1. Os documentos
particulares devem ser assinados pelo seu autor, ou por outrem a seu rogo, se o
rogante não souber ou não puder assinar.
2. Nos títulos emitidos em
grande número ou nos demais casos em que o uso o admita, pode a assinatura ser
substituída por simples reprodução mecânica.
3. Se o documento for
subscrito por pessoa que não saiba ou não possa ler, a subscrição só obriga
quando feita ou confirmada perante notário, depois de lido o documento ao subscritor.
4. O rogo deve igualmente
ser dado ou confirmado perante notário, depois de lido o documento ao rogante.
ARTIGO 374º
(Autoria da letra e da
assinatura)
1. A letra e a assinatura,
ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras,
quando reconhecidas ou não impugnadas, pela parte contra quem o documento é
apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe
serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como
verdadeiras.
2. Se a parte contra quem o
documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou
declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe
à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.
ARTIGO 375º
(Reconhecimento
notarial)
1. Se estiverem
reconhecidas presencialmente, nos termos das leis notariais, a letra e a
assinatura do documento, ou só a assinatura, têm-se por verdadeiras.
2. Se a parte contra quem o
documento é apresentado arguir a falsidade do reconhecimento presencial da
letra e da assinatura, ou só da assinatura, a ela incumbe a prova dessa
falsidade.
3. Salvo disposição legal
em contrário, o reconhecimento por semelhança vale como mero juízo pericial.
ARTIGO 376º
(Força probatória)
1. O documento particular
cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova
plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e
prova da falsidade do documento.
2. Os factos compreendidos
na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos
interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos
para a prova por confissão.
3. Se o documento contiver
notas marginais, palavras entrelinhadas, rasuras, emendas ou outros vícios externos,
sem a devida ressalva, cabe ao julgador fixar livremente a medida em que esses
vícios excluem ou reduzem a força probatória do documento.
ARTIGO 377º
(Documentos
autenticados)
Os documentos particulares
autenticados nos termos da lei notarial têm a força probatória dos documentos
autênticos, mas não os substituem quando a lei exija documento desta natureza
para a validade do acto.
ARTIGO 378º
(Assinatura em branco)
Se o documento tiver sido
assinado em branco, total ou parcialmente, o seu valor probatório pode ser
ilidido, mostrando-se que nele se inseriram declarações divergentes do ajustado
com o signatário ou que o documento lhe foi subtraído.
ARTIGO 379º
(Valor dos telegramas)
Os telegramas cujos
originais tenham sido escritos e assinados ou somente assinados, pela pessoa em
nome de quem são expedidos, ou por outrem a seu rogo, nos termos do nº 4 do
artigo 373º, são considerados para todos os efeitos como documentos
particulares e estão sujeitos, como tais, ao disposto nos artigos anteriores.
SUBSECÇÃO IV
Diposições especiais
ARTIGO 380º
(Registos e outros
escritos)
1. Os registos e outros
escritos onde habitualmente alguém tome nota dos pagamentos que lhe são
efectuados fazem prova contra o seu autor, se indicarem inequivocamente, posto
que mediante um simples sinal, a recepção de algum pagamento; mas o autor do
escrito pode provar, por qualquer meio, que a nota não corresponde à realidade.
2. Têm igual força
probatória os mesmos escritos, quando feitos e assinados por outrem, segundo
instruções do credor.
3. É aplicável nestes casos
a regra da indivisibilidade, nos termos prescritos para a prova por confissão.
ARTIGO 381º
(Notas em seguimento, à
margem ou no verso do documento)
1. A nota escrita pelo
credor, ou por outrem segundo instruções dele, em seguimento, à margem ou no
verso do documento que ficou em poder do credor, ainda que não esteja datada
nem firmada, faz prova do facto anotado, se favorecer a exoneração do devedor.
2. Idêntico valor é
atribuído à nota escrita pelo credor, ou segundo instruções dele, em
seguimento, à margem ou no verso de documento de quitação ou de título de
dívida em poder do devedor.
3. A força probatória das
notas pode ser contrariada por qualquer meio de prova; mas, quando se trate de
quitação no documento ou título em poder do devedor, se a nota estiver assinada
pelo credor, são aplicáveis as regras legais acerca dos documentos particulares
assinados pelo seu autor.
ARTIGO 382º
(Cancelamento dos
escritos ou notas)
Se forem cancelados pelo
credor, os escritos a que se referem os dois artigos anteriores perdem a força
probatória que neles lhes é atribuída, ainda que o cancelamento não prejudique
a sua leitura, salvo quando forem feitos por exigência do devedor ou de
terceiro, nos termos do artigo 788º.
ARTIGO 383º
(Certidões)
1. As certidões de teor
extraídas de documentos arquivados nas repartições notariais ou noutras
repartições públicas, quando expedidas pelo notário ou por outro depositário
público autorizado, têm a força probatória dos originais.
2. A prova resultante da
certidão de teor parcial pode ser invalidada ou modificada por meio da certidão
de teor integral.
3. Qualquer interessado, e
bem assim a autoridade pública a quem for exibida, para efeito de prova, uma
certidão parcial, podem exigir do apresentante a exibição da certidão integral
correspondente.
ARTIGO 384º
(Certidões de certidões)
As certidões de certidões,
expedidas na conformidade da lei, têm a força probatória das certidões de que
forem extraídas.
ARTIGO 385º
(Invalidação da força
probatória das certidões)
1. A força probatória das
certidões pode ser invalidada ou modificada por confronto com o original ou com
a certidão de que foram extraídas.
2. A pessoa contra quem for
apresentada a certidão pode exigir que o confronto seja feito na sua presença.
ARTIGO 386º
(Públicas-formas)
1. As cópias de teor, total
ou parcial, expedidas por oficial público autorizado e extraídas de documentos
avulsos que lhe sejam apresentados para esse efeito têm a força probatória do
respectivo original, se a parte contra a qual forem apresentadas não requerer a
exibição desse original.
2. Requerida a exibição, a
pública-forma não tem a força probatória do original, se este não for
apresentado ou, sendo-o, se não mostrar conforme com ela.
ARTIGO 387º
(Fotocópias de documentos)
1. As cópias fotográficas
de documentos arquivados nas repartições notariais ou noutras repartições
públicas têm a força probatória das certidões de teor, se a conformidade delas
com o original for atestada pela entidade competente para expedir estas últimas;
é aplicável, neste caso, o disposto no artigo 385º.
2. As cópias fotográficas
de documentos estranhos aos arquivos mencionados no número anterior têm o valor
da pública-forma, se a sua conformidade com o original for atestada por
notário; é aplicável, neste caso, o disposto no artigo 386º.
SECÇÃO V
Prova pericial
ARTIGO 388º
(Objecto)
A prova pericial tem por
fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam
necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os
factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial.
ARTIGO 389º
(Força probatória)
A força probatória das
respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal.
SECÇÃO VI
Prova por inspecção
ARTIGO 390º
(Objecto)
A prova por inspecção tem
por fim a percepção directa de factos pelo tribunal.
ARTIGO 391º
(Força probatória)
O resultado da inspecção é
livremente apreciado pelo tribunal.
SECÇÃO VII
Prova testemunhal
ARTIGO 392º
(Admissibilidade)
A prova por testemunhas é
admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada.
ARTIGO 393º
(Inadmissibilidade da
prova testemunhal)
1. Se a declaração
negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser
reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida
prova testemunhal.
2. Também não é admitida
prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento
ou por outro meio com força probatória plena.
3. As regras dos números
anteriores não são aplicáveis à simples interpretação do contexto do documento.
ARTIGO 394º
(Convenções contra o
conteúdo de documentos ou além dele)
1. É inadmissível a prova
por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou
adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares
mencionados nos artigos 373º a 379º, quer as convenções sejam anteriores à
formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.
2. A proibição do número
anterior aplica-se ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado, quando
invocados pelos simuladores.
3. O disposto nos números
anteriores não é aplicável a terceiros.
ARTIGO 395º
(Factos extintivos da
obrigação)
As disposições dos artigos
precedentes são aplicáveis ao cumprimento, remissão, novação, compensação e, de
um modo geral, aos contratos extintivos da relação obrigacional, mas não aos
factos extintivos da obrigação, quando invocados por terceiro.
ARTIGO 396º
(Força probatória)
A força probatória dos
depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal.
LIVRO II
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
TÍTULO I
DAS OBRIGAÇÕES EM GERAL
CAPÍTULO I
Disposições gerais
SECÇÃO I
Conteúdo da obrigação
ARTIGO 397º
(Noção)
Obrigação é o vínculo
jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à
realização de uma prestação.
ARTIGO 398º
(Conteúdo da prestação)
1. As partes podem fixar
livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo ou negativo da
prestação.
2. A prestação não
necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um interesse do
credor, digno de protecção legal.
ARTIGO 399º
(Prestação de coisa
futura)
É admitida a prestação de
coisa futura sempre que a lei não a proíba.
ARTIGO 400º
(Determinação da
prestação)
1. A determinação da
prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes ou a terceiro; em
qualquer dos casos deve ser feita segundo juízos de equidade, se outros
critérios não tiverem sido estipulados.
2. Se a determinação não
puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo devido, sê-lo-á pelo tribunal,
sem prejuízo do disposto acerca das obrigações genéricas e alternativas.
ARTIGO 401º
(Impossibilidade
originária da prestação)
1. A impossibilidade
originária da prestação produz a nulidade do negócio jurídico.
2. O negócio é, porém,
válido, se a obrigação for assumida para o caso de a prestação se tornar
possível, ou se, estando o negócio dependente de condição suspensiva ou de
termo inicial, a prestação se tornar possível até à verificação da condição ou
até ao vencimento do termo.
3. Só se considera
impossível a prestação que o seja relativamente ao objecto, e não apenas em
relação à pessoa do devedor.
SECÇÃO II
Obrigações naturais
ARTIGO 402º
(Noção)
A obrigação diz-se natural,
quando se funda num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é
judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça.
ARTIGO 403º
(Não repetição do
indevido)
1. Não pode ser repetido o
que for prestado espontaneamente em cumprimento de obrigação natural, excepto
se o devedor não tiver capacidade para efectuar a prestação.
2. A prestação considera-se
espontânea, quando é livre de toda a coacção.
ARTIGO 404º
(Regime)
As obrigações naturais
estão sujeitas ao regime das obrigações civis em tudo o que não se relacione
com a realização coactiva da prestação, salvas as disposições especiais da lei.
CAPÍTULO II
Fontes das obrigações
SECÇÃO I
Contratos
SUBSECÇÃO I
Dispsosições gerais
ARTIGO 405º
(Liberdade contratual)
1. Dentro dos limites da
lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos,
celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as
claúsulas que lhes aprouver.
2. As partes podem ainda
reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente
regulados na lei.
ARTIGO 406º
(Eficácia dos contratos)
1. O contrato deve ser
pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo
consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
2. Em relação a terceiros,
o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei.
ARTIGO 407º
(Incompatibilidade entre
direitos pessoais de gozo)
Quando, por contratos
sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a mesma
coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si, prevalece o direito
mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do registo.
ARTIGO 408º
(Contratos com eficácia
real)
1. A constituição ou
transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito
do contrato, salvas as excepções previstas na lei.
2. Se a transferência
respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando a
coisa for adquirida pelo alienante ou determinada com conhecimento de ambas as
partes, sem prejuízo do disposto em matéria de obrigações genéricas e do
contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos naturais ou a partes
componentes ou integrantes, a transferência só se verifica no momento da
colheita ou separação.
ARTIGO 409º
(Reserva da propriedade)
1. Nos contratos de
alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade da coisa até ao
cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou até à verificação
de qualquer outro evento.
2. Tratando-se de coisa
imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a cláusula constante do registo
é oponível a terceiros.
SUBSECÇÃO II
Contrato-promessa
ARTIGO 410º
(Regime aplicável)
1. À convenção pela qual
alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais
relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas à forma e as que, por
sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa.
2. Porém, a promessa
respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija documento, quer
autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte
que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou
bilateral.
3. No caso de promessa
relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de
direito real sobre edifício, ou fracção autónoma dele, já construído, em
construção ou a construir, o documento referido no número anterior deve conter
o reconhecimento presencial da assinatura do promitente ou promitentes e a
certificação, pelo notário, da existência da licença respectiva de utilização
ou de construção; contudo, o contraente que promete transmitir ou constituir o
direito só pode invocar a omissão destes requisitos quando a mesma tenha sido
culposamente causada pela outra parte.
(Redacção do Dec.-Lei
379/86, de 11-11)
ARTIGO 411º
(Promessa unilateral)
Se o contrato-promessa
vincular apenas uma das partes e não se fixar o prazo dentro do qual o vínculo
é eficaz, pode o tribunal, a requerimento do promitente, fixar à outra parte um
prazo para o exercício do direito, findo o qual este caducará.
ARTIGO 412º
(Transmissão dos
direitos e obrigações das partes)
1. Os direitos e obrigações
resultantes do contrato-promessa que não sejam exclusivamente pessoais
transmitem-se aos sucessores das partes.
2. A transmissão por acto
entre vivos está sujeita às regras gerais.
(Redacção do Dec.-Lei
379/86, de 11-11)
ARTIGO 413º
(Eficácia real da
promessa)
1. À promessa de
transmissão ou constituição de direitos reais sobre bens imóveis, ou móveis
sujeitos a registo, podem as partes atribuir eficácia real, mediante declaração
expressa e inscrição no registo.
2. Deve constar de
escritura pública a promessa a que as partes atribuam eficácia real; porém,
quando a lei não exija essa forma para o contrato prometido, é bastante
documento particular com reconhecimento da assinatura da parte que se vincula
ou de ambas, consoante se trate de contrato-promessa unilateral ou bilateral.
(Redacção do Dec.-Lei
379/86, de 11-11)
SUBSECÇÃO III
Pactos de preferência
ARTIGO 414º
(Noção)
O pacto de preferência
consiste na convenção pela qual alguém assume a obrigação de dar preferência a
outrem na venda de determinada coisa.
ARTIGO 415º
(Forma)
É aplicável ao pacto de
preferência o disposto no nº 2 do artigo 410º.
ARTIGO 416º
(Conhecimento do
preferente)
1. Querendo vender a coisa
que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao titular do direito o
projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato.
2. Recebida a comunicação,
deve o titular exercer o seu direito dentro do prazo de oito dias, sob pena de
caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais curto ou o obrigado lhe
assinar prazo mais longo.
ARTIGO 417º
(Venda da coisa
juntamente com outras)
1. Se o obrigado quiser
vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o
direito ser exercido em relação àquela pelo preço que proporcionalmente lhe for
atribuído, sendo lícito, porém, ao obrigado exigir que a preferência abranja
todas as restantes, se estas não forem separáveis sem prejuízo apreciável.
2. O disposto no número
anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência ter eficácia real e a
coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou outras.
ARTIGO 418º
(Prestação acessória)
1. Se o obrigado receber de
terceiro a promessa de uma prestação acessória que o titular do direito de
preferência não possa satisfazer, será essa prestação compensada em dinheiro;
não sendo avaliável em dinheiro, é excluída a preferência, salvo se for lícito
presumir que, mesmo sem a prestação estipulada, a venda não deixaria de ser
efectuada, ou que a prestação foi convencionada para afastar a preferência.
2. Se a prestação acessória
tiver sido convencionada para afastar a preferência, o preferente não é
obrigado a satisfazê-la, mesmo que ela seja avaliável em dinheiro.
ARTIGO 419º
(Pluralidade de titulares)
1. Pertencendo
simultaneamente a vários titulares, o direito de preferência só pode ser
exercido por todos em conjunto; mas, se o direito se extinguir em relação a
algum deles, ou algum declarar que não o quer exercer, acresce o seu direito
aos restantes.
2. Se o direito pertencer a
mais de um titular, mas houver de ser exercido apenas por um deles, na falta de
designação abrir-se-á licitação entre todos, revertendo o excesso para o
alienante.
ARTIGO 420º
(Transmissão do direito
e da obrigação de preferência)
O direito e a obrigação de
preferência não são transmissíveis em vida nem por morte, salvo estipulação em
contrário.
ARTIGO 421º
(Eficácia real)
1. O direito de preferência
pode, por convenção das partes, gozar de eficácia real se, respeitando a bens
imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, forem observados os requisitos de
forma e de publicidade exigidos no artigo 413º.
2. É aplicável neste caso,
com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 1410º.
(Redacção do Dec.-Lei
379/86, de 11-11)
ARTIGO 422º
(Valor relativo do
direito de preferência)
O direito convencional de
preferência não prevalece contra os direitos legais de preferência; e, se não
gozar de eficácia real, também não procede relativamente à alienação efectuada
em execução, falência, insolvência ou casos análogos.
ARTIGO 423º
(Extensão das
disposições anteriores a outros contratos)
As disposições dos artigos
anteriores relativas à compra e venda são extensivas, na parte aplicável, à
obrigação de preferência que tiver por objecto outros contratos com ela
compatíveis.
SUBSECÇÃO IV
Cessão da posição
contratual
ARTIGO 424º
(Noção. Requisitos)
1. No contrato com
prestações recíprocas, qualquer das partes tem a faculdade de transmitir a
terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente, antes ou
depois da celebração do contrato, consinta na transmissão.
2. Se o consentimento do
outro contraente for anterior à cessão, esta só produz efeitos a partir da sua
notificação ou reconhecimento.
ARTIGO 425º
(Regime)
A forma da transmissão, a
capacidade de dispor e de receber, a falta e vícios da vontade e as relações
entre as partes definem-se em função do tipo de negócio que serve de base à
cessão.
ARTIGO 426º
(Garantia da existência
da posição contratual)
1. O cedente garante ao cessionário,
no momento da cessão, a existência da posição contratual transmitida, nos
termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso, em que a cessão se integra.
2. A garantia do
cumprimento das obrigações só existe se for convencionada nos termos gerais.
ARTIGO 427º
(Relações entre o outro
contraente e o cessionário)
A outra parte no contrato
tem o direito de opor ao cessionário os meios de defesa provenientes desse
contrato, mas não os que provenham de outras relações com o cedente, a não ser
que os tenha reservado ao consentir na cessão.
SUBSECÇÃO V
Excepção de não
cumprimento do contrato
ARTIGO 428º
(Noção)
1. Se nos contratos
bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada
um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro
não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
2. A excepção não pode ser
afastada mediante a prestação de garantias.
ARTIGO 429º
(Insolvência ou
diminuição de garantias)
Ainda que esteja obrigado a
cumprir em primeiro lugar, tem o contraente a faculdade de recusar a respectiva
prestação enquanto o outro não cumprir ou não der garantias de cumprimento, se,
posteriormente ao contrato, se verificar alguma das circunstâncias que importam
a perda do benefício do prazo.
ARTIGO 430º
(Prescrição)
Prescrito um dos direitos,
o respectivo titular continua a gozar da excepção de não cumprimento, excepto
quando se trate de prescrição presuntiva.
ARTIGO 431º
(Eficácia em relação a
terceiros)
A excepção de não cumprimento
é oponível aos que no contrato vierem a substituir qualquer dos contraentes nos
seus direitos e obrigações.
SUBSECÇÃO VI
Resolução do contrato
ARTIGO 432º
(Casos em que é
admitida)
1. É admitida a resolução
do contrato fundada na lei ou em convenção.
2. A parte, porém, que, por
circunstâncias não imputáveis ao outro contraente, não estiver em condições de
restituir o que houver recebido não tem o direito de resolver o contrato.
ARTIGO 433º
(Efeitos entre as
partes)
Na falta de disposição
especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou
anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do disposto nos artigos
seguintes.
ARTIGO 434º
(Retroactividade)
1. A resolução tem efeito
retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes ou a
finalidade da resolução.
2. Nos contratos de
execução continuada ou periódica, a resolução não abrange as prestações já
efectuadas, excepto se entre estas e a causa de resolução existir um vínculo
que legitime a resolução de todas elas.
ARTIGO 435º
(Efeitos em relação a
terceiros)
1. A resolução, ainda que
expressamente convencionada, não prejudica os direitos adquiridos por terceiro.
2. Porém, o registo da
acção de resolução que respeite a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo,
torna o direito de resolução oponível a terceiro que não tenha registado o seu
direito antes do registo da acção.
ARTIGO 436º
(Como e quando se
efectiva a resolução)
1. A resolução do contrato
pode fazer-se mediante declaração à outra parte.
2. Não havendo prazo
convencionado para a resolução do contrato, pode a outra parte fixar ao titular
do direito de resolução um prazo razoável para que o exerça, sob pena de
caducidade.
SUBSECÇÃO VII
Resolução ou modificação
do contrato por alteração das circunstâncias
ARTIGO 437º
(Condições de
admissibilidade)
1. Se as circunstâncias em
que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração
anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação
dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela
assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos
riscos próprios do contrato.
2. Requerida a resolução, a
parte contrária pode opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação do
contrato nos termos do número anterior.
ARTIGO 438º
(Mora da parte lesada)
A parte lesada não goza do
direito de resolução ou modificação do contrato, se estava em mora no momento
em que a alteração das circunstâncias se verificou.
ARTIGO 439º
(Regime)
Resolvido o contrato, são
aplicáveis à resolução as disposições da subsecção anterior.
SUBSECÇÃO VIII
Antecipação do
cumprimento. Sinal
ARTIGO 440º
(Antecipação do
cumprimento)
Se, ao celebrar-se o
contrato ou em momento posterior, um dos contraentes entregar ao outro coisa
que coincida, no todo ou em parte, com a prestação a que fica adstrito, é a
entrega havida como antecipação total ou parcial do cumprimento, salvo se as
partes quiserem atribuir à coisa entregue o carácter de sinal.
ARTIGO 441º
(Contrato-promessa de
compra e venda)
No contrato-promessa de
compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue
pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de
antecipação ou princípio de pagamento do preço.
ARTIGO 442º
(Sinal)
1. Quando haja sinal, a
coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a
imputação não for possível.
2. Se quem constitui o
sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o
outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não
cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele a faculdade de
exigir o dobro do que prestou, ou, se houve tradição da coisa a que se refere o
contrato prometido, o seu valor, ou o do direito a transmitir ou a constituir
sobre ela, determinado objectivamente, à data do não cumprimento da promessa,
com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o sinal e
a parte do preço que tenha pago.
3. Em qualquer dos casos
previstos no número anterior, o contraente não faltoso pode, em alternativa,
requerer a execução específica do contrato, nos termos do artigo 830º; se o
contraente não faltoso optar pelo aumento do valor da coisa ou do direito, como
se estabelece no número anterior, pode a outra parte opor-se ao exercício dessa
faculdade, oferecendo-se para cumprir a promessa, salvo o disposto no artigo
808º.
4. Na ausência de
estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a
qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do
dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não
cumprimento.
(Redacção do Dec.-Lei nº
379/86, de 11-11)
SUBSECÇÃO IX
Contrato a favor de
terceiro
ARTIGO 443º
(Noção)
1. Por meio de contrato,
pode uma das partes assumir perante outra, que tenha na promessa um interesse
digno de protecção legal, a obrigação de efectuar uma prestação a favor de
terceiro, estranho ao negócio; diz-se promitente a parte que assume a obrigação
e promissário o contraente a quem a promessa é feita.
2. Por contrato a favor de
terceiro, têm as partes ainda a possibilidade de remitir dívidas ou ceder
créditos, e bem assim de constituir, modificar, transmitir ou extinguir
direitos reais.
ARTIGO 444º
(Direitos do terceiro e
do promissário)
1. O terceiro a favor de
quem for convencionada a promessa adquire direito à prestação,
independentemente de aceitação.
2. O promissário tem
igualmente o direito de exigir do promitente o cumprimento da promessa, a não
ser que outra tenha sido a vontade dos contraentes.
3. Quando se trate da
promessa de exonerar o promissário de uma dívida para com terceiro, só àquele é
lícito exigir o cumprimento da promessa.
ARTIGO 445º
(Prestações em benefício
de pessoa indeterminada)
Se a prestação for
estipulada em benefício de um conjunto indeterminado de pessoas ou no interesse
público, o direito de a reclamar pertence não só ao promissário ou seus
herdeiros, como às entidades competentes para defender os interesses em causa.
ARTIGO 446º
(Direitos dos herdeiros
do promissário)
1. Nem os herdeiros do
promissário, nem as entidades a que o artigo anterior se refere, podem dispor
do direito à prestação ou autorizar qualquer modificação do seu objecto.
2. Quando a prestação se
torne impossível por causa imputável ao promitente, têm os herdeiros do
promissário, bem como as entidades competentes para reclamar o cumprimento da
prestação, o direito de exigir a correspondente indemnização, para os fins
convencionados.
ARTIGO 447º
(Rejeição ou adesão do
terceiro beneficiário)
1. O terceiro pode rejeitar
a promessa ou aderir a ela.
2. A rejeição faz-se
mediante declaração ao promitente, o qual deve comunicá-la ao promissário; se
culposamente deixar de o fazer, é responsável em face deste.
3. A adesão faz-se mediante
declaração, tanto ao promitente como ao promissário.
ARTIGO 448º
(Revogação pelos
contraentes)
1. Salvo estipulação em
contrário, a promessa é revogável enquanto o terceiro não manifestar a sua
adesão, ou enquanto o promissário for vivo, quando se trate de promessa que
haja de ser cumprida depois da morte deste.
2. O direito de revogação
pertence ao promissário; se, porém, a promessa foi feita no interesse de ambos
os outorgantes, a revogação depende do consentimento do promitente.
ARTIGO 449º
(Meios de defesa
oponíveis pelo promitente)
São oponíveis ao terceiro,
por parte do promitente, todos os meios de defesa derivados do contrato, mas
não aqueles que advenham de outra relação entre promitente e promissário.
ARTIGO 450º
(Relações entre o
promissário e pessoas estranhas ao benefício)
1. Só no que respeita à
contribuição do promissário para a prestação a terceiro são aplicáveis as
disposições relativas à colação, imputação e redução das doações e à impugnação
pauliana.
2. Se a designação de
terceiro for feita a título de liberalidade, são aplicáveis, com as necessárias
adaptações, as normas relativas à revogação das doações por ingratidão do
donatário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 451º
(Promessa a cumprir
depois da morte do promissário)
1. Se a prestação a
terceiro houver de ser efectuada após a morte do promissário, presume-se que só
depois do falecimento deste o terceiro adquire direito a ela.
2. Se, porém, o terceiro
morrer antes do promissário, os seus herdeiros são chamados em lugar dele à
titularidade da promessa.
SUBSECÇÃO X
Contrato para pessoa a
nomear
ARTIGO 452º
(Noção)
1. Ao celebrar o contrato,
pode uma das partes reservar o direito de nomear um terceiro que adquira os
direitos e assuma as obrigações provenientes desse contrato.
2. A reserva de nomeação
não é possível nos casos em que não é admitida a representação ou é
indispensável a determinação dos contraentes.
ARTIGO 453º
(Nomeação)
1. A nomeação deve ser
feita mediante declaração por escrito ao outro contraente, dentro do prazo
convencionado ou, na falta de convenção, dentro dos cinco dias posteriores à
celebração do contrato.
2. A declaração de nomeação
deve ser acompanhada, sob pena de ineficácia, do instrumento de ratificação do
contrato ou de procuração anterior à celebração deste.
ARTIGO 454º
(Forma da ratificação)
1. A ratificação deve
constar de documento escrito.
2. Se, porém, o contrato
tiver sido celebrado por meio de documento de maior força probatória, necessita
a ratificação de revestir igual forma.
ARTIGO 455º
(Efeitos)
1. Sendo a declaração de
nomeação feita nos termos do art. 453º, a pessoa nomeada adquire os direitos e
assume as obrigações provenientes do contrato a partir da celebração dele.
2. Não sendo feita a
declaração de nomeação nos termos legais, o contrato produz os seus efeitos
relativamente ao contraente originário, desde que não haja estipulação em
contrário.
ARTIGO 456º
(Publicidade)
1. Se o contrato estiver
sujeito a registo, pode este ser feito em nome do contraente originário, com
indicação da cláusula para pessoa a nomear, fazendo-se posteriormente os
necessários averbamentos.
2. O disposto no número
anterior é extensivo a qualquer outra forma de publicidade a que o contrato
esteja sujeito.
SECÇÃO II
Negócios unilaterais
ARTIGO 457º
(Princípio geral)
A promessa unilateral de
uma prestação só obriga nos casos previstos na lei.
ARTIGO 458º
(Promessa de cumprimento
e reconhecimento de dívida)
1. Se alguém, por simples
declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação
da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental,
cuja existência se presume até prova em contrário.
2. A promessa ou
reconhecimento deve, porém, constar de documento escrito, se outras
formalidades não forem exigidas para a prova da relação fundamental.
ARTIGO 459º
(Promessa pública)
1. Aquele que, mediante
anúncio público, prometer uma prestação a quem se encontre em determinada
situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo, fica vinculado desde
logo à promessa.
2. Na falta de declaração
em contrário, o promitente fica obrigado mesmo em relação àqueles que se
encontrem na situação prevista ou tenham praticado o facto sem atender à
promessa ou na ignorância dela.
ARTIGO 460º
(Prazo de validade)
A promessa pública sem
prazo de validade fixado pelo promitente ou imposto pela natureza ou fim da
promessa mantém-se enquanto não for revogada.
ARTIGO 461º
(Revogação)
1. Não tendo prazo de
validade, a promessa pública é revogável a todo o tempo pelo promitente; se
houver prazo, só é revogável ocorrendo justa causa.
2. Em qualquer dos casos, a
revogação não é eficaz, se não for feita na forma da promessa ou em forma
equivalente, ou se a situação prevista já se tiver verificado ou o facto já
tiver sido praticado.
ARTIGO 462º
(Cooperação de várias
pessoas)
Se na produção do resultado
previsto tiverem cooperado várias pessoas, conjunta ou separadamente, e todas
tiverem direito à prestação, esta será dividida equitativamente, atendendo-se à
parte que cada uma delas teve nesse resultado.
ARTIGO 463º
(Concursos públicos)
1. A oferta da prestação
como prémio de um concurso só é válida quando se fixar no anúncio público o
prazo para a apresentação dos concorrentes.
2. A decisão sobre a
admissão dos concorrentes ou a concessão do prémio a qualquer deles pertence
exclusivamente às pessoas designadas no anúncio ou, se não houver designação,
ao promitente.
SECÇÃO III
Gestão de negócios
ARTIGO 464º
(Noção)
Dá-se a gestão de negócios,
quando uma pessoa assume a direcção de negócio alheio no interesse e por conta
do respectivo dono, sem para tal estar autorizada.
ARTIGO 465º
(Deveres do gestor)
O gestor deve:
a) Conformar-se com o
interesse e a vontade, real ou presumível, do dono do negócio, sempre que esta
não seja contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes;
b) Avisar o dono do
negócio, logo que seja possível, de que assumiu a gestão;
c) Prestar contas, findo o
negócio ou interrompida a gestão, ou quando o dono as exigir;
d) Prestar a este todas as
informações relativas à gestão;
e) Entregar-lhe tudo o que
tenha recebido de terceiros no exercício da gestão ou o saldo das respectivas
contas, com os juros legais, relativamente às quantias em dinheiro, a partir do
momento em que a entrega haja de ser efectuada.
ARTIGO 466º
(Responsabilidade do
gestor)
1. O gestor responde
perante o dono do negócio, tanto pelos danos a que der causa, por culpa sua, no
exercício da gestão, como por aqueles que causar com a injustificada
interrupção dela.
2. Considera-se culposa a
actuação do gestor, quando ele agir em desconformidade com o interesse ou a
vontade, real ou presumível, do dono do negócio.
ARTIGO 467º
(Solidariedade dos
gestores)
Havendo dois ou mais
gestores que tenham agido conjuntamente, são solidárias as obrigações deles para
com o dono do negócio.
ARTIGO 468º
(Obrigações do dono do
negócio)
1. Se a gestão tiver sido
exercida em conformidade com o interesse e a vontade, real ou presumível, do
dono do negócio, é este obrigado a reembolsar o gestor das despesas que ele
fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais a contar do
momento em que foram feitas, e a indemnizá-lo do prejuízo que haja sofrido.
2. Se a gestão não foi
exercida nos termos do número anterior, o dono do negócio responde apenas
segundo as regras do enriquecimento sem causa, com ressalva do disposto no
artigo seguinte.
ARTIGO 469º
(Aprovação da gestão)
A aprovação da gestão
implica a renúncia ao direito de indemnização pelos danos devidos a culpa do
gestor e vale como reconhecimento dos direitos que a este são conferidos no nº
1 do artigo anterior.
ARTIGO 470º
(Remuneração do gestor)
1. A gestão não dá direito
a qualquer remuneração, salvo se corresponder ao exercício da actividade
profissional do gestor.
2. À fixação da remuneração
é aplicável, neste caso, o disposto no nº 2 do artigo 1158º.
ARTIGO 471º
(Representação sem
poderes e mandato sem representação)
Sem prejuízo do que
preceituam os artigos anteriores quando às relações entre o gestor e o dono do
negócio, é aplicável aos negócios jurídicos celebrados por aquele em nome deste
o disposto no artigo 268º; se o gestor os realizar em seu próprio nome, são
extensivas a esses negócios, na parte aplicável, as disposições relativas ao
mandato sem representação.
ARTIGO 472º
(Gestão de negócio alheio
julgado próprio)
1. Se alguém gerir negócio
alheio, convencido de que ele lhe pertence, só é aplicável o disposto nesta
secção se houver aprovação da gestão; em quaisquer outras circunstâncias, são
aplicáveis à gestão as regras do enriquecimento sem causa, sem prejuízo de
outras que ao caso couberem.
2. Se houver culpa do
gestor na violação do direito alheio, são aplicáveis ao caso as regras da
responsabilidade civil.
SECÇÃO IV
Enriquecimento sem causa
ARTIGO 473º
(Princípio geral)
1. Aquele que, sem causa
justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restiuir aquilo com
que injustamente se locupletou.
2. A obrigação de
restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que
for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que
deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.
ARTIGO 474º
(Natureza subsidiária da
obrigação)
Não há lugar à restituição
por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser
indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros
efeitos ao enriquecimento.
ARTIGO 475º
(Falta do resultado
previsto)
Também não há lugar à
restituição se, ao efectuar a prestação, o autor sabia que o efeito com ela
previsto era impossível, ou se, agindo contra a boa fé, impediu a sua
verificação.
ARTIGO 476º
(Repetição do indevido)
1. Sem prejuízo do disposto
acerca das obrigações naturais, o que for prestado com intenção de cumprir uma
obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento da prestação.
2. A prestação feita a
terceiro pode ser repetida pelo devedor enquanto não se tornar liberatória nos
termos do artigo 770º.
3. A prestação feita por
erro desculpável antes do vencimento da obrigação só dá lugar à repetição
daquilo com que o credor se enriqueceu por efeito do cumprimento antecipado.
ARTIGO 477º
(Cumprimento de
obrigação alheia na convicção de que é própria)
1. Aquele que, por erro
desculpável, cumprir uma obrigação alheia, julgando-a própria, goza de direito
de repetição, excepto se o credor, desconhecendo o erro do autor da prestação,
se tiver privado do título ou das garantias do crédito, tiver deixado
prescrever ou caducar o seu direito, ou não o tiver exercido contra o devedor
ou contra o fiador enquanto solventes.
2. Quando não existe o
direito de repetição, fica o autor da prestação sub-rogado nos direitos do
credor.
ARTIGO 478º
(Cumprimento de
obrigação alheia na convicção de estar obrigado a cumpri-la)
Aquele que cumprir
obrigação alheia, na convicção errónea de estar obrigado para com o devedor a
cumpri-la, não tem o direito de repetição contra o credor, mas apenas o direito
de exigir do devedor exonerado aquilo com que este injustamento se locupletou,
excepto se o credor conhecia o erro ao receber a prestação.
ARTIGO 479º
(Objecto da obrigação de
restituir)
1. A obrigação de restituir
fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quando se tenha obtido à
custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor
correspondente.
2. A obrigação de restituir
não pode exceder a medida do locupletamento à data da verificação de algum dos
factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.
ARTIGO 480º
(Agravamento da
obrigação)
O enriquecido passa a
responder também pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos
frutos que por sua culpa deixem de ser percebidos e pelos juros legais das
quantias a que o empobrecido tiver direito, depois de se verificar algumas das
seguintes circunstâncias:
a) Ter sido o enriquecido
citado judicialmente para a restituição;
b) Ter ele conhecimento da
falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do efeito que se pretendia
obter com a prestação.
ARTIGO 481º
(Obrigação de restituir
no caso de alienação gratuita)
1. Tendo o enriquecido
alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, fica o adquirente obrigado
em lugar dele, mas só na medida do seu próprio enriquecimento.
2. Se, porém, a transmissão
teve lugar depois da verificação de algum dos factos referidos no artigo
anterior, o alienante è responsável nos termos desse artigo, e o adquirente, se
estiver de má fé, é responsável nos mesmos termos.
ARTIGO 482º
(Prescrição)
O direito à restituição por
enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o
credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável,
sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a
contar do enriquecimento.
SECÇÃO V
Responsabilidade civil
SUBSECÇÃO I
Responsabilidade por
factos ilícitos
ARTIGO 483º
(Princípio geral)
1. Aquele que, com dolo ou
mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição
legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o
lesado pelos danos resultantes da violação.
2. Só existe obrigação de indemnizar
independentemente de culpa nos casos especificados na lei.
ARTIGO 484º
(Ofensa do crédito ou do
bom nome)
Quem afirmar ou difundir um
facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular
ou colectiva, responde pelos danos causados.
ARTIGO 485º
(Conselhos,
recomendações ou informações)
1. Os simples conselhos,
recomendações ou informações não responsabilizam quem os dá, ainda que haja
negligência da sua parte.
2. A obrigação de
indemnizar existe, porém, quando se tenha assumido a responsabilidade pelos
danos, quando havia o dever jurídico de dar conselho, recomendação ou
informação e se tenha procedido com negligência ou intenção de prejudicar, ou
quando o procedimento do agente constitua facto punível.
ARTIGO 486º
(Omissões)
As simples omissões dão
lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros
requisitos legais, havia, por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de
praticar o acto omitido.
ARTIGO 487º
(Culpa)
1. É ao lesado que incumbe
provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
2. A culpa é apreciada, na
falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em
face das circunstâncias de cada caso.
ARTIGO 488º
(Imputabilidade)
1. Não responde pelas
consequências do facto danoso quem, no momento em que o facto ocorreu, estava,
por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente se
colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório.
2. Presume-se falta de
imputabilidade nos menores de sete anos e nos interditos por anomalia psíquica.
ARTIGO 489º
(Indemnização por pessoa
não impútavel)
1. Se o acto causador dos
danos tiver sido praticado por pessoa não imputável, pode esta, por motivo de
equidade, ser condenada a repará-los, total ou parcialmente, desde que não seja
possível obter a devida reparação das pessoas a quem incumbe a sua vigilância.
2. A indemnização será,
todavia, calculada por forma a não privar a pessoa não imputável dos alimentos
necessários, conforme o seu estado e condição, nem dos meios indispensáveis
para cumprir os seus deveres legais de alimentos.
ARTIGO 490º
(Responsabilidade dos
autores, instigadores e auxiliares)
Se forem vários os autores,
instigadores ou auxiliares do acto ilícito, todos eles respondem pelos danos
que hajam causado.
ARTIGO 491º
(Responsabilidade das
pessoas obrigadas à vigilância de outrem)
As pessoas que, por lei ou
negócio jurídico, forem obrigadas a vigiar outras, por virtude da incapacidade
natural destas, são responsáveis pelos danos que elas causem a terceiro, salvo
se mostrarem que cumpriram o seu dever de vigilância ou que os danos se teriam
produzido ainda que o tivessem cumprido.
ARTIGO 492º
(Danos causados por
edifícios ou outras obras)
1. O proprietário ou
possuidor de edifício ou de outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício
de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo
se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência
devida, se não teriam evitado os danos.
2. A pessoa obrigada, por
lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do
proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a
defeito de conservação.
ARTIGO 493º
(Danos causados por
coisas, animais ou actividades)
1. Quem tiver em seu poder
coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido
o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa
ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou
que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua.
2. Quem causar danos a
outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou
pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar
que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de
os prevenir.
ARTIGO 494º
(Limitação da
indemnização no caso de mera culpa)
Quando a responsabilidade
se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em
montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de
culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais
circunstâncias do caso o justifiquem.
ARTIGO 495º
(Indemnização a terceiros
em caso de morte ou lesão corporal)
1. No caso de lesão de que
proveio a morte, é o responsável obrigado a indemnizar as despesas feitas para
salvar o lesado e todas as demais, sem exceptuar as do funeral.
2. Neste caso, como em
todos os outros de lesão corporal, têm direito a indemnização aqueles que
socorreram o lesado, bem como os estabelecimentos hospitalares, médicos ou
outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou
assistência da vítima.
3. Têm igualmente direito a
indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o
lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural.
ARTIGO 496º
(Danos não patrimoniais)
1. Na fixação da
indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade,
mereçam a tutela do direito.
2. Por morte da vítima, o
direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge
não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros
descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último
aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
3. O montante da
indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em
qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte,
podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como
os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número
anterior.
ARTIGO 497º
(Responsabilidade
solidária)
1. Se forem várias as
pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade.
2. O direito de regresso
entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das
consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas das pessoas
responsáveis.
ARTIGO 498º
(Prescrição)
1. O direito de indemnização
prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve
conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa
do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição
ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.
2. Prescreve igualmente no
prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os
responsáveis.
3. Se o facto ilícito
constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais
longo, é este o prazo aplicável.
4. A prescrição do direito
de indemnização não importa prescrição da acção de reivindicação nem da acção
de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra.
SUBSECÇÃO II
Responsabilidade pelo
risco
ARTIGO 499º
(Disposições aplicáveis)
São extensivas aos casos de
responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de preceitos legais
em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por factos
ilícitos.
ARTIGO 500º
(Responsabilidade do
comitente)
1. Aquele que encarrega
outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos
que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de
indemnizar.
2. A responsabilidade do
comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que
intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que
lhe foi confiada.
3. O comitente que
satisfizer a indemnização tem o direito de exigir do comissário o reembolso de
tudo quanto haja pago, excepto se houver também culpa da sua parte; neste caso
será aplicável o disposto no nº 2 do artigo 497º.
ARTIGO 501º
(Responsabilidade do
Estado e de outras pessoas colectivas públicas)
O Estado e demais pessoas
colectivas públicas, quando haja danos causados a terceiro pelos seus órgãos,
agentes ou representantes no exercício de actividades de gestão privada,
respondem civilmente por esses danos nos termos em que os comitentes respondem
pelos danos causados pelos seus comissários.
ARTIGO 502º
(Danos causados por
animais)
Quem no seu próprio
interesse utilizar quaisquer animais responde pelos danos que eles causarem,
desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua utilização.
ARTIGO 503º
(Acidentes causados por
veículos)
1. Aquele que tiver a
direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no
seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos
danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se
encontre em circulação.
2. As pessoas não
imputáveis respondem nos termos do art. 489º.
3. Aquele que conduzir o
veículo por conta de outrem responde pelos danos que causar, salvo se provar
que não houve culpa da sua parte; se, porém, o conduzir fora do exercício das
suas funções de comissário, responde nos termos do nº 1.
ARTIGO 504º
(Beneficiários da
responsabilidade)
1. A responsabilidade pelos
danos causados por veículos aproveita a terceiros, bem como às pessoas
transportadas.
2. No caso de transporte
por virtude de contrato, a responsabilidade abrange só os danos que atinjam a
própria pessoa e as coisas por ela transportadas.
3. No caso de transporte
gratuito, a responsabilidade abrange apenas os danos pessoais da pessoa
transportada.
4. São nulas as cláusulas
que excluam ou limitem a responsabilidade do transportador pelos acidentes que
atinjam a pessoa transportada.
(Redacção do Dec.-Lei
14/96, de 6-3)
ARTIGO 505º
(Exclusão da
responsabilidade)
Sem prejuízo do disposto no
artigo 570º, a responsabilidade fixada pelo nº 1 do artigo 503º só é excluída
quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando
resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.
ARTIGO 506º
(Colisão de veículos)
1. Se da colisão entre dois
veículos resultarem danos em relação aos dois ou em relação a um deles, e
nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a responsabilidade é repartida
na proporção em que o risco de cada um dos veículos houver contribuído para os
danos; se os danos forem causados somente por um dos veículos, sem culpa de
nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada a
indemnizar.
2. Em caso de dúvida,
considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os
danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores.
ARTIGO 507º
(Responsabilidade
solidária)
1. Se a responsabilidade
pelo risco recair sobre várias pessoas, todas respondem solidariamente pelos
danos, mesmo que haja culpa de alguma ou algumas.
2. Nas relações entre os
diferentes responsáveis, a obrigação de indemnizar reparte-se de harmonia com o
interesse de cada um na utilização do veículo; mas, se houver culpa de algum ou
de alguns, apenas os culpados respondem, sendo aplicável quanto ao direito de
regresso, entre eles, ou em relação a eles, o disposto no nº 2 do artigo 497º.
ARTIGO 508º
(Limites máximos)
1. A indemnização fundada
em acidente de viação, quando não haja culpa do responsável, tem como limites
máximos: no caso de morte ou lesão de uma pessoa, o montante correspondente ao
dobro da alçada da relação; no caso de morte ou lesão de várias pessoas em
consequência do mesmo acidente, o montante correspondente ao dobro da alçada da
relação para cada uma delas, com o máximo total do sextuplo da alçada da relação;
no caso de danos causados em coisas, ainda que pertencentes a diferentes
proprietários, o montante correspondente à alçada da relação.
2. Se a indemnização for
fixada sob a forma de renda anual e não houver culpa do responsável, o limite
máximo é de um quarto da alçada da relação para cada lesado, não podendo
ultrapassar três quartos da alçada da relação quando sejam vários os lesados em
virtude do mesmo acidente.
3. Se o acidente for
causado por veículo utilizado em transporte colectivo, são elevados ao triplo
os máximos totais fixados nos números anteriores; se for causado por caminho de
ferro, ao décuplo.
(Redacção do Dec.-Lei
423/91, de 30-10)
ARTIGO 509º
(Danos causados por
instalações de energia eléctrica ou gás)
1. Aquele que tiver a
direcção efectiva de instalação destinada à condução ou entrega da energia
eléctrica ou do gás, e utilizar essa instalação no seu interesse, responde
tanto pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da electricidade ou do
gás, como pelos danos resultantes da própria instalação, excepto se ao tempo do
acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito
estado de conservação.
2. Não obrigam a reparação
os danos devidos a causa de força maior; considera-se de força maior toda a
causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa.
3. Os danos causados por
utensílios de uso de energia não são reparáveis nos termos desta disposição.
ARTIGO 510º
(Limites da
responsabilidade)
1. A responsabilidade a que
se refere o artigo precedente, quando não haja culpa do responsável, tem para
cada acidente, como limite máximo, no caso de morte ou lesão corpórea, um
capital ou uma renda anual iguais aos estabelecidos, para a morte ou lesão de
uma pessoa, no nº 1 do artigo 508º.
2. Quando se trate de danos
em coisas, ainda que sejam várias e pertencentes a diversos proprietários, o
limite máximo é um capital igual ao da indemnização por morte ou lesão de uma
pessoa, nos termos no nº 1 do artigo 508º.
3. Quando se trate de danos
em prédios, o limite máximo da responsabilidade pelo risco é elevado ao décuplo
do previsto nos números anteriores, para cada prédio.
(Redacção do Dec.-Lei
190/85, de 24-06)
CAPÍTULO III
Modalidades das
obrigações
SECÇÃO I
Obrigações de sujeito
activo indeterminado
ARTIGO 511º
(Determinação da pessoa
do credor)
A pessoa do credor pode não
ficar determinada no momento em que a obrigação é constituída; mas deve ser
determinável, sob pena de ser nulo o negócio jurídico do qual a obrigação
resultaria.
SECÇÃO II
Obrigações solidárias
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 512º
(Noção)
1. A obrigação é solidária,
quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos
libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a
prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles.
2. A obrigação não deixa de
ser solidária pelo facto de os devedores estarem obrigados em termos diversos
ou com diversas garantias, ou de ser diferente o conteúdo das prestações de
cada um deles; igual diversidade se pode verificar quanto à obrigação do
devedor relativamente a cada um dos credores solidários.
ARTIGO 513º
(Fontes da
solidariedade)
A solidariedade de
devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes.
ARTIGO 514º
(Meios de defesa)
1. O devedor solidário
demandado pode defender-se por todos os meios que pessoalmente lhe competem ou
que são comuns a todos os condevedores.
2. Ao credor solidário são
oponíveis igualmente não só os meios de defesa comum, como os que pessoalmente
lhe respeitem.
ARTIGO 515º
(Herdeiros dos devedores
ou credores solidários)
1. Os herdeiros do devedor
solidário respondem colectivamente pela totalidade da dívida; efectuada a
partilha, cada co-herdeiro responde nos termos do artigo 2098º.
2. Os herdeiros do credor
solidário só conjuntamente podem exonerar o devedor; efectuada a partilha, se o
crédito tiver sido adjudicado a dois ou mais herdeiros, também só em conjunto
estes podem exonerar o devedor.
ARTIGO 516º
(Participação nas
dívidas e nos créditos)
Nas relações entre si,
presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes
iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles
existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles
deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito.
ARTIGO 517º
(Litisconsórcio)
1. A solidariedade não
impede que os devedores solidários demandem conjuntamente o credor ou sejam por
ele conjuntamente demandados.
2. De igual direito gozam
os credores solidários relativamente ao devedor e este em relação àqueles.
SUBSECÇÃO II
Solidariedade entre
devedores
ARTIGO 518º
(Exclusão do benefício
da divisão)
Ao devedor solidário
demandado não é lícito opor o benefício da divisão; e, ainda que chame os outros
devedores à demanda, nem por isso se libera da obrigação de efectuar a
prestação por inteiro.
ARTIGO 519º
(Direitos do credor)
1. O credor tem o direito
de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela,
proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir judicialmente a um
deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder
judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido, salvo se
houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do
demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação.
2. Se um dos devedores
tiver qualquer meio de defesa pessoal contra o credor, não fica este inibido de
reclamar dos outros a prestação integral, ainda que esse meio já lhe tenha sido
oposto.
ARTIGO 520º
(Impossibilidade da
prestação)
Se a prestação se tornar
impossível por facto imputável a um dos devedores, todos eles são
solidariamente responsáveis pelo seu valor; mas só o devedor a quem o facto é
imputável responde pela reparação dos danos que excedam esse valor, e, sendo
vários, é solidária a sua responsabilidade.
ARTIGO 521º
(Prescrição)
1. Se, por efeito da
suspensão ou interrupção da prescrição, ou de outra causa, a obrigação de um
dos devedores se mantiver, apesar de prescritas as obrigações dos outros, e
aquele for obrigado a cumprir, cabe-lhe o direito de regresso contra os seus
condevedores.
2. O devedor que não haja
invocado a prescrição não goza do direito de regresso contra os condevedores
cujas obrigações tenham prescrito, desde que estes aleguem a prescrição.
ARTIGO 522º
(Caso julgado)
O caso julgado entre o
credor e um dos devedores não é oponível aos restantes devedores, mas pode ser
oposto por estes, desde que não se baseie em fundamento que respeite
pessoalmente àquele devedor.
ARTIGO 523º
(Satisfação do direito
do credor)
A satisfação do direito do
credor, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em depósito
ou compensação, produz a extinção, relativamente a ele, das obrigações de todos
os devedores.
ARTIGO 524º
(Direito de regresso)
O devedor que satisfizer o
direito do credor além da parte que lhe competir tem direito de regresso contra
cada um dos condevedores, na parte que a estes compete.
Artigo 525º
(Meios de defesa
oponíveis pelos condevedores)
1. Os condevedores podem
opor ao que satisfaz o direito do credor a falta de decurso do prazo que lhes
tenha sido concedido para o cumprimento da obrigação, bem como qualquer outro
meio de defesa, quer este seja comum, quer respeite pessoalmente ao demandado.
2. A faculdade concedida no
número anterior tem lugar, ainda que o condevedor tenha deixado, sem culpa sua,
de opor ao credor o meio comum de defesa, salvo se a falta de oposição for
imputável ao devedor que pretende valer-se do mesmo meio.
ARTIGO 526º
(Insolvência dos
devedores ou impossibilidade de cumprimento)
1. Se um dos devedores
estiver insolvente ou não puder por outro motivo cumprir a prestação a que está
adstrito, é a sua quota-parte repartida proporcionalmente entre todos os
demais, incluíndo o credor de regresso e os devedores que pelo credor hajam
sido exonerados da obrigação ou apenas do vínculo da solidariedade.
2. Ao credor de regresso
não aproveita o benefício da repartição na medida em que só por negligência sua
lhe não tenha sido possível cobrar a parte do seu condevedor na obrigação
solidária.
ARTIGO 527º
(Renúncia à
solidariedade)
A renúncia à solidariedade
a favor de um ou alguns dos devedores não prejudica o direito do credor
relativamente aos restantes, contra os quais conserva o direito à prestação por
inteiro.
SUBSECÇÃO III
Solidariedade entre
credores
ARTIGO 528º
(Escolha do credor)
1. É permitido ao devedor
escolher o credor solidário a quem satisfaça a prestação, enquanto não tiver
sido judicialmente citado para a respectiva acção por outro credor cujo crédito
se ache vencido.
2. Se o devedor cumprir
perante credor diferente daquele que judicialmente exigiu a prestação, não fica
dispensado de realizar a favor deste a prestação integral; mas, quando a
solidariedade entre os credores tiver sido estabelecida em favor do devedor,
este pode, renunciando total ou parcialmente ao benefício, prestar a cada um
dos credores a parte que lhe cabe no crédito comum ou satisfazer a algum dos
outros a prestação com dedução da parte do demandante.
ARTIGO 529º
(Impossibilidade da
prestação)
1. Se a prestação se tornar
impossível por facto imputável ao devedor, subsiste a solidariedade
relativamente ao crédito da indemnização.
2. Se a prestação se tornar
impossível por facto imputável a um dos credores, fica este obrigado a
indemnizar os outros.
ARTIGO 530º
(Prescrição)
1. Se o direito de um dos
credores se mantiver devido a suspensão ou interrupção da prescrição ou a outra
causa, apesar de haverem prescrito os direitos dos restantes credores, pode o
devedor opor àquele credor a prescrição do crédito na parte relativa a estes
últimos.2. A renúncia à prescrição, feita pelo devedor em benefício de um dos
credores, não produz efeito relativamente aos restantes.
ARTIGO 531º
(Caso julgado)
O caso julgado entre um dos
credores e o devedor não é oponível aos outros credores; mas pode ser oposto
por estes ao devedor, sem prejuízo das excepções pessoais que o devedor tenha o
direito de invocar em relação a cada um deles.
ARTIGO 532º
(Satisfação do direito
de um dos credores)
A satisfação do direito de
um dos credores, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em
depósito ou compensação, produz a extinção, relativamente a todos os credores,
da obrigação do devedor.
ARTIGO 533º
(Obrigação do credor que
foi pago)
O credor cujo direito foi
satisfeito além da parte que lhe competia na relação interna entre os credores
tem de satisfazer aos outros a parte que lhes cabe no crédito comum.
SECÇÃO III
Obrigações divisíveis e
indivisíveis
ARTIGO 534º
(Obrigações divisíveis)
São iguais as partes que
têm na obrigação divisível os vários credores ou devedores, se outra proporção
não resultar da lei ou do negócio jurídico; mas entre os herdeiros do devedor,
depois da partilha, serão essas partes fixadas proporcionalmente às suas quotas
hereditárias, sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 2098º.
ARTIGO 535º
(Obrigações indivisíveis
com pluralidade de devedores)
1. Se a prestação for
indivisível e vários os devedores, só de todos os obrigados pode o credor
exigir o cumprimento da prestação, salvo se tiver sido estipulada a
solidariedade ou esta resultar da lei.
2. Quando ao primitivo
devedor da prestação indivisível sucedam vários herdeiros, também só de todos
eles tem o credor a possibilidade de exigir o cumprimento da prestação.
ARTIGO 536º
(Extinção relativamente
a um dos devedores)
Se a obrigação indivisível
se extinguir apenas em relação a algum ou alguns dos devedores, não fica o
credor inibido de exigir a prestação dos restantes obrigados, contanto que lhes
entregue o valor da parte que cabia ao devedor ou devedores exonerados.
ARTIGO 537º
(Impossibilidade da
prestação)
Se a prestação indivisível
se tornar impossível por facto imputável a algum ou alguns dos devedores, ficam
os outros exonerados.
ARTIGO 538º
(Pluralidade de
credores)
1. Sendo vários os credores
da prestação indivisível, qualquer deles tem o direito de exigi-la por inteiro;
mas o devedor, enquanto não for judicialmente citado, só relativamente a todos,
em conjunto, se pode exonerar.
2. O caso julgado favorável
a um dos credores aproveita aos outros, se o devedor não tiver, contra estes,
meios especiais de defesa
SECÇÃO IV
Obrigações genéricas
ARTIGO 539º
(Determinação do
objecto)
Se o objecto da prestação
for determinado apenas quanto ao género, compete a sua escolha ao devedor, na
falta de estipulação em contrário.
ARTIGO 540º
(Não perecimento do
género)
Enquanto a prestação for
possível com coisas do género estipulado, não fica o devedor exonerado pelo
facto de perecerem aquelas com que se dispunha a cumprir.
ARTIGO 541º
(Concentração da
obrigação)
A obrigação concentra-se,
antes do cumprimento, quando isso resultar de acordo das partes, quando o
género se extinguir a ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas,
quando o credor incorrer em mora, ou ainda nos termos do artigo 797º.
ARTIGO 542º
(Concentração por facto
do credor ou de terceiro)
1. Se couber ao credor ou a
terceiro, a escolha só é eficaz se for declarada, respectivamente, ao devedor
ou a ambas as partes, e é irrevogável.
2. Se couber a escolha ao
credor e este a não fizer dentro do prazo estabelecido ou daquele que para o
efeito lhe for fixado pelo devedor, é a este que a escolha passa a competir.
SECÇÃO V
Obrigações alternativas
ARTIGO 543º
(Noção)
1. É alternativa a
obrigação que compreende duas ou mais prestações, mas em que o devedor se
exonera efectuando aquela que, por escolha, vier a ser designada.
2. Na falta de determinação
em contrário, a escolha pertence ao devedor.
ARTIGO 544º
(Indivisibilidade das prestações)
O devedor não pode escolher
parte de uma prestação e parte de outra ou outras, nem ao credor ou a terceiro
é lícito fazê-lo quando a escolha lhes pertencer.
ARTIGO 545º
(Impossibilidade não
imputável às partes)
Se uma ou algumas das
prestações se tornarem impossíveis por causa não imputável às partes, a
obrigação considera-se limitada às prestações que forem possíveis.
ARTIGO 546º
(Impossibilidade
imputável ao devedor)
Se a impossibilidade de
alguma das prestações for imputável ao devedor e a escolha lhe pertencer, deve
efectuar uma das prestações possíveis; se a escolha pertencer ao credor, este
poderá exigir uma das prestações possíveis, ou pedir a indemnização pelos danos
provenientes de não ter sido efectuada a prestação que se tornou impossível, ou
resolver o contrato nos termos gerais.
ARTIGO 547º
(Impossibilidade
imputável ao credor)
Se a impossibilidade de
alguma das prestações for imputável ao credor e a escolha lhe pertencer,
considera-se cumprida a obrigação; se a escolha pertencer ao devedor, também a
obrigação se tem por cumprida, a menos que este prefira efectuar outra
prestação e ser indemnizado dos danos que houver sofrido.
ARTIGO 548º
(Falta de escolha pelo
devedor)
O credor, na execução, pode
exigir que o devedor, dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal, declare
por qual das prestações quer optar, sob pena de se devolver ao credor o direito
de escolha.
ARTIGO 549º
(Escolha pelo credor ou
por terceiro)
À escolha que o credor ou
terceiro deva efectuar é aplicável o disposto no artigo 542º.
SECÇÃO VI
Obrigações pecuniárias
SUBSECÇÃO I
Obrigações de quantidade
ARTIGO 550º
(Princípio nominalista)
O cumprimento das
obrigações pecuniárias faz-se em moeda que tenha curso legal no País à data em
que for efectuado e pelo valor nominal que a moeda nesse momento tiver, salvo
estipulação em contrário.
ARTIGO 551º
(Actualização das
obrigações pecuniárias)
Quando a lei permitir a
actualização das prestações pecuniárias, por virtude das flutuações do valor da
moeda, atender-se-á, na falta de outro critério legal, aos índices dos preços,
de modo a restabelecer, entre a prestação e a quantidade de mercadorias a que
ela equivale, a relação existente na data em que a obrigação se constituiu.
SUBSECÇÃO II
Obrigações de moeda
específica
ARTIGO 552º
(Validade das obrigações
de moeda específica)
O curso legal ou forçado da
nota de banco não prejudica a validade do acto pelo qual alguém se comprometa a
pagar em moeda metálica ou em valor dessa moeda.
ARTIGO 553º
(Obrigações de moeda
específica sem quantitativo expresso em moeda corrente)
Quando for estipulado o
pagamento em certa espécie monetária, o pagamento deve ser feito na espécie
estipulada, existindo ela legalmente, embora tenha variado de valor após a data
em que a obrigação foi constituída.
ARTIGO 554º
(Obrigações de moeda
específica ou de certo metal com quantitativo expresso em moeda corrente)
Quando o quantitativo da
obrigação é expresso em dinheiro corrente, mas se estipula que o cumprimento
será efectuado em certa espécie monetária ou em moedas de certo metal,
presume-se que as partes querem vincular-se ao valor corrente que a moeda ou as
moedas do metal escolhido tinham à data da estipulação.
ARTIGO 555º
(Falta da moeda
estipulada)
1. Quando se tiver
estipulado o cumprimento em determinada espécie monetária, em certo metal ou em
moedas de certo metal, e se não encontrem as espécies ou as moedas estipuladas
em quantidade bastante, pode o pagamento ser feito, quanto à parte da dívida
que não for possível cumprir nos termos acordados, em moeda corrente que
perfaça o valor dela, segundo a cotação que a moeda escolhida ou as moedas do
metal indicado tiverem na bolsa no dia do cumprimento.
2. Se as moedas estipuladas
ou as moedas do metal indicado não tiverem cotação na bolsa, atender-se-á ao
valor corrente, ou, na falta deste, ao valor corrente do metal; a esse mesmo
valor se atenderá, quando a moeda, devido à sua raridade, tenha atingido uma
cotação ou preço corrente anormal, com que as partes não hajam contado no
momento em que a obrigação se constituiu.
ARTIGO 556º
(Moeda específica sem
curso legal)
1. Sempre que a espécie
monetária estipulada ou as moedas do metal estipulado não tenham já curso legal
na data do cumprimento, deve a prestação ser feita em moeda que tenha curso
legal nessa data, de harmonia com a norma de redução que a lei tiver
estabelecido ou, na falta de determinação legal, segundo a relação de valores
correntes na data em que a nova moeda for introduzida.
2. Quando o quantitativo da
obrigação tiver sido expresso em moeda corrente, estipulando-se o pagamento em
espécies monetárias, em certo metal ou em moedas de certo metal, e essas moedas
carecerem de curso legal na data do cumprimento, observar-se-á a doutrina do
número anterior, uma vez determinada a quantidade dessas moedas que constituía
o montante da prestação em dívida.
ARTIGO 557º
(Cumprimento em moedas
de dois ou mais metais ou de um entre vários metais)
1. No caso de se ter
convencionado o cumprimento em moedas de um entre dois ou mais metais, a
determinação da pessoa a quem a escolha pertence é feita de acordo com as
regras das obrigações alternativas.
2. Quando se estipular o
cumprimento da obrigação em moedas de dois ou mais metais, sem se fixar a
proporção de umas e outras, cumprirá o devedor entregando em partes iguais
moedas dos metais especificados.
SUBSECÇÃO III
Obrigações em moeda
estrangeira
ARTIGO 558º
(Termos do cumprimento)
1. A estipulação do
cumprimento em moeda estrangeira não impede o devedor de pagar em moeda
nacional, segundo o câmbio do dia do cumprimento e do lugar para este
estabelecido, salvo se essa faculdade houver sido afastada pelos interessados.
2. Se, porém, o credor
estiver em mora, pode o devedor cumprir de acordo com o câmbio da data em que a
mora se deu.
SECÇÃO VII
Obrigações de juros
ARTIGO 559º
(Taxa de juro)
1. Os juros legais e os
estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são os fixados em portaria
conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do Plano.
2. A estipulação de juros a
taxa superior à fixada nos termos do número anterior deve ser feita por
escrito, sob pena de serem apenas devidos na medida dos juros legais.
(Redacção do Dec.-Lei
200-C/80, de 24-6)
ARTIGO 559º-A
(Juros usurários)
É aplicável o disposto no
artigo 1146º a toda a estipulação de juros ou quaisquer outras vantagens em
negócios ou actos de concessão, outorga, renovação, desconto ou prorrogação do
prazo de pagamento de um crédito e em outros análogos.
(Aditado pelo Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
ARTIGO 560º
(Anatocismo)
1. Para que os juros
vencidos produzam juros é necessária convenção posterior ao vencimento; pode
haver também juros de juros, a partir da notificação judicial feita ao devedor
para capitalizar os juros vencidos ou proceder ao seu pagamento sob pena de
capitalização.
2. Só podem ser capitalizados
os juros correspondentes ao período mínimo de um ano.
3. Não são aplicáveis as
restrições dos números anteriores, se forem contrárias a regras ou usos
particulares do comércio.
ARTIGO 561º
(Autonomia do crédito de
juros)
Desde que se constitui, o
crédito de juros não fica necessariamente dependente do crédito principal,
podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o outro.
SECÇÃO VIII
Obrigação de
indemnização
ARTIGO 562º
(Princípio geral)
Quem estiver obrigado a
reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse
verificado o evento que obriga à reparação.
ARTIGO 563º
(Nexo de causalidade)
A obrigação de indemnização
só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se
não fosse a lesão.
ARTIGO 564º
(Cálculo da
indemnização)
1. O dever de indemnizar
compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de
obter em consequência da lesão.
2. Na fixação da
indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam
previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização
correspondente será remetida para decisão ulterior.
ARTIGO 565º
(Indemnização
provisória)
Devendo a indemnização ser
fixada em execução de sentença, pode o tribunal condenar desde logo o devedor
no pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo que considere já
provado.
ARTIGO 566º
(Indemnização em
dinheiro)
1. A indemnização é fixada
em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare
integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
2. Sem prejuízo do
preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a
diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que
puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem
danos.
3. Se não puder ser
averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro
dos limites que tiver por provados.
ARTIGO 567º
(Indemnização em renda)
1. Atendendo à natureza
continuada dos danos, pode o tribunal, a requerimento do lesado, dar à
indemnização, no todo ou em parte, a forma de renda vitalícia ou temporária,
determinando as providências necessárias para garantir o seu pagamento.
2. Quando sofram alteração
sensível as circunstâncias em que assentou, quer o estabelecimento da renda,
quer o seu montante ou duração, quer a dispensa ou imposição de garantias, a
qualquer das partes é permitido exigir a correspondente modificação da sentença
ou acordo.
ARTIGO 568º
(Cessão dos direitos do
lesado)
Quando a indemnização
resulte da perda de qualquer coisa ou direito, o responsável pode exigir, no
acto do pagamento ou em momento posterior, que o lesado lhe ceda os seus
direitos contra terceiros.
ARTIGO 569º
(Indicação do montante
dos danos)
Quem exigir a indemnização
não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o
facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da acção, de
reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores
aos que foram inicialmente previstos.
ARTIGO 570º
(Culpa do lesado)
1. Quando um facto culposo
do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao
tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas
consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente
concedida, reduzida ou mesmo excluída.
2. Se a responsabilidade se
basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de
disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.
ARTIGO 571º
(Culpa dos
representantes legais e auxiliares)
Ao facto culposo do lesado
é equiparado o facto culposo dos seus representantes legais e das pessoas de
quem ele se tenha utilizado.
ARTIGO 572º
(Prova da culpa do
lesado)
Àquele que alega a culpa do
lesado incumbe a prova da sua verificação; mas o tribunal conhecerá dela, ainda
que não seja alegada.
SECÇÃO IX
Obrigação de informação
e de apresentação de coisas ou documentos
ARTIGO 573º
(Obrigação de
informação)
A obrigação de informação
existe, sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua
existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as
informações necessárias.
ARTIGO 574º
(Apresentação de coisas)
1. Ao que invoca um
direito, pessoal ou real, ainda que condicional ou a prazo, relativo a certa
coisa, móvel ou imóvel, é lícito exigir do possuidor ou detentor a apresentação
da coisa, desde que o exame seja necessário para apurar a existência ou o
conteúdo do direito e o demandado não tenha motivos para fundadamente se opor à
diligência.
2. Quando aquele de quem se
exige a apresentação da coisa a detiver em nome de outrem, deve avisar a pessoa
em cujo nome a detém, logo que seja exigida a apresentação, a fim de ela, se
quiser, usar os meios de defesa que no caso couberem.
ARTIGO 575º
(Apresentação de
documentos)
As disposições do artigo
anterior são, com as necessárias adaptações, extensivas aos documentos, desde
que o requerente tenha um interesse jurídico atendível no exame deles.
ARTIGO 576º
(Reprodução das coisas e
dos documentos)
Feita a apresentação, o
requerente tem a faculdade de tirar cópias ou fotografias, ou usar de outros
meios destinados a obter a reprodução da coisa ou documento, desde que a
reprodução se mostre necessária e se lhe não oponha motivo grave alegado pelo
requerido.
CAPÍTULO IV
Transmissão de créditos
e de dívidas
SECÇÃO I
Cessão de créditos
ARTIGO 577º
(Admissibilidade da
cessão)
1. O credor pode ceder a
terceiro uma parte ou a totalidade do crédito, independentemente do
consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja interdita por
determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela
própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor.
2. A convenção pela qual se
proíba ou restrinja a possibilidade da cessão não é oponível ao cessionário,
salvo se este a conhecia no momento da cessão.
ARTIGO 578º
(Regime aplicável)
1. Os requisitos e efeitos
da cessão entre as partes definem-se em função do tipo de negócio que lhe serve
de base.
2. A cessão de créditos
hipotecários, quando não seja feita em testamento e a hipoteca recaia sobre
bens imóveis, deve necessariamente constar de escritura pública.
ARTIGO 579º
(Proibição da cessão de
direitos litigiosos)
1. A cessão de créditos ou
outros direitos litigiosos feita, directamente ou por interposta pessoa, a
juízes ou magistrados do Ministério Público, funcionários de justiça ou
mandatários judiciais é nula, se o processo decorrer na área em que exercem
habitualmente a sua actividade ou profissão; é igualmente nula a cessão desses
créditos ou direitos feita a peritos ou outros auxiliares da justiça que tenham
intervenção no respectivo processo.
2. Entende-se que a cessão
é efectuada por interposta pessoa, quando é feita ao cônjuge do inibido ou a
pessoa de quem este seja herdeiro presumido, ou quando é feita a terceiro, de
acordo com o inibido, para o cessionário transmitir a este a coisa ou direito
cedido.
3. Diz-se litigioso o
direito que tiver sido contestado em juízo contencioso, ainda que arbitral, por
qualquer interessado.
ARTIGO 580º
(Sanções)
1. A cessão feita com
quebra do disposto no artigo anterior, além de nula, sujeita o cessionário à
obrigação de reparar os danos causados, nos termos gerais.
2. A nulidade da cessão não
pode ser invocada pelo cessionário.
ARTIGO 581º
(Excepções)
A proibição da cessão dos
créditos ou direitos litigiosos não tem lugar nos casos seguintes:
a) Quando a cessão for
feita ao titular de um direito de preferência ou de remição relativo ao direito
cedido;
b) Quando a cessão se
realizar para defesa de bens possuídos pelo cessionário;
c) Quando a cessão se fizer
ao credor em cumprimento do que lhe é devido.
ARTIGO 582º
(Transmissão de
garantias e outros acessórios)
1. Na falta de convenção em
contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das
garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam
inseparáveis da pessoa do cedente.
2. A coisa empenhada que
estiver na posse do cedente será entregue ao cessionário, mas não a que estiver
na posse de terceiro.
ARTIGO 583º
(Efeitos em relação ao
devedor)
1. A cessão produz efeitos
em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que
extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite.
2. Se, porém, antes da
notificação ou aceitação, o devedor pagar ao cedente ou celebrar com ele algum
negócio jurídico relativo ao crédito, nem o pagamento nem o negócio é oponível
ao cessionário, se este provar que o devedor tinha conhecimento da cessão.
ARTIGO 584º
(Cessão a várias
pessoas)
Se o mesmo crédito for
cedido a várias pessoas, prevalece a cessão que primeiro for notificada ao
devedor ou que por este tiver sido aceita.
ARTIGO 585º
(Meios de defesa
oponíveis pelo devedor)
O devedor pode opor ao
cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe
seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto
posterior ao conhecimento da cessão.
ARTIGO 586º
(Documentos e outros
meios probatórios)
O cedente é obrigado a
entregar ao cessionário os documentos e outros meios probatórios do crédito,
que estejam na sua posse e em cuja conservação não tenha interesse legítimo.
ARTIGO 587º
(Garantia da existência
do crédito e da solvência do devedor)
1. O cedente garante ao
cessionário a existência e a exigibilidade do crédito ao tempo da cessão, nos
termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso, em que a cessão se integra.
2. O cedente só garante a
solvência do devedor se a tanto expressamente se tiver obrigado.
ARTIGO 588º
(Aplicação das regras da
cessão a outra figuras)
As regras da cessão de
créditos são extensivas, na parte aplicável, à cessão de quaisquer outros
direitos não exceptuados por lei, bem como à transferência legal ou judicial de
créditos.
SECÇÃO II
Sub-rogação
ARTIGO 589º
(Sub-rogação pelo
credor)
O credor que recebe a
prestação de terceiro pode sub-rogá-lo nos seus direitos, desde que o faça
expressamente até ao momento do cumprimento da obrigação.
ARTIGO 590º
(Sub-rogação pelo
devedor)
1. O terceiro que cumpre a
obrigação pode ser igualmente sub-rogado pelo devedor até ao momento do
cumprimento, sem necessidade do consentimento do credor.
2. A vontade de sub-rogar
deve ser expressamente manifestada.
ARTIGO 591º
(Sub-rogação em
consequência de empréstimo feito ao devedor)
1. O devedor que cumpre a
obrigação com dinheiro ou outra coisa fungível emprestada por terceiro pode
sub-rogar este nos direitos do credor.
2. A sub-rogação não
necessita do consentimento do credor, mas só se verifica quando haja declaração
expressa, no documento do empréstimo, de que a coisa se destina ao cumprimento
da obrigação e de que o mutuante fica sub-rogado nos direitos do credor.
ARTIGO 592º
(Sub-rogação legal)
1. Fora dos casos previstos
nos artigos anteriores ou noutras disposições da lei, o terceiro que cumpre a
obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o
cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver directamente interessado na
satisfação do crédito.
2. Ao cumprimento é
equiparada a dação em cumprimento, a consignação em depósito, a compensação ou
outra causa de satisfação do crédito compatível com a sub-rogação.
ARTIGO 593º
(Efeitos da sub-rogação)
1. O sub-rogado adquire, na
medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este
competiam.
2. No caso de satisfação
parcial, a sub-rogação não prejudica os direitos do credor ou do seu
cessionário, quando outra coisa não for estipulada.
3. Havendo vários
sub-rogados, ainda que em momentos sucessivos, por satisfações parciais do
crédito, nenhum deles tem preferência sobre os demais.
ARTIGO 594º
(Disposições aplicáveis)
É aplicável à sub-rogação,
com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 582º a 584º.
SECÇÃO III
Transmissão singular de
dívidas
ARTIGO 595º
(Assunção de dívida)
1. A transmissão a título
singular de uma dívida pode verificar-se:
a) Por contrato entre o
antigo e o novo devedor, ratificado pelo credor;
b) Por contrato entre o
novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do antigo devedor.
2. Em qualquer dos casos a
transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor;
de contrário, o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado.
ARTIGO 596º
(Ratificação do credor)
1. Enquanto não for
ratificado pelo credor, podem as partes distratar o contrato a que se refere a
alínea a) do nº 1 do artigo anterior.
2. Qualquer das partes tem
o direito de fixar ao credor um prazo para a ratificação, findo o qual esta se
considera recusada.
ARTIGO 597º
(Invalidade da
transmissão)
Se o contrato de
transmissão da dívida for declarado nulo ou anulado e o credor tiver exonerado
o anterior obrigado, renasce a obrigação deste, mas consideram-se extintas as
garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na altura em
que teve notícia da transmissão.
ARTIGO 598º
(Meios de defesa)
Na falta de convenção em
contrário, o novo devedor não tem o direito de opor ao credor os meios de
defesa baseados nas relações entre ele e o antigo devedor, mas pode opor-lhe os
meios de defesa derivados das relações entre o antigo devedor e o credor, desde
que o seu fundamento seja anterior à assunção da dívida e se não trate de meios
de defesa pessoais do antigo devedor.
ARTIGO 599º
(Transmissão de
garantias e acessórios)
1. Com a dívida
transmitem-se para o novo devedor, salvo convenção em contrário, as obrigações
acessórias do antigo devedor que não sejam inseparáveis da pessoa deste.
2. Mantêm-se nos mesmos
termos as garantias do crédito, com excepção das que tiverem sido constituídas
por terceiro ou pelo antigo devedor, que não haja consentido na transmissão da
dívida.
ARTIGO 600º
(Insolvência do novo
devedor)
O credor que tiver
exonerado o antigo devedor fica impedido de exercer contra ele o seu direito de
crédito ou qualquer direito de garantia, se o novo devedor se mostrar
insolvente, a não ser que expressamente haja ressalvado a responsabilidade do
primitivo obrigado.
CAPÍTULO V
Garantia geral das
obrigações
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 601º
(Princípio geral)
Pelo cumprimento da
obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora, sem
prejuízo dos regimes especialmente estabelecidos em consequência da separação
de patrimónios.
ARTIGO 602º
(Limitação da
responsabilidade por convenção das partes)
Salvo quando se trate de
matéria subtraída à disponibilidade das partes, é possível, por convenção entre
elas, limitar a responsabilidade do devedor a alguns dos seus bens, no caso de
a obrigação não ser voluntariamente cumprida.
ARTIGO 603º
(Limitação por
determinação de terceiro)
1. Os bens deixados ou
doados com a cláusula de exclusão da responsabilidade por dívidas do
beneficiário respondem pelas obrigações posteriores à liberalidade, e também
pelas anteriores se for registada a penhora antes do registo daquela cláusula.
2. Se a liberalidade tiver
por objecto bens não sujeitos a registo, a cláusula só é oponível aos credores
cujo direito seja anterior à liberalidade.
ARTIGO 604º
(Concurso de credores)
1. Não existindo causas
legítimas de preferência, os credores têm o direito de ser pagos
proporcionalmente pelo preço dos bens do devedor, quando ele não chegue para
integral satisfação dos débitos.
2. São causas legítimas de
preferência, além de outras admitidas na lei, a consignação de rendimentos, o
penhor, a hipoteca, o privilégio e o direito de retenção.
SECÇÃO II
Conservação da garantia
patrimonial
SUBSECÇÃO I
Declaração de nulidade
ARTIGO 605º
(Legitimidade dos
credores)
1. Os credores têm
legitimidade para invocar a nulidade dos actos praticados pelo devedor, quer
estes sejam anteriores, quer posteriores à constituição do crédito, desde que
tenham interesse na declaração da nulidade, não sendo necessário que o acto
produza ou agrave a insolvência do devedor.
2. A nulidade aproveita não
só ao credor que a tenha invocado, como a todos os demais.
SUBSECÇÃO II
Sub-rogação do credor ao
devedor
ARTIGO 606º
(Direitos sujeitos à
sub-rogação)
1. Sempre que o devedor o
não faça, tem o credor a faculdade de exercer, contra terceiro, os direitos de
conteúdo patrimonial que competem àquele, excepto se, por sua própria natureza
ou disposição da lei, só puderem ser exercidos pelo respectivo titular.
2. A sub-rogação, porém, só
é permitida quando seja essencial à satisfação ou garantia do direito do
credor.
ARTIGO 607º
(Credores sob condição
suspensiva ou a prazo)
O credor sob condição
suspensiva e o credor a prazo apenas são admitidos a exercer a sub-rogação
quando mostrem ter interesse em não aguardar a verificação da condição ou o
vencimento do crédito.
ARTIGO 608º
(Citação do devedor)
Sendo exercida
judicialmente a sub-rogação, é necessária a citação do devedor.
ARTIGO 609º
(Efeitos da sub-rogação)
A sub-rogação exercida por
um dos credores aproveita a todos os demais.
SUBSECÇÃO III
Impugnação pauliana
ARTIGO 610º
(Requisitos gerais)
Os actos que envolvam
diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal
podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:
a) Ser o crédito anterior
ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de
impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do acto a
imposibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito,
ou agravamento dessa impossibilidade.
ARTIGO 611º
(Prova)
Incumbe ao credor a prova
do montante das dívidas, e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção
do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior
valor.
ARTIGO 612º
(Requisito da má fé)
1. O acto oneroso só está
sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má fé;
se o acto for gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro agissem de
boa fé.
2. Entende-se por má fé a
consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.
ARTIGO 613º
(Transmissões
posteriores ou constituição posterior de direitos)
1. Para que a impugnação
proceda contra as transmissões posteriores é necessário:
a) Que, relativamente à
primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade referidos
nos artigos anteriores;
b) Que haja má fé tanto do
alienante como do posterior adquirente, no caso de a nova transmissão ser a
título oneroso.
2. O disposto no número
anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à constituição de direitos
sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro.
ARTIGO 614º
(Créditos não vencidos
ou sob condição suspensiva)
1. Não obsta ao exercício
da impugnação o facto de o direito do credor não ser ainda exigível.
2. O credor sob condição
suspensiva pode, durante a pendência da condição, verificados os requisitos da
impugnabilidade, exigir a prestação de caução.
ARTIGO 615º
(Actos impugnáveis)
1. Não obsta à impugnação a
nulidade do acto realizado pelo devedor.
2. O cumprimento de
obrigação vencida não está sujeito a impugnação; mas é impugnável o cumprimento
tanto da obrigação ainda não exigível como da obrigação natural.
ARTIGO 616º
(Efeitos em relação ao
credor)
1. Julgada procedente a
impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu
interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e
praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei.
2. O adquirente de má fé é
responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem como dos que tenham
perecido ou se hajam deteriorado por caso fortuito, salvo se provar que a perda
ou deterioração se teriam igualmente verificado no caso de os bens se
encontrarem no poder do devedor.
3. O adquirente de boa fé
responde só na medida do seu enriquecimento.
4. Os efeitos da impugnação
aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.
ARTIGO 617º
(Relações entre devedor
e terceiro)
1. Julgada procedente a
impugnação, se o acto impugnado for de natureza gratuita, o devedor só é
responsável perante o adquirente nos termos do disposto em matéria de doações;
sendo o acto oneroso, o adquirente tem somente o direito de exigir do devedor
aquilo com que este se enriqueceu.
2. Os direitos que terceiro
adquira contra o devedor não prejudicam a satisfação dos direitos do credor
sobre os bens que são objecto da restituição.
ARTIGO 618º
(Caducidade)
O direito de impugnação
caduca ao fim de cinco anos, contados da data do acto impugnável.
SUBSECÇÃO IV
Arresto
ARTIGO 619º
(Requisitos)
1. O credor que tenha justo
receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto
de bens do devedor, nos termos da lei de processo.
2. O credor tem o direito
de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do devedor, se tiver sido
judicialmente impugnada a transmissão.
ARTIGO 620º
(Caução)
O requerente do arresto é
obrigado a prestar caução, se esta lhe for exigida pelo tribunal.
ARTIGO 621º
(Responsabilidade do
credor)
Se o arresto for julgado
injustificado ou caducar, o requerente é responsável pelos danos causados ao
arrestado, quando não tenha agido com a prudência normal.
ARTIGO 622º
(Efeitos)
1. Os actos de disposição
dos bens arrestados são ineficazes em relação ao requerente do arresto, de
acordo com as regras próprias da penhora.
2. Ao arresto são
extensivos, na parte aplicável, os demais efeitos da penhora.
CAPÍTULO VI
Garantias especiais das
obrigações
SECÇÃO I
Prestação de caução
ARTIGO 623º
(Caução imposta ou
autorizada por lei)
1. Se alguém for obrigado
ou autorizado por lei a prestar caução, sem se designar a espécie que ela deve
revestir, pode a garantia ser prestada por meio de depósito de dinheiro,
títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou
fiança bancária.
2. Se a caução não puder
ser prestada por nenhum dos meios referidos, é lícita a prestação de outra
espécie de fiança, desde que o fiador renuncie ao benefício da excussão.
3. Cabe ao tribunal
apreciar a idoneidade da caução, sempre que não haja acordo dos interessados.
ARTIGO 624º
(Caução resultante de
negócio jurídico ou determinação do tribunal)
1. Se alguém for obrigado
ou autorizado por negócio jurídico a prestar caução, ou esta for imposta pelo
tribunal, é permitido prestá-la por meio de qualquer garantia, real ou pessoal.
2. É aplicável, nestes
casos, o disposto no nº 3 do artigo anterior.
ARTIGO 625º
(Falta de prestação de
caução)
1. Se a pessoa obrigada à
caução a não prestar, o credor tem o direito de requerer o registo de hipoteca
sobre os bens do devedor, ou outra cautela idónea, salvo se for diferente a
solução especialmente fixada na lei.
2. A garantia limita-se aos
bens suficientes para assegurar o direito do credor.
ARTIGO 626º
(Insuficiência ou
impropriedade da caução)
Quando a caução prestada se
torne insuficiente ou imprópria, por causa não imputável ao credor, tem este o
direito de exigir que ela seja reforçada ou que seja prestada outra forma de
caução.
SECÇÃO II
Fiança
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 627º
(Noção. Acessoriedade)
1. O fiador garante a
satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o
credor.
2. A obrigação do fiador é
acessória da que recai sobre o principal devedor.
ARTIGO 628º
(Requisitos)
1. A vontade de prestar
fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação
principal.
2. A fiança pode ser
prestada sem conhecimento do devedor ou contra a vontade dele, e à sua
prestação não obsta o facto de a obrigação ser futura ou condicional.
ARTIGO 629º
(Mandato de crédito)
1. Aquele que encarrega
outrem de dar crédito a terceiro, em nome e por conta do encarregado, responde
como fiador, se o encargo for aceito.
2. O autor do encargo tem a
faculdade de revogar o mandato enquanto o crédito não for concedido, assim como
a todo o momento o pode denunciar, sem prejuízo da responsabilidade pelos danos
que haja causado.
3. É lícito ao encarregado
recusar o cumprimento do encargo, sempre que a situação patrimonial dos outros
contraentes ponha em risco o seu futuro direito.
Artigo 630º
(Subfiança)
Subfiador é aquele que
afiança o fiador perante o credor.
ARTIGO 631º
(Âmbito da fiança)
1. A fiança não pode
exceder a dívida principal nem ser contraída em condições mais onerosas, mas
pode ser contraída por quantidade menor ou em menos onerosas condições.
2. Se exceder a dívida
principal ou for contraída em condições mais onerosas, a fiança não é nula, mas
apenas redutível aos precisos termos da dívida afiançada.
ARTIGO 632º
(Invalidade da obrigação
principal)
1. A fiança não é válida se
o não for a obrigação principal.
2. Sendo, porém, anulada a
obrigação principal, por incapacidade ou por falta ou vício da vontade do
devedor, nem por isso a fiança deixa de ser válida, se o fiador conhecia a
causa da anulabilidade ao tempo em que a fiança foi prestada.
ARTIGO 633º
(Idoneidade do fiador.
Reforço da fiança)
1. Se algum devedor estiver
obrigado a dar fiador, não é o credor forçado a aceitar quem não tiver
capacidade para se obrigar ou não tiver bens suficientes para garantir a
obrigação.
2. Se o fiador nomeado
mudar de fortuna, de modo que haja risco de insolvência, tem o credor a
faculdade de exigir o reforço da fiança.
3. Se o devedor não
reforçar a fiança ou não oferecer outra garantia idónea dentro do prazo que lhe
for fixado pelo tribunal, tem o credor o direito de exigir o imediato
cumprimento da obrigação.
SUBSECÇÃO II
Relações entre o credor
e o fiador
ARTIGO 634º
(Obrigação do fiador)
A fiança tem o conteúdo da
obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou
culpa do devedor.
ARTIGO 635º
(Caso julgado)
1. O caso julgado entre
credor e devedor não é oponível ao fiador, mas a este é lícito invocá-lo em seu
benefício, salvo se respeitar a circunstâncias pessoais do devedor que não
excluam a responsabilidade do fiador.
2. O caso julgado entre
credor e fiador aproveita ao devedor, desde que respeite à obrigação principal,
mas não o prejudica o caso julgado desfavorável.
ARTIGO 636º
(Prescrição:
interrupção, suspensão e renúncia)
1. A interrupção da
prescrição relativamente ao devedor não produz efeito contra o fiador, nem a
interrupção relativa a este tem eficácia contra aquele; mas, se o credor
interromper a prescrição contra o devedor e der conhecimento do facto ao
fiador, considera-se a prescrição interrompida contra este na data da
comunicação.
2. A suspensão da
prescrição relativamente ao devedor não produz efeito em relação ao fiador, nem
a suspensão relativa a este se repercute naquele.
3. A renúncia à prescrição
por parte de um dos obrigados também não produz efeito relativamente ao outro.
ARTIGO 637º
(Meios de defesa do
fiador)
1. Além dos meios de defesa
que lhe são próprios, o fiador tem o direito de opor ao credor aqueles que
competem ao devedor, salvo se forem incompatíveis com a obrigação do fiador.
2. A renúncia do devedor a
qualquer meio de defesa não produz efeito em relação ao fiador.
ARTIGO 638º
(Benefício da excussão)
1. Ao fiador é lícito
recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do
devedor sem obter a satisfação do seu crédito.
2. É lícita ainda a recusa,
não obstante a excussão de todos os bens do devedor, se o fiador provar que o
crédito não foi satisfeito por culpa do credor.
ARTIGO 639º
(Benefício da excussão,
havendo garantias reais)
1. Se, para segurança da
mesma dívida, houver garantia real constituída por terceiro, contemporânea da
fiança ou anterior a ela, tem o fiador o direito de exigir a execução prévia
das coisas sobre que recai a garantia real.
2. Quando as coisas
oneradas garantam outros créditos do mesmo credor, o disposto no número
anterior só é aplicável se o valor delas for suficiente para satisfazer a
todos.
3. O autor da garantia
real, depois de executado, não fica sub-rogado nos direitos do credor contra o
fiador.
ARTIGO 640º
(Exclusão dos benefícios
anteriores)
O fiador não pode invocar
os benefícios constantes dos artigos anteriores:
a) Se houver renunciado ao
benefício da excussão e, em especial, se tiver assumido a obrigação de
principal pagador;
b) Se o devedor ou o dono
dos bens onerados com a garantia não puder, em virtude de facto posterior à
constituição da fiança, ser demandado ou executado no território continental ou
das ilhas adjacentes.
ARTIGO 641º
(Chamamento do devedor à
demanda)
1. O credor, ainda que o
fiador goze do benefício da excussão, pode demandá-lo só ou juntamente com o
devedor; se for demandado só, ainda que não goze do benefício da excussão, o
fiador tem a faculdade de chamar o devedor à demanda, para com ele se defender
ou ser conjuntamente condenado.
2. Salvo declaração
expressa em contrário no processo, a falta de chamamento do devedor à demanda
importa renúncia ao benefício da excussão.
ARTIGO 642º
(Outros meios de defesa
do fiador)
1. Ao fiador é lícito
recusar o cumprimento enquanto o direito do credor puder ser satisfeito por
compensação com um crédito do devedor ou este tiver a possibilidade de se valer
da compensação com uma dívida do credor.
2. Enquanto o devedor tiver
o direito de impugnar o negócio donde provém a sua obrigação, pode igualmente o
fiador recusar o cumprimento.
ARTIGO 643º
(Subfiador)
O subfiador goza do
benefício da excussão, tanto em relação ao fiador como em relação ao devedor.
SUBSECÇÃO III
Relações entre o devedor
e o fiador
ARTIGO 644º
(Sub-rogação)
O fiador que cumprir a
obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida em que estes foram
por ele satisfeitos.
ARTIGO 645º
(Aviso do cumprimento ao
devedor)
1. O fiador que cumprir a
obrigação deve avisar do cumprimento o devedor, sob pena de perder o seu
direito contra este no caso de o devedor, por erro, efectuar de novo a
prestação.
2. O fiador que, nos termos
do número anterior, perder o seu direito contra o devedor pode repetir do
credor a prestação feita, como se fosse indevida.
ARTIGO 646º
(Aviso do cumprimento ao
fiador)
O devedor que cumprir a
obrigação deve avisar o fiador, sob pena de responder pelo prejuízo que causar
se culposamente o não fizer.
ARTIGO 647º
(Meios de defesa)
O devedor que consentir no
cumprimento pelo fiador ou que, avisado por este, lhe não der conhecimento,
injustificadamente, dos meios de defesa que poderia opor ao credor fica
impedido de opor esses meios contra o fiador.
ARTIGO 648º
(Direito à liberação ou
à prestação de caução)
É permitido ao fiador
exigir a sua liberação, ou a prestação de caução para garantia do seu direito
eventual contra o devedor, nos casos seguintes:
a) Se o credor obtiver
contra o fiador sentença exequível;
b) Se os riscos da fiança
se agravarem sensivelmente;
c) Se, após a assunção da
fiança, o devedor se houver colocado na situação prevista na alínea b) do
artigo 640º;
d) Se o devedor se houver
comprometido a desonerar o fiador dentro de certo prazo ou verificado certo
evento e já tiver decorrido o prazo ou se tiver verificado o evento previsto;
e) Se houverem decorrido
cinco anos, não tendo a obrigação principal um termo, ou se, tendo-o, houver
prorrogação legal imposta a qualquer das partes.
SUBSECÇÃO IV
Pluralidade de fiadores
ARTIGO 649º
(Responsabilidade para
com o credor)
1. Se várias pessoas
tiverem, isoladamente, afiançado o devedor pela mesma dívida, responde cada uma
delas pela satisfação integral do crédito, excepto se foi convencionado o
benefício da divisão; são aplicáveis, naquele caso, com as ressalvas
necessárias, as regras das obrigações solidárias.
2. Se os fiadores se
houverem obrigado conjuntamente, ainda que em momentos diferentes, é lícito a
qualquer deles invocar o benefício da divisão, respondendo, porém, cada um
deles, proporcionalmente, pela quota do confiador que se encontre insolvente.
3. É equiparado ao fiador
insolvente aquele que não puder ser demandado, nos termos da alínea b) do
artigo 640º.
ARTIGO 650º
(Relações entre fiadores
e subfiadores)
1. Havendo vários fiadores,
e respondendo cada um deles pela totalidade da prestação, o que tiver cumprido
fica sub-rogado nos direitos do credor contra o devedor e, de harmonia com as
regras das obrigações solidárias, contra os outros fiadores.
2. Se o fiador,
judicialmente demandado, cumprir integralmente a obrigação ou uma parte
superior à sua quota, apesar de lhe ser lícito invocar o benefício da divisão,
tem o direito de reclamar dos outros as quotas deles, no que haja pago a mais,
ainda que o devedor não esteja insolvente.
3. Se o fiador, podendo
embora invocar o benefício da divisão, cumprir voluntariamente a obrigação nas
condições previstas no número anterior, o seu regresso contra os outros
fiadores só é admitido depois de excutidos todos os bens do devedor.
4. Se algum dos fiadores
tiver um subfiador, este não responde, perante os outros fiadores, pela quota
do seu afiançado que se mostre insolvente, salvo se o contrário resultar do
acto da subfiança.
SUBSECÇÃO V
Extinção da fiança
ARTIGO 651º
(Extinção da obrigação
principal)
A extinção da obrigação
principal determina a extinção da fiança.
ARTIGO 652º
(Vencimento da obrigação
principal)
1. Se a obrigação principal
for a prazo, o fiador que gozar do benefício da excussão pode exigir, vencida a
obrigação, que o credor proceda contra o devedor dentro de dois meses, a contar
do vencimento, sob pena de a fiança caducar; este prazo não termina sem
decorrer um mês sobre a notificação feita ao credor.
2. Sob igual cominação pode
o fiador que goze do benefício da excussão exigir a interpelação do devedor,
quando dela depender o vencimento da obrigação e houver decorrido mais de um
ano sobre a assunção da fiança.
ARTIGO 653º
(Liberação por
impossibilidade de sub-rogação)
Os fiadores, ainda que
solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram, na medida em que,
por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar sub-rogados nos
direitos que a este competem.
ARTIGO 654º
(Obrigação futura)
Sendo a fiança prestada
para garantia de obrigação futura, tem o fiador, enquanto a obrigação se não
constituir, a possibilidade de liberar-se da garantia, se a situação
patrimonial do devedor se agravar em termos de pôr em risco os seus direitos
eventuais contra este, ou se tiverem decorrido cinco anos sobre a prestação da
fiança, quando outro prazo não resulte da convenção.
ARTIGO 655º
(Fiança do locatário)
1. A fiança pelas
obrigações do locatário abrange apenas, salvo estipulação em contrário, o
período inicial de duração do contrato.
2. Obrigando-se o fiador
relativamente aos períodos de renovação, sem se limitar o número destes, a
fiança extingue-se, na falta de nova convenção, logo que haja alteração da
renda ou decorra o prazo de cinco anos sobre o início da primeira prorrogação.
SECÇÃO III
Consignação de
rendimentos
ARTIGO 656º
(Noção)
1. O cumprimento da
obrigação, ainda que condicional ou futura, pode ser garantido mediante a
consignação dos rendimentos de certos bens imóveis, ou de certos bens móveis
sujeitos a registo.
2. A consignação de
rendimentos pode garantir o cumprimento da obrigação e o pagamento dos juros,
ou apenas o cumprimento da obrigação ou só o pagamento dos juros.
ARTIGO 657º
(Legitimidade.Consignação
constituída por terceiro)
1. Só tem legitimidade para
constituir a consignação quem puder dispor dos rendimentos consignados.
2. É aplicável à
consignação constituída por terceiro o disposto no artigo 717º.
ARTIGO 658º
(Espécies)
1. A consignação é
voluntária ou judicial.
2. É voluntária a
consignação constituída pelo devedor ou por terceiro, quer mediante negócio
entre vivos, quer por meio de testamento, e judicial a que resulta de decisão
do tribunal.
ARTIGO 659º
(Prazo)
1. A consignação de
rendimentos pode fazer-se por determinado número de anos ou até ao pagamento da
dívida garantida.
2. Quando incida sobre os
rendimentos de bens imóveis, a consignação nunca excederá o prazo de quinze
anos.
ARTIGO 660º
(Forma. Registo)
1. O acto constitutivo da
consignação voluntária deve constar de escritura pública ou testamento, se
respeitar a coisas imóveis, e de escrito particular, quando recaia sobre
móveis.
2. A consignação está
sujeita a registo, salvo se tiver por objecto os rendimentos de títulos de
crédito nominativos, devendo neste caso ser mencionada nos títulos e averbada,
nos termos da respectiva legislação.
ARTIGO 661º
(Modalidades)
1. Na consignação é
possível estipular:
a) Que continuem em poder
do concedente os bens cujos rendimentos são consignados;
b) Que os bens passem para
o poder do credor, o qual fica, na parte aplicável, equiparado ao locatário,
sem prejuízo da faculdade de por seu turno os locar;
c) Que os bens passem para
o poder de terceiro, por título de locação ou por outro, ficando o credor com o
direito de receber os respectivos frutos.
2. Os frutos da coisa são
imputados primeiro nos juros, e só depois no capital, se a consignação garantir
tanto o capital como os juros.
ARTIGO 662º
(Prestação de contas)
1. Continuando os bens no
poder do concedente, tem o credor o direito de exigir dele a prestação anual de
contas, se não houver de receber em cada período uma importância fixa.
2. De igual direito goza o
concedente, em relação ao credor, nos demais casos previstos no nº 1 do artigo
anterior.
ARTIGO 663º
(Obrigações do credor.
Renúncia à garantia)
1. Se os bens cujos
rendimentos são consignados passarem para o poder do credor, deve este
administrá-los como um proprietário diligente e pagar as contribuições e demais
encargos das coisas.
2. O credor só pode
liberar-se das obrigações referidas no número anterior renunciando à garantia.
3. À renúncia é aplicável o
disposto no artigo 731º.
ARTIGO 664º
(Extinção)
A consignação extingue-se
pelo decurso do prazo estipulado, e ainda pelas mesmas causas por que cessa o
direito de hipoteca, com excepção da indicada na alínea b) do artigo 730º.
ARTIGO 665º
(Remissão)
São aplicáveis à consignação,
com as necessárias adaptações, os artigos 692º, 694º a 696º, 701º e 702º.
SECÇÃO IV
Penhor
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 666º
(Noção)
1. O penhor confere ao
credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos juros, se os houver,
com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel, ou
pelo valor de créditos ou outros direitos não susceptíveis de hipoteca,
pertencentes ao devedor ou a terceiro.
2. É havido como penhor o
depósito a que se refere o nº 1 do artigo 623º.
3. A obrigação garantida
pelo penhor pode ser futura ou condicional.
ARTIGO 667º
(Legitimidade para
empenhar.Penhor constituído por terceiro)
1. Só tem legitimidade para
dar bens em penhor quem os puder alienar.
2. É aplicável ao penhor
constituído por terceiro o disposto no artigo 717º.
ARTIGO 668º
(Regimes especiais)
As disposições desta secção
não prejudicam os regimes especiais estabelecidos por lei para certas
modalidades de penhor.
SUBSECÇÃO II
Penhor de coisas
ARTIGO 669º
(Constituição do penhor)
1. O penhor só produz os
seus efeitos pela entrega da coisa empenhada, ou de documento que confira a
exclusiva disponibilidade dela, ao credor ou a terceiro.
2. A entrega pode consistir
na simples atribuição da composse ao credor, se essa atribuição privar o autor
do penhor da possibilidade de dispor materialmente da coisa.
ARTIGO 670º
(Direitos do credor
pignoratício)
Mediante o penhor, o credor
pignoratício adquire o direito:
a) De usar, em relação à
coisa empenhada, das acções destinadas à defesa da posse, ainda que seja contra
o próprio dono;
b) De ser indemnizado das
benfeitorias necessárias e úteis e de levantar estas últimas, nos termos do
artigo 1273º;
c) De exigir a substituição
ou o reforço do penhor ou o cumprimento imediato da obrigação, se a coisa
empenhada perecer ou se tornar insuficiente para segurança da dívida, nos
termos fixados para a garantia hipotecária.
ARTIGO 671º
(Deveres do credor
pignoratício)
O credor pignoratício é
obrigado:
a) A guardar e administrar
como um proprietário diligente a coisa empenhada, respondendo pela sua
existência e conservação;
b) A não usar dela sem
consentimento do autor do penhor, excepto se o uso for indispensável à
conservação da coisa;
c) A restituir a coisa,
extinta a obrigação a que serve de garantia.
ARTIGO 672º
(Frutos da coisa
empenhada)
1. Os frutos da coisa
empenhada serão encontrados nas despesas feitas com ela e nos juros vencidos,
devendo o excesso, na falta de convenção em contrário, ser abatido no capital
que for devido.
2. Havendo lugar à restituição
de frutos, não se consideram estes, salvo convenção em contrário, abrangidos
pelo penhor.
ARTIGO 673º
(Uso da coisa empenhada)
Se o credor usar da coisa
empenhada contra o disposto na alínea b) do artigo 671º, ou proceder de forma a
que a coisa corra o risco de perder-se ou deteriorar-se, tem o autor do penhor
o direito de exigir que ele preste caução idónea ou que a coisa seja depositada
em poder de terceiro.
ARTIGO 674º
(Venda antecipada)
1. Sempre que haja receio
fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, tem o credor, bem como
o autor do penhor, a faculdade de proceder à venda antecipada da coisa,
mediante prévia autorização judicial.
2. Sobre o produto da venda
fica o credor com os direitos que lhe cabiam em relação à coisa vendida,
podendo o tribunal, no entanto, ordenar que o preço seja depositado.
3. O autor do penhor tem a
faculdade de impedir a venda antecipada da coisa, oferecendo outra garantia
real idónea.
ARTIGO 675º
(Execução do penhor)
1. Vencida a obrigação,
adquire o credor o direito de se pagar pelo produto da venda judicial da coisa
empenhada, podendo a venda ser feita extrajudicialmente, se as partes asssim o
tiverem convencionado.
2. É lícito aos
interessados convencionar que a coisa empenhada seja adjudicada ao credor pelo
valor que o tribunal fixar.
ARTIGO 676º
(Cessão da garantia)
1. O direito de penhor pode
ser transmitido independentemente da cessão do crédito, sendo aplicável neste
caso, com as necessárias adaptações, o disposto sobre a transmissão da hipoteca.
2. À entrega da coisa
empenhada ao cessionário é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 582º.
ARTIGO 677º
(Extinção do penhor)
O penhor extingue-se pela
restituição da coisa empenhada, ou do documento a que se refere o nº 1 do
artigo 669º, e ainda pelas mesmas causas por que cessa o direito da hipoteca,
com excepção da indicada na alínea b) do artigo 730º.
ARTIGO 678º
(Remissão)
São aplicáveis ao penhor,
com as necessárias adaptações, os artigos 692º, 694º a 699º, 701º e 702º.
SUBSECÇÃO III
Penhor de direitos
ARTIGO 679º
(Disposições aplicáveis)
São extensivas ao penhor de
direitos, com as necessárias adaptações, as disposições da subsecção anterior,
em tudo o que não seja contrariado pela natureza especial desse penhor ou pelo
preceituado nos artigos subsequentes.
ARTIGO 680º
(Objecto)
Só é admitido o penhor de
direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e sejam susceptíveis de
transmissão.
ARTIGO 681º
(Forma e publicidade)
1. A constituição do penhor
de direitos está sujeita à forma e publicidade exigidas para a transmissão dos
direitos empenhados.
2. Se, porém, tiver por
objecto um crédito, o penhor só produz os seus efeitos desde que seja
notificado ao respectivo devedor, ou desde que este o aceite, salvo tratando-se
de penhor sujeito a registo, pois neste caso produz os seus efeitos a partir do
registo.
3. A ineficácia do penhor
por falta de notificação ou registo não impede a aplicação, com as necessárias
correcções, do disposto no nº 2 do artigo 583º.
ARTIGO 682º
(Entrega de documentos)
O titular do direito
empenhado deve entregar ao credor pignoratício os documentos comprovativos
desse direito que estiverem na sua posse e em cuja conservação não tenha
interesse legítimo.
ARTIGO 683º
(Conservação do direito
empenhado)
O credor pignoratício é
obrigado a praticar os actos indispensáveis à conservação do direito empenhado
e a cobrar os juros e mais prestações acessórias compreendidas na garantia.
ARTIGO 684º
(Relações entre o
obrigado e o credor pignoratício)
Dando em penhor um direito
por virtude do qual se possa exigir uma prestação, as relações entre o obrigado
e o credor pignoratício estão sujeitas às disposições aplicáveis, na cessão de
créditos, às relações entre o devedor e o cessionário.
ARTIGO 685º
(Cobrança de créditos
empenhados)
1. O credor pignoratício
deve cobrar o crédito empenhado logo que este se torne exigível, passando o
penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação desse crédito.
2. Se, porém, o crédito
tiver por objecto a prestação de dinheiro ou de outra coisa fungível, o devedor
não pode fazê-la senão aos dois credores conjuntamente; na falta de acordo
entre os interessados, tem o obrigado a faculdade de usar da consignação em
depósito.
3. Se o mesmo crédito for
objecto de vários penhores, só o credor cujo direito prefira aos demais tem
legitimidade para cobrar o crédito empenhado; mas os outros têm a faculdade de
compelir o devedor a satisfazer a prestação ao credor preferente.
4. O titular do crédito
empenhado só pode receber a respectiva prestação com o consentimento do credor
pignoratício, extinguindo-se neste caso o penhor.
SECÇÃO V
Hipoteca
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 686º
(Noção)
1. A hipoteca confere ao
credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou
equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os
demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de
registo.
2. A obrigação garantida
pela hipoteca pode ser futura ou condicional.
ARTIGO 687º
(Registo)
A hipoteca deve ser
registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes.
ARTIGO 688º
(Objecto)
1. Só podem ser
hipotecados:
a) Os prédios rústicos e
urbanos;
b) O domínio directo e o
domínio útil dos bens enfitêuticos;
c) O direito de superfície;
d) O direito resultante de
concessões em bens do domínio público, observadas as disposições legais
relativas à transmissão dos direitos concedidos;
e) O usufruto das coisas e
direitos constantes das alíneas anteriores;
f) As coisas móveis que,
para este efeito, sejam por lei equiparadas às imóveis.
2. As partes de um prédio
susceptíveis de propriedade autónoma sem perda da sua natureza imobiliária
podem ser hipotecadas separadamente.
ARTIGO 689º
(Bens comuns)
1. É também susceptível de
hipoteca a quota de coisa ou direito comum.
2. A divisão da coisa ou
direito comum, feita com o consentimento do credor, limita a hipoteca à parte
que for atribuída ao devedor.
ARTIGO 690º
(Bens excluídos)
Não pode ser hipotecada a
meação dos bens comuns do casal, nem tão-pouco a quota de herança indivisa.
ARTIGO 691º
(Extensão)
1. A hipoteca abrange:
a) As coisas imóveis
referidas nas alíneas c) a e) do nº 1 do artigo 204º;
b) As acessões naturais;
c) As benfeitorias, salvo o
direito de terceiros.
2. Na hipoteca de fábricas,
consideram-se abrangidos pela garantia os maquinismos e demais móveis
inventariados no título constitutivo, mesmo que não sejam parte integrante dos
respectivos imóveis.
3. Os donos e possuidores
de maquinismos, móveis e utensílios destinados à exploração de fábricas,
abrangidos no registo de hipoteca dos respectivos imóveis, não os podem alienar
ou retirar sem consentimento escrito do credor e incorrem na responsabilidade
própria dos fiéis depositários.
(Redacção do Dec.-Lei
225/84, de 6-7)
ARTIGO 692º
(Indemnizações devidas)
1. Se a coisa ou direito
hipotecado se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e o dono tiver direito a
ser indemnizado, os titulares da garantia conservam, sobre o crédito respectivo
ou as quantias pagas a título de indemnização, as preferências que lhes competiam
em relação à coisa onerada.
2. Depois de notificado da
existência da hipoteca, o devedor da indemnização não se libera pelo
cumprimento da sua obrigação com prejuízo dos direitos conferidos no número
anterior.
3. O disposto nos números
precedentes é aplicável às indemnizações devidas por expropriação ou
requisição, bem como por extinção do direito de superfície, ao preço da remição
do foro e aos casos análogos.
ARTIGO 693º
(Acessórios do crédito)
1. A hipoteca assegura os
acessórios do crédito que constem do registo.
2. Tratando-se de juros, a
hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os
relativos a três anos.
3. O disposto no número
anterior não impede o registo de nova hipoteca em relação a juros em dívida.
ARTIGO 694º
(Pacto comissório)
É nula, mesmo que seja
anterior ou posterior à constituição da hipoteca, a convenção pela qual o
credor fará sua a coisa onerada no caso de o devedor não cumprir.
ARTIGO 695º
(Cláusula de
inalienabilidade dos bens hipotecados)
É igualmente nula a
convenção que proíba o respectivo dono de alienar ou onerar os bens
hipotecados, embora seja lícito convencionar que o crédito hipotecário se
vencerá logo que esses bens sejam alienados ou onerados.
ARTIGO 696º
(Indivisibilidade)
Salvo convenção em
contrário, a hipoteca é indivisível, subsistindo por inteiro sobre cada uma das
coisas oneradas e sobre cada uma das partes que as constituam, ainda que a
coisa ou o crédito seja dividido ou este se encontre parcialmente satisfeito.
ARTIGO 697º
(Penhora dos bens)
O devedor que for dono da
coisa hipotecada tem o direito de se opor não só a que outros bens sejam
penhorados na execução enquanto se não reconhecer a insuficiência da garantia,
mas ainda a que, relativamente aos bens onerados, a execução se estenda além do
necessário à satisfação do direito do credor.
ARTIGO 698º
(Defesa do dono da coisa
ou do titular do direito)
1. Sempre que o dono da
coisa ou o titular do direito hipotecado seja pessoa diferente do devedor,
é-lhe lícito opor ao credor, ainda que o devedor a eles tenha renunciado, os
meios de defesa que o devedor tiver contra o crédito, com exclusão das
excepções que são recusadas ao fiador.
2. O dono ou o titular a
que o número anterior se refere tem a faculdade de se opor à execução enquanto o
devedor puder impugnar o negócio donde provém a sua obrigação, ou o credor
puder ser satisfeito por compensação com um crédito do devedor, ou este tiver a
possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do credor.
ARTIGO 699º
(Hipoteca e usufruto)
1. Extinguindo-se o
usufruto constituído sobre a coisa hipotecada, o direito do credor hipotecário
passa a exercer-se sobre a coisa, como se o usufruto nunca tivesse sido
constituído.
2. Se a hipoteca tiver por
objecto o direito de usufruto, considera-se extinta com a extinção deste
direito.
3. Porém, se a extinção do
usufruto resultar de renúncia, ou da transferência dos direitos do usufrutuário
para o proprietário, ou da aquisição da propriedade por parte daquele, a
hipoteca subsiste, como se a extinção do direito se não tivesse verificado.
ARTIGO 700º
(Administração da coisa
hipotecada)
O corte de árvores ou
arbustos, a colheita de frutos naturais e a alienação de partes integrantes ou
coisas acessórias abrangidas pela hipoteca só são eficazes em relação ao credor
hipotecário se forem anteriores ao registo da penhora e couberem nos poderes de
administração ordinária.
ARTIGO 701º
(Substituição ou reforço
da hipoteca)
1. Quando, por causa não
imputável ao credor, a coisa hipotecada perecer ou a hipoteca se tornar
insuficiente para segurança da obrigação, tem o credor o direito de exigir que
o devedor a substitua ou reforce; e, não o fazendo este nos termos declarados
na lei de processo, pode aquele exigir o imediato cumprimento da obrigação ou,
tratando-se de obrigação futura, registar hipoteca sobre outros bens do
devedor.
2. Não obsta ao direito do
credor o facto de a hipoteca ter sido constituída por terceiro, salvo se o
devedor for estranho à sua constituição; porém, mesmo neste caso, se a
diminuição da garantia for devida a culpa do terceiro, o credor tem o direito
de exigir deste a substituição ou o reforço, ficando o mesmo sujeito à
cominação do número anterior em lugar do devedor.
ARTIGO 702º
(Seguro)
1. Quando o devedor se
comprometa a segurar a coisa hipotecada e não a segure no prazo devido ou deixe
rescindir o contrato por falta de pagamento dos respectivos prémios, tem o
credor a faculdade de segurá-la à custa do devedor; mas, se o fizer por um
valor excessivo, pode o devedor exigir a redução do contrato aos limites
convenientes.
2. Nos casos previstos no
número anterior, pode o credor reclamar, em lugar do seguro, o imediato
cumprimento da obrigação.
ARTIGO 703º
(Espécies de hipoteca)
As hipotecas são legais,
judiciais ou voluntárias.
SUBSECÇÃO II
Hipotecas legais
ARTIGO 704º
(Noção)
As hipotecas legais
resultam imediatamente da lei, sem dependência da vontade das partes, e podem
constituir-se desde que exista a obrigação a que servem de segurança.
ARTIGO 705º
(Credores com hipoteca
legal)
Os credores que têm
hipoteca legal são:
a) O Estado e as autarquias
locais, sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos à constituição predial,
para garantia do pagamento desta contribuição;
b) O Estado e as demais
pessoas colectivas públicas, sobre os bens dos encarregados da gestão de fundos
públicos, para garantia do cumprimento das obrigações por que se tornem
responsáveis;
c) O menor, o interdito e o
inabilitado, sobre os bens do tutor, curador e administrador legal, para
assegurar a responsabilidade que nestas qualidades vierem a assumir;
d) O credor por alimentos;
e) O co-herdeiro, sobre os
bens adjudicados ao devedor de tornas, para garantir o pagamento destas;
f) O legatário de dinheiro
ou outra coisa fungível, sobre os bens sujeitos ao encargo do legado ou, na sua
falta, sobre os bens que os herdeiros responsáveis houverem do testador.
ARTIGO 706º
(Registo da hipoteca a
favor de incapazes)
1. A determinação do valor
da hipoteca estabelecida a favor do menor, interdito ou inabilitado, para
efeito do registo, e a designação dos bens sobre que há-de ser registada cabem
ao conselho de família.
2. Têm legitimidade para
requerer o registo o tutor, curador ou administrador legal, os vogais do
conselho de família e qualquer dos parentes do incapaz.
ARTIGO 707º
(Substituição por outra
caução)
1. O tribunal pode
autorizar, a requerimento do devedor, a substituição da hipoteca legal por
outra caução.
2. Não tendo o devedor bens
susceptíveis de hipoteca, suficientes para garantir o crédito, pode o credor
exigir outra caução, nos termos do artigo 625º, salvo nos casos das hipotecas
destinadas a garantir o pagamento das tornas ou do legado de dinheiro ou outra
coisa fungível.
ARTIGO 708º
(Bens sujeitos à
hipoteca legal)
Sem prejuízo do direito de
redução, as hipotecas legais podem ser registadas em relação a quaisquer bens
do devedor, quando não forem especificados por lei ou no título respectivo os
bens sujeitos à garantia.
ARTIGO 709º
(Reforço)
O credor só goza do direito
de reforçar as hipotecas previstas nas alíneas e) e f) do artigo 705º se a
garantia puder continuar a incidir sobre os bens aí especificados.
SUBSECÇÃO III
Hipotecas judiciais
ARTIGO 710º
(Constituição)
1. A sentença que condenar
o devedor à realização de uma prestação em dinheiro ou outra coisa fungível é
título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens do obrigado,
mesmo que não haja transitado em julgado.
2. Se a prestação for
ilíquida, pode a hipoteca ser registada pelo quantitativo provável do crédito.
3. Se o devedor for
condenado a entregar uma coisa ou a prestar um facto, só pode ser registada a
hipoteca havendo conversão da prestação numa indemnização pecuniária.
ARTIGO 711º
(Sentenças estrangeiras)
As sentenças dos tribunais
estrangeiros, revistas e confirmadas em Portugal, podem titular o registo da
hipoteca judicial, na medida em que a lei do país onde foram proferidas lhes
reconheça igual valor.
SUBSECÇÃO IV
Hipotecas voluntárias
ARTIGO 712º
(Noção)
Hipoteca voluntária é a que
nasce de contrato ou declaração unilateral.
ARTIGO 713º
(Segunda hipoteca)
A hipoteca não impede o
dono dos bens de os hipotecar de novo; neste caso, extinta uma das hipotecas,
ficam os bens a garantir, na sua totalidade, as restantes dívidas hipotecárias.
ARTIGO 714º
(Forma)
O acto de constituição ou
modificação da hipoteca voluntária, quando recaia sobre bens imóveis, deve
constar de escritura pública ou de testamento.
ARTIGO 715º
(Legitimidade para
hipotecar)
Só tem legitimidade para
hipotecar quem puder alienar os respectivos bens.
ARTIGO 716º
(Hipotecas gerais)
1. São nulas as hipotecas
voluntárias que incidam sobre todos os bens do devedor ou de terceiro sem os
especificar.
2. A especificação deve
constar do título constitutivo da hipoteca.
ARTIGO 717º
(Hipoteca constituída
por terceiro)
1. A hipoteca constituída
por terceiro extingue-se na medida em que, por facto positivo ou negativo do
credor, não possa dar-se a sub-rogação daquele nos direitos deste.
2. O caso julgado proferido
em relação ao devedor produz efeitos relativamente a terceiro que haja constituído
a hipoteca, nos termos em que os produz em relação ao fiador.
SUBSECÇÃO V
Redução da hipoteca
ARTIGO 718º
(Modalidades)
A hipoteca pode ser
reduzida voluntária ou judicialmente.
ARTIGO 719º
(Redução voluntária)
A redução voluntária só
pode ser consentida por quem puder dispor da hipoteca, sendo aplicável à
redução o regime estabelecido para a renúncia à garantia.
ARTIGO 720º
(Redução judicial)
1. A redução judicial tem
lugar, nas hipotecas legais e judiciais, a requerimento de qualquer interessado,
quer no que concerne aos bens, quer no que respeita à quantia designada como
montante do crédito, excepto se, por convenção ou sentença, a coisa onerada ou
a quantia assegurada tiver sido especialmente indicada.
2. No caso previsto na
parte final do número anterior, ou no de hipoteca voluntária, a redução
judicial só é admitida:
a) Se, em consequência do
cumprimento parcial ou outra causa de extinção, a dívida se encontrar reduzida
a menos de dois terços do seu montante inicial;
b) Se, por virtude de acessões
naturais ou benfeitorias, a coisa ou o direito hipotecado se tiver valorizado
em mais de um terço do seu valor à data da constituição da hipoteca.
3. A redução é realizável,
quanto aos bens, ainda que a hipoteca tenha por objecto uma só coisa ou direito,
desde que a coisa ou direito seja susceptível de cómoda divisão.
SUBSECÇÃO VI
Transmissão dos bens
hipotecados
ARTIGO 721º
(Expurgação da hipoteca)
Aquele que adquiriu bens
hipotecados, registou o título de aquisição e não é pessoalmente responsável pelo
cumprimento das obrigações garantidas tem o direito de expurgar a hipoteca por
qualquer dos modos seguintes:
a) Pagando integralmente
aos credores hipotecários as dívidas a que os bens estão hipotecados;
b) Declarando que está
pronto a entregar aos credores, para pagamento dos seus créditos, até à quantia
pela qual obteve os bens, ou aquela em que os estima, quando a aquisição tenha
sido feita por título gratuito ou não tenha havido fixação de preço.
ARTIGO 722º
(Expurgação no caso de
revogação de doação)
O direito de expurgação é
extensivo ao doador ou aos seus herdeiros, relativamente aos bens hipotecados
pelo donatário que venham ao poder daqueles em consequência da revogação da
liberalidade por ingratidão do donatário, ou da sua redução por inoficiosidade.
(Redacção do Dec.-Lei
497/77, de 25-11)
ARTIGO 723º
(Direitos dos credores
quanto à expurgação)
1. A sentença que declarar
os bens livres de hipotecas em consequência de expurgação não será proferida
sem se mostrar que foram citados todos os credores hipotecários.
2. O credor que, tendo a
hipoteca registada, não for citado nem comparecer espontaneamente em juízo não
perde os seus direitos de credor hipotecário, seja qual for a sentença
proferida em relação aos outros credores.
3. Se o requerente da expurgação
não depositar a importância devida, nos termos da lei de processo, fica o
requerimento sem efeito e não pode ser renovado, sem prejuízo da
responsabilidade do requerente pelos danos causados aos credores.
ARTIGO 724º
(Direitos reais que
renascem pela venda judicial)
1. Se o adquirente da coisa
hipotecada tinha, anteriormente à aquisição, algum direito real sobre ela, esse
direito renasce no caso de venda em processo de execução ou de expurgação da
hipoteca e é atendido em harmonia com as regras legais relativas a essa venda.
2. Renascem do mesmo modo e
são incluídas na venda as servidões que, à data do registo da hipoteca,
oneravam algum prédio do terceiro adquirente em benefício do prédio hipotecado.
ARTIGO 725º
(Exercício antecipado do
direito hipotecário contra o adquirente)
O credor hipotecário pode,
antes do vencimento do prazo, exercer o seu direito contra o adquirente da
coisa ou direito hipotecado se, por culpa deste, diminuir a segurança do
crédito.
ARTIGO 726º
(Benfeitorias e frutos)
Para os efeitos dos artigos
1269º, 1270º e 1275º, o terceiro adquirente é havido como possuidor de boa fé,
na execução, até ao registo da penhora, e, na expurgação da hipoteca, até à
venda judicial da coisa ou direito.
SUBSECÇÃO VII
Transmissão da hipoteca
ARTIGO 727º
(Cessão da hipoteca)
1. A hipoteca que não for
inseparável da pessoa do devedor pode ser cedida sem o crédito assegurado, para
garantia de crédito pertencente a outro credor do mesmo devedor, com
observância das regras próprias da cessão de créditos; se, porém, a coisa ou
direito hipotecado pertencer a terceiro, é necessário o consentimento deste.
2. O credor com hipoteca
sobre mais de uma coisa ou direito só pode cedê-la à mesma pessoa e na sua
totalidade.
ARTIGO 728º
(Valor da hipoteca
cedida)
1. A hipoteca cedida
garante o novo crédito nos limites do crédito originariamente garantido.
2. Registada a cessão, a
extinção do crédito originário não afecta a subsistência da hipoteca.
ARTIGO 729º
(Cessão do grau
hipotecário)
É também permitida a cessão
do grau hipotecário a favor de qualquer outro credor hipotecário posteriormente
inscrito sobre os mesmos bens, observadas igualmente as regras respeitantes à
cessão do respectivo crédito.
SUBSECÇÃO VIII
Extinção da hipoteca
ARTIGO 730º
(Causas de extinção)
A hipoteca extingue-se:
a) Pela extinção da
obrigação a que serve de garantia;
b) Por prescrição, a favor
de terceiro adquirente do prédio hipotecado, decorridos vinte anos sobre o
registo da aquisição e cinco sobre o vencimento da obrigação;
c) Pelo perecimento da
coisa hipotecada, sem prejuízo do disposto nos artigos 692º e 701º;
d) Pela renúncia do credor.
ARTIGO 731º
(Renúncia à hipoteca)
1. A renúncia à hipoteca
deve ser expressa e exarada em documento autenticado, não carecendo de
aceitação do devedor ou do autor da hipoteca para produzir os seus efeitos.
2. Os administradores de
patrimónios alheios não podem renunciar às hipotecas constituídas em benefício
das pessoas cujos patrimónios administram.
(Redacção do Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 732º
(Renascimento da
hipoteca)
Se a causa extintiva da
obrigação ou a renúncia do credor à garantia for declarada nula ou anulada, ou
ficar por outro motivo sem efeito, a hipoteca, se a inscrição tiver sido
cancelada, renasce apenas desde a data da nova inscrição.
SECÇÃO VI
Privilégios creditórios
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 733º
(Noção)
Privilégio creditório é a
faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores,
independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros.
ARTIGO 734º
(Acessórios do crédito)
O privilégio creditório
abrange os juros relativos aos últimos dois anos, se forem devidos.
ARTIGO 735º
(Espécies)
1. São de duas espécies os
privilégios creditórios: mobiliários e imobiliários.
2. Os privilégios mobiliários
são gerais, se abrangem o valor de todos os bens móveis existentes no
património do devedor à data da penhora ou de acto equivalente; são especiais,
quando compreendem só o valor de determinados bens móveis.
3. Os privilégios
imobiliários são sempre especiais.
SUBSECÇÃO II
Privilégios mobiliários
gerais
ARTIGO 736º
(Créditos do Estado e
das autarquias locais)
1. O Estado e as autarquias
locais têm privilégio mobiliário geral para garantia dos créditos por impostos
indirectos, e também pelos impostos directos inscritos para cobrança no ano
corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores.
2. Este privilégio não
compreende a sisa ou o imposto sobre as sucessões e doações, nem quaisquer
outros impostos que gozem de privilégio especial.
ARTIGO 737º
(Outros créditos que
gozam de privilégio mobiliário geral)
1. Gozam de privilégio
geral sobre os móveis:
a) O crédito por despesas
do funeral do devedor, conforme a sua condição e costume da terra;
b) O crédito por despesas
com doenças do devedor ou de pessoas a quem este deva prestar alimentos,
relativo aos últimos seis meses;
c) O crédito por despesas
indispensáveis para o sustento do devedor e das pessoas a quem este tenha a
obrigação de prestar alimentos, relativo aos últimos seis meses;
d) Os créditos emergentes
do contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato,
pertencentes ao trabalhador e relativos aos últimos seis meses.
2. O prazo de seis meses
referido nas alíneas b), c) e d) do número anterior conta-se a partir da morte
do devedor ou do pedido de pagamento.
SUBSECÇÃO III
Privilégios mobiliários
especiais
ARTIGO 738º
(Despesas de justiça e
imposto sobre sucessões e doações)
1. Os créditos por despesas
de justiça feitas directamente no interesse comum dos credores, para a
conservação, execução ou liquidação de bens móveis, têm privilégio sobre estes
bens.
2. Têm igualmente
privilégio sobre os bens móveis transmitidos os créditos do Estado resultantes
do imposto sobre as sucessões e doações.
ARTIGO 739º
(Privilégio sobre os
frutos de prédios rústicos)
Gozam de privilégio sobre
os frutos dos prédios rústicos respectivos:
a) Os créditos pelos
fornecimentos de sementes, plantas e adubos, e de água ou energia para
irrigação ou outros fins agrícolas;
b) Os créditos por dívidas
de foros relativos ao ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e
ao ano anterior.
ARTIGO 740º
(Privilégio sobre as
rendas dos prédios urbanos)
Os créditos por dívidas de
foros relativos ao ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e ao
ano anterior, gozam de privilégio sobre as rendas dos prédios urbanos
respectivos.
ARTIGO 741º
(Crédito de
indemnização)
O crédito da vítima de um
facto que implique responsabilidade civil tem privilégio sobre a indemnização
devida pelo segurador da responsabilidade em que o lesante haja incorrido.
ARTIGO 742º
(Crédito do autor de
obra intelectual)
O crédito do autor de obra
intelectual, fundado em contrato de edição, tem privilégio sobre os exemplares
da obra existentes em poder do editor.
SUBSECÇÃO IV
Privilégios imobiliários
ARTIGO 743º
(Despesas de justiça)
Os créditos por despesas de
justiça feitas directamente no interesse comum dos credores, para a
conservação, execução ou liquidação dos bens imóveis, têm privilégio sobre
estes bens.
ARTIGO 744º
(Contribuição predial e
impostos de transmissão)
1. Os créditos por
contribuição predial devida ao Estado ou às autarquias locais, inscritos para
cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois
anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos
àquela contribuição.
2. Os créditos do Estado
pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e doações têm privilégio sobre os
bens transmitidos.
SUBSECÇÃO V
Efeitos e extinção dos
privilégios
ARTIGO 745º
(Concurso de créditos
privilegiados)
1. Os créditos
privilegiados são pagos pela ordem segundo a qual vão indicados nas disposições
seguintes.
2. Havendo créditos
igualmente privilegiados, dar-se-á rateio entre eles, na proporção dos
respectivos montantes.
ARTIGO 746º
(Privilégios por
despesas de justiça)
Os privilégios por despesas
de justiça, quer sejam mobiliários, quer imobiliários, têm preferência não só
sobre os demais privilégios,como sobre as outras garantias, mesmo anteriores,
que onerem os mesmos bens, e valem contra os terceiros adquirentes.
ARTIGO 747º
(Ordem dos outros
privilégios mobiliários)
1. Os créditos com
privilégio mobiliário graduam-se pela ordem seguinte:
a) Os créditos por
impostos, pagando-se em primeiro lugar o Estado e só depois as autarquias
locais;
b) Os créditos por
fornecimentos destinados à produção agrícola;
c) Os créditos por dívidas
de foros;
d) Os créditos da vítima de
um facto que dê lugar a responsabilidade civil;
e) Os créditos do autor de
obra intelectual;
f) Os créditos com
privilégio mobiliário geral, pela ordem segundo a qual são enumerados no artigo
737º.
2. O disposto no presente
artigo é aplicável, ainda que os privilégios existam contra proprietários
sucessivos da coisa.
ARTIGO 748º
(Ordem dos outros
privilégios imobiliários)
1. Os créditos com
privilégio imobiliário graduam-se pela ordem seguinte:
a) Os créditos do Estado,
pela contribuição predial, pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e
doações;
b) Os créditos das
autarquias locais, pela contribuição predial.
ARTIGO 749º
(Privilégio geral e
direitos de terceiro)
O privilégio geral não vale
contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas
abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente.
ARTIGO 750º
(Privilégio mobiliário especial
e direitos de terceiro)
Salvo disposição em
contrário, no caso de conflito entre o privilégio mobiliário especial e um
direito de terceiro, prevalece o que mais cedo se houver adquirido.
ARTIGO 751º
(Privilégio imobiliário
e direitos de terceiro)
Os privilégios imobiliários
são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele, e
preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção,
ainda que estas garantias sejam anteriores.
ARTIGO 752º
(Extinção)
Os privilégios extinguem-se
pelas mesmas causas por que se extingue o direito de hipoteca.
ARTIGO 753º
(Remissão)
São aplicáveis aos
privilégios, com as necessárias adaptações, os artigos 692º e 694º a 699º.
SECÇÃO VII
Direito de retenção
ARTIGO 754º
(Quando existe)
O devedor que disponha de
um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado
a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa
dela ou de danos por ela causados.
ARTIGO 755º
(Casos especiais)
1. Gozam ainda do direito
de retenção:
a) O transportador, sobre
as coisas transportadas, pelo crédito resultante do transporte;
b) O albergueiro, sobre as
coisas que as pessoas albergadas hajam trazido para a pousada ou acessórios
dela, pelo crédito da hospedagem;
c) O mandatário, sobre as
coisas que lhe tiveram sido entregues para execução do mandato, pelo crédito
resultante da sua actividade;
d) O gestor de negócios,
sobre as coisas que tenha em seu poder para execução da gestão, pelo crédito
proveniente desta;
e) O depositário e o
comodatário, sobre as coisas que lhe tiverem sido entregues em consequência dos
respectivos contratos, pelos créditos deles resultantes;
f) O beneficiário da
promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição
da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito
resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo
442º.
2. Quando haja transportes
sucessivos, mas todos os transportadores se tenham obrigado em comum,
entende-se que o último detém as coisas em nome próprio e em nome dos outros.
(Redacção do Dec-Lei
379/86, de 11-11)
ARTIGO 756º
(Exclusão do direito de
retenção)
Não há direito de retenção:
a) A favor dos que tenham
obtido por meios ilícitos a coisa que devem entregar, desde que, no momento da
aquisição, conhecessem a ilicitude desta;
b) A favor dos que tenham
realizado de má fé as despesas de que proveio o seu crédito;
c) Relativamente a coisas
impenhoráveis;
d) Quando a outra parte
preste caução suficiente.
ARTIGO 757º
(Inexigibilidade e
iliquidez do crédito)
1. O devedor goza do
direito de retenção, mesmo antes do vencimento do seu crédito, desde que
entretanto se verifique alguma das circunstâncias que importam a perda do
benefício do prazo.
2. O direito de retenção
não depende da liquidez do crédito do respectivo titular.
ARTIGO 758º
(Retenção de coisas
móveis)
Recaindo o direito de
retenção sobre coisa móvel, o respectivo titular goza dos direitos e está
sujeito às obrigações do credor pignoratício, salvo pelo que respeita à
substituição ou reforço da garantia.
ARTIGO 759º
(Retenção de coisas
imóveis)
1. Recaindo o direito de
retenção sobre coisa imóvel, o respectivo titular, enquanto não entregar a
coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode
fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores
do devedor.
2. O direito de retenção
prevelece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada
anteriormente.
3. Até à entrega da coisa
são aplicáveis, quanto aos direitos e obrigações do titular da retenção, as
regras do penhor, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 760º
(Transmissão)
O direito de retenção não é
transmissível sem que seja transmitido o crédito que ele garante.
ARTIGO 761º
(Extinção)
O direito de retenção
extingue-se pelas mesmas causas por que cessa o direito de hipoteca, e ainda
pela entrega da coisa.
CAPÍTULO VII
Cumprimento e não
cumprimento das obrigações
SECÇÃO I
Cumprimento
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 762º
(Princípio geral)
1. O devedor cumpre a
obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado.
2. No cumprimento da
obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes
proceder de boa fé.
ARTIGO 763º
(Realização integral da
prestação)
1. A prestação deve ser
realizada integralmente e não por partes, excepto se outro for o regime
convencionado ou imposto por lei ou pelos usos.
2. O credor tem, porém, a
faculdade de exigir uma parte da prestação; a exigência dessa parte não priva o
devedor da possibilidade de oferecer a prestação por inteiro.
ARTIGO 764º
(Capacidade do devedor e
do credor)
1. O devedor tem de ser
capaz, se a prestação constituir um acto de disposição; mas o credor que haja
recebido do devedor incapaz pode opor-se ao pedido de anulação se o devedor não
tiver tido prejuízo com o cumprimento.
2. O credor deve, pelo seu
lado, ter capacidade para receber a prestação; mas, se esta chegar ao poder do
representante legal do incapaz ou o património deste tiver enriquecido, pode o
devedor opor-se ao pedido de anulação da prestação realizada e de novo
cumprimento da obrigação,
na medida do que tiver sido recebido pelo representante ou do enriquecimento do
incapaz.
ARTIGO 765º
(Entrega da coisa de que
o devedor não pode dispor)
1. O credor que de boa fé
receber a prestação de coisa que o devedor não pode alhear tem o direito de
impugnar o cumprimento, sem prejuízo da faculdade de se ressarcir dos danos que
haja sofrido.
2. O devedor que, de boa ou
má fé, prestar coisa de que lhe não é lícito dispor não pode impugnar o
cumprimento, a não ser que ofereça uma nova prestação.
ARTIGO 766º
(Declaração de nulidade
ou anulação do cumprimento e garantias prestadas por terceiro)
Se o cumprimento for
declarado nulo ou anulado por causa imputável ao credor, não renascem as
garantias prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício na data em que
teve notícia do cumprimento da obrigação.
SUBSECÇÃO II
Quem pode fazer e a quem
pode ser feita a prestação
ARTIGO 767º
(Quem pode fazer a
prestação)
1. A prestação pode ser
feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou não no cumprimento
da obrigação.
2. O credor não pode,
todavia, ser constrangido a receber de terceiro a prestação, quando se tenha
acordado expressamente em que esta deve ser feita pelo devedor, ou quando a
substituição o prejudique.
ARTIGO 768º
(Recusa da prestação
pelo credor)
1. Quando a prestação puder
ser efectuada por terceiro, o credor que a recuse incorre em mora perante o
devedor.
2. É, porém, lícito ao
credor recusá-la, desde que o devedor se oponha ao cumprimento e o terceiro não
possa ficar sub-rogado nos termos do artigo 592º; a oposição do devedor não
obsta a que o credor aceite validamente a prestação.
ARTIGO 769º
(A quem deve ser feita a
prestação)
A prestação deve ser feita
ao credor ou ao seu representante.
ARTIGO 770º
(Prestação feita a
terceiro)
A prestação feita a
terceiro não extingue a obrigação, excepto:
a) Se assim foi estipulado
ou consentido pelo credor;
b) Se o credor a ratificar;
c) Se quem a recebeu houver
adquirido posteriormente o crédito;
d) Se o credor vier a
aproveitar-se do cumprimento e não tiver interesse fundado em não a considerar
como feita a si próprio;
e) Se o credor for herdeiro
de quem a recebeu e responder pelas obrigações do autor da sucessão;
f) Nos demais casos em que
a lei o determinar.
ARTIGO 771º
(Oposição à indicação
feita pelo credor)
O devedor não é obrigado a
satisfazer a prestação ao representante voluntário do credor nem à pessoa por
este autorizada a recebê-la, se não houver convenção nesse sentido.
SUBSECÇÃO III
Lugar da prestação
ARTIGO 772º
(Princípio geral)
1. Na falta de estipulação
ou disposição especial da lei, a prestação deve ser efectuada no lugar do
domicílio do devedor.
2. Se o devedor mudar de domicílio
depois de constituída a obrigação, a prestação será efectuada no novo
domicílio, excepto se a mudança acarretar prejuízo para o credor, pois, nesse
caso, deve ser efectuada no lugar do domicílio primitivo.
ARTIGO 773º
(Entrega de coisa móvel)
1. Se a prestação tiver por
objecto coisa móvel determinada, a obrigação deve ser cumprida no lugar onde a
coisa se encontrava ao tempo da conclusão do negócio.
2. A disposição do número
anterior é ainda aplicável, quando se trate de coisa genérica que deve ser
escolhida de um conjunto determinado ou de coisa que deva ser produzida em
certo lugar.
ARTIGO 774º
(Obrigações pecuniárias)
Se a obrigação tiver por
objecto certa quantia em dinheiro, deve a prestação ser efectuada no lugar do
domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento.
ARTIGO 775º
(Mudança do domicílio do
credor)
Se tiver sido estipulado,
ou resultar da lei, que o cumprimento deve efectuar-se no domicílio do credor,
e este mudar de domicílio após a constituição da obrigação, pode a prestação ser
efectuada no domicílio do devedor, salvo se aquele se comprometer a indemnizar
este do prejuízo que sofrer com a mudança.
ARTIGO 776º
(Impossibilidade da
prestação no lugar fixado)
Quando a prestação for ou
se tornar impossível no lugar fixado para o cumprimento e não houver fundamento
para considerar a obrigação nula ou extinta, são aplicáveis as regras
supletivas dos artigos 772º a 774º.
SUBSECÇÃO IV
Prazo da prestação
ARTIGO 777º
(Determinação do prazo)
1. Na falta de estipulação
ou disposição especial da lei, o credor tem o direito de exigir a todo o tempo
o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode a todo o tempo
exonerar-se dela.
2. Se, porém, se tornar
necessário o estabelecimento de um prazo, quer pela própria natureza da
prestação, quer por virtude das circunstâncias que a determinaram, quer por
força dos usos, e as partes não acordarem na sua determinação, a fixação dele é
deferida
ao tribunal.
3. Se a determinação do
prazo for deixada ao credor e este não usar da faculdade que lhe foi concedida,
compete ao tribunal fixar o prazo, a requerimento do devedor.
ARTIGO 778º
(Prazo dependente da
possibilidade ou do arbítrio do devedor)
1. Se tiver sido estipulado
que o devedor cumprirá quando puder, a prestação só é exigível tendo este a
possibilidade de cumprir; falecendo o devedor, é a prestação exigível dos seus
herdeiros, independentemente da prova dessa possibilidade, mas sem prejuízo do
disposto no artigo 2071º.
2. Quando o prazo for
deixado ao arbítrio do devedor, só dos seus herdeiros tem o credor o direito de
exigir que satisfaçam a prestação.
ARTIGO 779º
(Beneficiário do prazo)
O prazo tem-se por
estabelecido a favor do devedor, quando se não mostre que o foi a favor do
credor, ou do devedor e do credor conjuntamente.
ARTIGO 780º
(Perda do benefício do
prazo)
1. Estabelecido o prazo a
favor do devedor, pode o credor, não obstante, exigir o cumprimento imediato da
obrigação, se o devedor se tornar insolvente, ainda que a insolvência não tenha
sido judicialmente declarada, ou se, por causa imputável ao devedor, diminuírem
as garantias do crédito ou não forem prestadas as garantias prometidas.
2. O credor tem o direito
de exigir do devedor, em lugar do cumprimento imediato da obrigação, a
substituição ou reforço das garantias, se estas sofreram diminuição.
ARTIGO 781º
(Dívida liquidável em
prestações)
Se a obrigação puder ser
liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas
importa o vencimento de todas.
ARTIGO 782º
(Perda do benefício do
prazo em relação aos co-obrigados e terceiros)
A perda do benefício do
prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do
crédito tenha constituído qualquer garantia.
SUBSECÇÃO V
Imputação do cumprimento
ARTIGO 783º
(Designação pelo
devedor)
1. Se o devedor, por
diversas dívidas da mesma espécie ao mesmo credor, efectuar uma prestação que
não chegue para as extinguir a todas, fica à sua escolha designar as dívidas a
que o cumprimento se refere.
2. O devedor, porém, não
pode designar contra a vontade do credor uma dívida que ainda não esteja
vencida, se o prazo tiver sido estabelecido em benefício do credor; e também
não lhe é lícito designar contra a vontade do credor uma dívida de montante
superior ao da prestação efectuada, desde que o credor tenha o direito de
recusar a prestação parcial.
ARTIGO 784º
(Regras supletivas)
1. Se o devedor não fizer a
designação, deve o cumprimento imputar-se na dívida vencida; entre várias
dívidas vencidas, na que oferece menor garantia para o credor; entre várias
dívidas igualmente garantidas, na mais onerosa para o devedor; entre várias
dívidas igualmente onerosas, na que primeiro se tenha vencido; se várias se
tiverem vencido simultaneamente, na mais antiga em data.
2. Não sendo possível
aplicar as regras fixadas no número precedente, a prestação presumir-se-á feita
por conta de todas as dívidas, rateadamente, mesmo com prejuízo, neste caso, do
disposto no artigo 763º.
ARTIGO 785º
(Dívidas de juros,
despesas e indemnização)
1. Quando, além do capital,
o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros, ou a indemnizar o credor
em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é
devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das despesas, da
indemnização, dos juros e do capital.
2. A imputação no capital
só pode fazer-se em último lugar, salvo se o credor concordar em que se faça
antes.
SUBSECÇÃO VI
Prova do cumprimento
ARTIGO 786º
(Presunções de
cumprimento)
1. Se o credor der quitação
do capital sem reserva dos juros ou de outras prestações acessórias, presume-se
que estão pagos os juros ou prestações.
2. Sendo devidos juros ou
outras prestações periódicas e dando o credor quitação, sem reserva, de uma
dessas prestações, presumem-se realizadas as prestações anteriores.
3. A entrega voluntária, feita
pelo credor ao devedor, do título original do crédito faz presumir a liberação
do devedor e dos seus condevedores, solidários ou conjuntos, bem como do fiador
e do devedor principal, se o título é entregue a algum destes.
ARTIGO 787º
(Direito à quitação)
1. Quem cumpre a obrigação
tem o direito de exigir quitação daquele a quem a prestação é feita, devendo a
quitação constar de documento autêntico ou autenticado ou ser provida de
reconhecimento notarial, se aquele que cumpriu tiver nisso interesse legítimo.
2. O autor do cumprimento
pode recusar a prestação enquanto a quitação não for dada, assim como pode
exigir a quitação depois do cumprimento.
SUBSECÇÃO VII
Direito à restituição do
título ou à menção do cumprimento
ARTIGO 788º
(Restituição do título. Menção
do cumprimento)
1. Extinta a dívida, tem o
devedor o direito de exigir a restituição do título da obrigação; se o
cumprimento for parcial, ou o título conferir outros direitos ao credor, ou
este tiver, por outro motivo, interesse legítimo na conservação dele, pode o
devedor exigir que o credor mencione no título o cumprimento efectuado.
2. Goza dos mesmos direitos
o terceiro que cumprir a obrigação, se ficar sub-rogado nos direitos do credor.
3. É aplicável à
restituição do título e à menção do cumprimento o disposto no nº 2 do artigo
anterior.
ARTIGO 789º
(Impossibilidade de
restituição ou de menção)
Se o credor invocar a
impossibilidade, por qualquer causa, de restituir o título ou de nele mencionar
o cumprimento, pode o devedor exigir quitação passada em documento autêntico ou
autenticado ou com reconhecimento notarial, correndo o encargo por conta do
credor.
SECÇÃO II
Não cumprimento
SUBSECÇÃO I
Impossibilidade do
cumprimento e mora não imputáveis ao devedor
ARTIGO 790º
(Impossibilidade
objectiva)
1. A obrigação extingue-se
quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor.
2. Quando o negócio do qual
a obrigação procede houver sido feito sob condição ou a termo, e a prestação
for possível na data da conclusão do negócio, mas se tornar impossível antes da
verificação da condição ou do vencimento do termo, é a imposibilidade
considerada superveniente e não afecta a validade do negócio.
ARTIGO 791º
(Impossibilidade
subjectiva)
A impossibilidade relativa
à pessoa do devedor importa igualmente a extinção da obrigação, se o devedor,
no cumprimento desta, não puder fazer-se substituir por terceiro.
ARTIGO 792º
(Impossibilidade
temporária)
1. Se a impossibilidade for
temporária, o devedor não responde pela mora no cumprimento.
2. A impossibilidade só se
considera temporária enquanto, atenta a finalidade da obrigação, se mantiver o
interesse do credor.
ARTIGO 793º
(Impossibilidade
parcial)
1. Se a prestação se tornar
parcialmente impossível, o devedor exonera-se mediante a prestação do que for
possível, devendo, neste caso, ser proporcionalmente reduzida a contraprestação
a que a outra parte estiver vinculada.
2. Porém, o credor que não
tiver, justificadamente, interesse no cumprimento parcial da obrigação pode
resolver o negócio.
ARTIGO 794º
(«Commodum» de
representação)
Se, por virtude do facto
que tornou impossível a prestação, o devedor adquirir algum direito sobre certa
coisa, ou contra terceiro, em substituição do objecto da prestação, pode o
credor exigir a prestação dessa coisa, ou substituir-se ao devedor na
titularidade do direito que este tiver adquirido contra terceiro.
ARTIGO 795º
(Contratos bilaterais)
1. Quando no contrato
bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da
contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua
restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
2. Se a prestação se tornar
impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da
contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, será
o valor do benefício descontado na contraprestação.
ARTIGO 796º
(Risco)
1. Nos contratos que
importem a transferência do domínio sobre certa coisa ou que constituam ou
transfiram um direito real sobre ela, o perecimento ou deterioração da coisa
por causa não imputável ao alienante corre por conta do adquirente.
2. Se, porém, a coisa tiver
continuado em poder do alienante em consequência de termo constituído a seu
favor, o risco só se transfere com o vencimento do termo ou a entrega da coisa,
sem prejuízo do disposto no artigo 807º.
3. Quando o contrato
estiver dependente de condição resolutiva, o risco do perecimento durante a
pendência da condição corre por conta do adquirente, se a coisa lhe tiver sido
entregue; quando for suspensiva a condição, o risco corre por conta do
alienante durante a pendência da condição.
ARTIGO 797º
(Promessa de envio)
Quando se trate de coisa
que, por força da convenção, o alienante deva enviar para local diferente do
lugar do cumprimento, a transferência do risco opera-se com a entrega ao
transportador ou expedidor da coisa ou à pessoa indicada para a execução do
envio.
SUBSECÇÃO II
Falta de cumprimento e
mora imputáveis ao devedor
Divisão I
Princípios gerais
ARTIGO 798º
(Responsabilidade do
devedor)
O devedor que falta
culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que
causa ao credor.
ARTIGO 799º
(Presunção de culpa e
apreciação desta)
1. Incumbe ao devedor
provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não
procede de culpa sua.
2. A culpa é apreciada nos
termos aplicáveis à responsabilidade civil.
ARTIGO 800º
(Actos dos
representantes legais ou auxiliares)
1. O devedor é responsável
perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que
utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados
pelo próprio devedor.
2. A responsabilidade pode
ser convencionalmente excluída ou limitada, mediante acordo prévio dos
interessados, desde que a exclusão ou limitação não compreenda actos que
representem a violação de deveres impostos por normas de ordem pública.
DIVISÃO II
Impossibilidade do
cumprimento
ARTIGO 801º
(Impossibilidade
culposa)
1. Tornando-se impossível a
prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse
culposamente ao cumprimento da obrigação.
2. Tendo a obrigação por
fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à
indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação,
exigir a restituição dela por inteiro.
ARTIGO 802º
(Impossibilidade
parcial)
1. Se a prestação se tornar
parcialmente impossível, o credor tem a faculdade de resolver o negócio ou de
exigir o cumprimento do que for possível, reduzindo neste caso a sua
contraprestação, se for devida; em qualquer dos casos o credor mantém o direito
à indemnização.
2. O credor não pode,
todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial, atendendo ao seu
interesse, tiver escassa importância.
ARTIGO 803º
(«Commodum» de
representação)
1. É extensivo ao caso de
impossibilidade imputável ao devedor o que dispõe o artigo 794º.
2. Se o credor fizer valer
o direito conferido no número antecedente, o montante da indemnização a que
tenha direito será reduzido na medida correspondente.
DIVISÃO III
Mora do devedor
ARTIGO 804º
(Princípios gerais)
1. A simples mora constitui
o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor.
2. O devedor considera-se
constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação,
ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.
ARTIGO 805º
(Momento da constituição
em mora)
1. O devedor só fica
constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente
interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do
devedor, independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver
prazo certo;
b) Se a obrigação provier
de facto ilícito;
c) Se o próprio devedor
impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que
normalmente o teria sido.
3. Se o crédito for
ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de
liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por
facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a
menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-06)
ARTIGO 806º
(Obrigações pecuniárias)
1. Na obrigação pecuniária
a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora.
2. Os juros devidos são os
juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou as
partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal.
3. Pode, no entanto, o
credor provar que a mora lhe causou dano superior aos juros referidos no número
anterior e exigir a indemnização suplementar correspondente, quando se trate de
responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-06)
ARTIGO 807º
(Risco)
1. Pelo facto de estar em
mora, o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que o credor tiver em
consequência da perda ou deterioração daquilo que deveria entregar, mesmo que
estes factos lhe não sejam imputáveis.
2. Fica, porém, salva ao
devedor a possibilidade de provar que o credor teria sofrido igualmente os
danos se a obrigação tivesse sido cumprida em tempo.
ARTIGO 808º
(Perda do interesse do
credor ou recusa do cumprimento)
1. Se o credor, em
consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não
for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor,
considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.
2. A perda do interesse na
prestação é apreciada objectivamente.
DIVISÃO IV
Fixação contratual dos
direitos do credor
ARTIGO 809º
(Renúncia do credor aos
seus direitos)
É nula a cláusula pela qual
o credor renuncia antecipadamente a qualquer dos direitos que lhe são
facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do
devedor, salvo o disposto no nº 2 do artigo 800º.
ARTIGO 810º
(Cláusula penal)
1. As partes podem, porém,
fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é o que se chama cláusula
penal.
2. A cláusula penal está
sujeita às formalidades exigidas para a obrigação principal, e é nula se for
nula esta obrigação.
ARTIGO 811º
(Funcionamento da
cláusula penal)
1. O credor não pode exigir
cumulativamente, com base no contrato, o cumprimento coercivo da obrigação
principal e o pagamento da cláusula penal, salvo se esta tiver sido
estabelecida para o atraso da prestação; é nula qualquer estipulação em
contrário.
2. O estabelecimento da
cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente,
salvo se outra for a convenção das partes.
3. O credor não pode em
caso algum exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do
incumprimento da obrigação principal.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
ARTIGO 812º
(Redução equitativa da
cláusula penal)
1. A cláusula penal pode
ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente
excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em
contrário.
2. É admitida a redução nas
mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
SUBSECÇÃO III
Mora do credor
ARTIGO 813º
(Requisitos)
O credor incorre em mora
quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos
termos legais ou não pratica os actos necessários ao cumprimento da obrigação.
ARTIGO 814º
(Responsabilidade do
devedor)
1. A partir da mora, o
devedor apenas responde, quanto ao objecto da prestação, pelo seu dolo;
relativamente aos proventos da coisa, só responde pelos que hajam sido
percebidos.
2. Durante a mora, a dívida
deixa de vencer juros, quer legais, quer convencionados.
ARTIGO 815º
(Risco)
1. A mora faz recair sobre
o credor o risco da impossibilidade superveniente da prestação, que resulte de
facto não imputável a dolo do devedor.
2. Sendo o contrato
bilateral, o credor que, estando em mora, perca total ou parcialmente o seu
crédito por impossibilidade superveniente da prestação não fica exonerado da
contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a extinção da sua
obrigação, deve o valor do benefício ser descontado na contraprestação.
ARTIGO 816º
(Indemnização)
O credor em mora
indemnizará o devedor das maiores despesas que este seja obrigado a fazer com o
oferecimento infrutífero da prestação e a guarda e conservação do respectivo
objecto.
SECÇÃO III
Realização coactiva da
prestação
SUBSECÇÃO I
Acção de cumprimento e
execução
ARTIGO 817º
(Princípio geral)
Não sendo a obrigação
voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu
cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados neste
código e nas leis de processo.
ARTIGO 818º
(Execução de bens de
terceiro)
O direito de execução pode
incidir sobre bens de terceiro, quando estejam vinculados à garantia do
crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que
este haja procedentemente impugnado.
ARTIGO 819º
(Disposição ou oneração
dos bens penhorados)
Sem prejuízo das regras do
registo, são ineficazes em relação ao exequente os actos de disposição ou
oneração dos bens penhorados.
ARTIGO 820º
(Penhora de créditos)
Sendo penhorado algum
crédito do devedor, a extinção dele por causa dependente da vontade do
executado ou do seu devedor, verificada depois da penhora, é igualmente
ineficaz em relação ao exequente.
ARTIGO 821º
(Liberação ou cessão de
rendas ou alugueres não vencidos)
A liberação ou cessão,
antes da penhora, de rendas e alugueres não vencidos é inoponível ao exequente,
na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a períodos de tempo não
decorridos à data da penhora.
ARTIGO 822º
(Preferência resultante
da penhora)
1. Salvo nos casos especialmente
previstos na lei, o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com
preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior.
2. Tendo os bens do
executado sido previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se à data
do arresto.
ARTIGO 823º
(Perda, expropriação ou
deterioração da coisa penhorada)
Se a coisa penhorada se
perder, for expropriada ou sofrer diminuição de valor, e, em qualquer dos
casos, houver lugar a indemnização de terceiro, o exequente conserva sobre os
créditos respectivos, ou sobre as quantias pagas a título de indemnização, o
direito que tinha sobre a coisa.
ARTIGO 824º
(Venda em execução)
1. A venda em execução
transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida.
2. Os bens são transmitidos
livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem como dos demais direitos
reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou
garantia, com excepção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos
em relação a terceiros independentemente de registo.
3. Os direitos de terceiro
que caducarem nos termos do número anterior transferem-se para o produto da
venda dos respectivos bens.
ARTIGO 825º
(Garantia no caso de
execução de coisa alheia)
1. O adquirente, no caso de
execução de coisa alheia, pode exigir que o preço lhe seja restituído por
aqueles a quem foi atribuído e que os danos sejam reparados pelos credores e
pelo executado que hajam procedido com culpa; é aplicável à restituição do
preço o disposto no artigo 894º.
2. Se o terceiro tiver
protestado pelo seu direito no acto da venda, ou anteriormente a ela, e o
adquirente conhecer o protesto, não lhe é lícito pedir a reparação dos danos,
salvo se os credores ou o devedor se tiverem responsabilizado pela indemnização.
3. Em lugar de exigir dos
credores a restituição do preço, o adquirente pode exercer contra o devedor,
por sub-rogação, os direitos desses credores.
ARTIGO 826º
(Adjudicação e remição)
As disposições dos artigos
antecedentes relativos à venda são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à
adjudicação e à remição.
SUBSECÇÃO II
Execução específica
ARTIGO 827º
(Entrega de coisa
determinada)
Se a prestação consistir na
entrega de coisa determinada, o credor tem a faculdade de requerer, em execução,
que a entrega lhe seja feita judicialmente.
ARTIGO 828º
(Prestação de facto
fungível)
O credor de prestação de
facto fungível tem a faculdade de requerer, em execução, que o facto seja
prestado por outrem à custa do devedor.
ARTIGO 829º
(Prestação de facto
negativo)
1. Se o devedor estiver
obrigado a não praticar algum acto e vier a praticá-lo, tem o credor o direito
de exigir que a obra, se obra feita houver, seja demolida à custa do que se
obrigou a não a fazer.
2. Cessa o direito
conferido no número anterior, havendo apenas lugar à indemnização, nos termos
gerais, se o prejuízo da demolição para o devedor for consideravelmente
superior ao prejuízo sofrido pelo credor.
ARTIGO 829º-A
(Sanção pecuniária
compulsória)
1. Nas obrigações de
prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem
especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a
requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia
pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção,
conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2. A sanção pecuniária
compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de
razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3. O montante da sanção
pecuniária compulsória destina-se, em parte iguais, ao credor e ao Estado.
4. Quando for estipulado ou
judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são
automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença
de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se
estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.
(Aditado pelo Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
ARTIGO 830º
(Contrato-promessa)
1. Se alguém se tiver
obrigado a celebrar certo contrato e não cumprir a promessa, pode a outra
parte, na falta de convenção em contrário, obter sentença que produza os
efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso não se oponha a
natureza da obrigação assumida.
2. Entende-se haver
convenção em contrário, se existir sinal ou tiver sido fixada uma pena para o
caso de não cumprimento da promessa.
3. O direito à execução
específica não pode ser afastado pelas partes nas promessas a que se refere o
nº 3 do artigo 410º; a requerimento do faltoso, porém, a sentença que produza
os efeitos da sua declaração negocial pode ordenar a modificação do contrato
nos termos do artigo 437º, ainda que a alteração das circunstâncias seja
posterior à mora.
4. Tratando-se de promessa
relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de
direito real sobre edifício, ou fracção autónoma dele, em que caiba ao
adquirente, nos termos do artigo 721º, a faculdade de expurgar hipoteca a que o
mesmo se encontre sujeito, pode aquele, caso a extinção de tal garantia não
preceda a mencionada transmissão ou constituição, ou não coincida com esta,
requerer, para efeito da expurgação, que a sentença referida no nº 1 condene
também o promitente faltoso a entregar-lhe o montante do débito garantido, ou o
valor nele correspondente à fracção do edifício ou do direito objecto do
contrato e dos juros respectivos, vencidos e vincendos, até pagamento integral.
5. No caso de contrato em
que ao obrigado seja lícito invocar a excepção de não cumprimento, a acção
improcede, se o requerente não consignar em depósito a sua prestação no prazo
que lhe for fixado pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei
379/86, de 11-11)
SECÇÃO IV
Cessão de bens aos
credores
ARTIGO 831º
(Noção)
Dá-se a cessão de bens aos
credores quando estes, ou alguns deles, são encarregados pelo devedor de
liquidar o património deste, ou parte dele, e repartir entre si o respectivo
produto, para satisfação dos seus créditos.
ARTIGO 832º
(Forma)
1. A cessão deve ser feita
por escrito e está, além disso, sujeita à forma exigida para a validade da
transmissão dos bens nela compreendidos.
2. A cessão deve ser
registada sempre que abranja bens sujeitos a registo.
ARTIGO 833º
(Execução dos bens
cedidos)
A cessão não impede que os
bens cedidos sejam executados pelos credores que dela não participam, enquanto
não tiverem sido alienados; não gozam de igual direito os cessionários nem os
credores posteriores à cessão.
ARTIGO 834º
(Poderes dos
cessionários e do devedor)
1. Enquanto a cessão se
mantiver, os poderes de administração e disposição dos respectivos bens
pertencem exclusivamente aos cessionários.
2. O devedor conserva,
porém, o direito de fiscalizar a gestão dos credores, e tem o direito à
prestação de contas no fim da liquidação ou, se a cessão se prolongar por mais
de um ano, no termo de cada ano.
ARTIGO 835º
(Exoneração do devedor)
O devedor só fica liberado
em face dos credores a partir do recebimento da parte que a estes compete no
produto da liquidação, e na medida do que receberam.
ARTIGO 836º
(Desistência da cessão)
1. É permitido ao devedor
desistir a todo o tempo da cessão, cumprindo as obrigações a que está adstrito
para com os cessionários.
2. A desistência não tem
efeito retroactivo.
CAPÍTULO VIII
Causas de extinção das
obrigações além do cumprimento
SECÇÃO I
Dação em cumprimento
ARTIGO 837º
(Quando é admitida)
A prestação de coisa
diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o
credor der o seu assentimento.
ARTIGO 838º
(Vícios da coisa ou do
direito)
O credor a quem for feita a
dação em cumprimento goza de garantia pelos vícios da coisa ou do direito
transmitido, nos termos prescritos para a compra e venda; mas pode optar pela
prestação primitiva e reparação dos danos sofridos.
ARTIGO 839º
(Nulidade ou anulabilidade
da dação)
Sendo a dação declarada
nula ou anulada por causa imputável ao credor, não renascem as garantias
prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na data em que teve
notícia da dação.
ARTIGO 840º
(Dação «pro solvendo»)
1. Se o devedor efectuar
uma prestação diferente da devida, para que o credor obtenha mais facilmente,
pela realização do valor dela, a satisfação do seu crédito, este só se extingue
quando for satisfeito, e na medida respectiva.
2. Se a dação tiver por
objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma dívida, presume-se feita
nos termos do número anterior.
SECÇÃO II
Consignação em depósito
ARTIGO 841º
(Quando tem lugar)
1. O devedor pode livrar-se
da obrigação mediante o depósito da coisa devida, nos casos seguintes:
a) Quando, sem culpa sua,
não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com segurança, por qualquer
motivo relativo à pessoa do credor;
b) Quando o credor estiver
em mora.
2. A consignação em
depósito é facultativa.
ARTIGO 842º
(Consignação por terceiro)
A consignação em depósito
pode ser efectuada a requerimento de terceiro a quem seja lícito efectuar a
prestação.
ARTIGO 843º
(Dependência de outra
prestação)
Se o devedor tiver a
faculdade de não cumprir senão contra uma prestação do credor, é-lhe lícito
exigir que a coisa consignada não seja entregue ao credor enquanto este não
efectuar aquela prestação.
ARTIGO 844º
(Entrega da coisa
consignada)
Feita a consignação, fica o
consignatário obrigado a entregar ao credor a coisa consignada, e o credor com
o direito de exigir a sua entrega.
ARTIGO 845º
(Revogação da
consignação)
1. O devedor pode revogar a
consignação, mediante declaração feita no processo, e pedir a restituição da
coisa consignada.
2. Extingue-se o direito de
revogação, se o credor, por declaração feita no processo, aceitar a
consignação, ou se esta for considerada válida por sentença passada em julgado.
ARTIGO 846º
(Extinção da obrigação)
A consignação aceita pelo
credor ou declarada válida por decisão judicial libera o devedor, como se ele
tivesse feito a prestação ao credor na data do depósito.
SECÇÃO III
Compensação
ARTIGO 847º
(Requisitos)
1. Quando duas pessoas
sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua
obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os
seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito
exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou
dilatória, de direito material;
b) Terem as duas obrigações
por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
2. Se as duas dívidas não
forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente.
3. A iliquidez da dívida
não impede a compensação.
ARTIGO 848º
(Como se torna efectiva)
1. A compensação torna-se
efectiva mediante declaração de uma das partes à outra.
2. A declaração é ineficaz,
se for feita sob condição ou a termo.
ARTIGO 849º
(Prazo gratuito)
O credor que concedeu
gratuitamente um prazo ao devedor está impedido de compensar a sua dívida antes
do vencimento do prazo.
ARTIGO 850º
(Créditos prescritos)
O crédito prescrito não
impede a compensação, se a prescrição não podia ser invocada na data em que os
dois créditos se tornaram compensáveis.
ARTIGO 851º
(Reciprocidade dos
créditos)
1. A compensação apenas
pode abranger a dívida do declarante, e não a de terceiro, ainda que aquele
possa efectuar a prestação deste, salvo se o declarante estiver em risco de
perder o que é seu em consequência de execução por dívida de terceiro.
2. O declarante só pode
utilizar para a compensação créditos que sejam seus, e não créditos alheios,
ainda que o titular respectivo dê o seu consentimento; e só procedem para o
efeito créditos seus contra o seu credor.
ARTIGO 852º
(Diversidade de lugares
do cumprimento)
1. Pelo simples facto de
deverem ser cumpridas em lugares diferentes, as duas obrigações não deixam de
ser compensáveis, salvo estipulação em contrário.
2. O declarante é, todavia,
obrigado a reparar os danos sofridos pela outra parte, em consequência de esta
não receber o seu crédito ou não cumprir a sua obrigação no lugar determinado.
ARTIGO 853º
(Exclusão da
compensação)
1. Não podem extinguir-se
por compensação:
a) Os créditos provenientes
de factos ilícitos dolosos;
b) Os créditos
impenhoráveis, excepto se ambos forem da mesma natureza;
c) Os créditos do Estado ou
de outras pessoas colectivas públicas, excepto quando a lei o autorize.
2. Também não é admitida a
compensação, se houver prejuízo de direitos de terceiro, constituídos antes de
os créditos se tornarem compensáveis, ou se o devedor a ela tiver renunciado.
ARTIGO 854º
(Retroactividade)
Feita a declaração de
compensação, os créditos consideram-se extintos desde o momento em que se
tornaram compensáveis.
ARTIGO 855º
(Pluralidade de
créditos)
1. Se existirem, de uma ou
outra parte, vários créditos compensáveis, a escolha dos que ficam extintos
pertence ao declarante.
2. Na falta de escolha, é
aplicável o disposto nos artigos 784º e 785º.
ARTIGO 856º
(Nulidade ou
anulabilidade da compensação)
Declarada nula ou anulada a
compensação, subsistem as obrigações respectivas; mas, sendo a nulidade ou
anulação imputável a alguma das partes, não renascem as garantias que em seu
benefício foram prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício quando
foi feita a declaração de compensação.
SECÇÃO IV
Novação
ARTIGO 857º
(Novação objectiva)
Dá-se a novação objectiva
quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da
antiga.
ARTIGO 858º
(Novação subjectiva)
A novação por substituição
do credor dá-se quando um novo credor é substituído ao antigo, vinculando-se o
devedor para com ele por uma nova obrigação; e a novação por substituição do
devedor, quando um novo devedor, contraindo nova obrigação, é substituído ao
antigo, que é exonerado pelo credor.
ARTIGO 859º
(Declaração negocial)
A vontade de contrair a
nova obrigação em substituição da antiga deve ser expressamente manifestada.
ARTIGO 860º
(Ineficácia da novação)
1. Se a primeira obrigação
estava extinta ao tempo em que a segunda foi contraída, ou vier a ser declarada
nula ou anulada, fica a novação sem efeito.
2. Se for declarada nula ou
anulada a nova obrigação, subsiste a obrigação primitiva; mas, sendo a nulidade
ou anulação imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por
terceiro, salvo se este, na data em que teve notícia da novação, conhecia o
vício da nova obrigação.
ARTIGO 861º
(Garantias)
1. Extinta a obrigação
antiga pela novação, ficam igualmente extintas, na falta de reserva expressa,
as garantias que asseguravam o seu cumprimento, mesmo quando resultantes da
lei.
2. Dizendo a garantia
respeito a terceiro, é necessária também a reserva expressa deste.
ARTIGO 862º
(Meios de defesa)
O novo crédito não está
sujeito aos meios de defesa oponíveis à obrigação antiga, salvo estipulação em
contrário.
SECÇÃO V
Remissão
ARTIGO 863º
(Natureza contratual da
remissão)
1. O credor pode remitir a
dívida por contrato com o devedor.
2. Quando tiver o carácter
de liberalidade, a remissão por negócio entre vivos é havida como doação, na
conformidade dos artigos 940º e seguintes.
ARTIGO 864º
(Obrigações solidárias)
1. A remissão concedida a
um devedor solidário libera os outros somente na parte do devedor exonerado.
2. Se o credor, neste caso,
reservar o seu direito, por inteiro, contra os outros devedores, conservam estes,
por inteiro também, o direito de regresso contra o devedor exonerado.
3. A remissão concedida por
um dos credores solidários exonera o devedor para com os restantes credores,
mas somente na parte que respeita ao credor remitente.
ARTIGO 865º
(Obrigações
indivisíveis)
1. À remissão concedida
pelo credor de obrigação indivisível a um dos devedores é aplicável o disposto
no artigo 536º.
2. Sendo a remissão
concedida por um dos credores ao devedor, este não fica exonerado para com os
outros credores; mas estes não podem exigir do devedor a prestação senão
entregando-lhe o valor da parte daquele concredor.
ARTIGO 866º
(Eficácia em relação a
terceiros)
1. A remissão concedida ao
devedor aproveita a terceiros.
2. A remissão concedida a
um dos fiadores aproveita aos outros na parte do fiador exonerado; mas, se os
outros consentirem na remissão, respondem pela totalidade da dívida, salvo
declaração em contrário.
3. Se for declarada nula ou
anulada a remissão por facto imputável ao credor, não renascem as garantias
prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na data em que teve
notícia da remissão.
ARTIGO 867º
(Renúncia às garantias)
A renúncia às garantias da
obrigação não faz presumir a remissão da dívida.
SECÇÃO VI
Confusão
ARTIGO 868º
(Noção)
Quando na mesma pessoa se
reúnam as qualidades de credor e devedor da mesma obrigação, extinguem-se o
crédito e a dívida.
ARTIGO 869º
(Obrigações solidárias)
1. A reunião na mesma
pessoa das qualidades de devedor solidário e credor exonera os demais
obrigados, mas só na parte da dívida relativa a esse devedor.
2. A reunião na mesma
pessoa das qualidades de credor solidário e devedor exonera este na parte
daquele.
ARTIGO 870º
(Obrigações
indivisíveis)
1. Se na obrigação
indivisível em que há vários devedores se reunirem as qualidades de credor e
devedor, é aplicável o disposto no artigo 536º.
2. Sendo vários os credores
e verificando-se a confusão entre um deles e o devedor, é aplicável o disposto
no nº 2 do artigo 865º.
ARTIGO 871º
(Eficácia em relação a
terceiros)
1. A confusão não prejudica
os direitos de terceiro.
2. Se houver, a favor de
terceiro, direitos de usufruto ou de penhor sobre o crédito, este subsiste, não
obstante a confusão, na medida em que o exija o interesse do usufrutuário ou do
credor pignoratício.
3. Se na mesma pessoa se
reunirem as qualidades de devedor e fiador, fica extinta a fiança, excepto se o
credor tiver legítimo interesse na subsistência da garantia.
4. A reunião na mesma
pessoa das qualidades de credor e de proprietário da coisa hipotecada ou
empenhada não impede que a hipoteca ou o penhor se mantenha, se o credor nisso
tiver interesse e na medida em que esse interesse se justifique.
ARTIGO 872º
(Patrimónios separados)
Não há confusão, se o
crédito e a dívida pertencem a patrimónios separados.
ARTIGO 873º
(Cessação da confusão)
1. Se a confusão se
desfizer, renasce a obrigação com os seus acessórios, mesmo em relação a
terceiro, quando o facto que a destrói seja anterior à própria confusão.
2. Quando a cessação da
confusão for imputável ao credor, não renascem as garantias prestadas por
terceiro, salvo se este conhecia o vício na data em que teve notícia da
confusão.
TÍTULO II
DOS CONTRATOS EM
ESPECIAL
CAPÍTULO I
Compra e venda
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 874º
(Noção)
Compra e venda é o contrato
pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante
um preço.
ARTIGO 875º
(Forma)
O contrato de compra e
venda de bens imóveis só é válido se for celebrado por escritura pública.
ARTIGO 876º
(Venda de coisa ou direito
litigioso)
1. Não podem ser
compradores de coisa ou direito litigioso, quer directamente, quer por
interposta pessoa, aqueles a quem a lei não permite que seja feita a cessão de
créditos ou direitos litigiosos, conforme se dispõe no capítulo respectivo.
2. A venda feita com quebra
do disposto no número anterior, além de nula, sujeita o comprador, nos termos
gerais, à obrigação de reparar os danos causados.
3. A nulidade não pode ser
invocada pelo comprador.
ARTIGO 877º
(Venda a filhos ou
netos)
1. Os pais e avós não podem
vender a filhos ou netos, se os outros filhos ou netos não consentirem na
venda; o consentimento dos descendentes, quando não possa ser prestado ou seja
recusado, é susceptível de suprimento judicial.
2. A venda feita com quebra
do que preceitua o número anterior é anulável; a anulação pode ser pedida pelos
filhos ou netos que não deram o seu consentimento, dentro do prazo de um ano a
contar do conhecimento da celebração do contrato, ou do termo da incapacidade,
se forem incapazes.
3. A proibição não abrange
a dação em cumprimento feita pelo ascendente.
ARTIGO 878º
(Despesas do contrato)
Na falta de convenção em
contrário, as despesas do contrato e outras acessórias ficam a cargo do
comprador.
SECÇÃO II
Efeitos da compra e
venda
ARTIGO 879º
(Efeitos essenciais)
A compra e venda tem como
efeitos essenciais:
a) A transmissão da
propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b) A obrigação de entregar
a coisa;
c) A obrigação de pagar o
preço.
ARTIGO 880º
(Bens futuros, frutos
pendentes e partes componentes ou integrantes)
1. Na venda de bens
futuros, de frutos pendentes ou de partes componentes ou integrantes de uma
coisa, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o
comprador adquira os bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar
das circunstâncias do contrato.
2. Se as partes atribuírem
ao contrato carácter aleatório, é devido o preço, ainda que a transmissão dos
bens não chegue a verificar-se.
ARTIGO 881º
(Bens de existência ou
titularidade incerta)
Quando se vendam bens de
existência ou titularidade incerta e no contrato se faça menção dessa
incerteza, é devido o preço, ainda que os bens não existam ou não pertençam ao
vendedor, excepto se as partes recusarem ao contrato natureza aleatória.
ARTIGO 882º
(Entrega da coisa)
1. A coisa deve ser
entregue no estado em que se encontrava ao tempo da venda.
2. A obrigação de entrega
abrange, salvo estipulação em contrário, as partes integrantes, os frutos
pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
3. Se os documentos
contiverem outras matérias de interesse do vendedor, é este obrigado a entregar
pública-forma da parte respeitante à coisa ou direito que foi objecto da venda,
ou fotocópia de igual valor.
ARTIGO 883º
(Determinação do preço)
1. Se o preço não estiver
fixado por entidade pública, e as partes o não determinarem nem convencionarem
o modo de ele ser determinado, vale como preço contratual o que o vendedor
normalmente praticar à data da conclusão do contrato ou, na falta dele, o do mercado
ou bolsa no momento do contrato e no lugar em que o comprador deva cumprir; na
insuficiência destas regras, o preço é determinado pelo tribunal, segundo
juízos de equidade.
2. Quando as partes se
tenham reportado ao justo preço, é aplicável o disposto no número anterior.
ARTIGO 884º
(Redução do preço)
1. Se a venda ficar
limitada a parte do seu objecto, nos termos do artigo 292º ou por força de
outros preceitos legais, o preço respeitante à parte válida do contrato é o que
neste figurar, se houver sido discriminado como parcela do preço global.
2. Na falta de
discriminação, a redução é feita por meio de avaliação.
ARTIGO 885º
(Tempo e lugar do
pagamento do preço)
1. O preço deve ser pago no
momento e no lugar da entrega da coisa vendida.
2. Mas, se por estipulação
das partes ou por força dos usos o preço não tiver de ser pago no momento da
entrega, o pagamento será efectuado no lugar do domicílio que o credor tiver ao
tempo do cumprimento.
ARTIGO 886º
(Falta de pagamento do
preço)
Transmitida a propriedade
da coisa, ou o direito sobre ela, e feita a sua entrega, o vendedor não pode,
salvo convenção em contrário, resolver o contrato por falta de pagamento do
preço.
SECÇÃO III
Venda de coisas sujeitas
a contagem, pesagem ou medição
ARTIGO 887º
(Coisas determinadas.
Preço fixado por unidade)
Na venda de coisas
determinadas, com preço fixado à razão de tanto por unidade, é devido o preço
proporcional ao número, peso ou medida real das coisas vendidas, sem embargo de
no contrato se declarar quantidade diferente.
ARTIGO 888º
(Coisas determinadas.
Preço não fixado por unidade)
1. Se na venda de coisas
determinadas o preço não for estabelecido à razão de tanto por unidade, o
comprador deve o preço declarado, mesmo que no contrato se indique o número,
peso ou medida das coisas vendidas e a indicação não corresponda à realidade.
2. Se, porém, a quantidade
efectiva diferir da declarada em mais de um vigésimo desta, o preço sofrerá
redução ou aumento proporcional.
ARTIGO 889º
(Compensação entre
faltas e excessos)
Quando se venda por um só
preço uma pluralidade de coisas determinadas e homogéneas, com indicação do
peso ou medida de cada uma delas, e se declare quantidade inferior à real
quanto a alguma ou algumas e superior quanto a outra ou outras, far-se-á
compensação entre as faltas e os excessos até ao limite da sua concorrência.
ARTIGO 890º
(Caducidade do direito à
diferença de preço)
1. O direito ao recebimento
da diferença de preço caduca dentro de seis meses ou um ano após a entrega da
coisa, consoante esta for móvel ou imóvel; mas, se a diferença só se tornar
exigível em momento posterior à entrega, o prazo contar-se-á a partir desse
momento.
2. Na venda de coisas que
hajam de ser transportadas de um lugar para outro, o prazo reportado à data da
entrega só começa a correr no dia em que o comprador as receber.
ARTIGO 891º
(Resolução do contrato)
1. Se o preço devido por
aplicação do artigo 887º ou do nº 2 do artigo 888º exceder o proporcional à
quantidade declarada em mais de um vigésimo deste, e o vendedor exigir esse
excesso, o comprador tem o direito de resolver o contrato, salvo se houver
procedido com dolo.
2. O direito à resolução
caduca no prazo de três meses, a contar da data em que o vendedor fizer por
escrito a exigência do excesso.
SECÇÃO IV
Venda de bens alheios
ARTIGO 892º
(Nulidade da venda)
É nula a venda de bens
alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para a realizar; mas o
vendedor não pode opor a nulidade ao comprador de boa fé, como não pode opô-la
ao vendedor de boa fé o comprador doloso.
ARTIGO 893º
(Bens alheios como bens
futuros)
A venda de bens alheios
fica, porém, sujeita ao regime da venda de bens futuros, se as partes os
considerarem nesta qualidade.
ARTIGO 894º
(Restituição do preço)
1. Sendo nula a venda de
bens alheios, o comprador que tiver procedido de boa fé tem o direito de exigir
a restituição integral do preço, ainda que os bens se hajam perdido, estejam
deteriorados ou tenham diminuído de valor por qualquer outra causa.
2. Mas, se o comprador
houver tirado proveito da perda ou diminuição de valor dos bens, será o
proveito abatido no montante do preço e da indemnização que o vendedor tenha de
pagar-lhe.
ARTIGO 895º
(Convalidação do
contrato)
Logo que o vendedor adquira
por algum modo a propriedade da coisa ou o direito vendido, o contrato torna-se
válido e a dita propriedade ou direito transfere-se para o comprador.
ARTIGO 896º
(Casos em que o contrato
se não convalida)
1. O contrato não adquire,
porém, validade, se entretanto ocorrer algum dos seguintes factos:
a) Pedido judicial de
declaração de nulidade do contrato, formulado por um dos contraentes contra o
outro;
b) Restituição do preço ou
pagamento da indemnização, no todo ou em parte, com aceitação do credor;
c) Transacção entre os
contraentes, na qual se reconheça a nulidade do contrato;
d) Declaração escrita,
feita por um dos estipulantes ao outro, de que não quer que o contrato deixe de
ser declarado nulo.
2. As disposições das
alíneas a) e d) do número precedente não prejudicam o disposto na segunda parte
do artigo 892º.
ARTIGO 897º
(Obrigação de
convalidação)
1. Em caso de boa fé do
comprador, o vendedor é obrigado a sanar a nulidade da venda, adquirindo a
propriedade da coisa ou o direito vendido.
2. Quando exista uma tal
obrigação, o comprador pode subordinar ao não cumprimento dela, dentro do prazo
que o tribunal fixar, o efeito previsto na alínea a) do nº 1 do artigo
anterior.
ARTIGO 898º
(Indemnização em caso de
dolo)
Se um dos contraentes
houver procedido de boa fé e o outro dolosamente, o primeiro tem direito a ser
indemnizado, nos termos gerais, de todos os prejuízos que não teria sofrido se
o contrato fosse válido desde o começo, ou não houvesse sido celebrado,
conforme venha ou não a ser sanada a nulidade.
ARTIGO 899º
(Indemnização, não
havendo dolo nem culpa)
O vendedor é obrigado a
indemnizar o comprador de boa fé, ainda que tenha agido sem dolo nem culpa;
mas, neste caso, a indemnização compreende apenas os danos emergentes que não
resultem de despesas voluptuárias.
ARTIGO 900º
(Indemnização pela não
convalidação da venda)
1. Se o vendedor for
responsável pelo não cumprimento da obrigação de sanar a nulidade da venda ou
pela mora no seu cumprimento, a respectiva indemnização acresce à regulada nos
artigos anteriores, excepto na parte em que o prejuízo seja comum.
2. Mas, no caso previsto no
artigo 898º, o comprador escolherá entre a indemnização dos lucros cessantes
pela celebração do contrato nulo e a dos lucros cessantes pela falta ou
retardamento da convalidação.
ARTIGO 901º
(Garantia do pagamento
de benfeitorias)
O vendedor é garante
solidário do pagamento das benfeitorias que devam ser reembolsadas pelo dono da
coisa ao comprador de boa fé.
ARTIGO 902º
(Nulidade parcial do
contrato)
Se os bens só parcialmente
forem alheios e o contrato valer na parte restante por aplicação do artigo
292º, observar-se-ão as disposições antecedentes quanto à parte nula e
reduzir-se-á proporcionalmente o preço estipulado.
ARTIGO 903º
(Disposições supletivas)
1. O disposto no artigo
894º, no nº 1 do artigo 897º, no artigo 899º, no nº 1 do artigo 900º e no
artigo 901º cede perante convenção em contrário, excepto se o contraente a quem
a convenção aproveitaria houver agido com dolo, e de boa fé o outro
estipulante.
2. A declaração contratual
de que o vendedor não garante a sua legitimidade ou não responde pela evicção
envolve derrogação de todas as disposições legais a que o número anterior se
refere, com excepção do preceituado no artigo 894º.
3. As cláusulas
derrogadoras das disposições supletivas a que se refere o nº 1 são válidas, sem
embargo da nulidade do contrato de compra e venda onde se encontram insertas,
desde que a nulidade proceda da ilegitimidade do vendedor, nos termos desta
secção.
ARTIGO 904º
(Âmbito desta secção)
As normas da presente
secção apenas se aplicam à venda de coisa alheia como própria.
SECÇÃO V
Venda de bens onerados
ARTIGO 905º
(Anulabilidade por erro
ou dolo)
Se o direito transmitido
estiver sujeito a alguns ónus ou limitações que excedam os limites normais
inerentes aos direitos da mesma categoria, o contrato é anulável por erro ou
dolo, desde que no caso se verifiquem os requisitos legais da anulabilidade.
ARTIGO 906º
(Convalescença do
contrato)
1. Desaparecidos por
qualquer modo os ónus ou limitações a que o direito estava sujeito, fica sanada
a anulabilidade do contrato.
2. A anulabilidade
persiste, porém, se a existência dos ónus ou limitações já houver causado
prejuízo ao comprador, ou se este já tiver pedido em juízo a anulação da compra
e venda.
ARTIGO 907º
(Obrigação de fazer
convalescer o contrato. Cancelamento dos registos)
1. O vendedor é obrigado a
sanar a anulabilidade do contrato, mediante a expurgação dos ónus ou limitações
existentes.
2. O prazo para a
expurgação será fixado pelo tribunal, a requerimento do comprador.
3. O vendedor deve ainda
promover, à sua custa, o cancelamento de qualquer ónus ou limitação que conste
do registo, mas na realidade não exista.
ARTIGO 908º
(Indemnização em caso de
dolo)
Em caso de dolo, o
vendedor, anulado o contrato, deve indemnizar o comprador do prejuízo que este
não sofreria se a compra e venda não tivesse sido celebrada.
ARTIGO 909º
(Indemnização em caso de
simples erro)
Nos casos de anulação
fundada em simples erro, o vendedor também é obrigado a indemnizar o comprador,
ainda que não tenha havido culpa da sua parte, mas a indemnização abrange
apenas os danos emergentes do contrato.
ARTIGO 910º
(Não cumprimento da
obrigação de fazer convalescer o contrato)
1. Se o vendedor se
constituir em responsabilidade por não sanar a anulabilidade do contrato, a correspondente
indemnização acresce à que o comprador tenha direito a receber na conformidade
dos artigos precedentes, salvo na parte em que o prejuízo foi comum.
2. Mas, no caso previsto no
artigo 908º, o comprador escolherá entre a indemnização dos lucros cessantes
pela celebração do contrato que veio a ser anulado e a dos lucros cessantes
pelo facto de não ser sanada a anulabilidade.
ARTIGO 911º
(Redução do preço)
1. Se as circunstâncias
mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria igualmente adquirido os
bens, mas por preço inferior, apenas lhe caberá o direito à redução do preço,
em harmonia com a desvalorização resultante dos ónus ou limitações, além da
indemnização que no caso competir.
2. São aplicáveis à redução
do preço os preceitos anteriores, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 912º
(Disposições supletivas)
1. O disposto nos nºs 1 e 3
do artigo 907º, no artigo 909º e no nº 1 do artigo 910º cede perante
estipulação das partes em contrário, a não ser que o vendedor tenha procedido
com dolo e as cláusulas contrárias àquelas normas visem a beneficiá-lo.
2. Não obsta à validade das
cláusulas derrogadoras destas disposições supletivas a anulação do contrato de
compra e venda por erro ou dolo, segundo as prescrições desta secção.
SECÇÃO VI
Venda de coisas
defeituosas
ARTIGO 913º
(Remissão)
1. Se a coisa vendida
sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é
destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias
para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas adaptações, o
prescrito na secção precendente, em tudo quanto não seja modificado pelas
disposições dos artigos seguintes.
2. Quando do contrato não
resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal
das coisas da mesma categoria.
ARTIGO 914º
(Reparação ou
substituição da coisa)
O comprador tem o direito
de exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver
natureza fungível, a substituição dela; mas esta obrigação não existe, se o
vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que a coisa
padece.
ARTIGO 915º
(Indemnização em caso de
simples erro)
A indemnização prevista no
artigo 909º também não é devida, se o vendedor se encontrava nas condições a
que se refere a parte final do artigo anterior.
ARTIGO 916º
(Denúncia do defeito)
1. O comprador deve
denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, excepto se este
houver usado de dolo.
2. A denúncia será feita
até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a
entrega da coisa.
3. Os prazos referidos no
número anterior são, respectivamente, de um e de cinco anos, caso a coisa
vendida seja um imóvel.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 917º
(Caducidade da acção)
A acção de anulação por
simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o
comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem
prejuízo, neste último caso, do disposto no nº 2 do artigo 287º.
ARTIGO 918º
(Defeito superveniente)
Se a coisa, depois de
vendida e antes de entregue, se deteriorar, adquirindo vícios ou perdendo
qualidades, ou a venda respeitar a coisa futura ou a coisa indeterminada de
certo género, são aplicáveis as regras relativas ao não cumprimento das obrigações.
ARTIGO 919º
(Venda sobre amostra)
Sendo a venda feita sobre
amostra, entende-se que o vendedor assegura a existência, na coisa vendida, de
qualidades iguais às da amostra, salvo se da convenção ou dos usos resultar que
esta serve somente para indicar de modo aproximado as qualidades do objecto.
ARTIGO 920º
(Venda de animais
defeituosos)
Ficam ressalvadas as leis
especiais ou, na falta destas, os usos sobre a venda de animais defeituosos
ARTIGO 921º
(Garantia de bom
funcionamento)
1. Se o vendedor estiver
obrigado, por convenção das partes ou por força dos usos, a garantir o bom
funcionamento da coisa vendida, cabe-lhe repará-la, ou substituí-la quando a
substituição for necessária e a coisa tiver natureza fungível,
independentemente de culpa sua ou de erro do comprador.
2. No silêncio do contrato,
o prazo da garantia expira seis meses após a entrega da coisa, se os usos não
estabelecerem prazo maior.
3. O defeito de
funcionamento deve ser denunciado ao vendedor dentro do prazo da garantia e,
salvo estipulação em contrário, até trinta dias depois de conhecido.
4. A acção caduca logo que
finde o tempo para a denúncia sem o comprador a ter feito, ou passados seis
meses sobre a data em que a denúncia foi efectuada.
ARTIGO 922º
(Coisas que devem ser
transportadas)
Na venda de coisas que
devam ser transportadas de um lugar para outro, os prazos que os artigos 916º e
921º mandam contar a partir da entrega só começam a correr no dia em que o
credor as receber.
SECÇÃO VII
Venda a contento e venda
sujeita a prova
ARTIGO 923º
(Primeira modalidade de
venda a contento)
1. A compra e venda feita
sob reserva de a coisa agradar ao comprador vale como proposta de venda.
2. A proposta considera-se
aceita se, entregue a coisa ao comprador, este não se pronunciar dentro do
prazo da aceitação, nos termos do nº 1 do artigo 228º.
3. A coisa deve ser
facultada ao comprador para exame.
ARTIGO 924º
(Segunda modalidade de
venda a contento)
1. Se as partes estiverem
de acordo sobre a resolução da compra e venda no caso de a coisa não agradar ao
comprador, é aplicável ao contrato o disposto nos artigos 432º e seguintes.
2. A entrega da coisa não
impede a resolução do contrato.
3. O vendedor pode fixar um
prazo razoável para a resolução, se nenhum for estabelecido pelo contrato ou,
no silêncio deste, pelos usos.
ARTIGO 925º
(Venda sujeita a prova)
1. A venda sujeita a prova
considera-se feita sob a condição suspensiva de a coisa ser idónea para o fim a
que é destinada e ter as qualidades asseguradas pelo vendedor, excepto se as
partes a subordinarem a condição resolutiva.
2. A prova deve ser feita
dentro do prazo e segundo a modalidade estabelecida pelo contrato ou pelos
usos; se tanto o contrato como os usos forem omissos, observar-se-ão o prazo
fixado pelo vendedor e a modalidade escolhida pelo comprador, desde que sejam
razoáveis.
3. Não sendo o resultado da
prova comunicado ao vendedor antes de expirar o prazo a que se refere o número
antecedente, a condição tem-se por verificada quando suspensiva, e por não
verificada quando resolutiva.
4. A coisa deve ser
facultada ao comprador para prova.
ARTIGO 926º
(Dúvidas sobre a
modalidade da venda)
Em caso de dúvida sobre a
modalidade de venda que as partes escolheram, de entre as previstas nesta
secção, presume-se terem adoptado a primeira.
SECÇÃO VIII
Venda a retro
ARTIGO 927º
(Noção)
Diz-se a retro a venda em
que se reconhece ao vendedor a faculdade de resolver o contrato.
ARTIGO 928º
(Cláusulas nulas)
1. É nula, sem prejuízo da
validade das outras cláusulas, a estipulação de pagamento de dinheiro ao
comprador ou de qualquer outra vantagem para este, como contrapartida da
resolução.
2. É igualmente nula,
quanto ao excesso, a cláusula que declare o vendedor obrigado a restituir, em
caso de resolução, preço superior ao fixado para a venda.
ARTIGO 929º
(Prazo para a resolução)
1. A resolução pode ser
exercida dentro de dois ou cinco anos a contar da venda, conforme esta for de
bens móveis ou imóveis, salvo estipulação de prazo mais curto.
2. Se as partes
convencionarem prazo ou prorrogação de prazo que exceda o limite de dois ou
cinco anos a partir da venda, a convenção considera-se reduzida a esse preciso
limite.
ARTIGO 930º
(Forma da resolução)
A resolução é feita por
meio de notificação judicial ao comprador dentro dos prazos fixados no artigo
antecedente; se respeitar a coisas imóveis, a resolução será reduzida a
escritura pública nos quinze dias imediatos, com ou sem a intervenção do
comprador, sob pena de caducidade do direito.
ARTIGO 931º
(Reembolso do preço e de
despesas)
No silêncio do contrato, a
resolução fica igualmente sem efeito se, dentro do mesmo prazo de quinze dias,
o vendedor não fizer ao comprador oferta real das importâncias líquidas que
haja de pagar-lhe a título de reembolso do preço e das despesas com o contrato
e outras acessórias.
ARTIGO 932º
(Efeitos em relação a
terceiros)
A cláusula a retro é
oponível a terceiros, desde que a venda tenha por objecto coisas imóveis, ou
coisas móveis sujeitas a registo, e tenha sido registada.
ARTIGO 933º
(Venda de coisa ou
direito comum)
Se for vendida coisa ou
direito comum com a cláusula a retro, só em conjunto os vendedores podem
exercer o direito de resolução.
SECÇÃO IX
Venda a prestações
ARTIGO 934º
(Falta de pagamento de
uma prestação)
Vendida a coisa a
prestações, com reserva de propriedade, e feita a sua entrega ao comprador, a
falta de pagamento de uma só prestação que não exceda a oitava parte do preço
não dá lugar à resolução do contrato, nem sequer, haja ou não reserva de
propriedade, importa a perda do benefício do prazo relativamente às prestações
seguintes, sem embargo de convenção em contrário.
ARTIGO 935º
(Cláusula penal no caso
de o comprador não cumprir)
1. A indemnização
estabelecida em cláusula penal, por o comprador não cumprir, não pode
ultrapassar metade do preço, salva a faculdade de as partes estipularem, nos
termos gerais, a ressarcibilidade de todo o prejuízo sofrido.
2. A indemnização fixada
pelas partes será reduzida a metade do preço, quando tenha sido estipulada em
montante superior, ou quando as prestações pagas superem este valor e se tenha
convencionado a não restituição delas; havendo, porém, prejuízo excedente e não
se tendo estipulado a sua ressarcibilidade, será ressarcido até ao limite da
indemnização convencionada pelas partes .
ARTIGO 936º
(Outros contratos com
finalidade equivalente)
1. O disposto nos dois
artigos anteriores é extensivo a todos os contratos pelos quais se pretenda
obter resultado equivalente ao da venda a prestações.
2. Quando se locar uma
coisa, com a cláusula de que se tornará propriedade do locatário depois de
satisfeitas todas as rendas ou alugueres pactuados, a resolução do contrato por
o locatário o não cumprir tem efeito retroactivo, devendo o locador restituir
as importâncias recebidas, sem possibilidade de convenção em contrário, mas
também sem prejuízo do seu direito a indemnização nos termos gerais e nos do
artigo anterior.
SECÇÃO X
Venda sobre documentos
ARTIGO 937º
(Entrega dos documentos)
Na venda sobre documentos,
a entrega da coisa é substituída pela entrega do seu título representativo e
dos outros documentos exigidos pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
ARTIGO 938º
(Venda de coisa em
viagem)
1. Se o contrato tiver por
objecto coisa em viagem e, mencionada esta circunstância, figurar entre os
documentos entregues a apólice de seguro contra os riscos do transporte,
observar-se-ão as regras seguintes, na falta de estipulação em contrário:
a) O preço deve ser pago,
ainda que a coisa já não existisse quando o contrato foi celebrado, por se
haver perdido casualmente depois de ter sido entregue ao transportador;
b) O contrato não é
anulável com fundamento em defeitos da coisa, produzidos casualmente após o
momento da entrega;
c) O risco fica a cargo do
comprador desde a data da compra.
2. As duas primeiras regras
do número anterior não têm aplicação se, ao tempo do contrato, o vendedor já
sabia que a coisa estava perdida ou deteriorada e dolosamente o não revelou ao
comprador de boa fé.
3. Quando o seguro apenas
cobrir parte dos riscos, o disposto neste artigo vale exclusivamente em relação
à parte segurada.
SECÇÃO XI
Outros contratos
onerosos
ARTIGO 939º
(Aplicabilidade das
normas relativas à compra e venda)
As normas da compra e venda
são aplicáveis aos outros contratos onerosos pelos quais se alienam bens ou se
estabeleçam encargos sobre eles, na medida em que sejam conformes com a sua
natureza e não estejam em contradição com as disposições legais respectivas.
CAPÍTULO II
Doação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 940º
(Noção)
1. Doação é o contrato pelo
qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património,
dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em
benefício do outro contraente.
2. Não há doação na
renúncia a direitos e no repúdio de herança ou legado, nem tão-pouco nos
donativos conformes aos usos sociais.
ARTIGO 941º
(Doação remuneratória)
É considerada doação a
liberalidade remuneratória de serviços recebidos pelo doador, que não tenham a
natureza de dívida exigível.
ARTIGO 942º
(Objecto da doação)
1. A doação não pode
abranger bens futuros.
2. Incidindo, porém, a
doação sobre uma universalidade de facto que continue no uso e fruição do
doador, consideram-se doadas, salvo declaração em contrário, as coisas
singulares que venham de futuro a integrar a universalidade.
ARTIGO 943º
(Prestações periódicas)
A doação que tiver por
objecto prestações periódicas extingue-se por morte do doador.
ARTIGO 944º
(Doação conjunta)
1. A doação feita a várias
pessoas conjuntamente considera-se feita por partes iguais, sem que haja
direito de acrescer entre os donatários, salvo se o doador houver declarado o
contrário.
2. O disposto no número
anterior não prejudica o direito de acrescer entre usufrutuários, quando o
usufruto tenha sido constituído por doação.
ARTIGO 945º
(Aceitação da doação)
1. A proposta de doação
caduca, se não for aceita em vida do doador.
2. A tradição para o
donatário, em qualquer momento, da coisa móvel doada, ou do seu título
representativo, é havida como aceitação.
3. Se a proposta não for
aceita no próprio acto ou não se verificar a tradição nos termos do número
anterior, a aceitação deve obedecer à forma prescrita no artigo 947º e ser
declarada ao doador, sob pena de não produzir os seus efeitos.
ARTIGO 946º
(Doação por morte)
1. É proibida a doação por
morte, salvo nos casos especialmente previstos na lei.
2. Será, porém, havida como
disposição testamentária a doação que houver de produzir os seus efeitos por
morte do doador, se tiverem sido observadas as formalidades dos testamentos.
ARTIGO 947º
(Forma da doação)
1. A doação de coisas
imóveis só é válida se for celebrada por escritura pública.
2. A doação de coisas
móveis não depende de formalidade alguma externa, quando acompanhada de
tradição da coisa doada; não sendo acompanhada de tradição da coisa, só pode
ser feita por escrito.
SECÇÃO II
Capacidade para fazer ou
receber doações
ARTIGO 948º
(Capacidade activa)
1. Têm capacidade para
fazer doações todos os que podem contratar e dispor dos seus bens.
2. A capacidade é regulada
pelo estado em que o doador se encontrar ao tempo da declaração negocial.
ARTIGO 949º
(Carácter pessoal da
doação)
1. Não é permitido atribuir
a outrem, por mandato, a faculdade de designar a pessoa do donatário ou
determinar o objecto da doação, salvo nos casos previstos no nº 2 do artigo
2182º.
2. Os representantes legais
dos incapazes não podem fazer doações em nome destes.
ARTIGO 950º
(Capacidade passiva)
1. Podem receber doações
todos os que não estão especialmente inibidos de as aceitar por disposição da
lei.
2. A capacidade do
donatário é fixada no momento da aceitação.
ARTIGO 951º
(Aceitação por parte de
incapazes)
1. As pessoas que não têm
capacidade para contratar não podem aceitar doações com encargos senão por
intermédio dos seus representantes legais.
2. Porém, as doações puras
feitas a tais pessoas produzem efeitos independentemente de aceitação em tudo o
que aproveite aos donatários.
ARTIGO 952º
(Doações a nascituros)
1. Os nascituros concebidos
ou não concebidos podem adquirir por doação, sendo filhos de pessoa determinada,
viva ao tempo da declaração de vontade do doador.
2. Na doação feita a
nascituro presume-se que o doador reserva para si o usufruto dos bens doados
até ao nascimento do donatário.
ARTIGO 953º
(Casos de
indisponibilidade relativa)
É aplicável às doações,
devidamente adaptado, o disposto nos artigos 2192º a 2198º.
SECÇÃO III
Efeitos das doações
ARTIGO 954º
(Efeitos essenciais)
A doação tem como efeitos
essenciais:
a) A transmissão da
propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b) A obrigação de entregar
a coisa;
c) A assunção da obrigação,
quando for esse o objecto do contrato.
ARTIGO 955º
(Entrega da coisa)
1. A coisa deve ser
entregue no estado em que se encontrava ao tempo da aceitação.
2. A obrigação de entrega
abrange, na falta de estipulação em contrário, as partes integrantes, os frutos
pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
ARTIGO 956º
(Doação de bens alheios)
1. É nula a doação de bens
alheios; mas o doador não pode opor a nulidade ao donatário de boa fé.
2. O doador só responde
pelo prejuízo causado ao donatário quando este esteja de boa fé e se verifique
algum dos seguintes factos:
a) Ter o doador assumido
expressamente a obrigação de indemnizar o prejuízo;
b) Ter o doador agido com
dolo;
c) Ter a doação carácter
remuneratório;
d) Ser a doação onerosa ou
modal, ficando a responsabilidade do doador limitada, neste caso, ao valor dos
encargos.
3. É imputável no prejuízo
do donatário o valor da coisa ou do direito doado, mas não os benefícios que
ele deixou de obter em consequência da nulidade.
4. Não havendo lugar a
indemnização, o donatário fica sub-rogado nos direitos que possam competir ao
doador relativamente à coisa ou direito doado.
ARTIGO 957º
(Ónus ou vícios do
direito ou da coisa doada)
1 . O doador não responde
pelos ónus ou limitações do direito transmitido, nem pelos vícios da coisa,
excepto quando se tiver expressamente responsabilizado ou tiver procedido com
dolo.
2. A doação é, porém,
anulável em qualquer caso, a requerimento do donatário de boa fé.
ARTIGO 958º
(Reserva de usufruto)
1. O doador tem a faculdade
de reservar para si, ou para terceiro, o usufruto dos bens doados.
2. Havendo reserva de
usufruto em favor de várias pessoas, simultânea ou sucessivamente, são
aplicáveis as disposições dos artigos 1441º e 1442º.
ARTIGO 959º
(Reserva do direito de
dispor de coisa determinada)
1. O doador pode reservar
para si o direito de dispor, por morte ou por acto entre vivos, de alguma ou
algumas das coisas compreendidas na doação, ou o direito a certa quantia sobre
os bens doados.
2. O direito reservado não
se transmite aos herdeiros do doador, e, quando respeite a imóveis, ou móveis
sujeitos a registo, carece de ser registado.
ARTIGO 960º
(Cláusula de reversão)
1. O doador pode estipular
a reversão da coisa doada.
2. A reversão dá-se no caso
de o doador sobreviver ao donatário, ou a este e a todos os seus descendentes;
não havendo estipulação em contrário, entende-se que a reversão só se verifica
neste último caso.
3. A cláusula de reversão
que respeite a coisas imóveis, ou a coisas móveis sujeitas a registo, carece de
ser registada.
ARTIGO 961º
(Efeitos da reversão)
Os bens doados que pela
cláusula de reversão regressem ao património do doador passam livres dos
encargos que lhes tenham sido impostos enquanto estiverem em poder do donatário
ou de terceiros a quem tenham sido transmitidos.
ARTIGO 962º
(Substituições
fideicomissárias)
1. São admitidas
substituições fideicomissárias nas doações.
2. A estas substituições
são aplicáveis, com as necessárias correcções, os artigos 2286º e seguintes.
ARTIGO 963º
(Cláusulas modais)
1. As doações podem ser
oneradas com encargos.
2. O donatário não é
obrigado a cumprir os encargos senão dentro dos limites do valor da coisa ou do
direito doado.
ARTIGO 964º
(Pagamento de dívidas)
1. Se a doação for feita
com o encargo de pagamento das dívidas do doador, entender-se-á a cláusula, na
falta de outra declaração, como obrigando ao pagamento das que existirem ao
tempo da doação.
2. Só é legal o encargo do
pagamento de dívidas futuras do doador desde que se determine o seu montante no
acto da doação.
ARTIGO 965º
(Cumprimento dos
encargos)
Na doação modal, tanto o
doador, ou os seus herdeiros, como quaisquer interessados têm legitimidade para
exigir do donatário, ou dos seus herdeiros, o cumprimento dos encargos.
ARTIGO 966º
(Resolução da doação)
O doador, ou os seus
herdeiros, também podem pedir a resolução da doação, fundada no não cumprimento
dos encargos, quando esse direito lhes seja conferido pelo contrato.
ARTIGO 967º
(Condições ou encargos
impossíveis ou ilícitos)
As condições ou encargos
física ou legalmente impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou
ofensivos dos bons costumes ficam sujeitos às regras estabelecidas em matéria
testamentária.
ARTIGO 968º
(Confirmação das doações
nulas)
Não pode prevalecer-se da
nulidade da doação o herdeiro do doador que a confirme depois da morte deste ou
lhe dê voluntária execução, conhecendo o vício e o direito à declaração de
nulidade.
SECÇÃO IV
Revogação das doações
ARTIGO 969º
(Revogação da proposta
de doação)
1. Enquanto não for aceita
a doação, o doador pode livremente revogar a sua declaração negocial, desde que
observe as formalidades desta.
2. A proposta de doação não
caduca pelo decurso dos prazos fixados no nº 1 do artigo 228º.
ARTIGO 970º
(Revogação da doação)
As doações são revogáveis
por ingratidão do donatário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGOS 971º A 973º
(Revogados pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 974º
(Casos de ingratidão)
A doação pode ser revogada
por ingratidão, quando o donatário se torne incapaz, por indignidade, de
suceder ao doador, ou quando se verifique alguma das ocorrências que justificam
a deserdação.
ARTIGO 975º
(Exclusão da revogação)
A doação não é revogável
por ingratidão do donatário:
a) Sendo feita para
casamento;
b) Sendo remuneratória;
c) Se o doador houver
perdoado ao donatário.
ARTIGO 976º
(Prazo e legitimidade
para a acção)
1. A acção de revogação por
ingratidão não pode ser proposta, nem depois da morte do donatário, nem pelos
herdeiros do doador, salvo o caso previsto no nº 3 e caduca ao cabo de um ano,
contado desde o facto que lhe deu causa ou desde que o doador teve conhecimento
desse facto.
2. Falecido o doador ou o
donatário, a acção, quando pendente, é transmissível aos herdeiros de um ou de
outro.
3. Se o donatário tiver
cometido contra o doador o crime de homicídio, ou por qualquer causa o tiver
impedido de revogar a doação, a acção pode ser proposta pelos herdeiros do
doador dentro de um ano a contar da morte deste.
ARTIGO 977º
(Inadmissibilidade de
renúncia antecipada)
O doador não pode
antecipadamente renunciar ao direito de revogar a doação por ingratidão do
donatário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 978º
(Efeitos da revogação)
1. Os efeitos da revogação
da doação retrotraem-se à data da proposição da acção.
2. Revogada a liberalidade,
são os bens doados restituídos ao doador, ou aos seus herdeiros, no estado em
que se encontrarem.
3. Se os bens tiverem sido
alienados ou não puderem ser restituídos em espécie por outra causa imputável
ao donatário, entregará este, ou entregarão os seus herdeiros, o valor que eles
tinham ao tempo em que foram alienados ou se verificou a impossibilidade de
restituição, acrescido dos juros legais a contar da proposição da acção.
ARTIGO 979º
(Efeitos em relação a
terceiros)
A revogação da doação não
afecta terceiros que hajam adquirido, anteriormente à demanda, direitos reais
sobre os bens doados, sem prejuízo das regras relativas ao registo; neste caso,
porém, o donatário indemnizará o doador.
CAPÍTULO III
Sociedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 980º
(Noção)
Contrato de sociedade é
aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços
para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera
fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade.
ARTIGO 981º
(Forma)
1. O contrato de sociedade
não está sujeito a forma especial, à excepção da que for exigida pela natureza
dos bens com que os sócios entram para a sociedade.
2. A inobservância da
forma, quando esta for exigida, só anula todo o negócio se este não puder
converter-se segundo o disposto no artigo 293º, de modo que à sociedade fique o
simples uso e fruição dos bens cuja transferência determina a forma especial,
ou se o negócio não puder reduzir-se, nos termos do artigo 292º, às demais
participações.
ARTIGO 982º
(Alterações do contrato)
1. As alterações do
contrato requerem o acordo de todos os sócios, excepto se o próprio contrato o
dispensar.
2. Se o contrato conceder
direitos especiais a algum dos sócios, não podem os direitos concedidos ser
suprimidos ou coarctados sem o assentimento do respectivo titular, salvo
estipulação expressa em contrário.
SECÇÃO II
Relações entre os sócios
ARTIGO 983º
(Entradas)
1. Os sócios estão somente
obrigados às entradas estabelecidas no contrato.
2. As entradas dos sócios
presumem-se iguais em valor, se este não for determinado no contrato.
ARTIGO 984º
(Execução da prestação,
garantia e risco da coisa)
A execução da prestação, a
garantia e o risco da coisa são regulados nos termos seguintes:
a) Se a entrada consistir
na transferência ou constituição de um direito real, pelas normas do contrato
de compra e venda;
b) Se o sócio apenas se
obrigar a facultar à sociedade o uso e fruição de uma coisa, pelas normas do
contrato de locação;
c) Se a entrada consistir
na transferência de um crédito ou de uma posição contratual, pelas normas,
respectivamente, da cessão de créditos ou da cessão da posição contratual,
presumindo-se, todavia, que o sócio garante a solvência do devedor.
ARTIGO 985º
(Administração)
1. Na falta de convenção em
contrário, todos os sócios têm igual poder para administrar.
2. Pertencendo a
administração a todos os sócios ou apenas a alguns deles, qualquer dos
administradores tem o direito de se opor ao acto que outro pretenda realizar,
cabendo à maioria decidir sobre o mérito da oposição.
3. Se o contrato confiar a
administração a todos ou a vários sócios em conjunto, entende-se, em caso de
dúvida, que as deliberações podem ser tomadas por maioria.
4. Salvo estipulação noutro
sentido, considera-se tomada por maioria a deliberação que reúna os sufrágios
de mais de metade dos administradores.
5. Ainda que para a
administração em geral, ou para determinada categoria de actos, seja exigido o
assentimento de todos os administradores, ou da maioria deles, a qualquer dos
administradores é lícito praticar os actos urgentes da administração destinados
a evitar à sociedade um dano iminente.
ARTIGO 986º
(Alteração da
administração)
1. A cláusula do contrato
que atribuir a administração ao sócio pode ser judicialmente revogada, a
requerimento de qualquer outro, ocorrendo justa causa.
2. É permitido incluir no
contrato casos especiais de revogação, mas não é lícito aos interessados
afastar a regra do número anterior.
3. A designação de
administradores feita em acto posterior pode ser revogada por deliberação da
maioria dos sócios, sendo em tudo o mais aplicáveis à revogação as regras do
mandato.
ARTIGO 987º
(Direitos e obrigações
dos administradores)
1. Aos direitos e
obrigações dos administradores são aplicáveis as normas do mandato.
2. Qualquer sócio pode
tornar efectiva a responsabilidade a que está sujeito o administrador.
ARTIGO 988º
(Fiscalização dos
sócios)
1. Nenhum sócio pode ser
privado, nem sequer por cláusula do contrato, do direito de obter dos
administradores as informações de que necessite sobre os negócios da sociedade,
de consultar os documentos a eles pertinentes e de exigir a prestação de
contas.
2. As contas são prestadas
no fim de cada ano civil, salvo se outra coisa for estipulada no contrato, ou
se for inferior a um ano a duração prevista para a sociedade.
ARTIGO 989º
(Uso das coisas sociais)
O sócio não pode, sem
consentimento unânime dos consócios, servir-se das coisas sociais para fins
estranhos à sociedade.
ARTIGO 990º
(Proibição de
concorrência)
O sócio que, sem expressa
autorização de todos os outros, exercer, por conta própria ou alheia,
actividade igual à da sociedade fica responsável pelos danos que lhe causar,
podendo ainda ser excluído, nos termos da alínea a) do artigo 1003º.
ARTIGO 991º
(Distribuição periódica
dos lucros)
Se os contraentes nada
tiverem declarado sobre o destino dos lucros de cada exercício, os sócios têm
direito a que estes lhes sejam atribuídos nos termos fixados no artigo
imediato, depois de deduzidas as quantias afectadas, por deliberação da
maioria, à prossecução dos fins sociais.
ARTIGO 992º
(Distribuição dos lucros
e das perdas)
1. Na falta de convenção em
contrário, os sócios participam nos lucros e perdas da sociedade segundo a
proporção das respectivas entradas.
2. No silêncio do contrato,
os sócios de indústria não respondem, nas relações internas, pelas perdas
sociais.
3. Se o contrato não fixar
o quinhão do sócio de indústria nos lucros nem o valor da sua contribuição,
será o quinhão deste estimado pelo tribunal segundo juízos de equidade; do
mesmo modo se avaliará a parte nos lucros e perdas do sócio que apenas se
obrigou a facultar à sociedade o uso e fruição de uma coisa.
4. Se o contrato determinar
somente a parte de cada sócio nos lucros, presumir-se-á ser a mesma a sua parte
nas perdas.
ARTIGO 993º
(Divisão deferida a
terceiro)
1. Convencionando-se que a
divisão dos ganhos e perdas seja feita por terceiro, deve este fazê-la segundo
juízos de equidade, sempre que não haja estipulação em contrário; se a divisão
não puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo devido, sê-lo-á pelo
tribunal, segundo os mesmos juízos.
2. Qualquer sócio tem o
direito de impugnar a divisão feita por terceiro, no prazo de seis meses a
contar do dia em que ela chegou ao seu conhecimento.
3. Porém, a recepção dos
respectivos lucros extingue o direito à impugnação, salvo se anteriormente se
protestou contra a divisão, ou se, ao tempo do recebimento, eram desconhecidas
as causas da impugnabilidade.
ARTIGO 994º
(Pacto leonino)
É nula a cláusula que
exclui um sócio da comunhão nos lucros ou que o isenta de participar nas perdas
da sociedade, salvo o disposto no nº 2 do artigo 992º.
ARTIGO 995º
(Cessão de quotas)
1. Nenhum sócio pode ceder
a terceiro a sua quota sem consentimento de todos os outros.
2. A cessão de quotas está
sujeita à forma exigida para a transmissão dos bens da sociedade.
SECÇÃO III
Relações com terceiros
ARTIGO 996º
(Representação da
sociedade)
1. A sociedade é
representada em juízo e fora dele pelos seus administradores, nos termos do
contrato ou de harmonia com as regras fixadas no artigo 985º.
2. Quando não estiverem
sujeitas a registo, as deliberações sobre a extinção ou modificação dos poderes
dos administradores não são oponíveis a terceiros que, sem culpa, as ignoravam
ao tempo em que contrataram com a sociedade; considera-se sempre culposa a
ignorância, se à deliberação foi dada a publicidade conveniente.
ARTIGO 997º
(Responsabilidade pelas
obrigações sociais)
1. Pelas dívidas sociais
respondem a sociedade e, pessoal e solidariamente, os sócios.
2. Porém, o sócio demandado
para pagamento dos débitos da sociedade pode exigir a prévia excussão do
património social.
3. A responsabilidade dos
sócios que não sejam administradores pode ser modificada, limitada ou excluída
por cláusula expressa do contrato, excepto no caso de a administração competir
unicamente a terceiras pessoas; se a cláusula não estiver sujeita a registo, é
aplicável, quanto à sua oponibilidade a terceiros, o disposto no nº 2 do artigo
anterior.
4. O sócio não pode
eximir-se à responsabilidade por determinada dívida a pretexto de esta ser
anterior à sua entrada para a sociedade.
ARTIGO 998º
(Resposabilidade por
factos ilícitos)
1. A sociedade responde
civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou
mandatários, nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou
omissões dos seus comissários.
2. Não podendo o lesado
ressarcir-se completamente, nem pelos bens da sociedade, nem pelo património do
representante, agente ou mandatário, ser-lhe-á lícito exigir dos sócios o que
faltar, nos mesmos termos em que o poderia fazer qualquer credor social.
ARTIGO 999º
(Credor particular do
sócio)
1. Enquanto se não
dissolver a sociedade, e sendo suficientes outros bens do devedor, o credor
particular do sócio apenas pode executar o direito deste aos lucros e à quota
de liquidação.
2. Se os outros bens do
devedor forem insuficientes, o credor pode exigir a liquidação da quota do
devedor nos termos do artigo 1021º.
ARTIGO 1000º
(Compensação)
Não é admitida compensação
entre aquilo que um terceiro deve à sociedade e o crédito dele sobre algum dos
sócios, nem entre o que a sociedade deve a terceiro e o crédito que sobre este
tenha algum dos sócios.
SECÇÃO IV
Morte, exoneração ou
exclusão de sócios
ARTIGO 1001º
(Morte de um sócio)
1. Falecendo um sócio, se o
contrato nada estipular em contrário, deve a sociedade liquidar a sua quota em
benefício dos herdeiros; mas os sócios supérstites têm a faculdade de optar
pela dissolução da sociedade, ou pela sua continuação com os herdeiros se
vierem a acordo com eles.
2. A opção pela dissolução
da sociedade só é oponível aos herdeiros do sócio falecido se lhes for
comunicada dentro de sessenta dias, a contar do conhecimento da morte pelos
sócios supérstites.
3. Sendo dissolvida a
sociedade, os herdeiros assumem todos os direitos inerentes, na sociedade em
liquidação, à quota do sócio falecido.
4. Sendo os herdeiros
chamados à sociedade, podem livremente dividir entre si o quinhão do seu
antecessor ou encabeçá-lo em algum ou alguns deles.
ARTIGO 1002º
(Exoneração)
1. Todo o sócio tem o
direito de se exonerar da sociedade, se a duração desta não tiver sido fixada
no contrato; não se considera, para este efeito, fixada no contrato a duração
da sociedade, se esta tiver sido constituída por toda a vida de um sócio ou por
período superior a trinta anos.
2. Havendo fixação de
prazo, o direito de exoneração só pode ser exercido nas condições previstas no
contrato ou quando ocorra justa causa.
3. A exoneração só se torna
efectiva no fim do ano social em que é feita a comunicação respectiva, mas
nunca antes de decorridos três meses sobre esta comunicação.
4. As causas legais de
exoneração não podem ser suprimidas ou modificadas; a supressão ou modificação
das causas contratuais depende do acordo de todos os sócios.
ARTIGO 1003º
(Exclusão)
A exclusão de um sócio pode
dar-se nos casos previstos no contrato, e ainda nos seguintes:
a) Quando lhe seja
imputável violação grave das obrigações para com a sociedade;
b) Em caso de interdição ou
inabilitação;
c) Quando, sendo sócio de
indústria, se impossibilite de prestar à sociedade os serviços a que ficou
obrigado;
d) Quando, por causa não
imputável aos administradores, se verifique o perecimento da coisa ou direito
que constituía a entrada do sócio, nos termos do artigo seguinte.
ARTIGO 1004º
(Perecimento
superveniente da coisa)
O perecimento superveniente
da coisa é fundamento de exclusão do sócio:
a) Se a entrada consistir
na transferência ou constituição de um direito real sobre a coisa e esta
perecer antes da entrega;
b) Se o sócio entrou para a
sociedade apenas com o uso e fruição da coisa perdida.
ARTIGO 1005º
(Deliberação sobre a
exclusão)
1. A exclusão depende do
voto da maioria dos sócios, não incluindo no número destes o sócio em causa, e
produz efeitos decorridos trinta dias sobre a data da respectiva comunicação ao
excluído.
2. O direito de oposição do
sócio excluído caduca decorrido o prazo referido no número anterior.
3. Se a sociedade tiver
apenas dois sócios, a exclusão de qualquer deles só pode ser pronunciada pelo
tribunal.
ARTIGO 1006º
(Eficácia da exoneração
ou exclusão)
1. A exoneração ou exclusão
não isenta o sócio da responsabilidade em face de terceiros pelas obrigações
sociais contraídas até ao momento em que a exoneração ou exclusão produzir os
seus efeitos.
2. A exoneração e a
exclusão que não estejam sujeitas a registo não são oponíveis a terceiros que,
sem culpa, as ignoravam ao tempo em que contrataram com a sociedade;
considera-se sempre culposa a ignorância, se ao acto foi dada a publicidade
conveniente.
SECÇÃO V
Dissolução da sociedade
ARTIGO 1007º
(Causas de dissolução)
A sociedade dissolve-se:
a) Por acordo dos sócios;
b) Pelo decurso do prazo
fixado no contrato, não havendo porrogação;
c) Pela realização do
objecto social, ou por este se tornar impossível;
d) Por se extinguir a
pluralidade dos sócios, se no prazo de seis meses não for reconstituída;
e) Por decisão judicial que
declare a sua insolvência;
f) Por qualquer outra causa
prevista no contrato.
ARTIGO 1008º
(Dissolução por acordo.
Prorrogação do prazo)
1. A dissolução por acordo
depende do voto unânime dos sócios, a não ser que o contrato permita a
modificação das suas cláusulas ou a dissolução da sociedade por simples voto
maioritário.
2. A prorrogação do prazo
fixado no contrato pode ser validamente convencionada até à partilha;
considera-se tacitamente prorrogada a sociedade, por tempo indeterminado, se os
sócios continuaram a exercer a actividade social, salvo se das circunstâncias
resultar que não houve essa intenção.
ARTIGO 1009º
(Poderes dos
administradores depois da dissolução)
1. Dissolvida a sociedade,
os poderes dos administradores ficam limitados à prática dos actos meramente
conservatórios e, no caso de não terem sido nomeados liquidatários, dos actos
necessários à liquidação do património social.
2. Pelas obrigações que os
administradores assumam contra o disposto no número anterior, a sociedade e os
outros sócios só respondem perante terceiros se estes estavam de boa fé ou, no
caso de ser obrigatório o registo da dissolução, se este não tiver sido
efectuado; nos restantes casos, respondem solidariamente os administradores que
tenham assumido aquelas obrigações.
SECÇÃO VI
Liquidação da sociedade
e de quotas
ARTIGO 1010º
(Liquidação da
sociedade)
Dissolvida a sociedade,
procede-se à liquidação do seu património.
ARTIGO 1011º
(Forma da liquidação)
1. Se não estiver fixada no
contrato, a forma da liquidação é regulada pelos sócios; na falta de acordo de
todos, observar-se-ão as disposições dos artigos subsequentes e as das leis de
processo.
2. Se o prazo para a
liquidação não estiver determinado, qualquer sócio ou credor pode requerer a
sua determinação pelo tribunal.
ARTIGO 1012º
(Liquidatários)
1. A liquidação compete aos
administradores.
2. Se o contrato confiar
aos sócios a nomeação dos liquidatários e o acordo se revelar impossível, será
a falta deste suprida pelo tribunal, por iniciativa de qualquer sócio ou
credor.
ARTIGO 1013º
(Posição dos
liquidatários)
1. A posição dos
liquidatários é idêntica à dos administradores, com as modificações constantes
dos artigos seguintes.
2. Salvo acordo dos sócios
em contrário, as decisões dos liquidatários são tomadas por maioria.
ARTIGO 1014º
(Termos iniciais da
liquidação)
1. Se os liquidatários não
forem os administradores, devem exigir destes a entrega dos bens e dos livros e
documentos da sociedade, bem como as contas relativas ao último período de
gestão; na falta de entrega, esta deve ser requerida ao tribunal.
2. É obrigatória a
organização de um inventário que dê a conhecer a situação do património social;
o inventário é elaborado conjuntamente por administradores e liquidatários.
ARTIGO 1015º
(Poderes dos liquidatários)
Cabe aos liquidatários
praticar todos os actos necessários à liquidação do património social,
ultimando os negócios pendentes, cobrando os créditos, alienando os bens e
pagando aos credores.
ARTIGO 1016º
(Pagamento do passivo)
1. É defeso aos liquidatários
proceder à partilha dos bens sociais enquanto não tiverem sido pagos os
credores da sociedade ou consignadas as quantias necessárias.
2. Quando os bens da
sociedade não forem suficientes para liquidação do passivo, os liquidatários
podem exigir dos sócios, além das entradas em dívida, as quantias necessárias,
em proporção da parte de cada um nas perdas e dentro dos limites da respectiva
responsabilidade; se, porém, algum sócio se encontrar insolvente, será a sua
parte dividida pelos demais, nos termos referidos.
ARTIGO 1017º
(Restituição dos bens
atribuídos em uso e fruição)
1. O sócio que tiver
entrado para a sociedade com o uso e fruição de certos bens tem o direito de os
levantar no estado em que se encontrarem.
2. Se os bens se houverem
perdido ou deteriorado por causa imputável aos administradores, são estes e a
sociedade solidariamente responsáveis pelos danos.
ARTIGO 1018º
(Partilha)
1. Extintas as dívidas
sociais, o activo restante é destinado em primeiro lugar ao reembolso das
entradas efectivamente realizadas, exceptuadas as contribuições de serviços e
as de uso e fruição de certos bens.
2. Se não puder ser feito o
reembolso integral, o activo existente é distribuído pelos sócios, por forma
que a diferença para menos recaia em cada um deles na proporção da parte que
lhe competir nas perdas da sociedade; se houver saldo depois de feito o
reembolso, será repartido por eles na proporção da parte que lhes caiba nos
lucros.
3. As entradas que não
sejam de dinheiro são estimadas no valor que tinham à data da constituição da
sociedade, se não lhes tiver sido atribuído outro no contrato.
4. Ainda que o contrato o
não preveja, podem os sócios acordar em que a partilha dos bens se faça em
espécie.
ARTIGO 1019º
(Regresso à actividade
social)
1. Enquanto não se
ultimarem as partilhas, podem os sócios retomar o exercício da actividade
social, desde que o resolvam por unanimidade.
2. Se, porém, a dissolução
tiver resultado de causa imperativa, é necessário que tenham cessado as
circunstâncias que a determinaram.
ARTIGO 1020º
(Responsabilidade dos
sócios após a liquidação)
Encerrada a liquidação e
extinta a sociedade, os antigos sócios continuam responsáveis perante terceiros
pelo pagamento dos débitos que não tenham sido saldados, como se não tivesse
havido liquidação.
ARTIGO 1021º
(Liquidação de quotas)
1. Nos casos de morte,
exoneração ou exclusão de um sócio, o valor da sua quota é fixado com base no
estado da sociedade à data em que ocorreu ou produziu efeitos o facto
determinante da liquidação; se houver negócios em curso, o sócio ou os
herdeiros participarão nos lucros e perdas deles resultantes.
2. Na avaliação da quota
observar-se-ão, com as adaptações necessárias, as regras dos nºs 1 a 3 do
artigo 1018º, na parte em que forem aplicáveis.
3. O pagamento do valor da
liquidação deve ser feito, salvo acordo em contrário, dentro do prazo de seis
meses, a contar do dia em que tiver ocorrido ou produzido efeitos o facto
determinante da liquidação.
CAPÍTULO IV
Locação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1022º
(Noção)
Locação é o contrato pelo
qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma
coisa, mediante retribuição.
ARTIGO 1023º
(Arrendamento e aluguer)
A locação diz-se
arrendamento quando versa sobre coisa imóvel, aluguer quando incide sobre coisa
móvel.
ARTIGO 1024º
(A locação como acto de
administração)
1. A locação constitui,
para o locador, um acto de administração ordinária, excepto quando for
celebrada por prazo superior a seis anos.
2. Porém, o arrendamento de
prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes administradores só se
considera válido quando os restantes comproprietários manifestem, antes ou
depois do contrato, o seu assentimento; se a lei exigir escritura pública para
a celebração do arrendamento, deve o assentimento ser prestado por igual forma.
ARTIGO 1025º
(Duração máxima)
A locação não pode
celebrar-se por mais de trinta anos; quando estipulada por tempo superior, ou
como contrato perpétuo, considera-se reduzida àquele limite.
ARTIGO 1026º
(Prazo supletivo)
Na falta de estipulação,
entende-se que o prazo de duração do contrato é igual à unidade de tempo a que
corresponde a retribuição fixada, salvas as disposições especiais deste código.
ARTIGO 1027º
(Fim do contrato)
Se do contrato e
respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa locada se destina,
é permitido ao locatário aplicá-la a quaisquer fins lícitos, dentro da função
normal das coisas de igual natureza.
ARTIGO 1028º
(Pluralidade de fins)
1. Se uma ou mais coisas
forem locadas para fins diferentes, sem subordinação de uns a outros,
observar-se-á, relativamente a cada um deles, o regime respectivo.
2. As causas de nulidade,
anulabilidade ou resolução que respeitem a um dos fins não afectam a parte
restante da locação, excepto se do contrato ou das circunstâncias que o
acompanham não resultar a discriminação das coisas ou partes da coisa
correspondentes às várias finalidades, ou estas forem solidárias entre si.
3. Se, porém, um dos fins
for principal e os outros subordinados, prevalecerá o regime correspondente ao
fim principal; os outros regimes só são aplicáveis na medida em que não
contrariem o primeiro e a aplicação deles se não mostre incompatível com o fim
principal.
ARTIGO 1029º
(Exigência de escritura
pública)
1. Devem ser reduzidos a escritura
pública:
a) Os arrendamentos
sujeitos a registo;
b) Os arrendamentos para o
comércio, indústria ou exercício de profissão liberal.
2. No caso da alínea a) do
número anterior, a falta de escritura pública ou do registo não impede que o
contrato se considere validamente celebrado e plenamente eficaz pelo prazo
máximo por que o poderia ser sem a exigência de escritura e de registo.
(Redacção do Dec.-Lei
321-B/90, de 15-10)
ARTIGO 1030º
(Encargos da coisa
locada)
Os encargos da coisa
locada, sem embargo de estipulação em contrário, recaem sobre o locador, a não
ser que a lei os imponha ao locatário.
SECÇÃO II
Obrigações do locador
ARTIGO 1031º
(Enumeração)
São obrigações do locador:
a) Entregar ao locatário a
coisa locada;
b) Assegurar-lhe o gozo
desta para os fins a que a coisa se destina.
ARTIGO 1032º
(Vício da coisa locada)
Quando a coisa locada
apresentar vício que lhe não permita realizar cabalmente o fim a que é
destinada, ou carecer de qualidades necessárias a esse fim ou asseguradas pelo
locador, considera-se o contrato não cumprido:
a) Se o defeito datar, pelo
menos, do momento da entrega e o locador não provar que o desconhecia sem
culpa;
b) Se o defeito surgir
posteriormente à entrega, por culpa do locador.
ARTIGO 1033º
(Casos de irresponsabilidade
do locador)
O disposto no artigo
anterior não é aplicável:
a) Se o locatário conhecia
o defeito quando celebrou o contrato ou recebeu a coisa;
b) Se o defeito já existia
ao tempo da celebração do contrato e era facilmente reconhecível, a não ser que
o locador tenha assegurado a sua inexistência ou usado de dolo para o ocultar;
c) Se o defeito for da
responsabilidade do locatário;
d) Se este não avisou do
defeito o locador, como lhe cumpria.
ARTIGO 1034º
(Ilegitimidade do
locador ou deficiência do seu direito)
1. São aplicáveis as
disposições dos dois artigos anteriores:
a) Se o locador não tiver a
faculdade de proporcionar a outrem o gozo da coisa locada;
b) Se o seu direito não for
de propriedade ou estiver sujeito a algum ónus ou limitação que exceda os
limites normais inerentes a este direito;
c) Se o direito do locador
não possuir os atributos que ele assegurou ou estes atributos cessarem
posteriormente por culpa dele.
2. As circunstâncias
descritas no número antecedente só importam a falta de cumprimento do contrato
quando determinarem a privação, definitiva ou temporária, do gozo da coisa ou a
diminuição dele por parte do locatário.
ARTIGO 1035º
(Anulabilidade por erro
ou dolo)
O disposto nos artigos
1032º e 1034º não obsta à anulação do contrato por erro ou por dolo, nos termos
gerais.
ARTIGO 1036º
(Reparações ou outras
despesas urgentes)
1. Se o locador estiver em
mora quanto à obrigação de fazer reparações ou outras despesas, e umas ou
outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as delongas do procedimento
judicial, tem o locatário a possibilidade de fazê-las extrajudicialmente, com
direito ao seu reembolso.
2. Quando a urgência não
consinta qualquer dilação, o locatário pode fazer as reparações ou despesas,
também com direito a reembolso, independentemente de mora do locador, contanto
que o avise ao mesmo tempo.
ARTIGO 1037º
(Actos que impedem ou
diminuem o gozo da coisa)
1. Não obstante convenção
em contrário, o locador não pode praticar actos que impeçam ou diminuam o gozo
da coisa pelo locatário, com excepção dos que a lei ou os usos facultem ou o
próprio locatário consinta em cada caso, mas não tem obrigação de assegurar
esse gozo contra actos de terceiro.
2. O locatário que for
privado da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo
contra o locador, dos meios facultados ao possuidor nos artigos 1276º e
seguintes.
SECÇÃO III
Obrigações do locatário
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1038º
(Enumeração)
São obrigações do
locatário:
a) Pagar a renda ou
aluguer;
b) Facultar ao locador o
exame da coisa locada;
c) Não aplicar a coisa a
fim diverso daqueles a que ela se destina;
d) Não fazer dela uma
utilização imprudente;
e) Tolerar as reparações
urgentes, bem como quaisquer obras ordenadas pela autoridade pública;
f) Não proporcionar a
outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão onerosa ou gratuita
da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se a lei o permitir ou
o locador o autorizar;
g) Comunicar ao locador,
dentro de quinze dias, a cedência do gozo da coisa por algum dos referidos
títulos, quando permitida ou autorizada;
h) Avisar imediatamente o
locador, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa, ou saiba que a
ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos em relação a ela,
desde que o facto seja ignorado pelo locador;
i) Restituir a coisa locada
findo o contrato.
SUBSECÇÃO II
Pagamento da renda ou
aluguer
ARTIGO 1039º
(Tempo e lugar do
pagamento)
1. O pagamento da renda ou
aluguer deve ser efectuado no último dia de vigência do contrato ou do período
a que respeita, e no domicílio do locatário à data do vencimento, se as partes
ou os usos não fixarem outro regime.
2. Se a renda ou aluguer
houver de ser pago no domicílio, geral ou particular, do locatário ou de
procurador seu, e o pagamento não tiver sido efectuado, presume-se que o
locador não veio nem mandou receber a prestação no dia do vencimento.
ARTIGO 1040º
(Redução da renda ou
aluguer)
1. Se, por motivo não
atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário sofrer privação ou
diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma redução da renda ou
aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta, sem
prejuízo do disposto na secção anterior.
2. Mas, se a privação ou
diminuição não for imputável ao locador nem aos seus familiares, a redução só
terá lugar no caso de uma ou outra exceder um sexto da duração do contrato.
3. Consideram-se familiares
os parentes, afins ou serviçais que vivam habitualmente em comunhão de mesa e
habitação com o locatário ou o locador.
ARTIGO 1041º
(Mora do locatário)
1. Constituindo-se o
locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou
alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido, salvo se o
contrato for resolvido com base na falta de pagamento.
2. Cessa o direito à
indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer cessar a mora no
prazo de oito dias a contar do seu começo.
3. Enquanto não forem
cumpridas as obrigações a que o nº 1 se refere, o locador tem o direito de
recusar o recebimento das rendas ou alugueres seguintes, os quais são
considerados em dívida para todos os efeitos.
4. A recepção de novas
rendas ou alugueres não priva o locador do direito à resolução do contrato ou à
indemnização referida, com base nas prestações em mora.
(Redacção do Dec.-Lei
293/77, de 20-7)
ARTIGO 1042º
(Depósito das rendas ou
alugueres em atraso)
1. Se o locatário depositar
as rendas ou alugueres em atraso, bem como a indemnização fixada no nº 1 do
artigo anterior, quando devida, e requerer dentro de cinco dias a notificação
judicial do depósito ao locador, presume-se que lhe ofereceu o pagamento
respectivo, pondo fim à mora, e que este o recusou.
2. O depósito, quando
abranja a indemnização, envolve da parte do locatário o reconhecimento de que
caíra em mora, salvo se for feito condicionalmente; mas este preceito não se
aplica à oferta do pagamento.
SUBSECÇÃO III
Restituição da coisa
locada
ARTIGO 1043º
(Dever de manutenção e
restituição da coisa)
1. Na falta de convenção, o
locatário é obrigado a manter e restituir a coisa no estado em que a recebeu,
ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em
conformidade com os fins do contrato.
2. Presume-se que a coisa
foi entregue ao locatário em bom estado de manutenção, quando não exista
documento onde as partes tenham descrito o estado dela ao tempo da entrega.
ARTIGO 1044º
(Perda ou deterioração
da coisa)
O locatário responde pela
perda ou deteriorações da coisa, não exceptuadas no artigo anterior, salvo se
resultarem de causa que lhe não seja imputável nem a terceiro a quem tenha
permitido a utilização dela.
ARTIGO 1045º
(Indemnização pelo
atraso na restituição da coisa)
1. Se a coisa locada não
for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é
obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a
renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento
para consignar em depósito a coisa devida.
2. Logo, porém, que o
locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro.
ARTIGO 1046º
(Indemnização de
despesas e levantamento de benfeitorias)
1. Fora dos casos previstos
no artigo 1036º, e salvo estipulação em contrário, o locatário é equiparado ao
possuidor de má fé quanto a benfeitorias que haja feito na coisa locada.
2. Tratando-se de aluguer
de animais, as despesas de alimentação destes correm sempre, na falta de
estipulação em contrário, por conta do locatário.
SECÇÃO IV
Resolução e caducidade
do contrato
SUBSECÇÃO I
Resolução
ARTIGO 1047º
(Falta de cumprimento
por parte do locatário)
A resolução do contrato
fundada na falta de cumprimento por parte do locatário tem de ser decretada
pelo tribunal.
ARTIGO 1048º
(Falta de pagamento da
renda ou aluguer)
O direito à resolução do
contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer caduca logo que o
locatário, até à contestação da acção destinada a fazer valer esse direito,
pague ou deposite as somas devidas e a indemnização referida no nº 1 do artigo
1041º.
ARTIGO 1049º
(Cedência do gozo da
coisa)
O locador não tem direito à
resolução do contrato com fundamento na violação do disposto nas alíneas f) e
g) do artigo 1038º, se tiver reconhecido o beneficiário da cedência como tal,
ou ainda, no caso da alínea g), se a comunicação lhe tiver sido feita por este.
ARTIGO 1050º
(Resolução do contrato
pelo locatário)
O locatário pode resolver o
contrato, independentemente de responsabilidade do locador:
a) Se, por motivo estranho
à sua própria pessoa ou à dos seus familiares, for privado do gozo da coisa,
ainda que só temporariamente;
b) Se na coisa locada
existir ou sobrevier defeito que ponha em perigo a vida ou a saúde do locatário
ou dos seus familiares.
SUBSECÇÃO II
Caducidade
ARTIGO 1051º
(Casos de caducidade)
1. O contrato de locação
caduca:
a) Findo o prazo estipulado
ou estabelecido por lei;
b) Verificando-se a
condição a que as partes o subordinaram, ou tornando-se certo que não pode
verificar-se, conforme a condição seja resolutiva ou suspensiva;
c) Quando cesse o direito
ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi
celebrado;
d) Por morte do locatário
ou, tratando-se de pessoa colectiva, pela extinção desta, salvo convenção
escrita em contrário;
e) Pela perda da coisa
locada;
f) No caso de expropriação
por utilidade pública, a não ser que a expropriação se compadeça com a
subsistência do contrato.
(Redacção do Dec.-Lei
321-B/90, de 15-10)
ARTIGO 1052º
(Excepções)
O contrato de locação não
caduca:
a) Se for celebrado pelo
usufrutuário e a propriedade se consolidar na sua mão;
b) Se o usufrutuário
alienar o seu direito ou renunciar a ele, pois nestes casos o contrato só
caduca pelo termo normal do usfruto;
c) Se for celebrado pelo
cônjuge administrador.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1053º
(Despejo do prédio)
Em qualquer dos casos de
caducidade previstos nas alíneas b) e seguintes do artigo 1051º, a restituição
do prédio, tratando-se de arrendamento, só pode ser exigida passados três meses
sobre a verificação do facto que determina a caducidade ou, sendo o
arrendamento rural, no fim do ano agrícola em curso no termo do referido prazo.
ARTIGO 1054º
(Renovação do contrato)
1. Findo o prazo do
arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos, se nenhuma das
partes o tiver denunciado no tempo e pela forma convencionados ou designados na
lei.
2. O prazo da renovação é
igual ao do contrato; mas é apenas de um ano, se o prazo do contrato for mais
longo.
ARTIGO 1055º
(Denúncia)
1. A denúncia tem de ser
comunicada ao outro contraente com a antecedência mínima seguinte:
a) Seis meses, se o prazo
for igual ou superior a seis anos;
b) Sessenta dias, se o
prazo for de um a seis anos;
c) Trinta dias, quando o
prazo for de três meses a um ano;
d) Um terço do prazo,
quando este for inferior a três meses.
2. A antecedência a que se
refere o número anterior reporta-se ao fim do prazo do contrato ou da
renovação.
ARTIGO 1056º
(Outra causa de
renovação)
Se, não obstante a
caducidade do arrendamento, o locatário se mantiver no gozo da coisa pelo lapso
de um ano, sem oposição do locador, o contrato considera-se igualmente renovado
nas condições do artigo 1054º.
SECÇÃO V
Transmissão da posição
contratual
ARTIGO 1057º
(Transmissão da posição
do locador)
O adquirente do direito com
base no qual foi celebrado o contrato sucede nos direitos e obrigações do
locador, sem prejuízo das regras do registo.
ARTIGO 1058º
(Liberação ou cessão de
rendas ou alugueres)
A liberação ou cessão de
rendas ou alugueres não vencidos é inoponível ao sucessor entre vivos do locador,
na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a períodos de tempo não
decorridos à data da sucessão.
ARTIGO 1059º
(Transmissão da posição
do locatário)
1. A posição contratual do
locatário é transmissível por morte dele ou, tratando-se de pessoa colectiva,
pela extinção desta, se assim tiver sido convencionado por escrito.
2. A cessão da posição do
locatário está sujeita ao regime geral dos artigos 424º e seguintes, sem
prejuízo das disposições especiais deste capítulo.
SECÇÃO VI
Sublocação
ARTIGO 1060º
(Noção)
A locação diz-se
sublocação, quando o locador a celebra com base no direito de locatário que lhe
advém de um precedente contrato locativo.
ARTIGO 1061º
(Efeitos)
A sublocação só produz
efeitos em relação ao locador ou a terceiros a partir do seu reconhecimento
pelo locador ou da comunicação a que se refere a alínea g) do artigo 1038º.
ARTIGO 1062º
(Limite da renda ou
aluguer)
O locatário não pode cobrar
do sublocatário renda ou aluguer superior ou proporcionalmente superior ao que
é devido pelo contrato de locação, aumentado de vinte por cento, salvo se outra
coisa tiver sido convencionada com o locador.
ARTIGO 1063º
(Direitos do locador em
relação ao sublocatário)
Se tanto o locatário como o
sublocatário estiverem em mora quanto às respectivas dívidas de renda ou
aluguer, é lícito ao locador exigir do sublocatário o que este dever, até ao
montante do seu próprio crédito.
SECÇÃO VII
Arrendamento rural
ARTIGOS 1064º A 1082º
(Revogados pelo Dec.-Lei
201/75, de 15-4)
SECÇÃO VIII
Arrendamento de prédios
urbanos e arrendamento de prédios rústicos não abrangidos na secção precedente
ARTIGOS 1083º A 1120º
(Revogados pelo Dec.-Lei
321-B/90, de 15-10)
CAPÍTULO V
Parceria pecuária
ARTIGO 1121º
(Noção)
Parceria pecuária é o
contrato pelo qual uma ou mais pessoas entregam a outra ou outras um animal ou
certo número deles, para estas os criarem, pensarem e vigiarem, com o ajuste de
repartirem entre si os lucros futuros em certa proporção.
ARTIGO 1122º
(Prazo)
1. Na falta de convenção
quanto a prazo, atender-se-á aos usos da terra; na falta de usos, qualquer dos
contraentes pode, a todo o tempo, fazer caducar a parceria.
2. A existência de prazo
não impede que o contraente resolva o contrato, se a outra parte não cumprir as
suas obrigações.
ARTIGO 1123º
(Caducidade)
A parceria caduca pela
morte do parceiro pensador ou pela perda dos animais, e também quando cesse o
direito ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o
contrato foi celebrado, ou quando se verifique a condição resolutiva a que as
partes o subordinaram.
ARTIGO 1124º
(Obrigações do parceiro
pensador)
O parceiro pensador é
obrigado a empregar na guarda e tratamento dos animais o cuidado de um pensador
diligente.
ARTIGO 1125º
(Utilização dos animais)
1. O parceiro proprietário
é obrigado a assegurar a utilização dos animais ao parceiro pensador.
2. O parceiro pensador que
for privado dos seus direitos ou perturbado no exercício deles pode usar, mesmo
contra o parceiro proprietário, dos meios facultados ao possuidor nos artigos
1276º e seguintes.
ARTIGO 1126º
(Risco)
1. Se os animais perecerem,
se inutilizarem ou diminuírem de valor, por facto não imputável ao parceiro
pensador, o risco corre por conta do proprietário.
2. Se, porém, algum
proveito se puder tirar dos animais que pereceram ou se inutilizaram, pertence
o benefício ao proprietário até ao valor deles no momento da entrega.
3. As regras dos números
anteriores são imperativas.
ARTIGO 1127º
(Tosquia de gado
lanígero)
O parceiro pensador de gado
lanígero não pode fazer a tosquia sem que previna o parceiro proprietário; se o
não prevenir, pagará em dobro o valor da parte que deveria pertencer ao
proprietário.
ARTIGO 1128º
(Regime subsidiário)
Em tudo o que não estiver
estabelecido nos artigos precedentes devem ser observados, na falta de
convenção, os usos da terra.
CAPÍTULO VI
Comodato
ARTIGO 1129º
(Noção)
Comodato é o contrato
gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel ou imóvel,
para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir.
ARTIGO 1130º
(Comodato fundado num
direito temporário)
1. Se o comodante emprestar
a coisa com base num direito de duração limitada, não pode o contrato ser
celebrado por tempo superior; e, quando o seja, reduzir-se-á ao limite de
duração desse direito.
2. É aplicável ao comodato
constituído pelo usufrutuário o disposto nas alíneas a) e b) do artigo 1052º.
ARTIGO 1131º
(Fim do contrato)
Se do contrato e
respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa emprestada se
destina, é permitido ao comodatário aplicá-la a quaisquer fins lícitos, dentro
da função normal das coisas de igual natureza.
ARTIGO 1132º
(Frutos da coisa)
Só por força de convenção
expressa o comodatário pode fazer seus os frutos colhidos.
ARTIGO 1133º
(Actos que impedem ou
diminuem o uso da coisa)
1. O comodante deve
abster-se de actos que impeçam ou restrinjam o uso da coisa pelo comodatário,
mas não é obrigado a assegurar-lhe esse uso.
2. Se este for privado dos
seus direitos ou perturbado no exercício deles, pode usar, mesmo contra o
comodante, dos meios facultados ao possuidor nos artigos 1276º e seguintes.
ARTIGO 1134º
(Responsabilidade do
comodante)
O comodante não responde
pelos vícios ou limitações do direito nem pelos vícios da coisa, excepto quando
se tiver expressamente responsabilizado ou tiver procedido com dolo.
ARTIGO 1135º
(Obrigações do
comodatário)
São obrigações do
comodatário:
a) Guardar e conservar a
coisa emprestada;
b) Facultar ao comodante o
exame dela;
c) Não a aplicar a fim
diverso daquele a que a coisa se destina;
d) Não fazer dela uma
utilização imprudente;
e) Tolerar quaisquer
benfeitorias que o comodante queira realizar na coisa;
f) Não proporcionar a
terceiro o uso da coisa, excepto se o comodante o autorizar;
g) Avisar imediantamente o
comodante, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa ou saiba que a
ameaça algum perigo ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde
que o facto seja ignorado do comodante;
h) Restituir a coisa findo
o contrato.
ARTIGO 1136º
(Perda ou deterioração
da coisa)
1. Quando a coisa
emprestada perecer ou se deteriorar casualmente, o comodatário é responsável,
se estava no seu poder tê-lo evitado, ainda que mediante o sacrifício de coisa
própria de valor não superior.
2. Quando, porém, o
comodatário a tiver aplicado a fim diverso daquele a que a coisa se destina, ou
tiver consentido que terceiro a use sem para isso estar autorizado, será
responsável pela perda ou deterioração, salvo provando que ela teria igualmente
ocorrido sem a sua conduta ilegal.
3. Sendo avaliada a coisa
ao tempo do contrato, presume-se que a responsabilidade ficou a cargo do
comodatário, embora este não pudesse evitar o prejuízo pelo sacrifício de coisa
própria.
ARTIGO 1137º
(Restituição)
1. Se os contraentes não
convencionaram prazo certo para a restituição da coisa, mas esta foi emprestada
para uso determinado, o comodatário deve restituí-la ao comodante logo que o
uso finde, independentemente de interpelação.
2. Se não foi convencionado
prazo para a restituição nem determinado o uso da coisa, o comodatário é obrigado
a restituí-la logo que lhe seja exigida.
3. É aplicável à manutenção
e restituição da coisa emprestada o disposto no artigo 1043º.
ARTIGO 1138º
(Benfeitorias)
1. O comodatário é
equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de má fé.
2. Tratando-se de
empréstimo de animais, as despesas de alimentação destes correm, salvo
estipulação em contrário, por conta do comodatário.
ARTIGO 1139º
(Solidariedade dos
comodatários)
Sendo dois ou mais os
comodatários, são solidárias as suas obrigações.
ARTIGO 1140º
(Resolução)
Não obstante a existência
de prazo, o comodante pode resolver o contrato, se para isso tiver justa causa.
ARTIGO 1141º
(Caducidade)
O contrato caduca pela
morte do comodatário.
CAPÍTULO VII
Mútuo
ARTIGO 1142º
(Noção)
Mútuo é o contrato pelo qual
uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a
segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
ARTIGO 1143º
(Forma)
O contrato de mútuo de
valor superior a 3 000 000$ só é válido se for celebrado por escritura pública
e o de valor superior a 200 000$ se o for por documento assinado pelo mutuário.
(Redacção do Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1144º
(Propriedade das coisas
mutuadas)
As coisas mutuadas
tornam-se propriedade do mutuário pelo facto da entrega.
ARTIGO 1145º
(Gratuidade ou
onerosidade do mútuo)
1. As partes podem
convencionar o pagamento de juros como retribuição do mútuo; este presume-se
oneroso em caso de dúvida.
2. Ainda que o mútuo não
verse sobre dinheiro, observar-se-á, relativamente a juros, o disposto no
artigo 559º e, havendo mora do mutuário, o disposto no artigo 806º.
ARTIGO 1146º
(Usura)
1. É havido como usurário o
contrato de mútuo em que sejam estipulados juros anuais que excedam os juros
legais, acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou não garantia real.
2. É havida também como
usurária a cláusula penal que fixar como indemnização devida pela falta de
restituição de empréstimo, relativamente ao tempo de mora, mais do que o
correspondente a 7% ou a 9% acima dos juros legais, conforme exista ou não
garantia real.
3. Se a taxa de juros
estipulada ou o montante da indemnização exceder o máximo fixado nos números
precedentes, considera-se reduzido a esses máximos, ainda que seja outra a
vontade dos contraentes.
4. O respeito dos limites
máximos referidos neste artigo não obsta à aplicabilidade dos artigos 282º a
284º.
(Redacção do Dec.-Lei
262/83, de 16-6)
ARTIGO 1147º
(Prazo no mútuo oneroso)
No mútuo oneroso o prazo
presume-se estipulado a favor de ambas as partes, mas o mutuário pode antecipar
o pagamento, desde que satisfaça os juros por inteiro.
ARTIGO 1148º
(Falta de fixação de
prazo)
1. Na falta de estipulação
de prazo, a obrigação do mutuário, tratando-se de mútuo gratuito, só se vence
trinta dias após a exigência do seu cumprimento.
2. Se o mútuo for oneroso e
não se tiver fixado prazo, qualquer das partes pode pôr termo ao contrato,
desde que o denuncie com uma antecipação mínima de trinta dias.
3. Tratando-se, porém, de
empréstimo, gratuito ou oneroso, de cereais ou outros produtos rurais a favor
de lavrador, presume-se feito até à colheita seguinte dos produtos semelhantes.
4. A doutrina do número
anterior é aplicável aos mutuários que, não sendo lavradores, recolhem pelo
arrendamento de terras próprias frutos semelhantes aos que receberam de
empréstimo.
ARTIGO 1149º
(Impossibilidade de
restituição)
Se o mútuo recair em coisa
que não seja dinheiro e a restituição se tornar impossível ou extremamente
difícil por causa não imputável ao mutuário, pagará este o valor que a coisa
tiver no momento e lugar do vencimento da obrigação.
ARTIGO 1150º
(Resolução do contrato)
O mutuante pode resolver o
contrato, se o mutuário não pagar os juros no seu vencimento.
ARTIGO 1151º
(Responsabilidade do
mutuante)
É aplicável à
responsabilidade do mutuante, no mútuo gratuito, o disposto no artigo 1134º.
CAPÍTULO VIII
Contrato de trabalho
ARTIGO 1152º
(Noção)
Contrato de trabalho é
aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua
actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção
desta.
ARTIGO 1153º
(Regime)
O contrato de trabalho está
sujeito a legislação especial.
CAPÍTULO IX
Prestação de serviço
ARTIGO 1154º
(Noção)
Contrato de prestação de
serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo
resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
ARTIGO 1155º
(Modalidades do
contrato)
O mandato, o depósito e a
empreitada, regulados nos capítulos subsequentes, são modalidades do contrato
de prestação de serviço.
ARTIGO 1156º
(Regime)
As disposições sobre o
mandato são extensivas, com as necessárias adaptações, às modalidades do
contrato de prestação de serviço que a lei não regule especialmente.
CAPÍTULO X
Mandato
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1157º
(Noção)
Mandato é o contrato pelo
qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta
da outra.
ARTIGO 1158º
(Gratuidade ou
onerosidade do mandato)
1. O mandato presume-se
gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por
profissão; neste caso, presume-se oneroso.
2. Se o mandato for
oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é
determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na
falta de umas e outros, por juízos de equidade.
ARTIGO 1159º
(Extensão do mandato)
1. O mandato geral só
compreende os actos de administração ordinária.
2. O mandato especial
abrange, além dos actos nele referidos, todos os demais necessários à sua
execução.
ARTIGO 1160º
(Pluralidade de
mandatos)
Se alguém incumbir duas ou
mais pessoas da prática dos mesmos actos jurídicos, haverá tantos mandatos
quantas as pessoas designadas, salvo se o mandante declarar que devem agir
conjuntamente.
SECÇÃO II
Direitos e obrigações do
mandatário
ARTIGO 1161º
(Obrigações do
mandatário)
O mandatário é obrigado:
a) A praticar os actos
compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante;
b) A prestar as informações
que este lhe peça, relativas ao estado da gestão;
c) A comunicar ao mandante,
com prontidão, a execução do mandato ou, se o não tiver executado, a razão por
que assim procedeu;
d) A prestar contas, findo
o mandato ou quando o mandante as exigir;
e) A entregar ao mandante o
que recebeu em execução do mandato ou no exercício deste, se o não despendeu
normalmente no cumprimento do contrato.
ARTIGO 1162º
(Inexecução do mandato
ou a inobservância das instruções)
O mandatário pode deixar de
executar o mandato ou afastar-se das instruções recebidas, quando seja razoável
supor que o mandante aprovaria a sua conduta, se conhecesse certas
circunstâncias que não foi possível comunicar-lhe em tempo útil.
ARTIGO 1163º
(Aprovação tácita da
execução ou inexecução do mandato)
Comunicada a execução ou
inexecução do mandato, o silêncio do mandante por tempo superior àquele em que
teria de pronunciar-se, segundo os usos ou, na falta destes, de acordo com a
natureza do assunto, vale como aprovação da conduta do mandatário, ainda que
este haja excedido os limites do mandato ou desrespeitado as instruções do mandante,
salvo acordo em contrário.
ARTIGO 1164º
(Juros devidos pelo
mandatário)
O mandatário deve pagar ao
mandante os juros legais correspondentes às quantias que recebeu dele ou por
conta dele, a partir do momento em que devia entregar-lhas, ou remeter-lhas, ou
aplicá-las segundo as suas instruções.
ARTIGO 1165º
(Substituto e auxiliares
do mandatário)
O mandatário pode, na
execução do mandato, fazer-se substituir por outrem ou servir-se de auxiliares,
nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.
ARTIGO 1166º
(Pluralidade de
mandatários)
Havendo dois ou mais
mandatários com o dever de agirem conjuntamente, responderá cada um deles pelos
seus actos, se outro regime não tiver sido convencionado.
SECÇÃO III
Obrigações do mandante
ARTIGO 1167º
(Enumeração)
O mandante é obrigado:
a) A fornecer ao mandatário
os meios necessários à execução do mandato, se outra coisa não foi
convencionada;
b) A pagar-lhe a
retribuição que ao caso competir, e fazer-lhe provisão por conta dela segundo
os usos;
c) A reembolsar o mandatário
das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com
juros legais desde que foram efectuadas;
d) A indemnizá-lo do
prejuízo sofrido em consequência do mandato, ainda que o mandante tenha
procedido sem culpa.
ARTIGO 1168º
(Suspensão da execução
do mandato)
O mandatário pode abster-se
da execução do mandato enquanto o mandante estiver em mora quanto à obrigação
expressa na alínea a) do artigo anterior.
ARTIGO 1169º
(Pluralidade de
mandantes)
Sendo dois ou mais os
mandantes, as suas obrigações para com o madatário são solidárias, se o mandato
tiver sido conferido para assunto de interesse comum.
SECÇÃO IV
Revogação e caducidade
do mandato
SUBSECÇÃO I
Revogação
ARTIGO 1170º
(Revogabilidade do
mandato)
1. O mandato é livremente
revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou
renúncia ao direito de revogação.
2. Se, porém, o mandato
tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, não pode
ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa
causa.
ARTIGO 1171º
(Revogação tácita)
A designação de outra
pessoa, por parte do mandante, para a prática dos mesmos actos implica
revogação do mandato, mas só produz este efeito depois de ser conhecida pelo
mandatário.
ARTIGO 1172º
(Obrigação de
indemnização)
A parte que revogar o
contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta sofrer:
a) Se assim tiver sido
convencionado;
b) Se tiver sido estipulada
a irrevogabilidade ou tiver havido renúncia ao direito de revogação;
c) Se a revogação proceder
do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que o mandato tenha sido
conferido por certo tempo ou para determinado assunto, ou que o mandante o
revogue sem a antecedência conveniente;
d) Se a revogação proceder
do mandatário e não tiver sido realizada com a antecedência conveniente.
ARTIGO 1173º
(Mandato colectivo)
Sendo o mandato conferido
por várias pessoas e para assunto de interesse comum, a revogação só produz
efeito se for realizada por todos os mandantes.
SUBSECÇÃO II
Caducidade
ARTIGO 1174º
(Casos de caducidade)
O mandato caduca:
a) Por morte ou interdição
do mandante ou do mandatário;
b) Por inabilitação do
mandante, se o mandato tiver por objecto actos que não possam ser praticados
sem intervenção do curador.
ARTIGO 1175º
(Morte, interdição ou
inabilitação do mandante)
A morte, interdição ou
inabilitação do mandante não faz caducar o mandato, quando este tenha sido
conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro; nos outros casos,
só o faz caducar a partir do momento em que seja conhecida do mandatário, ou
quando da caducidade não possam resultar prejuízos para o mandante ou seus
herdeiros.
ARTIGO 1176º
(Morte, interdição ou
incapacidade natural do mandatário)
1. Caducando o mandato por
morte ou interdição do mandatário, os seus herdeiros devem prevenir o mandante
e tomar as providências adequadas, até que ele próprio esteja em condições de
providenciar.
2. Idêntica obrigação recai
sobre as pessoas que convivam com o mandatário, no caso de incapacidade natural
deste.
ARTIGO 1177º
(Pluralidade de
mandatários)
Se houver vários
mandatários com obrigação de agir conjuntamente, o mandato caduca em relação a
todos, embora a causa de caducidade respeite apenas a um deles, salvo convenção
em contrário.
SECÇÃO V
Mandato com
representação
ARTIGO 1178º
(Mandatário com poderes
de representação)
1. Se o mandatário for
representante, por ter recebido poderes para agir em nome do mandante, é também
aplicável ao mandato o disposto nos artigos 258º e seguintes.
2. O mandatário a quem
hajam sido conferidos poderes de representação tem o dever de agir não só por
conta, mas em nome do mandante, a não ser que outra coisa tenha sido
estipulada.
ARTIGO 1179º
(Revogação ou renúncia
da procuração)
A revogação e a renúncia da
procuração implicam revogação do mandato.
SECÇÃO VI
Mandato sem
representação
ARTIGO 1180º
(Mandatário que age em
nome próprio)
O mandatário, se agir em
nome próprio, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes dos actos
que celebra, embora o mandato seja conhecido dos terceiros que participem nos
actos ou sejam destinatários destes.
ARTIGO 1181º
(Direitos adquiridos em
execução do mandato)
1. O mandatário é obrigado
a transferir para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato.
2. Relativamente aos
créditos, o mandante pode substituir-se ao mandatário no exercício dos
respectivos direitos.
ARTIGO 1182º
(Obrigações contraídas
em execução do mandato)
O mandante deve assumir,
por qualquer das formas indicadas no nº 1 do artigo 595º, as obrigações
contraídas pelo mandatário em execução do mandato; se não puder fazê-lo, deve
entregar ao mandatário os meios necessários para as cumprir ou reembolsá-lo do
que este houver despendido nesse cumprimento.
ARTIGO 1183º
(Responsabilidade do
mandatário)
Salvo estipulação em
contrário, o mandatário não é responsável pela falta de cumprimento das
obrigações assumidas pelas pessoas com quem haja contratado, a não ser que no
momento da celebração do contrato conhecesse ou devesse conhecer a insolvência
delas.
ARTIGO 1184º
(Responsabilidade dos
bens adquiridos pelo mandatário)
Os bens que o mandatário
haja adquirido em execução do mandato e devam ser transferidos para o mandante
nos termos do nº 1 do artigo 1181º não respondem pelas obrigações daquele,
desde que o mandato conste de documento anterior à data da penhora desses bens
e não tenha sido feito o registo da aquisição, quando esta esteja sujeita a
registo.
CAPÍTULO XI
Depósito
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1185º
(Noção)
Depósito é o contrato pelo
qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a
guarde, e a restitua quando for exigida.
ARTIGO 1186º
(Gratuidade ou
onerosidade do depósito)
É aplicável ao depósito o
disposto no artigo 1158º.
SECÇÃO II
Direitos e obrigações do
depositário
ARTIGO 1187º
(Obrigações de
depositário)
O depositário é obrigado:
a) A guardar a coisa
depositada;
b) A avisar imediatamente o
depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se
arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do
depositante;
c) A restituir a coisa com
os seus frutos.
ARTIGO 1188º
(Turbação de detenção ou
esbulho da coisa)
1. Se o depositário for
privado da detenção da coisa por causa que lhe não seja imputável, fica
exonerado das obrigações de guarda e restituição, mas deve dar conhecimento
imediato da privação ao depositante.
2. Independentemente da
obrigação imposta no número anterior, o depositário que for privado da detenção
da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos pode usar, mesmo contra o
depositante, dos meios facultados ao possuidor nos artigos 1276º e seguintes.
ARTIGO 1189º
(Uso da coisa e
subdepósito)
O depositário não tem o
direito de usar a coisa depositada nem de a dar em depósito a outrem, se o
depositante o não tiver autorizado.
ARTIGO 1190º
(Guarda da coisa)
O depositário pode guardar
a coisa de modo diverso do convencionado, quando haja razões para supor que o
depositante aprovaria a alteração, se conhecesse as circunstâncias que a
fundamentam; mas deve participar-lhe a mudança logo que a comunicação seja
possível.
ARTIGO 1191º
(Depósito cerrado)
1. Se o depósito recair
sobre coisa encerrada nalgum invólucro ou recipiente, deve o depositário
guardá-la e restituí-la no mesmo estado, sem a devassar.
2. No caso de o invólucro
ou recipiente ser violado, presume-se que na violação houve culpa do
depositário; e, se este não ilidir a presunção, presumir-se-á verdadeira a
descrição feita pelo depositante.
ARTIGO 1192º
(Restituição da coisa)
1. O depositário não pode
recusar a restituição ao depositante com o fundamento de que este não é
proprietário da coisa nem tem sobre ela outro direito.
2. Se, porém, for proposta
por terceiro acção de reivindicação contra o depositário, este, enquanto não
for julgada definitivamente a acção, só pode liberar-se da obrigação de
restituir consignando em depósito a coisa.
3. Se chegar ao
conhecimento do depositário que a coisa provém de crime, deve participar
imediatamente o depósito à pessoa a quem foi subtraída ou, não sabendo quem é, ao
Ministério Público; e só poderá restituir a coisa ao depositante se dentro de
quinze dias, contados da participação, ela não lhe for reclamada por quem de
direito.
ARTIGO 1193º
(Terceiro interessado no
depósito)
Se a coisa foi depositada
também no interesse de terceiro e este comunicou ao depositário a sua adesão, o
depositário não pode exonerar-se restituindo a coisa ao depositante sem
consentimento do terceiro.
ARTIGO 1194º
(Prazo de restituição)
O prazo de restituição da
coisa tem-se por estabelecido a favor do depositante; mas, sendo o depósito
oneroso, o depositante satisfará por inteiro a retribuição do depositário,
mesmo quando exija a restituição da coisa antes de findar o prazo estipulado,
salvo se para isso tiver justa causa.
ARTIGO 1195º
(Lugar de restituição)
No silêncio das partes, o
depositário deve restituir a coisa móvel no lugar onde, segundo o contrato,
tiver de a guardar.
ARTIGO 1196º
(Despesas da
restituição)
As despesas da restituição
ficam a cargo do depositante.
ARTIGO 1197º
(Responsabilidade no
caso de subdepósito)
Se o depositário,
devidamente autorizado, confiar por sua vez a coisa em depósito a terceiro, é
responsável por culpa sua na escolha dessa pessoa.
ARTIGO 1198º
(Auxiliares)
O depositário pode
socorrer-se de auxiliares no cumprimento das suas obrigações, sempre que o
contrário não resulte do conteúdo ou finalidade do depósito.
SECÇÃO III
Obrigações do
depositante
ARTIGO 1199º
(Enumeração)
O depositante é obrigado:
a) A pagar ao depositário a
retribuição devida;
b) A reembolsá-lo das
despesas que ele fundadamente tenha considerado indispensáveis para a
conservação da coisa, com juros legais desde que foram efectuadas;
c) A indemnizá-lo do
prejuízo sofrido em consequência do depósito, salvo se o depositante houver
procedido sem culpa.
ARTIGO 1200º
(Remuneração do
depositário)
1. A remuneração do
depositário, quando outra coisa se não tenha convencionado, deve ser paga no
termo do depósito; mas, se for fixada por períodos de tempo, pagar-se-á no fim
de cada um deles.
2. Findado o depósito antes
do prazo convencionado, pode o depositário exigir uma parte proporcional ao
tempo decorrido, sem prejuízo do preceituado no artigo 1194º.
ARTIGO 1201º
(Restituição da coisa)
Não tendo sido
convencionado prazo para a restituição da coisa, o depositário tem o direito de
a restituir a todo o tempo; se, porém, tiver sido convencionado prazo, só
havendo justa causa o pode fazer antes de o prazo findar.
SECÇÃO IV
Depósito de coisa
controvertida
ARTIGO 1202º
(Noção)
Se duas ou mais pessoas
disputam a propriedade de uma coisa ou outro direito sobre ela, podem por meio
de depósito entregá-la a terceiro, para que este a guarde e, resolvida a
controvérsia, a restitua à pessoa a quem se apurar que pertence.
ARTIGO 1203º
(Onerosidade do
depósito)
O depósito de coisa
controvertida presume-se oneroso.
ARTIGO 1204º
(Administração da coisa)
Salvo convenção em
contrário, cabe ao depositário a obrigação de administrar a coisa.
SECÇÃO V
Depósito irregular
ARTIGO 1205º
(Noção)
Diz-se irregular o depósito
que tem por objecto coisas fungíveis.
ARTIGO 1206º
(Regime)
Consideram-se aplicáveis ao
depósito irregular, na medida do possível, as normas relativas ao contrato de
mútuo.
CAPÍTULO XII
Empreitada
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1207º
(Noção)
Empreitada é o contrato
pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra,
mediante um preço.
ARTIGO 1208º
(Execução da obra)
O empreiteiro deve executar
a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou
reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no
contrato.
ARTIGO 1209º
(Fiscalização)
1. O dono da obra pode
fiscalizar, à sua custa, a execução dela, desde que não perturbe o andamento
ordinário da empreitada.
2. A fiscalização feita
pelo dono da obra, ou por comissário, não impede aquele, findo o contrato, de
fazer valer os seus direitos contra o empreiteiro, embora sejam aparentes os
vícios da coisa ou notória a má execução do contrato, excepto se tiver havido
da sua parte concordância expressa com a obra executada.
ARTIGO 1210º
(Fornecimento dos
materiais e utensílios)
1. Os materiais e
utensílios necessários à execução da obra devem ser fornecidos pelo
empreiteiro, salvo convenção ou uso em contrário.
2. No silêncio do contrato,
os materiais devem corresponder às características da obra e não podem ser de
qualidade inferior à média.
ARTIGO 1211º
(Determinação e
pagamento do preço)
1. É aplicável à
determinação do preço, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo
883º.
2. O preço deve ser pago,
não havendo cláusula ou uso em contrário, no acto de aceitação da obra.
ARTIGO 1212º
(Propriedade da obra)
1. No caso de empreitada de
construção de coisa móvel com materiais fornecidos, no todo ou na sua maior
parte, pelo empreiteiro, a aceitação da coisa importa a transferência da
propriedade para o dono da obra; se os materiais foram fornecidos por este,
continuam a ser propriedade dele, assim como é propriedade sua a coisa logo que
seja concluída.
2. No caso de empreitada de
construção de imóveis, sendo o solo ou a superfície pertença do dono da obra, a
coisa é propriedade deste, ainda que seja o empreiteiro quem fornece os
materiais; estes consideram-se adquiridos pelo dono da obra à medida que vão
sendo incorporados no solo.
ARTIGO 1213º
(Subempreitada)
1. Subempreitada é o
contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a
obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela.
2. É aplicável à
subempreitada, assim como ao concurso de auxiliares na execução da empreitada,
o disposto no artigo 264º, com as necessárias adaptações.
SECÇÃO II
Alterações e obras novas
ARTIGO 1214º
(Alterações da
iniciativa do empreiteiro)
1. O empreiteiro não pode,
sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao plano convencionado.
2. A obra alterada sem
autorização é havida como defeituosa; mas, se o dono quiser aceitá-la tal como
foi executada, não fica obrigado a qualquer suplemento de preço nem a
indemnização por enriquecimento sem causa.
3. Se tiver sido fixado
para a obra um preço global e a autorização não tiver sido dada por escrito com
fixação do aumento de preço, o empreiteiro só pode exigir do dono da obra uma
indemnização correspondente ao enriquecimento deste.
ARTIGO 1215º
(Alterações necessárias)
1. Se, para execução da
obra, for necessário, em consequência de direitos de terceiro ou de regras
técnicas, introduzir alterações ao plano convencionado, e as partes não vierem
a acordo, compete ao tribunal determinar essas alterações e fixar as
correspondentes modificações quanto ao preço e prazo de execução.
2. Se, em consequência das
alterações, o preço for elevado em mais de vinte por cento, o empreiteiro pode
denunciar o contrato e exigir uma indemnização equitativa.
ARTIGO 1216º
(Alterações exigidas
pelo dono da obra)
1. O dono da obra pode
exigir que sejam feitas alterações ao plano convencionado, desde que o seu
valor não exceda a quinta parte do preço estipulado e não haja modificação da
natureza da obra.
2. O empreiteiro tem
direito a um aumento do preço estipulado, correspondente ao acréscimo de
despesa e trabalho, e a um prolongamento do prazo para a execução da obra.
3. Se das alterações
introduzidas resultar uma diminuição de custo ou de trabalho, o empreiteiro tem
direito ao preço estipulado, com dedução do que, em consequência das
alterações, poupar em despesas ou adquirir por outras aplicações da sua
actividade.
ARTIGO 1217º
(Alterações posteriores
à entrega e obras novas)
1. Não é aplicável o
disposto nos artigos precedentes às alterações feitas depois da entrega da
obra, nem às obras que tenham autonomia em relação às previstas no contrato.
2. O dono da obra tem o
direito de recusar as alterações e as obras referidas no número anterior, se as
não tiver autorizado; pode, além disso, exigir a sua eliminação, se esta for
possível, e, em qualquer caso, uma indemnização pelo prejuízo, nos termos
gerais.
SECÇÃO III
Defeitos da obra
ARTIGO 1218º
(Verificação da obra)
1. O dono da obra deve
verificar, antes de a aceitar, se ela se encontra nas condições convencionadas
e sem vícios.
2. A verificação deve ser
feita dentro do prazo usual ou , na falta de uso, dentro do período que se
julgue razoável depois de o empreiteiro colocar o dono da obra em condições de
a poder fazer.
3. Qualquer das partes tem
o direito de exigir que a verificação seja feita, à sua custa, por peritos.
4. Os resultados da
verificação devem ser comunicados ao empreiteiro.
5. A falta da verificação
ou da comunicação importa aceitação da obra.
ARTIGO 1219º
(Casos de
irresponsabilidade do empreiteiro)
1. O empreiteiro não
responde pelos defeitos da obra, se o dono a aceitou sem reserva, com
conhecimento deles.
2. Presumem-se conhecidos
os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação da obra.
ARTIGO 1220º
(Denúncia dos defeitos)
1. O dono da obra deve, sob
pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos seguintes, denunciar ao
empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu
descobrimento.
2. Equivale à denúncia o
reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito.
ARTIGO 1221º
(Eliminação dos
defeitos)
1. Se os defeitos puderem
ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua
eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção.
2. Cessam os direitos conferidos
no número anterior, se as despesas forem desproporcionadas em relação ao
proveito.
ARTIGO 1222º
(Redução do preço e
resolução do contrato)
1. Não sendo eliminados os
defeitos ou construída de novo a obra, o dono pode exigir a redução do preço ou
a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que
se destina.
2. A redução do preço é
feita nos termos do artigo 884º.
ARTIGO 1223º
(Indemnização)
O exercício dos direitos
conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito a ser indemnizado nos
termos gerais.
ARTIGO 1224º
(Caducidade)
1. Os direitos de
eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização
caducam, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da
aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade
prevista no artigo 1220º.
2. Se os defeitos eram
desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se
a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos
depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da obra.
ARTIGO 1225º
(Imóveis destinados a
longa duração)
1. Sem prejuízo do disposto
nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada tiver por objecto a construção,
modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua
natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no
decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da
construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos,
ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável
pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente.
2. A denúncia, em qualquer
dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser
pedida no ano seguinte à denúncia.
3. Os prazos previstos no
número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos,
previstos no artigo 1221º.
4. O disposto nos números
anteriores é aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado
ou reparado.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1226º
(Responsabilidade dos
subempreiteiros)
O direito de regresso do
empreiteiro contra os subempreiteiros quanto aos direitos conferidos nos
artigos anteriores caduca, se não lhes for comunicada a denúncia dentro dos
trinta dias seguintes à sua recepção.
SECÇÃO IV
Impossibilidade de
cumprimento e risco pela perda ou deterioração da obra
ARTIGO 1227º
(Impossibilidade de
execução da obra)
Se a execução da obra se
tornar impossível por causa não imputável a qualquer das partes, é aplicável o
disposto no artigo 790º; tendo, porém, havido começo de execução, o dono da
obra é obrigado a indemnizar o empreiteiro do trabalho executado e das despesas
realizadas.
ARTIGO 1228º
(Risco)
1. Se, por causa não
imputável a qualquer das partes, a coisa perecer ou se deteriorar, o risco
corre por conta do proprietário.
2. Se, porém, o dono da
obra estiver em mora quanto à verificação ou aceitação da coisa, o risco corre
por conta dele.
SECÇÃO V
Extinção do contrato
ARTIGO 1229º
(Desistência do dono da
obra)
O dono da obra pode
desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido iniciada a sua
execução contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do
proveito que poderia tirar da obra.
ARTIGO 1230º
(Morte ou incapacidade
das partes)
1. O contrato de empreitada
não se extingue por morte do dono da obra, nem por morte ou incapacidade do
empreiteiro, a não ser que, neste último caso, tenham sido tomadas em conta, no
acto da celebração, as qualidades pessoais deste.
2. Extinto o contrato por
morte ou incapacidade do empreiteiro, considera-se a execução da obra como
impossível por causa não imputável a qualquer das partes.
CAPÍTULO XIII
Renda perpétua
ARTIGO 1231º
(Noção)
Contrato de renda perpétua
é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou
qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga, sem
limite de tempo, a pagar, como renda, determinada quantia em dinheiro ou outra
coisa fungível.
ARTIGO 1232º
(Forma)
A renda perpétua só é
válida se for constituída por escritura pública.
ARTIGO 1233º
(Caução)
O devedor da renda é
obrigado a caucionar o cumprimento da obrigação.
ARTIGO 1234º
(Exclusão do direito de
acrescer)
Não há na renda perpétua
direito de acrescer entre os beneficiários.
ARTIGO 1235º
(Resolução do contrato)
Ao beneficiário da renda é
permitido resolver o contrato, quando o devedor se constitua em mora quanto às
prestações correspondentes a dois anos, ou se verifique algum dos casos
previstos no artigo 780º.
ARTIGO 1236º
(Remição)
1. O devedor pode a todo o
tempo remir a renda, mediante o pagamento da importância em dinheiro que
represente a capitalização da mesma, à taxa legal de juros.
2. O direito de remição é
irrenunciável, mas é lícito estipular-se que não possa ser exercido em vida do
primeiro beneficiário ou dentro de certo prazo não superior a vinte anos.
ARTIGO 1237º
(Juros)
A renda perpétua fica
sujeita às disposições legais sobre juros, no que for compatível com a sua
natureza e com o preceituado nos artigos antecedentes.
CAPÍTULO XIV
Renda vitalícia
ARTIGO 1238º
(Noção)
Contrato de renda vitalícia
é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa soma de dinheiro, ou
qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a segunda se obriga a
pagar certa quantia em dinheiro ou outra coisa fungível durante a vida do
alienante ou de terceiro.
ARTIGO 1239º
(Forma)
Sem prejuízo da aplicação
das regras especiais de forma quanto à alienação da coisa ou do direito, a
renda vitalícia deve ser constituída por documento escrito, sendo necessária
escritura pública se a coisa ou o direito alienado for de valor igual ou
superior a 3 000 000$.
(Redacção do Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1240º
(Duração da renda)
A renda pode ser
convencionada por uma ou duas vidas.
ARTIGO 1241º
(Direito de acrescer)
No silêncio do contrato,
sendo dois ou mais os beneficiários da renda, e falecendo algum deles, a sua
parte acresce à dos outros.
ARTIGO 1242º
(Resolução do contrato)
Ao beneficiário da renda
vitalícia é lícito resolver o contrato nos mesmos termos em que é permitida a
resolução da renda perpétua ao respectivo beneficiário.
ARTIGO 1243º
(Remição)
O devedor só pode remir a
renda, com reembolso do que tiver recebido e perda das prestações já
efectuadas, se assim se tiver convencionado.
ARTIGO 1244º
(Prestações antecipadas)
Se as prestações se vencem
antecipadamente, a última é devida por inteiro, ainda que o beneficiário faleça
antes de completado o período respectivo.
CAPÍTULO XV
Jogo e aposta
ARTIGO 1245º
(Nulidade do contrato)
O jogo e a aposta não são
contratos válidos nem constiuem fonte de obrigações civis; porém, quando
lícitos, são fonte de obrigações naturais, excepto se neles concorrer qualquer
outro motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais de direito, ou se
houver fraude do credor na sua execução.
ARTIGO 1246º
(Competições
desportivas)
Exceptuam-se do disposto no
artigo anterior as competições desportivas, com relação às pessoas que nelas
tomarem parte.
ARTIGO 1247º
(Legislação especial)
Fica ressalvada a
legislação especial sobre a matéria de que trata este capítulo.
CAPÍTULO XVI
Transacção
ARTIGO 1248º
(Noção)
1. Transacção é o contrato
pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas
concessões.
2. As concessões podem
envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do
direito controvertido.
ARTIGO 1249º
(Matérias insusceptíveis
de transacção)
As partes não podem
transigir sobre direitos de que lhes não é permitido dispor, nem sobre questões
respeitantes a negócios jurídicos ilícitos.
ARTIGO 1250º
(Forma)
A transacção preventiva ou
extrajudicial constará de escritura pública quando dela possa derivar algum
efeito para o qual a escritura seja exigida, e constará de documento escrito
nos casos restantes.
LIVRO III
DIREITO DAS COISAS
TÍTULO I
DA POSSE
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1251º
(Noção)
Posse é o poder que se
manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito
de propriedade ou de outro direito real.
ARTIGO 1252º
(Exercício da posse por
intermediário)
1. A posse tanto pode ser
exercida pessoalmente como por intermédio de outrem.
2. Em caso de dúvida,
presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto, sem prejuízo do
disposto no nº 2 do artigo 1257º.
ARTIGO 1253º
(Simples detenção)
São havidos como detentores
ou possuidores precários:
a) Os que exercem o poder
de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito;
b) Os que simplesmente se
aproveitam da tolerância do titular do direito;
c) Os representantes ou
mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que possuem em nome de
outrem.
ARTIGO 1254º
(Presunções de posse)
1. Se o possuidor actual
possuiu em tempo mais remoto, presume-se que possuiu igualmente no tempo
intermédio.
2. A posse actual não faz
presumir a posse anterior, salvo quando seja titulada; neste caso, presume-se
que há posse desde a data do título.
ARTIGO 1255º
(Sucessão na posse)
Por morte do possuidor, a
posse continua nos seus sucessores desde o momento da morte, independentemente
da apreensão material da coisa.
ARTIGO 1256º
(Acessão da posse)
1. Aquele que houver
sucedido na posse de outrem por título diverso da sucessão por morte pode
juntar à sua a posse do antecessor.
2. Se, porém, a posse do
antecessor for de natureza diferente da posse do sucessor, a acessão só se dará
dentro dos limites daquela que tem menor âmbito.
ARTIGO 1257º
(Conservação da posse)
1. A posse mantém-se
enquanto durar a actuação correspondente ao exercício do direito ou a
possibilidade de a continuar.
2. Presume-se que a posse
continua em nome de quem a começou.
CAPÍTULO II
Caracteres da posse
ARTIGO 1258º
(Espécies de posse)
A posse pode ser titulada
ou não titulada, de boa ou de má fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta.
ARTIGO 1259º
(Posse titulada)
1. Diz-se titulada a posse
fundada em qualquer modo legítimo de adquirir, independentemente, quer do
direito do transmitente, quer da validade substancial do negócio jurídico.
2. O título não se presume,
devendo a sua existência ser provada por aquele que o invoca.
ARTIGO 1260º
(Posse de boa fé)
1. A posse diz-se de boa
fé, quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem.
2. A posse titulada
presume-se de boa fé, e a não titulada, de má fé.
3. A posse adquirida por
violência é sempre considerada de má fé, mesmo quando seja titulada.
ARTIGO 1261º
(Posse pacífica)
1. Posse pacífica é a que
foi adquirida sem violência.
2. Considera-se violenta a
posse quando, para obtê-la, o possuidor usou de coacção física, ou de coacção
moral nos termos do artigo 255º.
ARTIGO 1262º
(Posse pública)
Posse pública é a que se
exerce de modo a poder ser conhecida pelos interessados.
CAPÍTULO III
Aquisição e perda da
posse
ARTIGO 1263º
(Aquisição da posse)
A posse adquire-se:
a) Pela prática reiterada,
com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito;
b) Pela tradição material
ou simbólica da coisa, efectuada pelo anterior possuidor;
c) Por constituto
possessório;
d) Por inversão do título
da posse.
ARTIGO 1264º
(Constituto possessório)
1. Se o titular do direito
real, que está na posse da coisa, transmitir esse direito a outrem, não deixa
de considerar-se transferida a posse para o adquirente, ainda que, por qualquer
causa, aquele continue a deter a coisa.
2. Se o detentor da coisa,
à data do negócio translativo do direito, for um terceiro, não deixa de
considerar-se igualmente transferida a posse, ainda que essa detenção haja de
continuar.
ARTIGO 1265º
(Inversão do título da posse)
A inversão do título da
posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo
nome possuía ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse.
ARTIGO 1266º
(Capacidade para
adquirir a posse)
Podem adquirir posse todos
os que têm uso da razão, e ainda os que o não têm, relativamente às coisas
susceptíveis de ocupação.
ARTIGO 1267º
(Perda da posse)
1. O possuidor perde a
posse:
a) Pelo abandono;
b) Pela perda ou destruição
material da coisa ou por esta ser posta fora do comércio;
c) Pela cedência;
d) Pela posse de outrem,
mesmo contra a vontade do antigo possuidor, se a nova posse houver durado por
mais de um ano.
2. A nova posse de outrem
conta-se desde o seu início, se foi tomada publicamente, ou desde que é
conhecida do esbulhado, se foi tomada ocultamente; sendo adquirida por
violência, só se conta a partir da cessação desta.
CAPÍTULO IV
Efeitos da posse
ARTIGO 1268º
(Presunção da
titularidade do direito)
1. O possuidor goza da
presunção da titularidade do direito excepto se existir, a favor de outrem,
presunção fundada em registo anterior ao início da posse.
2. Havendo concorrência de
presunções legais fundadas em registo, será a prioridade entre elas fixada na
legislação respectiva.
ARTIGO 1269º
(Perda ou deterioração
da coisa)
O possuidor de boa fé só
responde pela perda ou deterioração da coisa se tiver procedido com culpa.
ARTIGO 1270º
(Frutos na posse de boa
fé)
1. O possuidor de boa fé
faz seus os frutos naturais percebidos até ao dia em que souber que está a
lesar com a sua posse o direito de outrem, e os frutos civis correspondentes ao
mesmo período.
2. Se ao tempo em que cessa
a boa fé estiverem pendentes frutos naturais, é o titular obrigado a indemnizar
o possuidor das despesas de cultura, sementes ou matérias-primas e, em geral,
de todas as despesas de produção, desde que não sejam superiores ao valor dos
frutos que vierem a ser colhidos.
3. Se o possuidor tiver
alienado frutos antes da colheita e antes de cessar a boa fé, a alienação
subsiste mas o produto da colheita pertence ao titular do direito, deduzida a
indemnização a que o número anterior se refere.
ARTIGO 1271º
(Frutos na posse de má
fé)
O possuidor de má fé deve
restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse e responde, além
disso, pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido.
ARTIGO 1272º
(Encargos)
Os encargos com a coisa são
pagos pelo titular do direito e pelo possuidor, na medida dos direitos de cada
um deles sobre os frutos no período a que respeitam os encargos.
ARTIGO 1273º
(Benfeitorias
necessárias e úteis)
1. Tanto o possuidor de boa
fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias
que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na
coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela.
2. Quando, para evitar o
detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará
o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do
enriquecimento sem causa.
ARTIGO 1274º
(Compensação de
benfeitorias com deteriorações)
A obrigação de indemnização
por benfeitorias é susceptível de compensação com a responsabilidade do
possuidor por deteriorações.
ARTIGO 1275º
(Benfeitorias
voluptuárias)
1. O possuidor de boa fé
tem direito a levantar as benfeitorias voluptuárias, não se dando detrimento da
coisa; no caso contrário, não pode levantá-las nem haver o valor delas.
2. O possuidor de má fé
perde, em qualquer caso, as benfeitorias voluptuárias que haja feito.
CAPÍTULO V
Defesa da posse
ARTIGO 1276º
(Acção de prevenção)
Se o possuidor tiver justo
receio de ser perturbado ou esbulhado por outrem, será o autor da ameaça, a
requerimento do ameaçado, intimado para se abster de lhe fazer agravo, sob pena
de multa e responsabilidade pelo prejuízo que causar.
ARTIGO 1277º
(Acção directa e defesa
judicial)
O possuidor que for
perturbado ou esbulhado pode manter-se ou restituir-se por sua própria força e
autoridade, nos termos do artigo 336º, ou recorrer ao tribunal para que este
lhe mantenha ou restitua a posse.
ARTIGO 1278º
(Manutenção e
restituição da posse)
1. No caso de recorrer ao
tribunal, o possuidor perturbado ou esbulhado será mantido ou restituído
enquanto não for convencido na questão da titularidade do direito.
2. Se a posse não tiver mais
de um ano, o possuidor só pode ser mantido ou restituído contra quem não tiver
melhor posse.
3. É melhor posse a que for
titulada; na falta de título, a mais antiga; e, se tiverem igual antiguidade, a
posse actual.
ARTIGO 1279º
(Esbulho violento)
Sem prejuízo do disposto
nos artigos anteriores, o possuidor que for esbulhado com violência tem o
direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, sem audiência do
esbulhador.
ARTIGO 1280º
(Exclusão das servidões
não aparentes)
As acções mencionadas nos
artigos anteriores não são aplicáveis à defesa das servidões não aparentes,
salvo quando a posse se funde em título provindo do proprietário do prédio
serviente ou de quem lho transmitiu.
ARTIGO 1281º
(Legitimidade)
1. A acção de manutenção da
posse pode ser intentada pelo perturbado ou pelos seus herdeiros, mas apenas
contra o perturbador, salva a acção de indemnização contra os herdeiros deste.
2. A acção de restituição
de posse pode ser intentada pelo esbulhado ou pelos seus herdeiros, não só
contra o esbulhador ou seus herdeiros, mas ainda contra quem esteja na posse da
coisa e tenha conhecimento do esbulho.
ARTIGO 1282º
(Caducidade)
A acção de manutenção, bem
como as de restituição da posse, caducam, se não forem intentadas dentro do ano
subsequente ao facto da turbação ou do esbulho, ou ao conhecimento dele quando
tenha sido praticado a ocultas.
ARTIGO 1283º
(Efeito da manutenção ou
restituição)
É havido como nunca
perturbado ou esbulhado o que foi mantido na sua posse ou a ela foi restituído
judicialmente.
ARTIGO 1284º
(Indemnização de
prejuízos e encargos com a restituição)
1. O possuidor mantido ou
restituído tem direito a ser indemnizado do prejuízo que haja sofrido em
consequência da turbação ou do esbulho.
2. A restituição da posse é
feita à custa do esbulhador e no lugar do esbulho.
ARTIGO 1285º
(Embargos de terceiro)
O possuidor cuja posse for
ofendida por diligência ordenada judicialmente pode defender a sua posse
mediante embargos de terceiro, nos termos definidos na lei de processo.
ARTIGO 1286º
(Defesa da composse)
1. Cada um dos
compossuidores, seja qual for a parte que lhe cabe, pode usar contra terceiro
dos meios facultados nos artigos precedentes, quer para defesa da própria
posse, quer para defesa da posse comum, sem que ao terceiro seja lícito
opor-lhe que ela não lhe pertence por inteiro.
2. Nas relações entre
compossuidores não é permitido o exercício da acção de manutenção.
3. Em tudo o mais são
aplicáveis à composse as disposições do presente capítulo.
CAPÍTULO VI
Usucapião
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1287º
(Noção)
A posse do direito de
propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de
tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do
direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama
usucapião.
ARTIGO 1288º
(Retroactividade da
usucapião)
Invocada a usucapião, os
seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse.
ARTIGO 1289º
(Capacidade para
adquirir)
1. A usucapião aproveita a
todos os que podem adquirir.
2. Os incapazes podem
adquirir por usucapião, tanto por si como por intermédio das pessoas que
legalmente os representam.
ARTIGO 1290º
(Usucapião em caso de
detenção)
Os detentores ou
possuidores precários não podem adquirir para si, por usucapião, o direito possuído,
excepto achando-se invertido o título da posse; mas, neste caso, o tempo
necessário para a usucapião só começa a correr desde a inversão do título.
ARTIGO 1291º
(Usucapião por
compossuidor)
A usucapião por um
compossuidor relativamente ao objecto da posse comum aproveita igualmente aos
demais compossuidores.
ARTIGO 1292º
(Aplicação das regras da
prescrição)
São aplicáveis à usucapião,
com as necessárias adaptações, as disposições relativas à suspensão e
interrupção da prescrição, bem como o preceituado nos artigos 300º, 302º, 303º
e 305º.
SECÇÃO II
Usucapião de imóveis
ARTIGO 1293º
(Direitos excluídos)
Não podem adquirir-se por
usucapião:
a) As servidões prediais
não aparentes;
b) Os direitos de uso e de
habitação.
ARTIGO 1294º
(Justo título e registo)
Havendo título de aquisição
e registo deste, a usucapião tem lugar:
a) Quando a posse, sendo de
boa fé, tiver durado por dez anos, contados desde a data do registo;
b) Quando a posse, ainda
que de má fé, houver durado quinze anos, contados da mesma data.
ARTIGO 1295º
(Registo da mera posse)
1. Não havendo registo do
título de aquisição, mas registo da mera posse, a usucapião tem lugar:
a) Se a posse tiver
continuado por cinco anos, contados desde a data do registo, e for de boa fé;
b) Se a posse tiver continuado
por dez anos, a contar da mesma data, ainda que não seja de boa fé.
2. A mera posse só será
registada em vista de sentença passada em julgado, na qual se reconheça que o
possuidor tem possuído pacífica e publicamente por tempo não inferior a cinco
anos.
ARTIGO 1296º
(Falta de registo)
Não havendo registo do
título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de quinze anos,
se a posse for de boa fé, e de vinte anos, se for de má fé.
ARTIGO 1297º
(Posse violenta ou
oculta)
Se a posse tiver sido
constituída com violência ou tomada ocultamente, os prazos da usucapião só
começam a contar-se desde que cesse a violência ou a posse se torne pública.
SECÇÃO III
Usucapião de móveis
ARTIGO 1298º
(Coisas sujeitas a
registo)
Os direitos reais sobre coisas
móveis sujeitas a registo adquirem-se por usucapião, nos termos seguintes:
a) Havendo título de
aquisição e registo deste, quando a posse tiver durado dois anos, estando o
possuidor de boa fé, ou quatro anos, se estiver de má fé;
b) Não havendo registo,
quando a posse tiver durado dez anos, independentemente da boa fé do possuidor
e da existência de título.
ARTIGO 1299º
(Coisas não sujeitas a
registo)
A usucapião de coisas não
sujeitas a registo dá-se quando a posse, de boa fé e fundada em justo título,
tiver durado três anos, ou quando, independentemente da boa fé e de título,
tiver durado seis anos.
ARTIGO 1300º
(Posse violenta ou
oculta)
1. É aplicável à usucapião
de móveis o disposto no artigo 1297º.
2. Se, porém, a coisa
possuída passar a terceiro de boa fé antes da cessação da violência ou da
publicidade da posse, pode o interessado adquirir direitos sobre ela passados
quatros anos desde a constituição da sua posse, se esta for titulada, ou sete,
na falta de título.
ARTIGO 1301º
(Coisa comprada a
comerciante)
O que exigir de terceiro
coisa por este comprada, de boa fé, a comerciante que negoceie em coisa do
mesmo ou semelhante género é obrigado a restituir o preço que o adquirente
tiver dado por ela, mas goza do direito de regresso contra aquele que
culposamente deu causa ao prejuízo.
TÍTULO II
DO DIREITO DE
PROPRIEDADE
CAPÍTULO I
Propriedade em geral
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1302º
(Objecto do direito de
propriedade)
Só as coisas corpóreas,
móveis ou imóveis, podem ser objecto do direito de propriedade regulado neste
código.
ARTIGO 1303º
(Propriedade
intelectual)
1. Os direitos de autor e a
propriedade industrial estão sujeitos a legislação especial.
2. São, todavia,
subsidiariamente aplicáveis aos direitos de autor e à propriedade industrial as
disposições deste código, quando se harmonizem com a natureza daqueles direitos
e não contrariem o regime para eles especialmente estabelecido.
ARTIGO 1304º
(Domínio do Estado e de
outras pessoas colectivas públicas)
O domínio das coisas
pertencentes ao Estado ou a quaisquer outras pessoas colectivas públicas está
igualmente sujeito às disposições deste código em tudo o que não for
especialmente regulado e não contrarie a natureza própria daquele domínio.
ARTIGO 1305º
(Conteúdo do direito de
propriedade)
O proprietário goza de modo
pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe
pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela
impostas.
ARTIGO 1306º
(«Numerus clausus»)
1. Não é permitida a constituição,
com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de figuras
parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei; toda a restrição
resultante de negócio jurídico, que não esteja nestas condições, tem natureza
obrigacional.
2. O quinhão e o compáscuo
constituídos até à entrada em vigor deste código ficam sujeitos à legislação
anterior.
ARTIGO 1307º
(Propriedade resolúvel e
temporária)
1. O direito de propriedade
pode constituir-se sob condição.
2. A propriedade temporária
só é admitida nos casos especialmente previstos na lei.
3. À propriedade sob
condição é aplicável o disposto nos artigos 272º a 277º.
ARTIGO 1308º
(Expropriações)
Ninguém pode ser privado,
no todo ou em parte, do seu direito de propriedade senão nos casos fixados na
lei.
ARTIGO 1309º
(Requisições)
Só nos casos previstos na
lei pode ter lugar a requisição temporária de coisas do domínio privado.
ARTIGO 1310º
(Indemnizações)
Havendo expropriação por
utilidade pública ou particular ou requisição de bens, é sempre devida a
indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais
afectados.
SECÇÃO II
Defesa da propriedade
ARTIGO 1311º
(Acção de reivindicação)
1. O proprietário pode
exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o
reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que
lhe pertence.
2. Havendo reconhecimento
do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos
previstos na lei.
ARTIGO 1312º
(Encargos com a
restituição)
A restituição da coisa é
feita à custa do esbulhador, se o houver, e no lugar do esbulho.
ARTIGO 1313º
(Imprescritibilidade da
acção de reivindicação)
Sem prejuízo dos direitos
adquiridos por usucapião, a acção de reivindicação não prescreve pelo decurso
do tempo.
ARTIGO 1314º
(Acção directa)
É admitida a defesa da
propriedade por meio de acção directa, nos termos do artigo 336º.
ARTIGO 1315º
(Defesa de outros
direitos reais)
As disposições precedentes
são aplicáveis, com as necessárias correcções, à defesa de todo o direito real.
CAPÍTULO II
Aquisição da propriedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1316º
(Modos de aquisição)
O direito de propriedade
adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e
demais modos previstos na lei.
ARTIGO 1317º
(Momento da aquisição)
O momento da aquisição do
direito de propriedade é:
a) No caso de contrato, o
designado nos artigos 408º e 409º;
b) No caso de sucessão por
morte, o da abertura da sucessão;
c) No caso de usucapião, o
do início da posse;
d) Nos casos de ocupação e
acessão, o da verificação dos factos respectivos.
SECÇÃO II
Ocupação
ARTIGO 1318º
(Coisas susceptíveis de
ocupação)
Podem ser adquiridos por
ocupação os animais e outras coisas móveis que nunca tiveram dono, ou foram
abandonados, perdidos ou escondidos pelos seus proprietários, salvas as
restrições dos artigos seguintes.
ARTIGO 1319º
(Caça e pesca)
A ocupação dos animais
bravios que se encontram no seu estado de liberdade natural é regulada por
legislação especial.
ARTIGO 1320º
(Animais selvagens com
guarida própria)
1. Os animais bravios
habituados a certa guarida, ordenada por indústria do homem, que mudem para
outra guarida de diverso dono ficam pertencendo a este, se não puderem ser
individualmente reconhecidos; no caso contrário, pode o antigo dono
recuperá-los, contanto que o faça sem prejuízo do outro.
2. Provando-se, porém, que
os animais foram atraídos por fraude ou artifício do dono da guarida onde se
hajam acolhido, é este obrigado a entregá-los ao antigo dono, ou a pagar-lhe em
triplo o valor deles, se lhe não for possível restituí-los.
ARTIGO 1321º
(Animais ferozes
fugidos)
Os animais ferozes e
maléficos que se evadirem da clausura em que o seu dono os tiver podem ser
destruídos ou ocupados livremente por qualquer pessoa que os encontre.
ARTIGO 1322º
(Enxames de abelhas)
1. O proprietário de enxame
de abelhas tem o direito de o perseguir e capturar em prédio alheio, mas é
responsável pelos danos que causar.
2. Se o dono da colmeia não
perseguir o enxame logo que saiba terem as abelhas enxameado, ou se decorrerem
dois dias sem que o enxame tenha sido capturado, pode ocupá-lo o proprietário
do prédio onde ele se encontre, ou consentir que outrem o ocupe.
ARTIGO 1323º
(Animais e coisas móveis
perdidas)
1. Aquele que encontrar animal
ou outra coisa móvel perdida e souber a quem pertence deve restituir o animal
ou a coisa a seu dono, ou avisar este do achado; se não souber a quem pertence,
deve anunciar o achado pelo modo mais conveniente, atendendo ao valor da coisa
e às possibilidades locais, ou avisar as autoridades, observando os usos da
terra, sempre que os haja.
2. Anunciado o achado, o
achador faz sua a coisa perdida, se não for reclamada pelo dono dentro do prazo
de um ano, a contar do anúncio ou aviso.
3. Restituída a coisa, o
achador tem direito à indemnização do prejuízo havido e das despesas
realizadas, bem como a um prémio dependente do valor do achado no momento da
entrega, calculado pela forma seguinte: até ao valor de mil escudos, dez por
cento; sobre o excedente desse valor até cinco mil escudos, cinco por cento;
sobre o restante, dois e meio por cento.
4. O achador goza do
direito de retenção e não responde, no caso de perda ou deterioração da coisa,
senão havendo da sua parte dolo ou culpa grave.
ARTIGO 1324º
(Tesouros)
1. Se aquele que descobrir
coisa móvel de algum valor, escondida ou enterrada, não puder determinar quem é
o dono dela, torna-se proprietário de metade do achado; a outra metade pertence
ao proprietário da coisa móvel ou imóvel onde o tesouro estava escondido ou
enterrado.
2. O achador deve anunciar
o achado nos termos do nº 1 do artigo anterior, ou avisar as autoridades,
excepto quando seja evidente que o tesouro foi escondido ou enterrado há mais
de vinte anos.
3. Se o achador não cumprir
o disposto no número anterior, ou fizer seu o achado ou parte dele sabendo quem
é o dono, ou ocultar do proprietário da coisa onde ele se encontrava, perde em
benefício do Estado os direitos conferidos no nº 1 deste artigo, sem exclusão
dos que lhe possam caber como proprietário.
SECÇÃO III
Acessão
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1325º
(Noção)
Dá-se a acessão, quando com
a coisa que é propriedade de alguém se une e incorpora outra coisa que lhe não
pertencia.
ARTIGO 1326º
(Espécies)
1. A acessão diz-se
natural, quando resulta exclusivamente das forças da natureza; dá-se a acessão
industrial, quando, por facto do homem, se confundem objectos pertencentes a
diversos donos, ou quando alguém aplica o trabalho próprio a matéria
pertencente a outrem, confundindo o resultado desse trabalho com propriedade
alheia.
2. A acessão industrial é
mobiliária ou imobiliária, conforme a natureza das coisas.
SUBSECÇÃO II
Acessão natural
ARTIGO 1327º
(Princípio geral)
Pertence ao dono da coisa
tudo o que a esta acrescer por efeito da natureza.
ARTIGO 1328º
(Aluvião)
1. Pertence aos donos dos
prédios confinantes com quaisquer correntes de água tudo o que, por acção das
águas, se lhes unir ou neles for depositado, sucessiva e imperceptivelmente.
2. É aplicável o disposto
no número anterior ao terreno que insensivelmente se for deslocando, por acção
das águas, de uma das margens para outra, ou de um prédio superior para outro
inferior, sem que o proprietário do terreno perdido possa invocar direitos
sobre ele.
ARTIGO 1329º
(Avulsão)
1. Se, por acção natural e
violenta, a corrente arrancar quaisquer plantas ou levar qualquer objecto ou
porção conhecida de terreno, e arrojar essas coisas sobre prédio alheio, o dono
delas tem o direito de exigir que lhe sejam entregues, contanto que o faça dentro
de seis meses, se antes não foi notificado para fazer a remoção no prazo
judicialmente assinado.
2. Não se fazendo a remoção
nos prazos designados, é aplicável o disposto no artigo anterior.
ARTIGO 1330º
(Mudança de leito)
1. Se a corrente mudar de direcção,
abandonando o leito antigo, os proprietários deste conservam o direito que
tinham sobre ele, e o dono do prédio invadido conserva igualmente a propriedade
do terreno ocupado de novo pela corrente.
2. Se a corrente se dividir
em dois ramos ou braços, sem que o leito antigo seja abandonado, é ainda
aplicável o disposto no número anterior.
ARTIGO 1331º
(Formação de ilhas e
mouchões)
1. As ilhas ou mouchões que
se formem nas correntes de água pertencem ao dono da parte do leito ocupado.
2. Se, porém, as ilhas ou
mouchões se formarem por avulsão, o proprietário do terreno onde a diminuição
haja ocorrido goza do direito de remoção nas condições prescritas pelo artigo
1329º.
ARTIGO 1332º
(Lagos e lagoas)
As disposições dos artigos
antecedentes são aplicáveis aos lagos e lagoas, quando aí ocorrerem factos
análogos.
SUBSECÇÃO III
Acessão industrial
mobiliária
ARTIGO 1333º
(União ou confusão de
boa fé)
1. Se alguém, de boa fé,
unir ou confundir objecto seu com objecto alheio, de modo que a separação deles
não seja possível ou, sendo-o, dela resulte prejuízo para alguma das partes,
faz seu o objecto adjunto o dono daquele que for de maior valor, contanto que
indemnize o dono do outro ou lhe entregue coisa equivalente.
2. Se ambas as coisas forem
de igual valor e os donos não acordarem sobre qual haja de ficar com ela,
abrir-se-á entre eles licitação, adjudicando-se o objecto licitado àquele que
maior valor oferecer por ele; verificada a soma que no valor oferecido deve
pertencer ao outro, é o adjudicatário obrigado a pagar-lha.
3. Se os interessados não
quiserem licitar, será vendida a coisa e cada um deles haverá no produto da
venda a parte que deva tocar-lhe.
4. Em qualquer dos casos
previstos nos números anteriores, o autor da confusão é obrigado a ficar com a coisa
adjunta, ainda que seja de maior valor, se o dono dela preferir a respectiva
indemnização.
ARTIGO 1334º
(União ou confusão de má
fé)
1. Se a união ou confusão
tiver sido feita de má fé e a coisa alheia puder ser separada sem padecer
detrimento, será esta restituída a seu dono, sem prejuízo do direito que este
tem de ser indemnizado do dano sofrido.
2. Se, porém, a coisa não
puder ser separada sem padecer detrimento, deve o autor da união ou confusão
restituir o valor da coisa e indemnizar o seu dono, quando este não prefira
ficar com ambas as coisas adjuntas e pagar ao autor da união ou confusão o
valor que for calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
ARTIGO 1335º
(Confusão casual)
1. Se a adjunção ou
confusão se operar casualmente e as coisas adjuntas ou confundidas não puderem
separar-se sem detrimento de alguma delas, ficam pertencendo ao dono da mais
valiosa, que pagará o justo valor da outra; se, porém, este não quiser fazê-lo,
assiste idêntico direito ao dono da menos valiosa.
2. Se nenhum deles quiser
ficar com a coisa, será esta vendida, e cada um deles haverá a parte do preço
que lhe pertencer.
3. Se ambas as coisas forem
de igual valor, observar-se-á o disposto nos números 2 e 3 do artigo 1333º.
ARTIGO 1336º
(Especificação de boa
fé)
1. Quem de boa fé der nova
forma, por seu trabalho, a coisa móvel pertencente a outrem faz sua a coisa
transformada, se ela não puder ser restituída à primitiva forma ou não puder
sê-lo sem perda do valor criado pela especificação; neste último caso, porém,
tem o dono da matéria o direito de ficar com a coisa, se o valor da
especificação não exceder o da matéria.
2. Em ambos os casos
previstos no número anterior, o que ficar com a coisa é obrigado a indemnizar o
outro do valor que lhe pertencer.
ARTIGO 1337º
(Especificação de má fé)
Se a especificação tiver
sido feita de má fé, será a coisa especificada restituída a seu dono no estado
em que se encontrar, com indemnização dos danos, sem que o dono seja obrigado a
indemnizar o especificador, se o valor da especificação não tiver aumentado em
mais de um terço o valor da coisa especificada; se o aumento for superior, deve
o dono da coisa repor o que exceder o dito terço.
ARTIGO 1338º
(Casos de especificação)
Constituem casos de
especificação a escrita, a pintura, o desenho, a fotografia, a impressão, a
gravura e outros actos semelhantes, feitos com utilização de materiais alheios.
SUBSECÇÃO IV
Acessão industrial
imobiliária
ARTIGO 1339º
(Obras, sementeiras ou
plantações com materiais alheios)
Aquele que em terreno seu
construir obra ou fizer sementeira ou plantação com materiais, sementes ou
plantas alheias adquire os materiais, sementes ou plantas que utilizou, pagando
o respectivo valor, além da indemnização a que haja lugar.
ARTIGO 1340º
(Obras, sementeiras ou
plantações feitas de boa fé em terreno alheio)
1. Se alguém, de boa fé,
construir obra em terreno alheio, ou nele fizer sementeira ou plantação, e o
valor que as obras, sementeiras ou plantações tiverem trazido à totalidade do
prédio for maior do que o valor que este tinha antes, o autor da incorporação
adquire a propriedade dele, pagando o valor que o prédio tinha antes das obras,
sementeiras ou plantações.
2. Se o valor acrescentado
for igual, haverá licitação entre o antigo dono e o autor da incorporação, pela
forma estabelecida no nº 2 do artigo 1333º.
3. Se o valor acrescentado
for menor, as obras, sementeiras ou plantações pertencem ao dono do terreno,
com obrigação de indemnizar o autor delas do valor que tinham ao tempo da
incorporação.
4. Entende-se que houve boa
fé, se o autor da obra, sementeira ou plantação desconhecia que o terreno era
alheio, ou se foi autorizada a incorporação pelo dono do terreno.
ARTIGO 1341º
(Obras, sementeiras ou
plantações feitas de má fé em terreno alheio)
Se a obra, sementeira ou
plantação for feita de má fé, tem o dono do terreno o direito de exigir que
seja desfeita e que o terreno seja restituído ao seu primitivo estado à custa
do autor dela, ou, se o preferir, o direito de ficar com a obra, sementeira ou
plantação pelo valor que for fixado segundo as regras do enriquecimento sem
causa.
ARTIGO 1342º
(Obras, sementeiras ou
plantações feitas com materiais alheios em terreno alheio)
1. Quando as obras,
sementeiras ou plantações sejam feitas em terreno alheio com materiais,
sementes ou plantas alheias, ao dono dos materiais, sementes ou plantas cabem
os direitos conferidos no artigo 1340º ao autor da incorporação, quer este
esteja de boa, quer de má fé.
2. Se, porém, o dono dos
materiais, sementes ou plantas tiver culpa, é-lhe aplicável o disposto no
artigo antecedente em relação ao autor da incorporação; neste caso, se o autor
da incorporação estiver de má fé, é solidária a responsabilidade de ambos, e a
divisão do enriquecimento é feita em proporção do valor dos materiais, sementes
ou plantas e da mão-de-obra.
ARTIGO 1343º
(Prolongamento de
edifício por terreno alheio)
1. Quando na construção de
um edifício em terreno próprio se ocupe, de boa fé, uma parcela de terreno
alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno ocupado, se tiverem
decorrido três meses a contar do início da ocupação, sem oposição do
proprietário, pagando o valor do terreno e reparando o prejuízo causado,
designadamente o resultante da depreciação eventual do terreno restante.
2. É aplicável o disposto
no número anterior relativamente a qualquer direito real de terceiro sobre o
terreno ocupado.
CAPÍTULO III
Propriedade de imóveis
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1344º
(Limites materiais)
1. A propriedade dos
imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo,
com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou
negócio jurídico.
2. O proprietário não pode,
todavia, proibir os actos de terceiro que, pela altura ou profundidade a que
têm lugar, não haja interesse em impedir.
ARTIGO 1345º
(Coisas imóveis sem dono
conhecido)
As coisas imóveis sem dono
conhecido consideram-se do património do Estado.
ARTIGO 1346º
(Emissão de fumo,
produção de ruídos e factos semelhantes)
O proprietário de um imóvel
pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores, cheiros, calor ou ruídos, bem
como à produção de trepidações e a outros quaisquer factos semelhantes,
provenientes de prédio vizinho, sempre que tais factos importem um prejuízo
substancial para o uso do imóvel ou não resultem da utilização normal do prédio
de que emanam.
ARTIGO 1347º
(Instalações
prejudiciais)
1. O proprietário não pode
construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de
substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o
prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei.
2. Se as obras, instalações
ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou
tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a
construção ou manutenção deles, a sua inutilização só é admitida a partir do
momemto em que o prejuízo se torne efectivo.
3. É devida, em qualquer
dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.
ARTIGO 1348º
(Escavações)
1. O proprietário tem a
faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer escavações, desde que
não prive os prédios vizinhos do apoio necssário para evitar desmoronamentos ou
deslocações de terra.
2. Logo que venham a
padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos serão indemnizados
pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as precauções julgadas
necessárias.
ARTIGO 1349º
(Passagem forçada
momentânea)
1. Se, para reparar algum
edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos
sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar
outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos.
2. É igualmente permitido o
acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de coisas suas que
acidentalmente nele se encontrem; o proprietário pode impedir o acesso,
entregando a coisa ao seu dono.
3. Em qualquer dos casos
previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser indemnizado do
prejuízo sofrido.
ARTIGO 1350º
(Ruína de construção)
Se qualquer edifício ou
outra obra oferecer perigo de ruir, no todo ou em parte, e do desmoronamento
puderem resultar danos para o prédio vizinho, é lícito ao dono deste exigir da
pessoa responsável pelos danos, nos termos do artigo 492º, as providências necessárias
para eliminar o perigo.
ARTIGO 1351º
(Escoamento natural das
águas)
1. Os prédios inferiores
estão sujeitos a receber as águas que, naturalmente e sem obra do homem,
decorrem dos prédios superiores, assim como a terra e entulhos que elas
arrastam na sua corrente.
2. Nem o dono do prédio
inferior pode fazer obras que estorvem o escoamento, nem o dono do prédio
superior obras capazes de o agravar, sem prejuízo da possibilidade de
constituição da servidão legal de escoamento, nos casos em que é admitida.
ARTIGO 1352º
(Obras defensivas das
águas)
1. O dono do prédio onde
existam obras defensivas para conter as águas, ou onde, pela variação do curso
das águas, seja necessário construir novas obras, é obrigado a fazer reparos
precisos, ou a tolerar que os façam, sem prejuízo dele, os donos dos prédios
que padeçam danos ou estejam exposto a danos iminentes.
2. O disposto no número
anterior é aplicável, sempre que seja necessário despojar algum prédio de
materiais cuja acumulação ou queda estorve o curso das águas com prejuízo ou
risco de terceiro.
3. Todos os proprietários
que participam do benefício das obras são obrigados a contribuir para as
despesas delas, em proporção do seu interesse, sem prejuízo da responsabilidade
que recaia sobre o autor dos danos.
SECÇÃO II
Direito de demarcação
ARTIGO 1353º
(Conteúdo)
O proprietário pode obrigar
os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas
entre o seu prédio e os deles.
ARTIGO 1354º
(Modo de proceder à
demarcação)
1. A demarcação é feita de
conformidade com os títulos de cada um e, na falta de títulos suficientes, de
harmonia com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar de
outros meios de prova.
2. Se os títulos não
determinarem os limites dos prédios ou a área pertencente a cada proprietário,
e a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova, a
demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais.
3. Se os títulos indicarem
um espaço maior ou menor do que o abrangido pela totalidade do terreno,
atribuir-se-á a falta ou o acréscimo proporcionalmente à parte de cada um.
ARTIGO 1355º
(Imprescritibilidade)
O direito de demarcação é
imprescritível, sem prejuízo dos direitos adquiridos por usucapião.
SECÇÃO III
Direito da tapagem
ARTIGO 1356º
(Conteúdo)
A todo o tempo o
proprietário pode murar, valar, rodear de sebes o seu prédio, ou tapá-lo de
qualquer modo.
ARTIGO 1357º
(Valas, regueiras e
valados)
O proprietário que pretenda
abrir vala ou regueira ao redor do prédio é obrigado a deixar mota externa de
largura igual à profundidade da vala e a conformar-se com o disposto no artigo
1348º; se fizer valado, deve deixar externamente regueira ou alcorca, salvo
havendo, em qualquer dos casos, uso da terra em contrário.
ARTIGO 1358º
(Presunção de comunhão)
1. As valas, regueiras e
valados, entre prédios de diversos donos, a que faltem as condições impostas no
artigo antecedente, presumem-se comuns, não havendo sinal em contrário.
2. É sinal de que a vala ou
regueira sem mota externa não é comum o achar-se a terra da escavação ou
limpeza lançada só de um lado durante mais de um ano; neste caso, presume-se
que a vala é do proprietário de cujo lado a terra estiver.
ARTIGO 1359º
(Sebes vivas)
1. Não podem ser plantadas
sebes vivas nas estremas dos prédios sem previamente se colocarem marcos
divisórios.
2. As sebes vivas
consideram-se, em caso de dúvida, pertencentes ao proprietário que mais precisa
delas; se ambos estiverem no mesmo caso, presumem-se comuns, salvo se existir
uso da terra pelo qual se determine de outro modo a sua propriedade.
SECÇÃO IV
Construções e
edificações
ARTIGO 1360º
(Abertura de janelas,
portas, varandas e obras semelhantes)
1. O proprietário que no
seu prédio levantar edifício ou outra construção não pode abrir nela janelas ou
portas que deitem directamente sobre o prédio vizinho sem deixar entre este e
cada uma das obras o intervalo de metro e meio.
2. Igual restrição é
aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, quando sejam
servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua extensão
ou parte dela.
3. Se os dois prédios forem
oblíquos entre si, a distância de metro e meio conta-se perpendicularmente do
prédio para onde deitam as vistas até à construção ou edifício novamente levantado;
mas, se a obliquidade for além de quarenta e cinco graus, não tem aplicação a
restrição imposta ao proprietário.
ARTIGO 1361º
(Prédios isentos da
restrição)
As restrições do artigo
precedente não são aplicáveis a prédios separados entre si por estrada,
caminho, rua, travessa ou outra passagem por terreno do domínio público.
ARTIGO 1362º
(Servidão de vistas)
1. A existência de janelas,
portas, varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, em contravenção do
disposto na lei, pode importar, nos termos gerais, a constituição da servidão
de vistas por usucapião.
2. Constituída a servidão
de vistas, por usucapião ou outro título, ao proprietário vizinho só é
permitido levantar edifício ou outra construção no seu prédio desde que deixe
entre o novo edifício ou construção e as obras mencionadas no nº 1 o espaço
mínimo de metro e meio, correpondente à extensão destas obras.
ARTIGO 1363º
(Frestas, seteiras ou
óculos para luz e ar)
1. Não se consideram
abrangidos pelas restrições da lei as frestas, seteiras ou óculos para luz e
ar, podendo o vizinho levantar a todo o tempo a sua casa ou contramuro, ainda
que vede tais aberturas.
2. As frestas, seteiras ou
óculos para luz e ar devem, todavia, situar-se pelo menos a um metro e oitenta
centímetros de altura, a contar do solo ou do sobrado, e não devem ter, numa
das suas dimensões, mais de quinze centímetros; a altura de um metro e oitenta
centímetros respeita a ambos os lados da parede ou muro onde essas aberturas se
encontram.
ARTIGO 1364º
(Janelas gradadas)
É aplicável o disposto no
nº 1 do artigo antecedente às aberturas, quaisquer que sejam as suas dimensões,
igualmente situadas a mais de um metro e oitenta centímetros do solo ou do
sobrado, com grades fixas de ferro ou outro metal, de secção não inferior a um
centímetro quadrado e cuja malha não seja superior a cinco centímetros.
ARTIGO 1365º
(Estilicídio)
1. O proprietário deve
edificar de modo que a beira do telhado ou outra cobertura não goteje sobre o
prédio vizinho, deixando um intervalo mínimo de cinco decímetros entre o prédio
e a beira, se de outro modo não puder evitá-lo.
2. Constituída por qualquer
título a servidão de estilicídio, o proprietário do prédio serviente não pode
levantar edifício ou construção que impeça o escoamento das águas, devendo realizar
as obras necessárias para que o escoamento se faça sobre o seu prédio, sem
prejuízo para o prédio dominante.
SECÇÃO V
Plantação de árvores e
arbustos
ARTIGO 1366º
(Termos em que pode ser
feita)
1. É lícita a plantação de
árvores e arbustos até à linha divisória dos prédios; mas ao dono do prédio
vizinho é permitido arrancar e cortar as raízes que se introduzirem no seu
terreno e o tronco ou ramos que sobre ele propenderem, se o dono da árvore,
sendo rogado judicialmente ou extrajudicialmente, o não fizer dentro de três
dias.
2. O disposto no número
antecedente não prejudica as restrições constantes de leis especiais relativas
à plantação ou sementeira de eucaliptos, acácias ou outras árvores igualmente
nocivas nas proximidades de terrenos cultivados, terras de regadio, nascentes
de água ou prédios urbanos, nem quaisquer outras restrições impostas por
motivos de interesse público.
ARTIGO 1367º
(Apanha de frutos)
O proprietário de árvore ou
arbusto contíguo a prédio de outrem ou com ele confinante pode exigir que o
dono do prédio lhe permita fazer a apanha dos frutos, que não seja possível
fazer do seu lado; mas é responsável pelo prejuízo que com a apanha vier a
causar.
ARTIGO 1368º
(Árvores ou arbustos
situados na linha divisória)
As árvores ou arbustos
nascidos na linha divisória de prédios pertencentes a donos diferentes
presumem-se comuns; qualquer dos consortes tem a faculdade de os arrancar, mas
o outro tem direito a haver metade do valor das árvores ou arbustos, ou metade
da lenha ou madeira que produzirem, como mais lhe convier.
ARTIGO 1369º
(Árvores ou arbustos que
sirvam de marco divisório)
Servindo a árvore ou o
arbusto de marco divisório, não pode ser cortado ou arrancado senão de comum
acordo.
SECÇÃO VI
Paredes e muros de
meação
ARTIGO 1370º
(Comunhão forçada)
1. O proprietário de prédio
confinante com parede ou muro alheio pode adquirir nele comunhão, no todo ou em
parte, quer quanto à sua extensão, quer quanto à sua altura, pagando metade do
seu valor e metade do valor do solo sobre que estiver construído.
2. De igual faculdade gozam
o superficiário e o enfiteuta.
ARTIGO 1371º
(Presunção de
compropriedade)
1. A parede ou muro
divisório entre dois edifícios presume-se comum em toda a sua altura, sendo os
edifícios iguais, e até à altura do inferior, se o não forem.
2. Os muros entre prédios
rústicos, ou entre pátios e quintais de prédios urbanos, presumem-se igualmente
comuns, não havendo sinal em contrário.
3. São sinais que excluem a
presunção de comunhão:
a) A existência de espigão
em ladeira só para um lado;
b) Haver no muro, só de um
lado, cachorros de pedra salientes encravados em toda a largura dele;
c) Não estar o prédio
contíguo igualmente murado pelos outros lados.
4. No caso da alínea a) do
número anterior, presume-se que o muro pertence ao prédio para cujo lado se
inclina a ladeira; nos outros casos, àquele de cujo lado se encontrem as
construções ou sinais mencionados.
5. Se o muro sustentar em
toda a sua largura qualquer construção que esteja só de um dos lados,
presume-se do mesmo modo que ele pertence exclusivamente ao dono da construção.
ARTIGO 1372º
(Abertura de janelas ou
frestas)
O proprietário a quem
pertença em comum alguma parede ou muro não pode abrir nele janelas ou frestas,
nem fazer outra alteração, sem consentimento do seu consorte.
ARTIGO 1373º
(Construção sobre o muro
comum)
1. Qualquer dos consortes
tem, no entanto, a faculdade de edificar sobre a parede ou muro comum e de
introduzir nele traves ou barrotes, contanto que não ultrapasse o meio da
parede ou do muro.
2. Tendo a parede ou muro
espessura inferior a cinco decímetros, não tem lugar a restrição do número
anterior.
ARTIGO 1374º
(Alçamento do muro
comum)
1. A qualquer dos consortes
é permitido alterar a parede ou muro comum, contanto que o faça à sua custa,
ficando a seu cargo todas as despesas de conservação da parte alterada.
2. Se a parede ou muro não
estiver em estado de aguentar o alçamento, o consorte que pretender levantá-lo
tem de reconstruí-lo por inteiro à sua custa e, se quiser aumentar-lhe a
espessura, é o espaço para isso necessário tomado do seu lado.
3. O consorte que não tiver
contribuído para o alçamento pode adquirir comunhão na parte aumentada, pagando
metade do valor dessa parte e, no caso de aumento de espessura, também metade
do valor do solo correspondente a esse aumento.
ARTIGO 1375º
(Reparação e
reconstrução do muro)
1. A reparação ou
reconstrução da parede ou muro comum é feita por conta dos consortes, em
proporção das suas partes.
2. Se o muro for
simplesmente de vedação, a despesa é dividida pelos consortes em partes iguais.
3. Se, além da vedação, um
dos consortes tirar do muro proveito que não seja comum ao outro, a despesa é
rateada entre eles em proporção do proveito que cada um tirar.
4. Se a ruína do muro
provier de facto do qual só um dos consortes tire proveito, só o beneficiário é
obrigado a reconstruí-lo ou repará-lo.
5. É sempre facultado ao
consorte eximir-se dos encargos de reparação ou reconstrução da parede ou muro,
renunciando ao seu direito nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 1411º.
SECÇÃO VII
Fraccionamento e
emparcelamento de prédios rústicos
ARTIGO 1376º
(Fraccionamento)
1. Os terrenos aptos para
cultura não podem fraccionar-se em parcelas de área inferior a determinada
superfície mínima, correspondente à unidade de cultura fixada para cada zona do
País; importa fraccionamento, para este efeito, a constituição de usufruto
sobre uma parcela do terreno.
2. Também não é admitido o
fraccionamento, quando dele possa resultar o encrave de qualquer das parcelas,
ainda que seja respeitada a área fixada para a unidade de cultura.
3. O preceituado neste
artigo abrange todo o terreno contíguo pertencente ao mesmo proprietário,
embora seja composto por prédios distintos.
ARTIGO 1377º
(Possibilidade do
fraccionamento)
A proibição do fraccionamento
não é aplicável:
a) A terrenos que
constituam partes componentes de prédios urbanos ou se destinem a algum fim que
não seja a cultura;
b) Se o adquirente da
parcela resultante do fraccionamento for proprietário de terreno contíguo ao
adquirido, desde que a área da parte restante do terreno fraccionado
corresponda, pelo menos, a uma unidade de cultura;
c) Se o fraccionamento
tiver por fim a desintegração de terrenos para construção ou rectificação de
estremas.
ARTIGO 1378º
(Troca de terrenos)
A troca de terrenos aptos
para cultura só é admissível:
a) Quando ambos os terrenos
tenham área igual ou superior à unidade de cultura fixada para a respectiva
zona;
b) Quando, tendo qualquer
dos terrenos àrea inferior à unidade de cultura, da permuta resulte adquirir um
dos proprietários terreno contíguo a outro que lhe pertença, em termos que lhe
permitam constituir um novo prédio com área igual ou superior àquela unidade;
c) Quando,
independentemente da área dos terrenos, ambos os permutantes adquiram terreno
confinante com prédio seu.
ARTIGO 1379º
(Sanções)
1. São anuláveis os actos
de fraccionamento ou troca contrários ao disposto nos artigos 1376º e 1378º,
bem como o fraccionamento efectuado ao abrigo da alínea c) do artigo 1377º, se
a construção não for iniciada dentro do prazo de três anos.
2. Têm legitimidade para a
acção de anulação o Ministério Público ou qualquer proprietário que goze do
direito de preferência nos termos do artigo seguinte.
3. A acção de anulação
caduca no fim de três anos, a contar da celebração do acto ou do termo do prazo
referido no nº 1.
ARTIGO 1380º
(Direito de preferência)
1. Os proprietários de
terrenos confinantes, de área inferior à unidade de cultura, gozam
reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda, dação em
cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja proprietário
confinante.
2. Sendo vários os
proprietários com direito de preferência, cabe este direito:
a) No caso de alienação de
prédio encravado, ao proprietário que estiver onerado com a servidão de
passagem;
b) Nos outros casos, ao
proprietário que, pela preferência, obtenha a área que mais se aproxime da
unidade de cultura fixada para a respectiva zona.
3. Estando os preferentes
em igualdade de circunstâncias, abrir-se-á licitação entre eles, revertendo o
excesso para o alienante.
4. É aplicável ao direito
de preferência conferido neste artigo o disposto nos artigos 416º a 418º e
1410º, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 1381º
(Casos em que não existe
o direito de preferência)
Não gozam do direito de
preferência os proprietários de terrenos confinantes:
a) Quando algum dos
terrenos constitua parte componente de um prédio urbano ou se destine a algum
fim que não seja a cultura;
b) Quando a alienação
abranja um conjunto de prédios que, embora dispersos, formem uma exploração
agrícola de tipo familiar.
ARTIGO 1382º
(Emparcelamento)
1. Chama-se emparcelamento
o conjunto de operações de remodelação predial destinadas a pôr termo à
fragmentação e dispersão dos prédios rústicos pertencentes ao mesmo titular,
com o fim de melhorar as condições técnicas e económicas da exploração
agrícola.
2. Os termos em que devem
ser realizadas as operações de emparcelamento são fixados em legislação
especial.
SECÇÃO VIII
Atravessadouros
ARTIGO 1383º
(Abolição dos
atravessadouros)
Consideram-se abolidos os
atravessadouros, por mais antigos que sejam, desde que não se mostrem
estabelecidos em proveito de prédios determinados, constituindo servidões.
ARTIGO 1384º
(Atravessadouros
reconhecidos)
São, porém, reconhecidos os
atravessadouros com posse imemorial, que se dirijam a ponte ou fonte de
manifesta utilidade, enquanto não existirem vias públicas destinadas à
utilização ou aproveitamento de uma ou outra, bem como os admitidos em
legislação especial.
CAPÍTULO IV
Propriedade das águas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1385º
(Classificação das
águas)
As águas são públicas ou
particulares; as primeiras estão sujeitas ao regime estabelecido em leis
especiais e as segundas às disposições dos artigos seguintes.
ARTIGO 1386º
(Águas particulares)
1. São particulares:
a) As águas que nascerem em
prédio particular e as pluviais que nele caírem, enquanto não transpuserem,
abandonadas, os limites do mesmo prédio ou daquele para onde o dono dele as
tiver conduzido, e ainda as que, ultrapassando esses limites e correndo por
prédios particulares, forem consumidas antes de se lançarem no mar ou em outra
água pública;
b) As águas subterrâneas
existentes em prédios particulares;
c) Os lagos e lagoas
existentes dentro de um prédio particular, quando não sejam alimentados por
corrente pública;
d) As águas originariamente
públicas que tenham entrado no domínio privado até 21 de Março de 1868, por
preocupação, doação régia ou concessão;
e) As águas públicas
concedidas perpetuamente para regas ou melhoramentos agrícolas;
f) As águas subterrâneas
existentes em terrenos públicos, municipais ou de freguesia, exploradas
mediante licença e destinadas a regas ou melhoramentos agrícolas.
2. Não estando fixado o
volume das águas referidas nas alíneas d), e) e f), do número anterior,
entender-se-á que há direito apenas ao caudal necessário para o fim a que as
mesmas se destinam.
ARTIGO 1387º
(Obras para
armanezamento ou derivação de águas; leito das correntes não navegáveis nem
flutuáveis)
1. São ainda particulares:
a) Os poços, galerias,
canais, levadas, aquedutos, reservatórios, albufeiras e demais obras destinadas
à captação, derivação ou armazenamento de águas públicas ou particulares;
b) O leito ou álveo das
correntes não navegáveis nem flutuáveis que atravessam terrenos particulares.
2. Entende-se por leito ou
álveo a porção do terreno que a água cobre sem transbordar para o solo natural,
habitualmente enxuto.
3. Quando a corrente passa
entre dois prédios, pertence a cada proprietário o tracto compreendido entre a
linha marginal e a linha média do leito ou álveo, sem prejuízo do disposto nos
artigos 1328º e seguintes.
4. As faces ou rampas e os
capelos dos cômoros, valados, tapadas, muros de terra, alvenaria ou
enrocamentos erguidos sobre a superfície natural do solo marginal não pertencem
ao leito ou álveo da corrente, mas fazem parte da margem.
ARTIGO 1388º
(Requisição de águas)
1. Em casos urgentes de
incêndio ou calamidade pública, as autoridades administrativas podem, sem forma
de processo nem indemnização prévia, ordenar a utilização imediata de quaisquer
águas particulares necessárias para conter ou evitar os danos.
2. Se da utilização da água
resultarem danos apreciáveis, têm os lesados direito a indemnização, paga por
aqueles em benefício de quem a água foi utilizada.
SECÇÃO II
Aproveitamento das águas
ARTIGO 1389º
(Fontes e nascentes)
O dono do prédio onde haja
alguma fonte ou nascente de água pode servir-se dela e dispor do seu uso
livremente, salvas as restrições previstas na lei e os direitos que terceiro
haja adquirido ao uso da água por título justo.
ARTIGO 1390º
(Títulos de aquisição)
1. Considera-se título
justo de aquisição da água das fontes e nascentes, conforme os casos, qualquer
meio legítimo de adquirir a propriedade de coisas imóveis ou de constituir
servidões.
2. A usucapião, porém, só é
atendida quando for acompanhada da construção de obras, visíveis e permanentes,
no prédio onde exista a fonte ou nascente, que revelem a captação e a posse da
água nesse prédio; sobre o significado das obras é admitida qualquer espécie de
prova.
3. Em caso de divisão ou
partilha de prédios sem intervenção de terceiro, a aquisição do direito de
servidão nos termos do artigo 1549º não depende da existência de sinais
reveladores da destinação do antigo proprietário.
ARTIGO 1391º
(Direitos dos prédios
inferiores)
Os donos dos prédios para
onde se derivam as águas vertentes de qualquer fonte ou nascente podem
eventualmente aproveitá-las nesses prédios; mas a privação desse uso por efeito
de novo aproveitamento que faça o proprietário da fonte ou nascente não
constitui violação de direito.
ARTIGO 1392º
(Restrições ao uso das
águas)
1. Ao proprietário da fonte
ou nascente não é lícito mudar o seu curso costumado, se os habitantes de uma
povoação ou casal há mais de cinco anos se abastecerem dela ou das suas águas
vertentes para gastos domésticos.
2. Se os habitantes da
povoação ou casal não houverem adquirido por título justo o uso das águas, o
proprietário tem direito a indemnização, que será paga, conforme os casos, pela
respectiva junta de freguesia ou pelo dono do casal.
ARTIGO 1393º
(Águas pluviais e de
lagos e lagoas)
O disposto nos artigos
antecedentes é aplicável, com as necessárias adaptações, às águas pluviais
referidas na alínea a) do nº 1 do artigo 1386º e às águas dos lagos e lagoas
compreendidas na alínea c) do mesmo número.
ARTIGO 1394º
(Águas subterrâneas)
1. É lícito ao proprietário
procurar águas subterrâneas no seu prédio, por meio de poços ordinários ou
artesianos, minas ou quaisquer escavações, contanto que não prejudique direitos
que terceiro haja adquirido por título justo.
2. Sem prejuízo do disposto
no artigo 1396º, a diminuição do caudal de qualquer água pública ou particular,
em consequência da exploração de água subterrânea, não constitui violação de
direitos de terceiro, excepto se a captação se fizer por meio de infiltrações
provocadas e não naturais.
ARTIGO 1395º
(Títulos de aquisição)
1. Consideram-se títulos
justos de aquisição das águas subterrâneas os referidos nos nº 1 e 2 do artigo
1390º.
2. A simples atribuição a
terceiro do direito de explorar águas subterrâneas não importa, para o
proprietário, privação do mesmo direito, se tal abdicação não resultar
claramente do título.
ARTIGO 1396º
(Restrições ao
aproveitamento das águas)
O proprietário que, ao
explorar águas subterrâneas, altere ou faça diminuir as águas de fonte ou
reservatório destinado a uso público é obrigado a repor as coisas no estado
anterior; não sendo isso possível, deve fornecer, para o mesmo uso, em local
apropriado, água equivalente àquela de que o público ficou privado.
ARTIGO 1397º
(Águas originariamente
públicas)
As águas referidas nas
alíneas d), e) e f) do nº 1 do artigo 1386º são inseparáveis dos prédios a que
se destinam, e o direito sobre elas caduca, revertendo as águas ao domínio
público, se forem abandonadas, ou não se fizer delas um uso proveitoso
correpondente ao fim a que eram destinadas ou para que foram concedidas.
SECÇÃO III
Condomínio das águas
ARTIGO 1398º
(Despesas de
conservação)
1. Pertencendo a água a
dois ou mais co-utentes, todos devem contribuir para as despesas necessárias ao
conveniente aproveitamento dela, na proporção do seu uso, podendo para esse fim
executar-se as obras necessárias e fazer-se os trabalhos de pesquisa indispensáveis,
quando se reconheça haver perda ou diminuição de volume ou caudal.
2. O co-utente não pode
eximir-se do encargo, renunciando ao seu direito em benefício dos outros
co-utentes, contra a vontade destes.
ARTIGO 1399º
(Divisão de águas)
A divisão das águas comuns,
quando deva realizar-se, é feita, no silêncio do título, em proporção da
superfície, necessidades e natureza da cultura dos terrenos a regar, podendo
repartir-se o caudal ou o tempo da sua utilização, como mais convier ao seu bom
aproveitamento.
ARTIGO 1400º
(Costumes na divisão de
águas)
1. As águas fruídas em
comum que, por costume seguido há mais de vinte anos, estiveram divididas ou
subordinadas a um regime estável e normal de distribuição continuam a ser
aproveitadas por essa forma, sem nova divisão.
2. A obrigatoriedade do
costume impõe-se também aos co-utentes que não sejam donos da água, sem
prejuízo dos direitos do proprietário, que pode a todo tempo desviá-la ou
reivindicá-la, se estiver a ser aproveitada por quem não tem nem adquiriu
direito a ela.
ARTIGO 1401º
(Costumes abolidos)
1. Consideram-se abolidos
no aproveitamento das águas o costume de as utilizar pelo sistema de
torna-torna ou outros semelhantes, mediante os quais a água pertença ao
primeiro ocupante, sem outra norma de distribuição que não seja o arbítrio; as
águas que assim tenham sido utilizadas consideram-se indivisas para todos os
efeitos.
2. Consideram-se igualmente
abolidos os costumes de romper ou esvaziar os açudes e diques construídos
superiormente, distraindo deles água para ser utilizada em prédios ou engenhos
inferiormente situados que não têm direito ao aproveitamento; se existir
direito ao aproveitamento, consideram-se as águas indivisas.
ARTIGO 1402º
(Interpretação dos
títulos)
Sempre que dos títulos não
resulte outro sentido, entende-se por uso contínuo o de todos os instantes; por
uso diário, o de vinte e quatro horas a contar da meia noite; por uso diurno ou
nocturno, o que medeia entre o nascer e o pôr do Sol ou vice-versa, por uso
semanal, o que principia ao meio-dia de domingo e termina à mesma hora em igual
dia da semana seguinte; por uso estival, o que começa em 1 de Abril e termina
em 1 de Outubro seguinte; por uso hibernal, o que corresponde aos outros meses
do ano.
CAPÍTULO V
Compropriedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1403º
(Noção)
1. Exite propriedade em
comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente
titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.
2. Os direitos dos
consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são qualitativamente iguais,
embora possam ser quantitativamente diferentes; as quotas presume-se, todavia,
quantitativamente iguais na falta de indicação em contrário do título
constitutivo.
ARTIGO 1404º
(Aplicação das regras da
compropriedade a outras formas de comunhão)
As regras da compropriedade
são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros
direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada um deles.
ARTIGO 1405º
(Posição dos
comproprietários)
1. Os comproprietários
exercem, em conjunto, todos os direitos que pertecem ao proprietário singular;
separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção da
suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.
2. Cada consorte pode
reivindicar de terceiro a coisa comum, sem que a este seja lícito opor-lhe que
ela lhe não pertence por inteiro.
SECÇÃO II
Direitos e encargos do
comproprietário
ARTIGO 1406º
(Uso da coisa comum)
1. Na falta de acordo sobre
o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela,
contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina
e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito.
2. O uso da coisa comum por
um dos comproprietários não constitui posse exclusiva ou posse de quota
superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título.
ARTIGO 1407º
(Administração da coisa)
1. É aplicável aos
comproprietários, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 985º;
para que haja, porém, a maioria dos consortes exigida por lei, é necessário que
eles representem, pelo menos, metade do valor total das quotas.
2. Quando não seja possível
formar a maioria legal, a qualquer dos consortes é lícito recorrer ao tribunal,
que decidirá segundo juízos de equidade.
3. Os actos realizados pelo
comproprietário contra a oposição da maioria legal dos consortes são anuláveis
e tornam o autor responsável pelo prejuízo a que der causa.
ARTIGO 1408º
(Disposição e oneração
da quota)
1. O comproprietário pode
dispor de toda a sua quota na comunhão ou de parte dela, mas não pode, sem
consentimento dos restantes consortes, alienar nem onerar parte especificada da
coisa comum.
2. A disposição ou oneração
de parte especificada sem o consentimento dos consortes é havida como
disposição ou oneração de coisa alheia.
3. A disposição da quota
está sujeita à forma exigida para a disposição da coisa.
ARTIGO 1409º
(Direito de preferência)
1. O comproprietário goza
do direito de preferência e tem o primeiro lugar entre os preferentes legais no
caso de venda, ou dação em cumprimento, a estranhos da quota de qualquer dos
seus consortes.
2. É aplicável à
preferência do comproprietário, com as adaptações convenientes, o disposto nos
artigos 416º a 418º.
3. Sendo dois ou mais os
preferentes, a quota alienada é adjudicada a todos, na proporção das suas
quotas.
ARTIGO 1410º
(Acção de preferência)
1. O comproprietário a quem
se não dê conhecimento da venda ou da dação em cumprimento tem o direito de
haver para si a quota alienada, contanto que o requeira dentro do prazo de seis
meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da
alienação, e deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à propositura da
acção.
2. O direito de preferência
e a respectiva acção não são prejudicados pela modificação ou distrate da
alienação, ainda que estes efeitos resultem de confissão ou transacção
judicial.
(Redacção do Dec.-Lei
68/96, de 31-5)
ARTIGO 1411º
(Benfeitorias
necessárias)
1. Os comproprietários
devem contribuir, em proporção das respectivas quotas, para as despesas
necessárias à conservação ou fruição da coisa comum, sem prejuízo da faculdade
de se eximirem do encargo renunciando ao seu direito.
2. A renúncia, porém, não é
válida sem o consentimento dos restantes consortes, quando a despesa tenha sido
anteriormente aprovada pelo interessado, e é revogável sempre que as despesas
previstas não venham a reslizar-se.
3. A renúcia do
comproprietário está sujeita à forma prescrita para a doação e aproveita a
todos os consortes, na proporção das respectivas quotas.
ARTIGO 1412º
(Direito de exigir a
divisão)
1. Nenhum dos
comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo quando se houver
convencionado que a coisa se conserve indivisa.
2. O prazo fixado para a
indivisão da coisa não excederá cinco anos; mas é lícito renovar ests prazo,
uma ou mais vezes, por nova convenção.
3. A cláusula de indivisão
vale em relação a terceiros, mas deve ser registada para tal efeito, se a
compropriedade respeitar a coisas imóveis ou a coisas móveis sujeitas a
registo.
ARTIGO 1413º
(Processo da divisão)
1. A divisão é feita
amigavelmente ou nos termos da lei do processo.
2. A divisão amigável está
sujeita à forma exigida para a alienação onerosa da coisa.
CAPÍTULO VI
Propriedade horizontal
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1414º
(Princípio geral)
As fracções de que um
edifício se compõe, em condições de constituirem unidades independentes, podem
pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal.
ARTIGO 1415º
(Objecto)
Só podem ser objecto de
propriedade horizontal as fracções autónomas que, além de constituírem unidades
independentes, sejam distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma
parte comum do prédio ou para a via pública.
ARTIGO 1416º
(Falta de requisitos
legais)
1. A falta de requisitos
legalmente exigidos importa a nulidade do título constitutivo da propriedade
horizontal e a sujeição do prédio ao regime da compropriedade, pela atribuição
a cada consorte da quota que lhe tiver sido fixada nos termos do artigo 1418º ou,
na falta de fixação, da quota correspondente ao valor relativo da sua fracção.
2. Têm legitimidade para
arguir a nulidade do título os condóminos, e também o Ministério Público sobre
participação da entidade pública a quem caiba a aprovação ou fiscalização das
construções.
SECÇÃO II
Constituição
ARTIGO 1417º
(Princípio geral)
1. A propriedade horizontal
pode ser constituída por negócio jurídico, usucapião ou decisão judicial,
proferida em acção de divisão de coisa comum ou em processo de inventário.
2. A constituição da
propriedade horizontal por decisão judicial pode ter lugar a requerimento de
qualquer consorte, desde que no caso se verifiquem os requisitos exigidos pelo
artigo 1415º.
ARTIGO 1418º
(Conteúdo do título
constitutivo)
1. No título constitutivo
serão especificadas as partes do edifício correspondentes às várias fracções,
por forma que estas fiquem devidamente individualizadas, e será fixado o valor
relativo de cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem, do valor total
do prédio.
2. Além das especificações
constantes do número anterior, o título constitutivo pode ainda conter,
designadamente:
a) Menção do fim a que se
destina cada fracção ou parte comum;
b) Regulamento do
condomínio, disciplinando o uso, fruição e conservação, quer das partes comuns,
quer das fracções autónomas;
c) Previsão do compromisso
arbitral para a resolução dos litígios emergentes da relação de condomínio.
3. A falta da especificação
exigida pelo nº 1 e a não coincidência entre o fim referido na alínea a) do nº
2 e o que foi fixado no projecto aprovado pela entidade pública competente
determinam a nulidade do título constitutivo.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1419º
(Modificação do título)
1. Sem prejuízo do disposto
no nº 3 do artigo 1422º-A, o título constitutivo da propriedade horizontal pode
ser modificado por escritura pública, havendo acordo de todos os condóminos.
2. O administrador, em
representação do condomínio, pode outorgar a escritura pública a que se refere
o número anterior, desde que o acordo conste de acta assinada por todos os
condóminos.
3. A inobservância do
disposto no artigo 1415º importa a nulidade do acordo; esta nulidade pode ser
declarada a requerimento das pessoas e entidades designadas no nº 2 do artigo
1416º.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
SECÇÃO III
Direitos e encargos dos
condóminos
ARTIGO 1420º
(Direitos dos
condóminos)
1. Cada condómino é
proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes
comuns do edifício.
2. O conjunto dos dois direitos
é incindível; nenhum deles pode ser alienado separadamente, nem é lícito
renunciar à parte comum como meio de o condómino se desonerar das despesas
necessárias à sua conservação ou fruição.
ARTIGO 1421º
(Partes comuns do
prédio)
1. São comuns as seguintes
partes do edifício:
a) O solo, bem como os
alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que
constituem a estrutura do prédio;
b) O telhado ou os terraços
de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção;
c) As entradas,
vestílbulos, escadas e corredores de uso ou passagem comum a dois ou mais
condóminos;
d) As instalações gerais de
água, electricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e
semelhantes.
2. Presumem-se ainda
comuns:
a) Os pátios e jardins
anexos ao edifício;
b) Os ascensores;
c) As dependências
destinadas ao uso e habitação do porteiro;
d) As garagens e outros
lugares de estacionamento;
e) Em geral, as coisas que
não sejam afectadas ao uso exclusivo de um dos condóminos.
3. O título constitutivo
pode afectar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas das partes
comuns.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1422º
(Limitações ao exercício
dos direitos)
1. Os condóminos, nas
relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que
exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas
aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
2. É especialmente vedado
aos condóminos:
a) Prejudicar, quer com
obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica
ou o arranjo estético do edifício;
b) Destinar a sua fracção a
usos ofensivos dos bons costumes;
c) Dar-lhe uso diverso do
fim a que é destinada;
d) Praticar quaisquer actos
ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou,
posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem
oposição.
3. As obras que modifiquem
a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas
se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada
por maioria representativa de dois terços do vaslor total do prédio.
4. Sempre que o título
constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao
seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria
representativa de dois terços do valor total do prédio.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1422º-A
(Junção e divisão de
fracções autónomas)
1. Não carece de
autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas ou mais
fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas.
2. Para efeitos do disposto
no número anterior, a contiguidade das fracções é dispensada quando se trate de
fracções correspondentes a arrecadações e garagens.
3. Não é permitida a
divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo autorização do título
constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição.
4. Nos casos previstos nos
números anteriores, cabe aos condóminos que juntaram ou cindiram as fracções o
poder de, por acto unilateral constante de escritura pública, introduzir a
correspondente alteração no título constitutivo.
5. A escritura pública a
que se refere o número anterior deve ser comunicada ao administrador no prazo
de 30 dias.
(Aditado pelo Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1423º
(Direitos de preferência
e de divisão)
Os condóminos não gozam do
direito de preferência na alienação de fracções nem do direito de pedir a
divisão das partes comuns.
ARTIGO 1424º
(Encargos de conservação
e fruição)
1. Salvo disposição em
contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do
edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos
condóminos em proporção do valor das suas fracções.
2. Porém, as despesas
relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante
disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria
representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo dos
condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que
devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua
imputação.
3. As despesas relativas
aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam
exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.
4. Nas despesas dos
ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser
servidas.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1425º
(Inovações)
1. As obras que constituam
inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria
representar dois terços do valor total do prédio.
2. Nas partes comuns do
edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por
parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns.
ARTIGO 1426º
(Encargos com as
inovações)
1. As despesas com as
inovações ficam a cargo dos condóminos nos termos fixados pelo artigo 1424º.
2. Os condóminos que não
tenham aprovado a inovação são obrigados a concorrer para as respectivas
despesas, salvo se a recusa for judicialmente havida como fundada.
3. Considera-se sempre
fundada a recusa, quando as obras tenham natureza voluptuária ou não sejam
proporcionadas à importância do edifício.
4. O condómino cuja recusa
seja havida como fundada pode a todo o tempo participar nas vantagens da
inovação, mediante o pagamento da quota correspondente às despesas de execução
e manutenção da obra.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1427º
(Reparações indispensáveis
e urgentes)
As reparações
indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a
efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de qualquer
condómino.
ARTIGO 1428º
(Destruição do edifício)
1. No caso de destruição do
edifício ou de uma parte que represente, pelo menos, três quartos do seu valor,
qualquer dos condóminos tem o direito de exigir a venda do terreno e dos
materiais, pela forma que a assembleia vier a designar.
2. Se a destruição atingir
uma parte menor, pode a assembleia deliberar, pela maioria do número dos
condóminos e do capital investido no edifício, a reconstrução deste.
3. Os condómios que não
queiram participar nas despesas da reconstrução podem ser obrigados a alienar
os seus direitos a outros condóminos, segundo o valor entre eles acordado ou
fixado judicialmente.
4. É permitido ao alienante
escolher o condómino ou condóminos a quem a transmissão deve ser feita.
ARTIGO 1429º
(Seguro obrigatório)
1. É obrigatório o seguro
contra o risco de incêndio do edifício, quer quanto às fracções autónomas, quer
relativamente às partes comuns.
2. O seguro deve ser
celebrado pelos condóminos; o administrador deve, no entanto, efectuá-lo quando
os condóminos o não hajam feito dentro do prazo e pelo valor que, para o
efeito, tenha sido fixado em assembleia; nesse caso, ficará com o direito de
reaver deles o respectivo prémio.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1429º-A
(Regulamento do
condomínio)
1 - Havendo mais de quatro
condóminos e caso não faça parte do título constitutivo, deve ser elaborado um
regulamento do condomínio disciplinando o uso, a fruição e a conservação das
partes comuns.
2 - Sem prejuízo do
disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 1418º, a feitura do regulamento compete
à assembleia de condóminos ou ao administrador, se aquela o não houver
elaborado.
(Aditado pelo Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
SECÇÃO IV
Administração das partes
comuns do edifício
ARTIGO 1430º
(Órgãos administrativos)
1. A administração das
partes comuns do edifício compete à assembleia dos condóminos e a um
administrador.
2. Cada condómio tem na
assembleia tantos votos quantas as unidades inteiras que couberem na
percentagem ou permilagem a que o artigo 1418º se refere.
ARTIGO 1431º
(Assembleia dos
condóminos)
1. A assembleia reúne-se na
primeira quinzena de Janeiro, mediante convocação do administrador, para
discussão e aprovação das contas respeitantes ao último ano e aprovação do
orçamento das despesas a efectuar durante o ano.
2. A assembleia também
reunirá quando for convocada pelo administrador, ou por condóminos que
representem, pelo menos, vinte e cinco por cento do capital investido.
3. Os condóminos podem
fazer-se representar por procurador.
ARTIGO 1432º
(Convocação e
funcionamento da assembleia)
1. A assembleia é convocada
por meio de carta registada, emviada com 10 dias de antecedência, ou mediante
aviso convocatório feito com a mesma antecedência, desde que haja recibo de
recepção assinado pelos condóminos.
2. A convocatória deve
indicar o dia, hora, local e ordem de trabalhos da reunião e informar sobre os
assuntos cujas deliberações só podem ser aprovadas por unanimidade dos votos.
3. As deliberações são
tomadas, salvo disposição especial, por maioria dos votos representativos do
capital investido.
4. Se não comparecer o
número de condóminos suficiente para se obter vencimento e na convocatória não
tiver sido desde logo fixada outra data, considera-se convocada nova reunião
para uma semana depois, na mesma hora e local, podendo neste caso a assembleia
deliberar por maioria de votos dos condóminos presentes, desde que estes
representem, pelo menos, um quarto do valor total do prédio.
5. As deliberações que
careçam de ser aprovadas por unanimidade dos votos podem ser aprovadas por
unanimidade dos condóminos presentes desde que estes representem, pelo menos,
dois terços do capital investido, sob condição de aprovação da deliberação
pelos condóminos ausentes, nos termos dos números seguintes.
6. As deliberações têm de
ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, por carta registada com aviso
de recepção, no prazo de 30 dias.
7. Os condóminos têm 90
dias após a recepção da carta referida no número anterior para comunicar, por
escrito, à assembleia de condóminos o seu assentimento ou a sua discordância.
8. O silêncio dos
condóminos deve ser considerado como aprovação da deliberação comunicada nos
termos do nº 6.
9. Os condóminos não
residentes devem comunicar, por escrito, ao administrador o seu domicílio ou o
do seu representante.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1433º
(Impugnação das
deliberações)
1. As deliberações da
assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são
anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.
2. No prazo de 10 dias
contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou contado da sua
comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a
convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias,
para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.
3. No prazo de 30 dias
contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a
deliberação a um centro de arbitragem.
4. O direito de propor a
acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da
assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de
60 dias sobre a data da deliberação.
5. Pode também ser
requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei de processo.
6. A representação
judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao
administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1434º
(Compromisso arbitral)
1. A assembleia pode
estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos arbitrais para a
resolução de litígios entre condóminos, ou entre condóminos e o administrador,
e fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições deste código,
das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador.
2. O montante das penas
aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável
anual da fracção do infractor.
ARTIGO 1435º
(Administrador)
1. O administrador é eleito
e exonerado pela assembleia.
2. Se a assembleia não
eleger administrador, será este nomeado pelo tribunal a requerimento de
qualquer dos condóminos.
3. O administrador pode ser
exonerado pelo tribunal, a requerimento de qualquer condómino, quando se mostre
que praticou irregularidades ou agiu com negligência no exercício das suas funções.
4. O cargo de administrador
é remunerável e tanto pode ser desempenhado por um dos condóminos como por
terceiro; o período de funções é, salvo disposição em contrário, de um ano,
renovável.
5. O administrador
mantém-se em funções até que seja eleito ou nomeado o seu sucessor.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1435º-A
(Administrador
provisório)
1. Se a assembleia de
condóminos não eleger administrador e este não houver sido nomeado
judicialmente, as correspondentes funções são obrigatoriamente desempenhadas, a
título provisório, pelo condómino cuja fracção ou fracções representem a maior
percentagem do capital investido, salvo se outro condómino houver manifestado
vontade de exercer o cargo e houver comunicado tal propósito aos demais condóminos.
2. Quando, nos termos do
número anterior, houver mais de um condómino em igualdade de circunstâncias, as
funções recaem sobre aquele a que corresponda a primeira letra na ordem
alfabética utilizada na descrição das fracções constante do registo predial.
3. Logo que seja eleito ou
judicialmente nomeado um administrador, o condómino que nos termos do presente
artigo se encontre provido na administração cessa funções, devendo entregar
àquele todos os documentos respeitantes ao condomínio que estejam confiados à
sua guarda.
(Aditado pelo Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1436º
(Funções do
administrador)
São funções do
administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela assembleia:
a) Convocar a assembleia
dos condóminos;
b) Elaborar o orçamento das
receitas e despesas relativas a cada ano;
c) Verificar a existência
do seguro contra o risco de incêndio, propondo à assembleia o montante do
capital seguro;
d) Cobrar as receitas e
efectuar as despesas comuns;
e) Exigir dos condóminos a
sua quota-parte nas despesas aprovadas;
f) Realizar os actos
conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns;
g) Regular o uso das coisas
comuns e a prestação dos serviços de interesse comum;
h) Executar as deliberações
da assembleia;
i) Representar o conjunto
dos condóminos perante as autoridades administrativas;
j) Prestar contas à
assembleia;
l) Assegurar a execução do
regulamento e das disposições legais e administrativas relativas ao condomínio;
m) Guardar e manter todos
os documentos que digam respeito ao condomínio.
(Redacção do Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
ARTIGO 1437º
(Legitimidade do
administrador)
1. O administrador tem
legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer
contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado
pela assembleia.
2. O administrador pode
também ser demandado nas acções respeitentes às partes comuns do edifício.
3. Exceptuam-se as acções
relativas a questões de propriedade ou posse dos bens comuns, salvo se a
assembleia atribuir para o efeito poderes especiais ao administrador.
ARTIGO 1438º
(Recurso dos actos do
administrador)
Dos actos do administrador
cabe recurso para a assembleia, a qual pode neste caso ser convocada pelo
condómino recorrente.
ARTIGO 1438º-A
(Propriedade horizontal
de conjuntos de edifícios)
O regime previsto neste
capítulo pode ser aplicado, com as necessárias adptações, a conjuntos de
edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si pela existência de partes
comuns afectadas ao uso de todas ou algumas unidades ou fracções que os
compõem.
(Aditado pelo Dec.-Lei
267/94, de 25-10)
TÍTULO III
DO USUFRUTO, USO E
HABITAÇÃO
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1439º
(Noção)
Usufruto é o direito de
gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua
forma ou substância.
ARTIGO 1440º
(Constituição)
O usufruto pode ser
constituído por contrato, testamento, usucapião ou disposição da lei.
ARTIGO 1441º
(Usufruto simultâneo e
sucessivo)
O usufruto pode ser
constituído em favor de uma ou mais pessoas, simultânea ou sucessivamente,
contanto que existam ao tempo em que o direito do primeiro usufrutuário se
torne efectivo.
ARTIGO 1442º
(Direito de acrescer)
Salvo estipulação em
contrário, o usufruto constituído por contrato ou testamento em favor de várias
pessoas conjuntamente só se consolida com a propriedade por morte da última que
sobreviver.
ARTIGO 1443º
(Duração)
Sem prejuízo do disposto
nos artigos anteriores, o usufruto não pode exceder a vida do usufrutuário;
sendo constituído a favor de uma pessoa colectiva, de direito público ou
privado, a sua duração máxima é de trinta anos.
ARTIGO 1444º
(Trespasse a terceiro)
1. O usufrutuário pode
trespassar a outrem o seu direito, definitiva ou temporáriamente, bem como
onerá-lo, salvas as restrições impostas pelo título constitutivo ou pela lei.
2. O usufrutuário responde
pelos danos que as coisas padecerem por culpa da pessoa que o substituir.
ARTIGO 1445º
(Direitos e obrigações
do usufrutuário)
Os direitos e obrigações do
usufrutuário são regulados pelo título constitutivo do usufruto; na falta ou
insuficiência deste, observar-se-ão as disposições seguintes.
CAPÍTULO II
Direitos do usufrutuário
ARTIGO 1446º
(Uso, fruição e
administração da coisa ou do direito)
O usufrutuário pode usar,
fruir e administrar a coisa ou o direito como faria um bom pai de família,
respeitando o seu destino económico.
ARTIGO 1447º
(Indemnização do
usufrutuário)
O usufrutuário, ao começar
o usufruto, não é obrigado a abonar ao proprietário despesa alguma feita; mas,
findo o usufruto, o proprietário é obrigado a indemnizar aquele das despesas de
cultura, sementes ou matérias-primas e, de um modo geral, de todas as despesas
de produção feitas pelo usufrutuário, até ao valor dos frutos que vierem a ser
colhidos.
ARTIGO 1448º
(Alienação dos frutos
antes da colheita)
Se o usufrutuário tiver
alienado frutos antes da colheita e o usufruto se extinguir antes que sejam
colhidos, a alienação subsiste, mas o produto dela pertence ao proprietário,
deduzida a indemnização a que o artigo anterior se refere.
ARTIGO 1449º
(Âmbito do usufruto)
O usufruto abrange as
coisas acrescidas e todos os direitos inerentes à coisa usufruída.
ARTIGO 1450º
(Benfeitorias úteis e
voluptuárias)
1. O usufrutuário tem a
faculdade de fazer na coisa usufruída as benfeitorias úteis e voluptuárias que
bem lhe parecer, contanto que não altere a sua forma ou substância, nem o seu
destino económico.
2. É aplicável ao
usufrutuário, quanto a benfeitorias úteis e voluptuárias, o que neste código se
prescreve relativamente ao possuidor de boa fé.
ARTIGO 1451º
(Usufruto de coisas
consumíveis)
1. Quando o usufruto tiver
por objecto coisas consumíveis, pode o usufrutuário servir-se delas ou
aliená-las, mas é obrigado a restituir o seu valor, findo o usufruto, no caso
de as coisas terem sido estimadas; se o não foram, a restituição será feita
pela entrega de outras do mesmo género, qualidade ou quantidade, ou do valor
destas na conjuntura em que findar o usufruto.
2. O usufruto de coisas
consumíveis não importa transferência da propriedade para o usufrutuário.
ARTIGO 1452º
(Usufruto de coisas
deterioráveis)
1. Se o usufruto abranger
coisas que, não sendo consumíveis, são, todavia, susceptíveis de se
deteriorarem pelo uso, não é o usufrutuário obrigado a mais do que restituí-las
no fim do usufruto como se encontrarem, a não ser que tenham sido deterioradas
por uso diverso daquele que lhes era próprio ou por culpa do usufrutuário.
2. Se as não apresentar, o
usufrutuário responde pelo valor que as coisas tinham na conjuntura em que
começou o usufruto, salvo se provar que perderam todo o seu valor em uso
legítimo.
ARTIGO 1453º
(Perecimento natural de
árvores e arbustos)
1. Ao usufrutuário de
árvores ou arbustos é lícito aproveitar-se das que forem perecendo
naturalmente.
2. Tratando-se, porém, de árvores
ou arbustos frutíferos, o usufrutuário é obrigado a plantar tantos pés quantos
os que perecerem naturalmente, ou a substituir esta cultura por outra
igualmente útil para o proprietário, se for impossível ou prejudicial a
renovação de plantas do mesmo género.
ARTIGO 1454º
(Perecimento acidental
de árvores e arbustos)
1. As árvores ou arbustos
que caiam ou sejam arrancados ou quebrados por acidente pertencem ao
proprietário, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo seguinte quando se
trate de matas ou árvores de corte.
2. O usufrutuário pode,
todavia, aplicar essas árvores e arbustos às reparações que seja obrigado a
fazer, ou exigir que o proprietário as retire, desocupando o terreno.
ARTIGO 1455º
(Usufruto de matas e
árvores de corte)
1. O usufrutuário de matas
ou quaisquer árvores isoladas que se destinem à produção de madeira ou lenha
deve observar, nos cortes, a ordem e as praxes usadas pelo proprietário ou, na
sua falta, o uso da terra.
2. Se, em consequência de
ciclone, incêndio, requisição do Estado ou outras causas análogas vier a ser
prejudicada consideravelmente a fruição normal do usufrutuário, deve o
proprietário compensá-lo até ao limite dos juros da quantia correspondente ao
valor das árvores mortas, ou até ao limite dos juros da importância recebida.
ARTIGO 1456º
(Usufruto de plantas de
viveiro)
O usufrutuário de plantas
de viveiro é obrigado a conformar-se, no arranque das plantas, com a ordem e
praxes do proprietário ou, na sua falta, com o uso da terra, tanto pelo que
toca ao tempo e modo do arranque como pelo que respeita ao tempo e modo de
retanchar o viveiro.
ARTIGO 1457º
(Exploração de minas)
1. O usufrutuário de
concessão mineira deve conformar-se, na exploração das minas, com as praxes
seguidas pelo respectivo titular.
2. O usufrutuário de
terrenos onde existam explorações mineiras tem direito às quantias devidas ao
proprietário do solo, quer a título de renda, quer por qualquer outro título,
em proporção do tempo que durar o usufruto.
ARTIGO 1458º
(Exploração de
pedreiras)
1. O usufrutuário não pode
abrir de novo pedreiras sem consentimento do proprietário; mas, se elas já
estiverem em exploração ao começar o usufruto,tem o usufrutuário a faculdade de
explorá-las, conformando-se com as praxes observadas pelo proprietário.
2. A proibição não inibe o
usufrutuário de extrair pedra do solo para reparações ou obras a que seja
obrigado.
ARTIGO 1459º
(Exploração de águas)
1. O usufrutuário pode, em
benefício do prédio usufruído, procurar águas subterrâneas por meio de poços,
minas ou outras escavações.
2. As benfeitorias a que o
número anterior se refere ficam sujeitas ao que neste código se dispõe quanto
ao possuidor de boa fé.
ARTIGO 1460º
(Constituição de
servidões)
1. Relativamente à
constituição de servidões activas, o usufrutuário goza dos mesmos direitos do
proprietário, mas não lhe é lícito constituir encargos que ultrapassem a
duração do usufruto.
2. O proprietário não pode
constituir servidões sem consentimento do usufrutuário, desde que delas resulte
diminuição do valor do usufruto.
ARTIGO 1461º
(Tesouros)
Se o usufrutuário descobrir
na coisa usufruída algum tesouro, observar-se-ão as disposições deste código
acerca dos que acham tesouros em propriedade alheia.
ARTIGO 1462º
(Usufruto sobre
universalidades de animais)
1. Se o usufruto for
constituído numa universalidade de animais, é o usufrutuário obrigado a
substituir com as crias novas as cabeças que, por qualquer motivo, vierem a
faltar.
2. Se os animais se
perderem, na totalidade ou em parte, por caso fortuito, sem produzirem outros
que os substituam, o usufrutuário é tão somente obrigado a entregar as cabeças
restantes.
3. Neste caso, porém, o
usufrutuário é responsável pelos despojos dos animais, quando de tais despojos
se tenha aproveitado.
ARTIGO 1463º
(Usufruto de rendas vitalícias)
O usufrutuário de rendas
vitalícias tem direito a perceber as prestações correspondentes à duração do
usufruto, sem ser obrigado a qualquer restituição.
ARTIGO 1464º
(Usufruto de capitais
postos a juro)
1. O usufrutuário de
capitais postos a juro ou a qualquer outro interesse, ou investidos em títulos
de crédito, tem o direito de perceber os frutos correspondentes à duração do
usufruto.
2. Não é lícito levantar ou
investir capitais sem o acordo dos dois titulares; no caso de divergência, pode
ser judicialmente suprido o consentimento, quer do proprietário, quer do
usufrutuário.
ARTIGO 1465º
(Usufruto constituído
sobre dinheiro e usufruto de capitais levantados)
1. Se o usufruto tiver por
objecto certa quantia, e bem assim quando no decurso do usufruto sejam
levantados capitais nos termos do artigo anterior, tem o usufrutuário a
faculdade de administrar esses valores como bem lhe parecer, desde que preste a
devida caução; neste caso, corre por sua conta o risco da perda da soma
usufruída.
2. Se o usufrutuário não
quiser usar desta faculdade, é aplicável o disposto no nº 2 do artigo anterior.
ARTIGO 1466º
(Prémios e outras
utilidades aleatórias)
O usufrutuário de títulos
de crédito tem direito à fruição dos prémios ou outras utilidades aleatórias
produzidas pelo título.
ARTIGO 1467º
(Usufruto de títulos de
participação)
1. O usufrutuário de acções
ou de partes sociais tem direito:
a) Aos lucros distribuídos
correspondentes ao tempo de duração do usufruto;
b) A votar nas assembleias
gerais, salvo quando se trate de deliberações que importem alteração dos
estatutos ou dissolução da sociedade;
c) A usufruir os valores
que, no acto de liquidação da sociedade ou da quota, caibam à parte social
sobre que incide o usufruto.
2. Nas deliberações que
importem alteração dos estatutos ou dissolução da sociedade, o voto pertence
conjuntamente ao usufrutuário e ao titular da raiz.
CAPÍTULO III
Obrigações do
usufrutário
ARTIGO 1468º
(Relação de bens e
caução)
Antes de tomar conta dos
bens, o usufrutuário deve:
a) Relacioná-los, com
citação ou assistência do proprietário, declarando o estado deles, bem como o
valor dos móveis, se os houver;
b) Prestar caução, se esta
lhe for exigida, tanto para a restituição dos bens ou do respectivo valor,
sendo bens consumíveis, como para a reparação das deteriorações que venham a
padecer por sua culpa, ou para o pagamento de qualquer outra indemnização que
seja devida.
ARTIGO 1469º
(Dispensa de caução)
A caução não é exigível do
alienante com reserva de usufruto e pode ser dispensada no título constitutivo
do usufruto.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1470º
(Falta de caução)
1. Se o usufrutuário não
prestar a caução devida, tem o proprietário a faculdade de exigir que os
imóveis se arrendem ou ponham em administração, que os móveis se vendam ou lhe
sejam entregues, que os capitais, bem como a importância dos preços das vendas,
se dêem a juros ou se empreguem em títulos de crédito nominativos, que os
títulos ao portador se convertam em nominativos ou se depositem nas mãos de terceiro,
ou que se adoptem outras medidas adequadas.
2. Não havendo acordo do
usufrutuário quanto ao destino dos bens, decidirá o tribunal.
ARTIGO 1471º
(Obras e melhoramentos)
1. O usufrutuário é
obrigado a consentir ao proprietário quaisquer obras ou melhoramentos de que
seja susceptível a coisa usufruída, e também quaisquer novas plantações, se o
usufruto recair em prédios rústicos, contanto que dos actos do proprietário não
resulte diminuição do valor do usufruto.
2. Das obras ou
melhoramentos realizados tem o usufrutuário direito ao usufruto, sem ser
obrigado a pagar juros das somas desembolsadas pelo proprietário ou qualquer
outra indemnização; no caso, porém, de as obras ou melhoramentos aumentarem o
rendimento líquido da coisa usufruída, o aumento pertence ao proprietário.
ARTIGO 1472º
(Reparações ordinárias)
1. Estão a cargo do
usufrutuário tanto as reparações ordinárias indispensáveis para a conservação
da coisa como as despesas de administração.
2. Não se consideram
ordinárias as reparações que, no ano em que forem necessárias, excedam dois
terços do rendimento líquido desse ano.
3. O usufrutuário pode
eximir-se das reparações ou despesas a que é obrigado, renunciando ao usufruto.
ARTIGO 1473º
(Reparações
extraordinárias)
1. Quanto às reparações extraordinárias,
só incumbe ao usufrutuário avisar em tempo o proprietário, para que este
querendo, as mande fazer; se, porém, elas se tiverem tornado necessárias por má
administração do usufrutuário, é aplicável o disposto no artigo anterior.
2. Se o proprietário,
depois de avisado, não fizer as reparações extraordinárias, e estas forem de
utilidade real, pode o usufrutuário fazê-las a expensas suas e exigir a
importância despendida, ou o pagamento do valor que tiverem no fim do usufruto,
se este valor for inferior ao custo.
3. Se o proprietário fizer
as reparações, observar-se-á o disposto no nº 2 do artigo 1471º.
ARTIGO 1474º
(Impostos e outros
encargos anuais)
O pagamento dos impostos e
quaisquer outros encargos anuais que incidam sobre o rendimento dos bens
usufruídos incumbe a quem for titular do usufruto no momento do vencimento.
ARTIGO 1475º
(Actos lesivos da parte
de terceiros)
O usufrutuário é obrigado a
avisar o proprietário de qualquer facto de terceiro, de que tenha notícia,
sempre que ele possa lesar os direitos do proprietário; se o não fizer,
responde pelos danos que este venha a sofrer.
CAPÍTULO IV
Extinção do usufruto
ARTIGO 1476º
(Causas de extinção)
1. O usufruto extingue-se:
a) Por morte do
usufrutuário, ou chegado o termo do prazo por que o direito foi conferido,
quando não seja vitalício;
b) Pela reunião do usufruto
e da propriedade na mesma pessoa;
c) Pelo seu não exercício
durante vinte anos, qualquer que seja o motivo;
d) Pela perda total da
coisa usufruída;
e) Pela renúncia.
2. A renúncia não requer
aceitação do proprietário.
ARTIGO 1477º
(Usufruto até certa
idade de terceira pessoa)
O usufruto concedido a
alguém até certa idade de terceira pessoa durará pelos anos prefixos, ainda que
o terceiro faleça antes da idade referida, excepto se o usufruto tiver sido
concedido só em atenção à existência de tal pessoa.
ARTIGO 1478º
(Perda parcial e «rei
mutatio»)
1. Se a coisa ou direito
usufruído se perder só em parte, continua o usufruto na parte restante.
2. O disposto no número
anterior é aplicável no caso de a coisa se transformar noutra que ainda tenha
valor, embora com finalidade económica distinta.
ARTIGO 1479º
(Destruição de
edifícios)
1. Se o usufruto for
constituído em algum prédio urbano e este for destruído por qualquer causa, tem
o usufrutuário direito a desfrutar o solo e os materiais restantes.
2. O proprietário da raiz
pode, porém, reconstruir o prédio, ocupando o solo e os materiais, desde que
pague ao usufrutuário, durante o usufruto, os juros correspondentes ao valor do
mesmo solo e dos materiais.
3. As disposições dos
números anteriores são igualmente aplicáveis, se o usufruto for constituído em
algum prédio rústico de que faça parte o edifício destruído.
ARTIGO 1480º
(Indemnizações)
1. Se a coisa ou direito
usufruído se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e o proprietário tiver
direito a ser indemnizado, o usufruto passa a incidir sobre a indemnização.
2. O disposto no número
antecedente é aplicável à indemnização resultante de expropriação ou requisição
da coisa ou direito, à indemnização devida por extinção do direito de
superfície, ao preço da remição do foro e a outros casos análogos.
ARTIGO 1481º
(Seguro de coisa
destruída)
1. Se o usufrutuário tiver
feito o seguro da coisa ou pago os prémios pelo seguro já feito, o usufruto
transfere-se para a indemnização devida pelo segurador.
2. Tratando-se de um
edifício, o proprietário pode reconstruí-lo, transferindo-se, neste caso, o
usufruto para o novo edifício; se, porém, a soma despendida na reconstrução for
superior à indemnização recebida, o direito do usufrutuário será proporcional à
indemnização.
3. Sendo os prémios pagos
pelo proprietário, a este pertence por inteiro a indemnização que for devida.
ARTIGO 1482º
(Mau uso por parte do
usufrutuário)
O usufruto não se extingue,
ainda que o usufrutuário faça mau uso da coisa usufruída; mas, se o abuso se
tornar consideravelmente prejudicial ao proprietário, pode este exigir que a
coisa lhe seja entregue, ou que se tomem as providências previstas no artigo
1470º, obrigando-se, no primeiro caso, a pagar anualmente ao usufrutuário o
produto líquido dela, depois de deduzidas as despesas e o prémio que pela sua
administração lhe for arbitrado.
ARTIGO 1483º
(Restituição da coisa)
Findo o usufruto, deve o
usufrutuário restituir a coisa ao proprietário, sem prejuízo do disposto para
as coisas consumíveis e salvo o direito de retenção nos casos em que possa ser
invocado.
CAPÍTULO V
Uso e habitação
ARTIGO 1484º
(Noção)
1. O direito de uso
consiste na faculdade de se servir de certa coisa alheia e haver os respectivos
frutos, na medida das necessidades, quer do titular, quer da sua família.
2. Quando este direito se
refere a casa de morada, chama-se direito de habitação.
ARTIGO 1485º
(Constituição, extinção
e regime)
Os direitos de uso e de habitação
constituem-se e extinguem-se pelos mesmos modos que o usufruto, sem prejuízo do
disposto na alínea b) do artigo 1293º, e são igualmente regulados pelo seu
título constitutivo; na falta ou insuficiência deste, observar-se-ão as
disposições seguintes.
ARTIGO 1486º
(Fixação das
necessidades pessoais)
As necessidades pessoais do
usuário ou do morador usuário são fixadas segundo a sua condição social.
ARTIGO 1487º
(Âmbito da família)
Na família do usuário ou do
morador usuário compreendem-se apenas o cônjuge, não separado judicialmente de
pessoas e bens, os filhos solteiros, outros parentes a quem sejam devidos
alimentos e as pessoas que, convivendo com o respectivo titular, se encontrem
ao seu serviço ou ao serviço das pessoas designadas.
ARTIGO 1488º
(Intransmissibilidade do
direito)
O usuário e o morador
usuário não podem trespassar ou locar o seu direito, nem onerá-lo por qualquer
modo.
ARTIGO 1489º
(Obrigações inerentes ao
uso e à habitação)
1. Se o usuário consumir
todos os frutos do prédio ou ocupar todo o edifício, ficam a seu cargo as
reparações ordinárias, as despesas de administração e os impostos e encargos
anuais, como se fosse usufrutuário.
2. Se o usuário perceber só
parte dos frutos ou ocupar só parte do edifício, contribuirá para as despesas
mencionadas no número precedente em proporção da sua fruição.
ARTIGO 1490º
(Aplicação das normas do
usufruto)
São aplicadas aos direitos
de uso e de habitação as disposições que regulam o usufruto, quando conformes à
natureza daqueles direitos
TÍTULO IV
DA ENFITEUSE
ARTIGOS 1491º A 1523º
(Revogados pelos Decs.-Lei
195-A/76, de 16-3, e 233/76, de 2-4)
TÍTULO V
DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1524º
(Noção)
O direito de superfície
consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma
obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações.
ARTIGO 1525º
(Objecto)
1. Tendo por objecto a
construção de uma obra, o direito de superfície pode abranger uma parte do solo
não necessária à sua implantação, desde que ela tenha utilidade para o uso da
obra.
2. O direito de superfície
pode ter por objecto a construção ou a manutenção de obra sob solo alheio.
(Redacção do Dec.-Lei
257/91, de 18-7)
ARTIGO 1526º
(Direito de construir
sobre edifício alheio)
O direito de construir
sobre edifício alheio está sujeito às disposições deste título e às limitações
impostas à constituição da propriedade horizontal; levantado o edifício, são
aplicáveis as regras da propriedade horizontal, passando o construtor a ser
condómino das partes referidas no artigo 1421º.
ARTIGO 1527º
(Direito de superfície
constituído pelo Estado ou por pessoas colectivas públicas)
O direito de superfície
constituído pelo Estado ou por pessoas colectivas públicas em terrenos do seu
domínio privado fica sujeito a legislação especial e, subsidiariamente, às
disposições deste código.
CAPÍTULO II
Constituição do direito
de superfície
ARTIGO 1528º
(Princípio geral)
O direito de superfície
pode ser constituído por contrato, testamento ou usucapião, e pode resultar da
alienação de obra ou árvores já existentes, separadamente da propriedade do
solo.
ARTIGO 1529º
(Servidões)
1. A constituição do
direito de superfície importa a constituição das servidões necessárias ao uso e
fruição da obra ou das árvores; se no título não forem designados o local e as
demais condições de exercício das servidões, serão fixados, na falta de acordo,
pelo tribunal.
2. A constituição coerciva
da servidão de passagem sobre prédio de terceiro só é possível se, à data da
constituição do direito de superfície, já era encravado o prédio sobre que este
direito recaía.
CAPÍTULO III
Direitos e encargos do
superficiário e do proprietário
ARTIGO 1530º
(Preço)
1. No acto de constituição
do direito de superfície, pode convencionar-se, a título de preço, que o
superficiário pague uma única prestação ou pague certa prestação anual,
perpétua ou temporária.
2. O pagamento temporário
de uma prestação anual é compatível com a constituição perpétua do direito de
superfície.
3. As prestações são sempre
em dinheiro.
ARTIGO 1531º
(Pagamento das
prestações anuais)
1. Ao pagamento das
prestações anuais é aplicável o disposto nos artigos 1505º e 1506º, com as
necessárias adaptações.
2. Havendo mora no
cumprimento, o proprietário do solo tem o direito de exigir o triplo das
prestações em dívida.
ARTIGO 1532º
(Fruição do solo antes
do início da obra)
Enquanto não se iniciar a
construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o uso e a fruição
da superfície pertencem ao proprietário do solo, o qual, todavia, não pode
impedir nem tornar mais onerosa a construção ou a plantação.
ARTIGO 1533º
(Fruição do subsolo)
O uso e a fruição do
subsolo pertencem ao proprietário; este é, porém, responsável pelos prejuízos
causados ao superficiário em consequência da exploração que dele fizer.
ARTIGO 1534º
(Transmissibilidade dos
direitos)
O direito de superfície e o
direito de propriedade do solo são transmissíveis por acto entre vivos ou por
morte.
ARTIGO 1535º
(Direito de preferência)
1. O proprietário do solo
goza do direito de preferência, em último lugar, na venda ou dação em
cumprimento do direito de superfície; sendo, porém, enfitêutico o prédio
incorporado no solo, prevalece o direito de preferência do proprietário.
2. É aplicável ao direito
de preferência o disposto nos artigos 416º a 418º e 1410º.
CAPÍTULO IV
Extinção do direito de
superfície
ARTIGO 1536º
(Casos de extinção)
1. O direito de superfície
extingue-se:
a) Se o superficiário não
concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo fixado ou, na falta de
fixação, dentro do prazo de dez anos;
b) Se, destruída a obra ou
as árvores, o superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação,
dentro dos mesmos prazos a contar da destruição;
c) Pelo decurso do prazo,
sendo constituído por certo tempo;
d) Pela reunião na mesma
pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade;
e) Pelo desaparecimento ou
inutilização do solo;
f) Pela expropriação por
utilidade pública.
2. No título constitutivo
pode também estipular-se a extinção do direito de superfície em consequência da
destruição da obra ou das árvores, ou da verificação de qualquer condição
resolutiva.
3. À extinção do direito de
superfície, nos casos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1, são aplicáveis as
regras da prescrição.
ARTIGO 1537º
(Falta de pagamento das
prestações anuais)
1. A falta de pagamento das
prestações anuais durante vinte anos extingue a obrigação de as pagar, mas o
superficiário não adquire a propriedade do solo, salvo se houver usucapião em
seu benefício.
2. À extinção da obrigação
de pagamento das prestações são aplicáveis as regras da prescrição.
ARTIGO 1538º
(Extinção pelo decurso
do prazo)
1. Sendo o direito de
superfície constituído por certo tempo, o proprietário do solo, logo que expire
o prazo, adquire a propriedade da obra ou das árvores.
2. Salvo estipulação em
contrário, o superficiário tem, nesse caso, direito a uma indemnização,
calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa.
3. Não havendo lugar à
indemnização, o superficiário responde pelas deteriorações da obra ou das
plantações, quando haja culpa da sua parte.
ARTIGO 1539º
(Extinção de direitos
reais constituídos sobre o direito de superfície)
1. A extinção do direito de
superfície pelo decurso do prazo fixado importa a extinção dos direitos reais
de gozo ou de garantia constituídos pelo superficiário em benefício de
terceiro.
2. Se, porém, o
superficiário tiver a receber alguma indemnização nos termos do artigo
anterior, aqueles direitos transferem-se para a indemnização, conforme o
disposto nos lugares respectivos.
ARTIGO 1540º
(Direitos reais
constituídos pelo proprietário)
Os direitos reais
constituídos pelo proprietário sobre o solo estendem-se à obra e às árvores
adquiridas nos termos do artigo 1538º.
ARTIGO 1541º
(Permanência dos
direitos reais)
Extinguindo-se o direito de
superfície perpétuo, ou o temporário antes do decurso do prazo, os direitos
reais constituídos sobre a superfície ou sobre o solo continuam a onerar
separadamente as duas parcelas, como se não tivesse havido extinção, sem prejuízo
da aplicação das disposições dos artigos anteriores logo que o prazo decorra.
ARTIGO 1542º
(Extinção por
expropriação)
Extinguindo-se o direito de
superfície em consequência da expropriação por utilidade pública, cabe a cada
um dos titulares a parte da indemnização que corresponder ao valor do
respectivo direito.
TÍTULO VI
DAS SERVIDÕES PREDIAIS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1543º
(Noção)
Servidão predial é o
encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a
dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que
dela beneficia.
ARTIGO 1544º
(Conteúdo)
Podem ser objecto da
servidão quaisquer utilidades, ainda que futuras ou eventuais, susceptíveis de
ser gozadas por intermédio do prédio dominante, mesmo que não aumentem o seu
valor.
ARTIGO 1545º
(Inseparabilidade das
servidões)
1. Salvas as excepções
previstas na lei, as servidões não podem ser separadas dos prédios a que
pertencem, activa ou passivamente.
2. A afectação das
utilidades próprias da servidão a outros prédios importa sempre a constituição
de uma servidão nova e a extinção da antiga.
ARTIGO 1546º
(Indivisibilidade das
servidões)
As servidões são
indivisíveis: se o prédio serviente for dividido entre vários donos, cada
porção fica sujeita à parte da servidão que lhe cabia; se for dividido o prédio
dominante, tem cada consorte o direito de usar da servidão sem alteração nem
mudança.
CAPÍTULO II
Constituição das
servidões
ARTIGO 1547º
(Princípios gerais)
1. As servidões prediais
podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai
de família.
2. As servidões legais, na
falta de constituição voluntária, podem ser constituídas por sentença judicial
ou por decisão administrativa, conforme os casos.
ARTIGO 1548º
(Constituição por
usucapião)
1. As servidões não
aparentes não podem ser constituídas por usucapião.
2. Consideram-se não
aparentes as servidões que não se revelam por sinais visíveis e permanentes.
ARTIGO 1549º
(Constituição por
destinação do pai de família)
Se em dois prédios do mesmo
dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e
permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com
outro, serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao
domínio, os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, vierem a
separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no
respectivo documento.
CAPÍTULO III
Servidões legais
SECÇÃO I
Servidões legais de
passagem
ARTIGO 1550º
(Servidão em benefício
de prédio encravado)
1. Os proprietários de
prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem condições que
permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a faculdade de
exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios rústicos
vizinhos.
2. De igual faculdade goza
o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a via pública, por
terreno seu ou alheio.
ARTIGO 1551º
(Possibilidade de
afastamento da servidão)
1. Os proprietários de
quintas muradas, quintais, jardins ou terreiros adjacentes a prédios urbanos
podem subtrair-se ao encargo de ceder passagem,adquirindo o prédio encravado
pelo seu justo valor.
2. Na falta de acordo, o
preço é fixado judicialmente; sendo dois ou mais os proprietários interessados,
abrir-se-á licitação entre eles, revertendo o excesso para o alienante.
ARTIGO 1552º
(Encrave voluntário)
1. O proprietário que, sem
justo motivo, provocar o encrave absoluto ou relativo do prédio só pode
constituir a servidão mediante o pagamento de indemnização agravada.
2. A indemnização agravada
é fixada, de harmonia com a culpa do proprietário, até ao dobro da que
normalmente seria devida.
ARTIGO 1553º
(Lugar da constituição
da servidão)
A passagem deve ser
concedida através do prédio ou prédios que sofram menor prejuízo, e pelo modo e
lugar menos inconvenientes para os prédios onerados.
ARTIGO 1554º
(Indemnização)
Pela constituição da
servidão de passagem é devida a indemnização correspondente ao prejuízo
sofrido.
ARTIGO 1555º
(Direito de preferência
na alienação do prédio encravado)
1. O proprietário de prédio
onerado com a servidão legal de passagem, qualquer que tenha sido o título
constitutivo, tem direito de preferência, no caso de venda, dação em
cumprimento ou aforamento do prédio dominante.
2. É aplicável a este caso
o disposto nos artigos 416º a 418º e 1410º.
3. Sendo dois ou mais os
preferentes, abrir-se-á entre eles licitação, revertendo o excesso para o
alienante.
ARTIGO 1556º
(Servidões de passagem
para o aproveitamento de águas)
1. Quando para seus gastos
domésticos os proprietários não tenham acesso às fontes, poços e reservatórios
públicos destinados a esse uso, bem como às correntes de domínio público, podem
ser constituídas servidões de passagem nos termos aplicáveis dos artigos
anteriores.
2. Estas servidões só serão
constituídas depois de se verificar que os proprietários que as reclamam não
podem haver água suficiente de outra proveniência, sem excessivo incómodo ou
dispêndio.
SECÇÃO II
Servidões legais de
águas
ARTIGO 1557º
(Aproveitamento de águas
para gastos domésticos)
1. Quando não seja possível
ao proprietário, sem excessivo incómodo ou dispêndio, obter água para seus
gastos domésticos pela forma indicada no artigo anterior, os proprietários
vizinhos podem ser compelidos a permitir, mediante indemnização, o
aproveitamento das águas sobrantes das suas nascentes ou reservatórios, na
medida do indispensável para aqueles gastos.
2. Estão isentos da
servidão os prédios urbanos e os referidos no nº 1 do artigo 1551º.
ARTIGO 1558º
(Aproveitamento de águas
para fins agrícolas)
1. O proprietário que não
tiver nem puder obter, sem excessivo incómodo ou dispêndio, água suficiente
para a irrigação do seu prédio, tem a faculdade de aproveitar as águas dos
prédios vizinhos, que estejam sem utilização, pagando o seu justo valor.
2. O disposto no número
anterior não é aplicável às águas provenientes de concessão nem faculta a
exploração de águas subterrâneas em prédio alheio.
ARTIGO 1559º
(Servidão legal de
presa)
Os proprietários e os donos
de estabelecimentos industriais, que tenham direito ao uso de águas
particulares existentes em prédio alheio, podem fazer neste prédio as obras
necessárias ao represamento e derivação da respectiva água, mediante o
pagamento da indemnização correspondente ao prejuízo que causarem.
ARTIGO 1560º
(Servidão legal de presa
para o aproveitamento de águas públicas)
1. A servidão de presa para
o aproveitamento de águas públicas só pode ser imposta coercivamente nos casos
seguintes:
a) Quando os proprietários,
ou os donos de estabelecimentos industriais, sitos na margem de uma corrente
não navegável nem flutuável, só possam aproveitar a água a que tenham direito
fazendo presa, açude ou obra semelhante que vá travar no prédio fronteiro;
b) Quando a água tenha sido
objecto de concessão.
2. No caso da alínea a) do
número anterior e no de concessão de interesse privado, não estão sujeitas à
servidão as casas de habitação, nem os quintais, jardins ou terreiros que lhes
sejam contíguos; no caso de concessão de utilidade pública, estes prédios só
estão sujeitos ao encargo se no respectivo processo administrativo se tiver
provado a impossibilidade material ou económica de executar as obras sem a sua
utilização.
3. No caso da alínea b) do
nº 1, a servidão considera-se constituída em consequência da concessão, mas a
indemnização, na falta de acordo, é fixada pelo tribunal.
4. Se o proprietário do
prédio fronteiro sujeito à servidão de travamento quiser utilizar a obra
realizada, pode torná-la comum, provando que tem direito a aproveitar-se da
água e pagando uma parte da despesa proporcional ao benefício que receber.
ARTIGO 1561º
(Servidão legal de
aqueduto)
1. Em proveito da
agricultura ou da indústria, ou para gastos domésticos, a todos é permitido
encanar, subterraneamente ou a descoberto, as águas particulares a que tenham
direito, através de prédios rústicos alheios, não sendo quintais, jardins ou
terreiros contíguos a casas de habitação, mediante indemnização do prejuízo que
da obra resulte para os ditos prédios; as quintas muradas só estão sujeitas ao
encargo quando o aqueduto seja construído subterraneamente.
2. O proprietário do prédio
serviente tem, a todo o tempo, o direito de ser também indemnizado do prejuízo
que venha a resultar da infiltração ou erupção das águas ou da deterioração das
obras feitas para a sua condução.
3. A natureza, direcção e
forma do aqueduto serão as mais convenientes para o prédio dominante e as menos
onerosas para o prédio serviente.
4. Se a água do aqueduto
não for toda necessária ao seu proprietário, e o proprietário do prédio
serviente quiser ter parte no excedente, ser-lhe-á concedida essa parte a todo
o tempo, mediante prévia indemnização, e pagando ele, além disso, a quota
proporcional à despesa feita com a sua condução até ao ponto donde pretende
derivá-la.
ARTIGO 1562º
(Servidão legal de
aqueduto para o aproveitamento de águas públicas)
1. Para o aproveitamento de
águas públicas, a constituição forçada de servidão de aqueduto só é admitida no
caso de haver concessão da água.
2. É aplicável a esta
servidão o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 1560º.
ARTIGO 1563º
(Servidão legal de
escoamento)
1. A constituição forçada
da servidão de escoamento é permitida, precedendo indemnização do prejuízo:
a) Quando, por obra do
homem, e para fins agrícolas ou industriais, nasçam águas em algum prédio ou
para ele sejam conduzidas de outro prédio;
b) Quando se pretenda dar
direcção definida a águas que seguiam o seu curso natural;
c) Em relação às águas
provenientes de gaivagem, canos falsos, valas, guarda-matos, alcorcas ou
qualquer outro modo de enxugo de prédios;
d) Quando haja concessão de
águas públicas, relativamente às sobejas.
2. Aos proprietários
onerados com a servidão de escoamento é aplicável o disposto no artigo 1391º.
3. Na liquidação da
indemnização será levado em conta o valor dos benefícios que para o prédio
serviente advenham do uso da água, nos termos do número anterior; e, no caso da
alínea b) do nº 1, será atendido o prejuízo que já resultava do decurso natural
das águas.
4. Só estão sujeitos à
servidão de escoamento os prédios que podem ser onerados com a servidão legal
de aqueduto.
CAPÍTULO IV
Exercício das servidões
ARTIGO 1564º
(Modo de exercício)
As servidões são reguladas,
no que respeita à sua extensão e exercício, pelo respectivo título; na
insuficiência do título, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes.
ARTIGO 1565º
(Extensão da servidão)
1. O direito de servidão
compreende tudo o que é necessário para o seu uso e conservação.
2. Em caso de dúvida quanto
à extensão ou modo de exercício, entender-se-á constituída a servidão por forma
a satisfazer as necessidades normais e previsíveis do prédio dominante com o
menor prejuízo para o prédio serviente.
ARTIGO 1566º
(Obras no prédio
serviente)
1. É lícito ao proprietário
do prédio dominante fazer obras no prédio serviente, dentro dos poderes que lhe
são conferidos no artigo anterior, desde que não torne mais onerosa a servidão.
2. As obras devem ser
feitas no tempo e pela forma que sejam mais convenientes para o proprietário do
prédio serviente.
ARTIGO 1567º
(Encargos das obras)
1. As obras são feitas à
custa do proprietário do prédio dominante, salvo se outro regime tiver sido
convencionado.
2. Sendo diversos os
prédios dominantes, todos os proprietários são obrigados a contribuir na
proporção da parte que tiverem nas vantagens da servidão, para as despesas das
obras; e só poderão eximir-se do encargo renunciando à servidão em proveito dos
outros.
3. Se o proprietário do
prédio serviente também auferir utilidades da servidão, é obrigado a contribuir
pela forma estabelecida no número anterior.
4. Se o proprietário do
prédio serviente se houver obrigado a custear as obras, só lhe será possível
eximir-se desse encargo pela renúncia ao seu direito de propriedade em
benefício do proprietário do prédio dominante, podendo a renúncia, no caso de a
servidão onerar apenas uma parte do prédio, limitar-se a essa parte;
recusando-se o proprietário do prédio dominante a aceitar a renúncia, não fica,
por isso, dispensado de custear as obras.
ARTIGO 1568º
(Mudança de servidão)
1. O proprietário do prédio
serviente não pode estorvar o uso da servidão, mas pode, a todo o tempo, exigir
a mudança dela para sítio diferente do primitivamente assinado, ou para outro
prédio, se a mudança lhe for conveniente e não prejudicar os interesses do
proprietário do prédio dominante, contanto que a faça à sua custa; com o
consentimento de terceiro pode a servidão ser mudada para o prédio deste.
2. A mudança também pode
dar-se a requerimento e à custa do proprietário do prédio dominante, se dela
lhe advierem vantagens e com ela não for prejudicado o proprietário do prédio
serviente.
3. O modo e o tempo de
exercício da servidão serão igualmente alterados, a pedido de qualquer dos
proprietários, desde que se verifiquem os requisitos referidos nos números
anteriores.
4. As faculdades conferidas
neste artigo não são renunciáveis nem podem ser limitadas por negócio jurídico.
CAPÍTULO V
Extinção das servidões
ARTIGO 1569º
(Casos de extinção)
1. As servidões
extinguem-se:
a) Pela reunião dos dois
prédios, dominante e serviente, no domínio da mesma pessoa;
b) Pelo não uso durante
vinte anos, qualquer que seja o motivo;
c) Pela aquisição, por
usucapião, da liberdade do prédio;
d) Pela renúncia;
e) Pelo decurso do prazo,
se tiverem sido constituídas temporariamente.
2. As servidões
constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas extintas, a
requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem
desnecessárias ao prédio dominante.
3. O disposto no número
anterior é aplicável às servidões legais, qualquer que tenha sido o título da
sua constituição: tendo havido indemnização, será esta restituída, no todo ou
em parte, conforme as circunstâncias.
4. As servidões referidas
nos artigos 1557º e 1558º também podem ser remidas judicialmente, mostrando o
proprietário do prédio serviente que pretende fazer da água um aproveitamento
justificado; no que respeita à restituição da indemnização, é aplicável o
disposto anteriormente, não podendo, todavia, a remição ser exigida antes de
decorridos dez anos sobre a constituição da servidão.
5. A renúncia a que se
refere a alínea d) do nº 1 não requer aceitação do proprietário do prédio
serviente.
ARTIGO 1570º
(Começo do prazo para a
extinção pelo não uso)
1. O prazo para a extinção
das servidões pelo não uso conta-se a partir do momento em que deixaram de ser
usadas; tratando-se de servidões para cujo exercício não é necessário o facto
do homem, o prazo corre desde a verificação de algum facto que impeça o seu
exercício.
2. Nas servidões exercidas
com intervalos de tempo, o prazo corre desde o dia em que poderiam exercer-se e
não foi retomado o seu exercício.
3. Se o prédio dominante
pertencer a vários proprietários, o uso que um deles fizer da servidão impede a
extinção relativamente aos demais.
ARTIGO 1571º
(Impossibilidade de
exercício)
A impossibilidade de
exercer a servidão não importa a sua extinção, enquanto não decorrer o prazo da
alínea b) do nº 1 do artigo 1569º.
ARTIGO 1572º
(Exercício parcial)
A servidão não deixa de
considerar-se exercida por inteiro, quando o proprietário do prédio dominante
aproveita apenas uma parte das utilidades que lhe são inerentes.
ARTIGO 1573º
(Exercício em época
diversa)
O exercício da servidão em
época diferente da fixada no título não impede a sua extinção pelo não uso, sem
prejuízo da possibilidade de aquisição de uma nova servidão por usucapião.
ARTIGO 1574º
(«Usucapio libertatis»)
1. A aquisição, por
usucapião, da liberdade do prédio só pode dar-se quando haja, por parte do
proprietário do prédio serviente, oposição ao exercício da servidão.
2. O prazo para a usucapião
só começa a contar-se desde a oposição.
ARTIGO 1575º
(Servidões constituídas
pelo usufrutuário ou enfiteuta)
As servidões activas
adquiridas pelo usufrutuário não se extinguem pela cessação do usufruto, como
também se não extinguem pela devolução do prazo ao senhorio as servidões,
activas ou passivas, constituídas pelo enfiteuta.
LIVRO IV
DIREITO DA FAMÍLIA
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
ARTIGO 1576º
(Fontes das relações jurídicas
familiares)
São fontes das relações
jurídicas familiares o casamento, o parentesco, a afinidade e a adopção.
ARTIGO 1577º
(Noção de casamento)
Casamento é o contrato
celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir familía
mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1578º
(Noção de parentesco)
Parentesco é o vínculo que
une duas pessoas, em consequência de uma delas descender da outra ou de ambas
procederem de um progenitor comum.
ARTIGO 1579º
(Elementos do
parentesco)
O parentesco determina-se
pelas gerações que vinculam os parentes um ao outro: cada geração forma um
grau, e a série dos graus constitui a linha de parestesco.
ARTIGO 1580º
(Linhas de parentesco)
1. A linha diz-se recta,
quando um dos parentes descende do outro; diz-se colateral, quando nenhum dos
parentes descende do outro, mas ambos procedem de um progenitor comum.
2. A linha recta é
descendente ou ascendente: descendente, quando se considera como partindo do
ascendente para o que dele procede; ascendente, quando se considera como
partindo deste para o progenitor.
ARTIGO 1581º
(Cômputo dos graus)
1. Na linha recta há tantos
graus quantas as pessoas que formam a linha de parentesco, excluindo o
progenitor.
2. Na linha colateral os
graus contam-se pela mesma forma, subindo por um dos ramos e descendo pelo
outro, mas sem contar o progenitor comum.
ARTIGO 1582º
(Limites do parentesco)
Salvo disposição da lei em
contrário, os efeitos do parentesco produzem-se em qualquer grau da linha recta
e até ao sexto grau na colateral.
ARTIGO 1583º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1584º
(Noção de afinidade)
Afinidade é o vínculo que
liga cada um dos cônjuges aos parentes do outro.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1585º
(Elementos e cessação da
afinidade)
A afinidade determina-se
pelos mesmos graus e linhas que definem o parentesco e não cessa pela
dissolução do casamento.
ARTIGO 1586º
(Noção de adopção)
Adopção é o vínculo que, à
semelhança da filiação natural, mas independentemente dos laços do sangue, se
estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos dos artigos 1973º e
seguintes.
TÍTULO II
DO CASAMENTO
CAPÍTULO I
Modalidades do casamento
ARTIGO 1587º
(Casamento católico e
civil)
1. O casamento é católico
ou civil.
2. A lei civil reconhece
valor e eficácia de casamento ao matrimónio católico nos termos das disposições
seguintes.
ARTIGO 1588º
(Efeitos do casamento
católico)
O casamento católico
rege-se, quantos aos efeitos civis, pelas normas comuns deste código, salvo
disposição em contrário.
ARTIGO 1589º
(Dualidade de
casamentos)
1. O casamento católico
contraído por pessoas já ligadas entre si por casamento civil não dissolvido é
averbado ao assento, independentemente do processo preliminar de publicações.
2. Não é permitido o
casamento civil de duas pessoas unidas por matrimónio católico anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
35/97, de 31-1)
ARTIGO 1590º
(Casamentos urgentes)
O casamento urgente que for
celebrado sem a presença de ministro da Igreja Católica ou funcionário do
registo civil é havido por católico ou civil segundo a intenção das partes,
manifestada expressamente ou deduzida das formalidades adoptadas, das crenças
dos nubentes ou de quaisquer outros elementos.
CAPÍTULO II
Promessa de casamento
ARTIGO 1591º
(Ineficácia da promessa)
O contrato pelo qual, a
título de esponsais, desposórios ou qualquer outro, duas pessoas de sexo
diferente se comprometem a contrair matrimónio não dá direito a exigir a
celebração do casamento, nem a reclamar, na falta de cumprimento, outras
indemnizações que não sejam as previstas no artigo 1594º, mesmo quando
resultantes de cláusula penal.
ARTIGO 1592º
(Restituições, nos casos
de incapacidade e de retractação)
1. No caso de o casamento
deixar de celebrar-se por incapacidade ou retractação de algum dos promitentes,
cada um deles é obrigado a restituir os donativos que o outro ou terceiro lhe
tenha feito em virtude da promessa e na expectativa do casamento, segundo os
termos prescritos para a nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico.
2. A obrigação de restituir
abrange as cartas e retratos pessoais do outro contraente, mas não as coisas
que hajam sido consumidas antes da retractação ou da verificação da
incapacidade.
ARTIGO 1593º
(Restituições no caso de
morte)
1. Se o casamento não se
efectuar em razão da morte de algum dos promitentes, o promitente sobrevivo
pode conservar os donativos do falecido, mas, nesse caso, perderá o direito de
exigir os que, por sua parte, lhe tenha feito.
2. O mesmo promitente pode
reter a correspondência e os retratos pessoais do falecido e exigir a
restituição dos que este haja recebido da sua parte.
ARTIGO 1594º
(Indemnizações)
1. Se algum dos contraentes
romper a promessa sem justo motivo ou, por culpa sua, der lugar a que outro se
retracte, deve indemnizar o esposado inocente, bem como os pais deste ou
terceiros que tenham agido em nome dos pais, quer das despesas feitas, quer das
obrigações contraída na previsão do casamento.
2. Igual indemnização é devida,
quando o casamento não se realize por motivo de incapacidade de algum dos
contraentes, se ele ou os seus representantes houverem procedido com dolo.
3. A indemnização é fixada
segundo o prudente arbítrio do tribunal, devendo atender-se, no seu cálculo,
não só à medida em que as despesas e obrigações se mostre razoáveis, perante as
circunstâncias do caso e a condição dos contraentes, mas também às vantagens
que, independentemente do casamento, umas e outras possam ainda proporcionar.
ARTIGO 1595º
(Caducidade das acções)
O direito de exigir a
restituição dos donativos ou a indemnização caduca no prazo de um ano, contado
da data do rompimento da promessa ou da morte do promitente.
CAPÍTULO III
Pressuposto da
celebração do casamento
SECÇÃO I
Casamento católico
ARTIGO 1596º
(Capacidade civil)
O casamento católico só
pode ser celebrado por quem tiver a capacidade matrimonial exigida na lei
civil.
ARTIGO 1597º
(Processo preliminar)
1. A capacidade matrimonial
dos nubentes é comprovada por meio do processo preliminar de publicações,
organizado nas repartições do registo civil a requerimento dos nubentes ou do
pároco respectivo.
2. O consentimento dos pais
ou tutor, relativo ao nubente menor, pode ser prestado na presença de duas
testemunhas perante o pároco, o qual levantará auto de ocorrência, assinando-o
com todos os intervenientes.
ARTIGO 1598º
(Certificado da
capacidade matrimonial)
1. Verificada no despacho
final do processo preliminar a inexistência de impedimento à realização do
casamento, o funcionário do registo civil extrairá dele o certificado da
capacidade matrimonial, que é remetido ao pároco e sem o qual o casamento não
pode ser celebrado.
2. Se, depois de expedido o
certificado, o funcionário tiver conhecimento de algum impedimento,
comunicá-lo-á imediatamente ao pároco, a fim de se sobrestar na celebração até
ao julgamento respectivo.
ARTIGO 1599º
(Dispensa do processo
preliminar)
1. O casamento in articulo
mortis, na iminência de parto ou cuja celebração imediata seja expressamente
autorizada pelo ordinário próprio por grave motivo de ordem moral pode
celebrar-se independentemente do processo preliminar de publicações de passagem
do certificado da capacidade matrimonial dos nubentes.
2. A dispensa de processo
preliminar não altera as exigências da lei civil quanto à capacidade
matrimonial dos nubentes, continuando estes sujeitos às sanções estabelecidas
na mesma lei.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Casamento Civil
SUBSECÇÃO I
Impedimentos
matrimoniais
ARTIGO 1600º
(Regra geral)
Têm capacidade para
contrair casamento todos aqueles em quem se não verifique algum dos
impedimentos matrimoniais previstos na lei.
ARTIGO 1601º
(Impedimentos dirimentes
absolutos)
São impedimentos
dirimentes, obstando ao casamento da pessoa a quem respeitam com qualquer
outra:
a) A idade inferior a
dezasseis anos;
b) A demência notória,
mesmo durante os intervalos lúcidos, e a interdição ou inabilitação por
anomalia psíquica;
c) O casamento anterior não
dissolvido, católico ou civil, ainda que o respectivo assento não tenha sido
lavrado no registo do estado civil.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1602º
(Impedimentos dirimentes
relativos)
São também dirimentes,
obstando ao casamento entre si das pessoas a quem respeitam, os impedimentos
seguintes:
a) O parentesco na linha
recta;
b) O parentesco no segundo
grau da linha colateral;
c) A afinidade na linha
recta;
d) A condenação anterior de
um dos nubentes, como autor ou cúmplice, por homicídio doloso, ainda que não
consumado, contra o cônjuge do outro.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1603º
(Prova da maternidade ou
paternidade)
1. A prova da maternidade
ou paternidade para efeitos do disposto nas alíneas a), b) e c) do artigo
precedente é sempre admitida no processo preliminar de publicações, mas o
reconhecimento do parentesco, quer neste processo, quer na acção de declaração
de nulidade ou anulação do casamento, não produz qualquer outro efeito, e não
vale sequer como começo de prova em acção de investigação de maternidade ou
paternidade.
2. Fica salvo o recurso aos
meios ordinários para o efeito de se fazer declarar a inexistência do
impedimento em acção proposta contra as pessoas que teriam legitimidade para
requerer a declaração de nulidade ou anulação do casamento, com base no impedimento
reconhecido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1604º
(Impedimentos
impedientes)
São impedimentos
impedientes, além de outros designados em leis especiais:
a) A falta de autorização
dos pais ou do tutor para o casamento do nubente menor, quando não suprida pelo
conservador do registo civil;
b) O prazo internupcial;
c) O parentesco no terceiro
grau da linha colateral;
d) O vínculo de tutela,
curatela ou administração legal de bens;
e) O vínculo de adopção
restrita;
f) A pronúncia do nubente pelo
crime de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro,
enquanto não houver despronúncia ou absolvição por decisão passada em julgado.
(Redacção do Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1605º
(Prazo internupcial)
1. O impedimento do prazo
internupcial obsta ao casamento daquele cujo matrimónio anterior foi
dissolvido, declarado nulo ou anulado, enquanto não decorrerem sobre a
dissolução, declaração de nulidade ou anulação, cento e oitenta ou trezentos
dias, conforme se trate de homem ou mulher.
2. É, porém, lícito à
mulher contrair novas núpcias passados cento e oitenta dias se obtiver
declaração judicial de que não está grávida ou tiver tido algum filho depois da
dissolução, declaração de nulidade ou anulação do casamento anterior; se os
cônjuges estavam separados judicialmente de pessoas e bens e o casamento se
dissolver por morte do marido, pode ainda a mulher celebrar segundo casamento
decorridos cento e oitenta dias sobre a data em que transitou em julgado a
sentença de separação, se obtiver declaração judicial de que não está grávida
ou tiver tido algum filho depois daquela data.
3. Sendo o casamento
católico declarado nulo ou dissolvido por dispensa, o prazo conta-se a partir
do registo da decisão proferida pelas autoridades eclesiásticas; no caso de
divórcio ou anulação do casamento civil, o prazo conta-se a partir do trânsito
em julgado da respectiva sentença.
4. Cessa o impedimento do
prazo internupcial se os prazos referidos nos números anteriores já tiverem
decorrido desde a data, fixada na sentença de divórcio, em que findou a
coabitação dos cônjuges ou, no caso de conversão da separação judicial de
pessoas e bens em divórcio, desde a data em que transitou em julgado a sentença
que decretou a separação.
5. O impedimento cessa ainda
se o casamento se dissolver por morte de um dos cônjuges, estando estes
separados judicialmente de pessoas e bens, quando já tenham decorrido, desde a
data do trânsito em julgado da sentença, os prazos fixados nos números
anteriores.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1606º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1607º
(Vínculo de adopção)
O impedimento do vínculo de
adopção restrita obsta ao casamento:
a) Do adoptante, ou seus
parentes na linha recta, com o adoptado ou seus descendentes;
b) Do adoptado com o que
foi cônjuge do adoptante;
c) Do adoptante com o que
foi cônjuge do adoptado;
d) Dos filhos adoptivos da
mesma pessoa, entre si.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1608º
(Vínculo de tutela,
curatela ou administração legal de bens)
O vínculo de tutela,
curatela ou administração legal de bens impede o casamento do incapaz com o
tutor, curador ou administrador, ou seus parentes ou afins na linha recta,
irmãos, cunhados ou sobrinhos, enquanto não tiver decorrido um ano sobre o
termo da incapacidade e não estiverem aprovadas as respectivas contas, se
houver lugar a elas.
ARTIGO 1609º
(Dispensa)
1. São susceptíveis de
dispensa os impedimentos seguintes:
a) O parentesco no terceiro
grau da linha colateral;
b) O vínculo de tutela,
curatela ou administração legal de bens, se as respectivas contas estiverem já
aprovadas;
c) O vínculo de adopção
restrita.
2. A dispensa compete ao
conservador do registo civil, que a concederá quando haja motivos sérios que
justifiquem a celebração do casamento.
3. Se algum dos nubentes
for menor, o conservador ouvirá, sempre que possível, os pais ou o tutor.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
SUBSECÇÃO II
Processo preliminar de
publicações
ARTIGO 1610º
(Necessidade e fim do
processo de publicações)
A celebração do casamento é
precedida de um processo de publicações, regulado nas leis do registo civil e
destinado à verificação da inexistência de impedimentos.
ARTIGO 1611º
(Declaração de
impedimentos)
1. Até ao momento da
celebração do casamento, qualquer pessoa pode declarar os impedimentos de que
tenha conhecimento.
2. A declaração é
obrigatória para o Ministério Público e para os funcionários do registo civil
logo que tenham conhecimento do impedimento.
3. Feita a declaração, o
casamento só será celebrado se o impedimento cessar, for dispensado nos termos
do artigo 1609º ou for julgado improcedente por decisão judicial com trânsito
em julgado.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1612º
(Autorização dos pais ou
do tutor)
1. A autorização para o
casamento de menor de dozoito anos e maior de dezasseis deve ser concedida
pelos progenitores que exerçam o poder paternal, ou pelo tutor.
2. Pode o conservador do
registo civil suprir a autorização a que se refere o número anterior se razões
ponderosas justificarem a celebração do casamento e o menor tiver suficiente
maturidade física e psíquica.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1613º
(Despacho final)
Findo o processo preliminar
e os processos judiciais a que este der causa, cabe ao funcionário do registo
civil proferir despacho final, no qual autorizará os nubentes a celebrar o
casamento ou mandará arquivar o processo.
ARTIGO 1614º
(Prazo para a celebração
do casamento)
Autorizada a realização do
casamento, este deve celebrar-se dentro dos noventa dias seguintes.
CAPÍTULO IV
Celebração do casamento
civil
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1615º
(Publicidade e
solenidade)
A celebração do casamento é
pública e está sujeita às solenidades fixadas nas leis do registo civil.
ARTIGO 1616º
(Pessoas que devem
intervir)
É indispensável para a
celebração do casamento a presença:
a) Dos contraentes, ou de
um deles e do procurador do outro;
b) Do funcionário do
registo civil;
c) De duas testemunhas,
sempre que exigida na lei do registo civil.
(Redacção do Dec.-Lei
35/97, de 31-1)
ARTIGO 1617º
(Actualidade do mútuo
consenso)
A vontade dos nubentes só é
relevante quando manifestada no próprio acto da celebração do casamento.
ARTIGO 1618º
(Aceitação dos efeitos
do casamento)
1. A vontade de contrair
casamento importa aceitação de todos os efeitos legais do matrimónio, sem
prejuízo das legítimas estipulações dos esposos em convenção antenupcial.
2. Consideram-se não
escritas as cláusulas pelas quais os nubentes, em convenção antenupcial, no
momento da celebração do casamento ou em outro acto, pretendam modificar os
efeitos do casamento, ou submetê-lo a condição, a termo ou à preexistência de
algum facto.
ARTIGO 1619º
(Carácter pessoal do
mútuo consenso)
A vontade de contrair
casamento é estritamente pessoal em relação a cada um dos nubentes.
ARTIGO 1620º
(Casamento por
procuração)
1. É lícito a um dos
nubentes fazer-se representar por procurador na celebração do casamento.
2. A procuração deve conter
poderes especiais para o acto, a designação expressa do outro nubente e a
indicação da modalidade do casamento.
ARTIGO 1621º
(Revogação e caducidade
da procuração)
1. Cessam todos os efeitos
da procuração pela revogação dela, pela morte do constituinte ou do procurador,
ou pela interdição ou inabilitação de qualquer deles em consequência de
anomalia psíquica.
2. O constituinte pode
revogar a todo o tempo a procuração, mas é responsável pelo prejuízo que causar
se, por culpa sua, o não fizer a tempo de evitar a celebração do casamento.
SECÇÃO II
Casamentos urgentes
ARTIGO 1622º
(Celebração)
1. Quando haja fundado
receio de morte próxima de algum dos nubentes, ou iminência de parto, é
permitida a celebração do casamento independentemente do processo preliminar de
publicações e sem a intervenção do funcionário do registo civil.
2. Do casamento urgente é
lavrado, oficiosamente, um assento provisório.
3. O funcionário do registo
civil é obrigado a lavrar o assento provisório, desde que lhe seja apresentada,
para esse fim, a acta do casamento urgente, nas condições prescritas nas leis
do registo civil.
ARTIGO 1623º
(Homologação do
casamento)
1. Lavrado o assento
provisório, o funcionário decidirá se o casamento deve ser homologado.
2. Se não tiver já
corrido,o processo de publicações é organizado oficiosamente e a decisão sobre
a homologação será proferida no despacho final deste processo.
ARTIGO 1624º
(Causas justificativas
da não homologação)
1. O casamento não pode ser
homologado:
a) Se não se verificarem os
requisitos exigidos por lei, ou não tiverem sido observadas as formalidades
prescritas para a celebração do casamento urgente e para a realização do
respectivo registo provisório;
b) Se houver indícios
sérios de serem supostos ou falsos esses requisitos ou formalidades;
c) Se existir algum
impedimento dirimente;
d) Se o casamento tiver
sido considerado como católico pelas autoridades eclesiásticas e, como tal, se
encontrar transcrito.
2. Se o casamento não for
homologado, o assento provisório será cancelado.
3. Do despacho que recusar
a homologação podem os cônjuges ou seus herdeiros, bem como o Ministério
Público, recorrer para o tribunal, a fim de ser declarada a validade do
casamento.
CAPÍTULO V
Invalidade do casamento
SECÇÃO I
Casamento católico
ARTIGO 1625º
(Competência dos
tribunais eclesiásticos)
O conhecimento das causas
respeitantes à nulidade do casamento católico e à dispensa do casamento rato e
não consumado é reservado aos tribunais e às repartições eclesiásticas
competentes.
ARTIGO 1626º
(Processo)
1. As decisões dos
tribunais e repartições eclesiásticas, quando definitivas, sobem ao Supremo
Tribunal da Assinatura Apostólica para verificação, e são depois, com os
decretos desse Tribunal, transmitidas por via diplomática ao tribunal da
Relação territorialmente competente, que as tornará executórias, independentemente
de revisão e confirmação, e mandará que sejam averbadas no registo civil.
2. O tribunal eclesiástico
pode requisitar aos tribunais judiciais a citação ou notificação das partes,
peritos ou testemunhas, bem como diligências de carácter probatório ou de outra
natureza.
SECÇÃO II
Casamento Civil
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1627º
(Regra de validade)
É válido o casamento civil
relativamente ao qual não se verifique alguma das causas de inexistência
jurídica, ou de anulabilidade, especificadas na lei.
SUBSECÇÃO II
Inexistência do
casamento
ARTIGO 1628º
(Casamentos
inexistentes)
É juridicamente
inexistente:
a) O casamento celebrado
perante quem não tinha competência funcional para o acto, salvo tratando-se de
casamento urgente;
b) O casamento urgente que
não tenha sido homologado;
c) O casamento em cuja
celebração tenha faltado a declaração da vontade de um ou ambos os nubentes, ou
do procurador de um deles;
d) O casamento contraído
por intermédio de procurador, quando celebrado depois de terem cessado os
efeitos da procuração, ou quando esta não tenha sido outorgada por quem nela
figura como constituinte, ou quando seja nula por falta de concessão de poderes
especiais para o acto ou de designação expressa do outro contraente;
e) O casamento contraído
por duas pessoas do mesmo sexo.
ARTIGO 1629º
(Funcionários de facto)
Não se considera, porém,
jurídicamente inexistente o casamento celebrado perante quem, sem ter
competência funcional para o acto, exercia publicamente as correspondentes
funções, salvo se ambos os nubentes, no momento da celebração, conheciam a
falta daquela competência.
ARTIGO 1630º
(Regime da inexistência)
1. O casamento
juridicamente inexistente não produz qualquer efeito jurídico e nem sequer é
havido como putativo.
2. A inexistência pode ser
invocada por qualquer pessoa, a todo o tempo, independentemente de declaração
judicial.
SUBSECÇÃO III
Anulabilidade do
casamento
Divisão I
Disposições gerais
ARTIGO 1631º
(Causas de
anulabilidade)
É anulável o casamento:
a) Contraído com algum impedimento
dirimente;
b) Celebrado, por parte de
um ou de ambos os nubentes, com falta de vontade ou com a vontade viciada por
erro ou coacção;
c) Celebrado sem a presença
das testemunhas quando exigida por lei.
(Redacção do Dec.-Lei
35/97, de 31-1)
ARTIGO 1632º
(Necessidade da acção de
anulação)
A anulabilidade do
casamento não é invocável para nenhum efeito, judicial ou.extrajudicial,
enquanto não for reconhecida por sentença em acção especialmente intentada para
esse fim.
ARTIGO 1633º
(Validação do casamento)
1. Considera-se sanada a
anulabilidade, e válido o casamento desde o momento da celebração, se antes de
transitar em julgado a sentença de anulação ocorrer algum dos seguintes factos:
a) Ser o casamento de menor
não núbil confirmado por este, perante o funcionário do registo civil e de duas
testemunhas, depois de atingir a maioridade;
b) Ser o casamento do
interdito ou inabilitado por anomalia psíquica confirmado por ele, nos termos
da alínea precedente, depois de lhe ser levantada a interdição ou inabilitação
ou, tratando-se de demência notória, depois de o demente fazer verificar
judicialmente o seu estado de sanidade mental;
c) Ser declarado nulo ou
anulado o primeiro casamento do bígamo;
d) Ser a falta de
testemunhas devida a circunstâncias atendíveis, como tais reconhecidas pelo
Ministro da Justiça, desde que não haja dúvidas sobre a celebração do acto.
2. Não é aplicável ao
casamento o disposto no nº 2 do artigo 287º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
DIVISÃO II
Falta ou vícios da
vontade
ARTIGO 1634º
(Presunção da vontade)
A declaração da vontade, no
acto da celebração, constitui presunção não só de que os nubentes quiseram
contrair o matrimónio, mas de que a sua vontade não está viciada por erro ou
coacção.
ARTIGO 1635º
(Anulabilidade por falta
de vontade)
O casamento é anulável por
falta de vontade:
a) Quando o nubente, no
momento da celebração, não tinha a consciência do acto que praticava, por
incapacidade acidental ou outra causa;
b) Quando o nubente estava
em erro acerca da identidade física do outro contraente;
c) Quando a declaração da
vontade tenha sido extorquida por coacção física;
d) Quando tenha sido
simulado.
ARTIGO 1636º
(Erro que vicia a
vontade)
O erro que vicia a vontade
só é relevante para efeitos de anulação quando recaia sobre qualidades
essenciais da pessoa do outro cônjuge, seja desculpável e se mostre que sem
ele, razoavelmente, o casamento não teria sido celebrado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1637º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1638º
(Coacção moral)
1. É anulável o casamento
celebrado sob coacção moral, contanto que seja grave o mal com que o nubente é
ilicitamente ameaçado, e justificado o receio da sua consumação.
2. É equiparada à ameaça
ilícita o facto de alguém, consciente e ilicitamente, extorquir ao nubente a
declaração da vontade mediante a promessa de o libertar de um mal fortuito ou
causado por outrem.
DIVISÃO III
Legitimidade
ARTIGO 1639º
(Anulação fundada em
impedimento dirimente)
1. Têm legitimidade para
intentar a acção de anulação fundada em impedimento dirimente, ou para
prosseguir nela, os cônjuges, ou qualquer parente deles na linha recta ou até
ao quarto grau da linha colateral, bem como os herdeiros e adoptantes dos
cônjuges, e o Ministério Público.
2. Além das pessoas
mencionadas no número precedente, podem ainda intentar a acção, ou prosseguir
nela, o tutor ou curador, no caso de menoridade, interdição ou inabilitação por
anomalia psíquica, e o primeiro cônjuge do infractor, no caso de bigamia.
ARTIGO 1640º
(Anulação fundada na
falta de vontade)
1. A anulação por simulação
pode ser requerida pelos próprios cônjuges ou por quaisquer pessoas
prejudicadas com o casamento.
2. Nos restantes casos de
falta de vontade, a acção de anulação só pode ser proposta pelo cônjuge cuja
vontade faltou; mas podem prosseguir nela os seus parentes, afins na linha
recta, herdeiros ou adoptantes, se o autor falecer na pendência da causa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1641º
(Anulação fundada em
vícios da vontade)
A acção de anulação fundada
em vícios da vontade só pode ser intentada pelo cônjuge que foi vítima do erro
ou da coacção; mas podem prosseguir na acção osseus parentes, afins na linha
recta, herdeiros ou adoptantes, se o autor falecer na pendência da causa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1642º
(Anulação fundada na
falta de testemunhas)
A acção de anulação por
falta de testemunhas só pode ser proposta pelo Ministério Público.
DIVISÃO IV
Prazos
ARTIGO 1643º
(Anulação fundada em
impedimento dirimente)
1. A acção de anulação
fundada em impedimento dirimente deve ser instaurada:
a) Nos casos de menoridade,
interdição ou inabilitação por anomalia psíquica ou demência notória, quando
proposta pelo próprio incapaz, até seis meses depois de ter atingido a maioridade,
de lhe ter sido levantada a interdição ou inabilitação ou de a demência ter
cessado; quando proposta por outra pessoa, dentro dos três anos seguintes à
celebração do casamento, mas nunca depois da maioridade, do levantamento da
incapacidade ou da cessação da demência;
b) No caso de condenação
por homicídio contra o cônjuge de um dos nubentes, no prazo de três anos a
contar da celebração do casamento;
c) Nos outros casos, até
seis meses depois da dissolução do casamento.
2. O Ministério Público só
pode propor a acção até à dissolução do casamento.
3. Sem prejuízo do prazo
fixado na alínea c) do nº 1, a acção de anulação fundada na existência de
casamento anterior não dissolvido não pode ser instaurada, nem prosseguir,
enquanto estiver pendente acção de declaração de nulidade ou anulação do
primeiro casamento do bígamo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1644º
(Anulação fundada na
falta de vontade)
A acção de anulação por
falta de vontade de um ou ambos os nubentes só pode ser instaurada dentro dos
três anos subsequentes à celebração do casamento ou, se este era ignorado do
requerente, nos seis meses seguintes ao momento em que dele teve conhecimento.
ARTIGO 1645º
(Anulação fundada em
vícios da vontade)
A acção de anulação fundada
em vícios da vontade caduca, se não for instaurada dentro dos seis meses
subsequentes à cessação do vício.
ARTIGO 1646º
(Anulação fundada na
falta de testemunhas)
A acção de anulação por
falta de testemunhas só pode ser intentada dentro do ano posterior à celebração
do casamento.
CAPÍTULO VI
Casamento putativo
ARTIGO 1647º
(Efeitos do casamento
declarado nulo ou anulado)
1. O casamento civil
anulado, quando contraído de boa fé por ambos os cônjuges, produz os seus
efeitos em relação a estes e a terceiros até ao trânsito em julgado da
respectiva sentença.
2. Se apenas um dos
cônjuges o tiver contraído de boa fé, só esse cônjuge pode arrogar-se os
benefícios do estado matrimonial e opô-los a terceiros, desde que,
relativamente a estes, se trate de mero reflexo das relações havidas entre os
cônjuges.
3. O casamento católico
declarado nulo pelos tribunais e repartições eclesiásticas produz os seus
efeitos, nos termos dos números anteriores, até ao averbamento da decisão,
desde que esteja transcrito no registo civil.
ARTIGO 1648º
(Boa fé)
1. Considera-se de boa fé o
cônjuge que tiver contraído o casamento na ignorância desculpável do vício
causador da nulidade ou anulabilidade, ou cuja declaração de vontade tenha sido
extorquida por coacção física ou moral.
2. É da exclusiva competência
dos tribunais do Estado o conhecimento judicial da boa fé.
3. A boa fé dos cônjuges
presume-se.
CAPÍTULO VII
Sanções especiais
ARTIGO 1649º
(Casamento de menores)
1. O menor que casar sem
ter obtido a autorização dos pais ou do tutor, ou o respectivo suprimento
judicial, continua a ser considerado menor quanto à administração de bens que
leve para o casal ou que posteriormente lhe advenham por título gratuito até à
maioridade, mas dos rendimentos desses bens ser-lhe-ão arbitrados os alimentos necessários
ao seu estado.
2. Os bens subtraídos à
administração do menor são administrados pelos pais, tutor ou administrador
legal, não podendo em caso algum ser entregues à administração do outro cônjuge
durante a menoridade do seu consorte; além disso, não respondem, nem antes nem
depois da dissolução do casamento, por dívidas contraídas por um ou ambos os
cônjuges no mesmo período.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1650º
(Casamento com
impedimento impediente)
1. Aquele que contrair novo
casamento sem respeitar o prazo internupcial perde todos os bens que tenha
recebido por doação ou testamento do seu primeiro cônjuge.
2. A infracção do disposto
nas alíneas c), d) e e) do artigo 1604º importa, respectivamente, para o tio ou
tia, para o tutor, curador ou administrador ou seus parentes ou afins na linha
recta, irmãos, cunhados ou sobrinhos, e para o adoptante, seu cônjuge ou
parentes na linha recta, a incapacidade para receberem do seu consorte qualquer
benefício por doação ou testamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO VIII
Registo do casamento
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1651º
(Casamentos sujeitos a
registo)
1. É obrigatório o registo:
a) Dos casamentos
celebrados em Portugal por qualquer das formas previstas na lei portuguesa;
b) Dos casamentos de
português ou portugueses celebrados no estrangeiro;
c) Dos casamentos dos
estrangeiros que, depois de o celebrarem, adquiram a nacionalidade portuguesa.
2. São admitidos a registo,
a requerimento de quem mostre legítimo interesse no assento, quaisquer outros
casamentos que não contrariem os princípios fundamentais da ordem pública
internacional do Estado português.
ARTIGO 1652º
(Forma do registo)
O registo do casamento
consiste no assento, que é lavrado por inscrição ou transcrição, na
conformidade das leis do registo.
ARTIGO 1653º
(Prova do casamento para
efeitos do registo)
1. Na acção judicial
proposta para suprir a omissão ou perda do registo do casamento presume-se a
existência deste, sempre que as pessoas vivam ou tenham vivido na posse do
estado de casado.
2. Existe posse de estado
quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
a) Viverem as pessoas como
casadas;
b) Serem reputadas como
tais nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
SECÇÃO II
Registo por transcrição
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1654º
(Casos de transcrição)
São lavrados por
transcrição:
a) Os assentos dos
casamentos católicos celebrados em Portugal;
b) Os assentos dos
casamentos civis urgentes celebrados em Portugal;
c) Os assentos dos
casamento católicos ou civis celebrados no estrangeiro por portugueses, ou por
estrangeiros que adquiram a nacionalidade portuguesa;
d) Os assentos mandados
lavrar por decisão judicial;
e) Os assentos dos
casamentos admitidos a registo, a requerimento dos interessados, nos termos do
nº 2 do artigo 1651º;
f) Os assentos dos
casamentos que devam passar a constar dos livros de repartição diversa daquela
onde originariamente foram registados.
SUBSECÇÃO II
Transcrição dos
casamentos católicos celebrados em Portugal
ARTIGO 1655º
(Remessa do duplicado ou
certidão do assento)
1. No caso de o casamento
católico ser celebrado em Portugal, o pároco é obrigado a enviar aos serviços
do registo civil o duplicado do assento paroquial, a fim de ser transcrito no
livro de casamentos.
2. Nos casamentos cuja
celebração imediata haja sido autorizada pelo ordinário, é remetida com o
duplicado uma cópia da autorização autenticada com a assinatura do pároco.
ARTIGO 1656º
(Dispensa da remessa de
duplicado)
A obrigação da remessa de
duplicado não é aplicável:
a) Ao casamento de
consciência, cujo assento só é transcrito perante certidão de teor e mediante
denúncia feita pelo ordinário, bem como aos casamentos celebrados nos termos do
artigo 1599º deste Código e que não possam ser transcritos;
b) Ao casamento em que,
logo após a celebração, se verifique a necessidade de convalidar o acto,
mediante a renovação da manifestação de vontade dos cônjuges na forma canónica,
bastando remeter à repartição do registo civil, quando assim seja, o duplicado
do assento paroquial da nova celebração.
(Redacção do Dec.-Lei
261/75, de 27-5)
ARTIGO 1657º
(Recusa da transcrição)
1. A transcrição do
casamento católico deve ser recusada:
a) Se o funcionário a quem
o duplicado é enviado for incompetente;
b) Se o duplicado ou
certidão do assento paroquial não contiver as indicações exigidas na lei ou as
assinaturas devidas;
c) Se o funcionário tiver
fundadas dúvidas acerca da identidade dos contraentes;
d) Se no momento da
celebração for oponível ao casamento algum impedimento dirimente;
e) Se, tratando-se de
casamento que possa legalmente ser celebrado sem precedência do processo de
publicações, existir no momento da celebração o impedimento de falta de idade
nupcial, o impedimento de interdição ou inabilitação por anomalia psíquica
reconhecida por sentença com trânsito em julgado ou o de casamento civil
anterior não dissolvido, desde que, em qualquer dos casos, o impedimento ainda
subsista.
2. A morte de um ou ambos
os cônjuges não obsta, em caso algum, à transcrição.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1658º
(Transcrição na falta de
processo preliminar)
Se o casamento católico não
houver sido precedido do processo de publicações, a transcrição só se efectua
depois de organizado esse processo.
ARTIGO 1659º
(Realização da
transcrição)
1. A transcrição do
duplicado ou da certidão do assento é comunicada ao pároco.
2. Na falta de remessa do
duplicado ou da certidão do assento pelo pároco, a transcrição pode ser feita a
todo o tempo, em face do documento necessário, a requerimento de qualquer
interessado ou do Ministério Público.
3. A falta do assento
paroquial é suprível mediante acção judicial.
ARTIGO 1660º
(Efectivação da
transcrição, depois de recusada)
A transcrição recusada com
base nos impedimentos dirimentes que a ela podem obstar deve ser efectuada
oficiosamente, ou por iniciativa do Ministério Público ou de qualquer
interessado, logo que cessar o impedimento que deu causa à recusa.
ARTIGO 1661º
(Sanação e convalidação
do casamento)
1. A sanação in radice do
casamento católico nulo, mas transcrito, é averbada à margem do assento
respectivo, mediante comunicação do pároco, feita no interesse dos cônjuges e
com o consentimento do ordinário do lugar da celebração.
2. No caso de convalidação
simples do casamento nulo, mas transcrito, operada pela renovação da
manifestação de vontade de ambos os cônjuges na forma canónica, o pároco
lavrará novo assento e dele enviará duplicado aos serviços do registo civil no
prazo de cinco dias, a fim de aí ser transcrito nos termos gerais.
3. Feita a transcrição, é
cancelado o primeiro assento do casamento convalidado, sem prejuízo dos
direitos de terceiro.
SUBSECÇÃO III
Transcrição dos
casamentos civis urgentes
ARTIGO 1662º
(Conteúdo do assento)
O despacho que homologar o
casamento civil urgente fixará o conteúdo do assento, de acordo com o registo
provisório, documentos juntos e diligências efectuadas.
ARTIGO 1663º
(Transcrição)
1. A transcrição é feita
com base no despacho de homologação, trasladando-se para o assento apenas os
elementos normais do registo, acrescidos da referência à natureza especial do
casamento transcrito.
2. A transcrição será
cancelada, se o casamento for havido como católico pelas autoridades
eclesiásticas e, como tal, se encontrar transcrito, sem prejuízo dos direitos
de terceiro.
SUBSECÇÃO IV
Transcrição dos
casamentos de portugueses no estrangeiro
ARTIGO 1664º
(Registo consular)
O casamento entre
portugueses, ou entre português e estrangeiro, celebrado fora do País, é
registado no consulado competente, ainda que do facto do casamento advenha para
a nubente portuguesa a perda desta nacionalidade.
ARTIGO 1665º
(Forma do registo)
1. O registo é lavrado por
inscrição, se o casamento for celebrado perante o agente diplomático ou consular
português, e, nos outros casos, por transcrição do documento comprovativo do
casamento, passado de harmonia com a lei do lugar da celebração e devidamente
legalizado.
2. A transcrição pode ser
requerida a todo o tempo por qualquer interessado, e deve ser promovida pelo
agente diplomático ou consular competente logo que tenha conhecimento da
celebração do casamento.
ARTIGO 1666º
(Processo preliminar)
1. Se o casamento não tiver
sido precedido das publicações exigidas na lei, o cônsul organizará o respectivo
processo.
2. No despacho final, o
cônsul relatará as diligências feitas e as informações recebidas da repartição
competente, e decidirá se o casamento pode ou não ser transcrito.
ARTIGO 1667º
(Recusa da transcrição)
A transcrição será recusada
se, pelo processo de publicações ou por outro modo, o cônsul verificar que o
casamento foi celebrado com algum impedimento que o torne anulável; sendo o
casamento católico, a transcrição só será recusada nos mesmos termos em que o
pode ser a transcrição dos casamentos católicos celebrados em Portugal.
SUBSECÇÃO V
Transcrição dos
casamentos admitidos a registo
ARTIGO 1668º
(Processo de
transcrição)
1. O registo dos casamentos
a que se refere o nº 2 do artigo 1651º é efectuado por transcrição, com base
nos documentos que os comprovem, lavrados de acordo com a lei do lugar da
celebração.
2. O registo, porém, só
pode realizar-se mediante prova de que não há ofensa dos princípios
fundamentais da ordem pública internacional do Estado Português.
SECÇÃO III
Efeitos do registo
ARTIGO 1669º
(Atendibilidade do
casamento)
O casamento cujo registo é
obrigatório não pode ser invocado, seja pelos cônjuges ou seus herdeiros, seja
por terceiro, enquanto não for lavrado o respectivo assento, sem prejuízo das
excepções previstas neste código.
ARTIGO 1670º
(Efeito retroactivo do
registo)
1. Efectuado o registo, e
ainda que venha a perder-se, os efeitos civis do casamento retrotraem-se à data
da sua celebração.
2. Ficam, porém,
ressalvados os direitos de terceiro que sejam compatíveis com os direitos e
deveres de natureza pessoal dos cônjuges e dos filhos, a não ser que,
tratando-se de casamento católico celebrado em Portugal, a sua transcrição
tenha sido feita dentro dos sete dias subsequentes à celebração.
CAPÍTULO IX
Efeitos do casamento
quanto às pessoas e aos bens dos cônjuges
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1671º
(Igualdade dos cônjuges)
1. O casamento baseia-se na
igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
2. A direcção da família
pertence a ambos os cônjuges, que devem acordar sobre, a orientação da vida em
comum tendo em conta o bem da família e os interesses de um e outro.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1672º
(Deveres dos cônjuges)
Os cônjuges estão
reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação,
cooperação e assistência.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1673º
(Residência da família)
1. Os cônjuges devem
escolher de comum acordo a residência da família, atendendo, nomeadamente, às
exigências da sua vida profissional e aos interesses dos filhos e procurando
salvaguardar a unidade da vida familiar.
2. Salvo motivos ponderosos
em contrário, os cônjuges devem adoptar a residência da família.
3. Na falta de acordo sobre
a fixação ou alteração da residência da família, decidirá o tribunal a
requerimento de qualquer dos cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1674º
(Dever de cooperação)
O dever de cooperação
importa para os cônjuges a obrigação de socorro e auxílio mútuos e a de
assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à vida da família que
fundaram.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1675º
(Dever de assistência)
1. O dever de assistência
compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir para os encargos
da vida familiar.
2. O dever de assistência
mantém-se durante a separação de facto se esta não for imputável a qualquer dos
cônjuges.
3. Se a separação de facto
for imputável a um dos cônjuges, ou a ambos, o dever de assistência só incumbe,
em princípio, ao único ou principal culpado; o tribunal pode, todavia,
exepcionalmente e por motivos de equidade, impor esse dever ao cônjuge inocente
ou menos culpado, considerando, em particular, a duração do casamento e a
colaboração que o outro cônjuge tenha prestado à economia do casal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1676º
(Dever de contribuir
para os encargos da vida familiar)
1. O dever de contribuir
para os encargos da vida familiar incumbe a ambos os cônjuges, de harmonia com
as possibilidades de cada um, e pode ser cumprido, por qualquer deles, pela
afectação dos seus recursos àqueles encargos e pelo trabalho despendido no lar
ou na manutenção e educação dos filhos.
2. Se a contribuição de um
dos cônjuges para os encargos da vida familiar exceder a parte que lhe pertencia
nos termos do número anterior, presume-se a renúncia ao direito de exigir do
outro a correspondente compensação.
3. Não sendo prestada a
contribuição devida, qualquer dos cônjuges pode exigir que lhe seja
directamente entregue a parte dos rendimentos ou proventos do outro que o
tribunal fixar.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º
(Direito ao nome)
1. Cada um dos cônjuges
conserva os seus próprios apelidos, mas pode acrescentar-lhes apelidos do outro
até ao máximo de dois.
2. A faculdade conferida na
segunda parte do número anterior não pode ser exercida por aquele que conserve
apelidos do cônjuge de anterior casamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-A
(Viuvez e segundas
núpcias)
O cônjuge que tenha
acrescentado ao seu nome apelidos do outro conserva-os em caso de viuvez e, se
o declarar até à celebração do novo casamento, mesmo depois das segundas
núpcias.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-B
(Divórcio e separação
judicial de pessoas e bens)
1. Decretada a separação
judicial de pessoas e bens, cada um dos cônjuges conserva os apelidos do outro
que tenha adoptado; no caso de divórcio, pode conservá-los se o ex-cônjuge der
o seu consentimento ou o tribunal o autorizar, tendo em atenção os motivos
invocados.
2. O consentimento do
ex-cônjuge pode ser prestado por documento autêntico ou autenticado, termo
lavrado em juízo ou declaração perante o funcionário do registo civil.
3. O pedido de autorização
judicial do uso dos apelidos do ex-cônjuge pode ser deduzido no processo de
divórcio ou em processo próprio, mesmo depois de o divórcio ter sido decretado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-C
(Privação judicial do
uso do nome)
1. Falecido um dos cônjuges
ou decretada a separação judicial de pessoas e bens ou o divórcio, o cônjuge
que conserve apelidos do outro pode ser privado pelo tribunal do direito de os
usar quando esse uso lese gravemente os interesses morais do outro cônjuge ou
da sua família.
2. Têm legitimidade para o
pedido de privação do uso do nome, no caso de separação judicial de pessoas e
bens ou divórcio, o outro cônjuge ou ex-cônjuge, e, no caso de viuvez, os
descendentes, ascendentes e irmãos do cônjuge falecido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-D
(Exercício de profissão
ou outra actividade)
Cada um dos cônjuges pode
exercer qualquer profissão ou actividade sem o consentimento do outro.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1678º
(Administração dos bens
do casal)
1. Cada um dos cônjuges tem
a administração dos seus bens próprios.
2. Cada um dos cônjuges tem
ainda a administração:
a) Dos proventos que receba
pelo seu trabalho;
b) Dos seus direitos de
autor;
c) Dos bens comuns por ele
levados para o casamento ou adquiridos a título gratuito depois do casamento,
bem como dos sub-rogados em lugar deles;
d) Dos bens que tenham sido
doados ou deixados a ambos os cônjuges com exclusão da administração do outro
cônjuge, salvo se se tratar de bens doados ou deixados por conta da legítima
desse outro cônjuge;
e) Dos bens móveis,
próprios do outro cônjuge ou comuns, por ele exclusivamente utilizados como
instrumento de trabalho;
f) Dos bens próprios do
outro cônjuge, se este se encontrar impossibilitado de exercer a administração
por se achar em lugar remoto ou não sabido ou por qualquer outro motivo, e
desde que não tenha sido conferida procuração bastante para administração
desses bens;
g) Dos bens próprios do
outro cônjuge se este lhe conferir por mandato esse poder.
3. Fora dos casos previstos
no número anterior, cada um dos cônjuges tem legitimidade para a prática de
actos de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal; os
restantes actos de administração só podem ser praticados com o consentimento de
ambos os cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 1679º
(Providências
administrativas)
O cônjuge que não tem a
administração dos bens não está inibido de tomar providências a ela
respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer causa, impossibilitado de o
fazer, e do retardamento das providências puderem resultar prejuízos.
ARTIGO 1680º
(Depósitos bancários)
Qualquer que seja o regime
de bens, pode cada um dos cônjuges fazer depósitos bancários em seu nome
exclusivo e movimentá-los livremente.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1681º
(Exercício da
administração)
1. O cônjuge que
administrar bens comuns ou próprios do outro cônjuge, ao abrigo do disposto nas
alíneas a) a f) do nº2 do artigo 1678º, não é obrigado a prestar contas da sua
administração, mas responde pelos actos intencionalmente praticados em prejuízo
do casal ou do outro cônjuge.
2. Quando a administração,
por um dos cônjuges, dos bens comuns ou próprios do outro se fundar em mandato,
são aplicáveis as regras deste contrato, mas, salvo se outra coisa tiver sido
estipulada, o cônjuge administrador só tem de prestar contas e entregar o
respectivo saldo, se o houver, relativamente a actos praticados durante os
últimos cinco anos.
3. Se um dos cônjuges
entrar na administração dos bens próprios do outro ou de bens comuns cuja
administração lhe não caiba, sem mandato escrito mas com conhecimento e sem
oposição expressa do outro cônjuge, é aplicável o disposto no número anterior;
havendo oposição, o cônjuge administrador responde como possuidor de má fé.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º
(Alienação ou oneração
de móveis)
1. A alienação ou oneração
de móveis comuns cuja administração caiba aos dois cônjuges carece do
consentimento de ambos, salvo se se tratar de acto de administração ordinária.
2. Cada um dos cônjuges tem
legitimidade para alienar ou onerar, por acto entre vivos, os móveis próprios
ou comuns de que tenha a administração, nos termos do nº 1 do artigo 1678º e
das alíneas a) a f) do nº 2 do mesmo artigo, ressalvado o disposto nos números
seguintes.
3. Carece do consentimento
de ambos os cônjuges a alienação ou oneração:
a) De móveis utilizados
conjuntamente por ambos os cônjuges na vida do lar ou como instrumento comum de
trabalho;
b) De móveis pertencentes
exclusivamente ao cônjuge que os não administra, salvo tratando-se de acto de
administração ordinária.
4. Quando um dos cônjuges,
sem consentimento do outro, alienar ou onerar, por negócio gratuito, móveis
comuns de que tem a administração, será o valor dos bens alheados ou a diminuição
de valor dos onerados levado em conta na sua meação, salvo tratando-se de
doação remuneratória ou de donativo conforme aos usos sociais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º-A
(Alienação ou oneração
de imóveis e de estabelecimento comercial)
1. Carece do consentimento
de ambos os cônjuges, salvo se entre eles vigorar o regime de separação de
bens:
a) A alienação, oneração,
arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre imóveis
próprios ou comuns;
b) A alienação, oneração ou
locação de estabelecimento comercial, próprio ou comum.
2. A alienação, oneração,
arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre a casa
de morada da família carece sempre do consentimento de ambos os cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º-B
(Disposição do direito
ao arrendamento)
Relativamente à casa de
morada de família, carecem do consentimento de ambos os cônjuges:
a) A resolução ou denúncia
do contrato de arrendamento pelo arrendatário;
b) A revogação do
arrendamento por mútuo consentimento;
c) A cessão da posição de
arrendatário;
d) O subarrendamento ou o
empréstimo, total ou parcial.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1683º
(Aceitação de doações e
sucessões. Repúdio da herança ou do legado)
1. Os cônjuges não
necessitam do consentimento um do outro para aceitar doações, heranças ou
legados.
2. O repúdio da herança ou
legado só pode ser feito com o consentimento de ambos os cônjuges, a menos que
vigore o regime da separação de bens.
ARTIGO 1684º
(Forma do consentimento
conjugal e seu suprimento)
1. O consentimento
conjugal, nos casos em que é legalmente exigido, deve ser especial para cada um
dos actos.
2. A forma do consentimento
é a exigida para a procuração.
3. O consentimento pode ser
judicialmente suprido, havendo injusta recusa, ou impossibilidade, por qualquer
causa, de o prestar.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1685º
(Disposições para depois
da morte)
1. Cada um dos cônjuges tem
a faculdade de dispor, para depois da morte, dos bens próprios e da sua meação
nos bens comuns, sem prejuízo das restrições impostas por lei em favor dos
herdeiros legitimários.
2. A disposição que tenha
por objecto coisa certa e determinada do património comum apenas dá ao
contemplado o direito de exigir o respectivo valor em dinheiro.
3. Pode, porém, ser exigida
a coisa em espécie:
a) Se esta, por qualquer
título, se tiver tornado propriedade exclusiva do disponente à data da sua
morte;
b) Se a disposição tiver
sido previamente autorizada pelo outro cônjuge por forma autêntica ou no
próprio testamento;
c) Se a disposição tiver
sido feita por um dos cônjuges em benefício do outro.
ARTIGO 1686º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1687º
(Sanções)
1. Os actos praticados
contra o disposto nos nº 1 e 3 do artigo 1682º, nos artigos 1682º-A e 1682º-B e
no nº 2 do artigo 1683º são anuláveis a requerimento do cônjuge que não deu o
consentimento ou dos seus herdeiros, ressalvado o disposto nos nºs 3 e 4 deste
artigo.
2. O direito de anulação
pode ser exercido nos seis meses subsequentes à data em que o requerente teve
conhecimento do acto, mas nunca depois de decorridos três anos sobre a sua
celebração.
3. Em caso de alienação ou
oneração de móvel não sujeito a registo feita apenas por um dos cônjuges,
quando é exigido o consentimento de ambos, a anulabilidade não poderá ser
oposta ao adquirente de boa fé.
4. À alienação ou oneração
de bens próprios do outro cônjuge, feita sem legitimidade, são aplicáveis as
regras relativas à alienação de coisa alheia.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1688º
(Cessação de relações
pessoais e patrimoniais entre os cônjuges)
As relações pessoais e
patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução, declaração de nulidade
ou anulação do casamento, sem prejuízo das disposições deste Código relativas a
alimentos; havendo separação judicial de pessoas e bens, é aplicável o disposto
no artigo 1795º-A.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1689º
(Partilha do casal.
Pagamento de dívidas)
1. Cessando as relações
patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros recebem os seus bens
próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada um deles o que
dever a este património.
2. Havendo passivo a
liquidar, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis até ao valor do
património comum, e só depois as restantes.
3. Os créditos de cada um
dos cônjuges sobre o outro são pagos pela meação do cônjuge devedor no
património comum; mas, não existindo bens comuns, ou sendo estes insuficientes,
respondem os bens próprios do cônjuge devedor.
SECÇÃO II
Dívidas dos cônjuges
ARTIGO 1690º
(Legitimidade para
contrair dívidas)
1. Tanto o marido como a
mulher têm legitimidade para contraír dívidas sem o consentimento do outro
cônjuge.
2. Para a determinação da
responsabilidade dos cônjuges, as dívidas por eles contraídas têm a data do
facto que lhes deu origem.
ARTIGO 1691º
(Dívidas que
responsabilizam ambos os cônjuges)
1. São da responsabilidade
de ambos os cônjuges:
a) As dívidas contraídas,
antes ou depois da celebração do casamento, pelos dois cônjuges, ou por um
deles com o consentimento do outro;
b) As dívidas contraídas
por qualquer dos cônjuges, antes ou depois da celebração do casamento, para
ocorrer aos encargos normais da vida familiar;
c) As dívidas contraídas na
constância do matrimónio pelo cônjuge administrador, em proveito comum do casal
e nos limites dos seus poderes de administração;
d) As dívidas contraídas
por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não
foram contraídas em proveito comum do casal, ou se vigorar entre os cônjuges o
regime de separação de bens;
e) As dívidas consideradas
comunicáveis nos termos do nº 2 do artigo 1693º;
2. No regime da comunhão
geral de bens, são ainda comunicáveis as dívidas contraídas antes do casamento
por qualquer dos cônjuges, em proveito comum do casal.
3. O proveito comum do
casal não se presume, excepto nos casos em que a lei o declarar.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1692º
(Dívidas da responsabilidade
de um dos cônjuges)
São de exclusiva
responsabilidade do cônjuge a que respeitam:
a) As dívidas contraídas,
antes ou depois da celebração do casamento, por cada um dos cônjuges sem o
consentimento do outro, fora dos casos indicados nas alíneas b) e c) do nº 1 do
artigo anterior;
b) As dívidas provenientes
de crimes e as indemnizações, restituições, custas judiciais ou multas devidas
por factos imputáveis a cada um dos cônjuges, salvo se esses factos, implicando
responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelo disposto nos nº 1
ou 2 do artigo anterior:
c) As dívidas cuja
incomunicabilidade resulta do disposto no nº 2 do artigo 1694º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1693º
(Dívidas que oneram
doações, heranças ou legados)
1. As dívidas que onerem
doações, heranças ou legados são da exclusiva responsabilidade do cônjuge
aceitante, ainda que a aceitação tenha sido efectuada com o consentimento do
outro.
2. Porém, se por força do
regime de bens adoptado, os bens doados, herdados ou legados ingressarem no
património comum, a responsabilidade pelas dívidas é comum, sem prejuízo do
direito que tem o cônjuge do aceitante de impugnar o seu cumprimento com o
fundamento de que o valor dos bens não é suficiente para a satisfação dos
encargos.
ARTIGO 1694º
(Dívidas que oneram bens
certos e determinados)
1. As dívidas que onerem
bens comuns são sempre da responsabilidade comum dos cônjuges, quer se tenham
vencido antes, quer depois da comunicação dos bens.
2. As dívidas que onerem
bens próprios de um dos cônjuges são da sua exclusiva responsabilidade, salvo
se tiverem como causa a percepção dos respectivos rendimentos e estes, por
força do regime aplicável, forem considerados comuns.
ARTIGO 1695º
(Bens que respondem
pelas dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges)
1. Pelas dívidas que são da
responsabilidade de ambos os cônjuges respondem os bens comuns do casal, e, na
falta ou insuficiência deles, solidariamente, os bens próprios de qualquer dos
cônjuges.
2. No regime da separação
de bens, a responsabilidade dos cônjuges não é solidária.
ARTIGO 1696º
(Bens que respondem
pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges)
1. Pelas dívidas da
exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do
cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.
2. Respondem, todavia, ao
mesmo tempo que os bens próprios do cônjuge devedor:
a) Os bens por ele levados
para o casal ou posteriormente adquiridos a título gratuito, bem como os
respectivos rendimentos;
b) O produto do trabalho e
os direitos de autor do cônjuge devedor;
c) Os bens sub-rogados no
lugar dos referidos na alínea a).
3. Não há lugar à moratória
estabelecida no nº 1, se a incomunicabilidade da dívida cujo cumprimento se
pretende exigir resulta do disposto na alínea b) do artigo 1692º.
(Redacção do Dec.-Lei
329-A/95, de 12-12)
ARTIGO 1697º
(Compensações devidas
pelo pagamento de dívidas do casal)
1. Quando por dívidas da
responsabilidade de ambos os cônjuges tenham respondido bens de um só deles,
este torna-se credor do outro pelo que haja satisfeito além do que lhe competia
satisfazer; mas este crédito só é exigível no momento da partilha dos bens do
casal, a não ser que vigore o regime da separação.
2. Sempre que por dívidas
da exclusiva responsabilidade de um só dos cônjuges tenham respondido bens
comuns, é a respectiva importância levada a crédito do património comum no
momento da partilha.
SECÇÃO III
Convenções antenupciais
ARTIGO 1698º
(Liberdade de convenção)
Os esposos podem fixar
livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do casamento, quer
escolhendo um dos regimes previstos neste código, quer estipulando o que a esse
respeito lhes aprouver, dentro dos limites da lei.
ARTIGO 1699º
(Restrições ao princípio
da liberdade)
1. Não podem ser objecto de
convenção antenupcial:
a) A regulamentação da
sucessão hereditária dos cônjuges ou de terceiro, salvo o disposto nos artigos
seguintes;
b) A alteração dos direitos
ou deveres, quer paternais, quer conjugais;
c) A alteração das regras sobre
administração dos bens do casal;
d) A estipulação da
comunicabilidade dos bens enumerados no artigo 1733º.
2. Se o casamento for
celebrado por quem tenha filhos, ainda que maiores ou emancipados, não poderá
ser convencionado o regime da comunhão geral nem estipulada a comunicabilidade
dos bens referidos no nº 1 do artigo 1722º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1700º
(Disposições por morte
consideradas lícitas)
1. A convenção antenupcial
pode conter:
a) A instituição de
herdeiro ou a nomeação de legatário em favor de qualquer dos esposados, feita
pelo outro esposado ou por terceiro nos termos prescritos nos lugares
respectivos;
b) A instituição de
herdeiro ou a nomeação de legatário em favor de terceiro, feita por qualquer
dos esposados.
2. São também admitidas na
convenção antenupcial cláusulas de reversão ou fideicomissárias relativas às
liberalidades aí efectuadas, sem prejuízo das limitações a que genericamente
estão sujeitas essas cláusulas.
ARTIGO 1701º
(Irrevogabilidade dos
pactos sucessórios)
1. A instituição contratual
de herdeiro e a nomeação de legatário, feitas na convenção antenupcial em favor
de qualquer dos esposados, quer pelo outro esposado, quer por terceiro, não
podem ser unilateralmente revogadas depois da aceitação, nem é lícito ao doador
prejudicar o donatário por actos gratuitos de disposição; mas podem essas
liberalidades, quando feitas por terceiro, ser revogadas a todo o tempo por
mútuo acordo dos contraentes.
2. Precedendo, em qualquer
dos casos, autorização do donatário, prestada por escrito, ou o respectivo
suprimento judicial, pode o doador alienar os bens doados com fundamento em
grave necessidade, própria ou dos membros da família a seu cargo.
3. Sempre que a doação seja
afectada nos termos do número anterior, o donatário concorrerá à sucessão do
doador como legatário do valor que os bens doados teriam ao tempo da morte
deste, devendo ser pago com preferência a todos os demais legatários do doador.
ARTIGO 1702º
(Regime da instituição
contratual)
1. Quando a instituição
contratual em favor de qualquer dos esposados tiver por objecto uma quota de
herança, o cálculo dessa quota será feito conferindo-se os bens de que o doador
haja disposto gratuitamente depois da doação.
2. Se a instituição tiver
por objecto a totalidade da herança, pode o doador dispor gratuitamente, em
vida ou por morte, de uma terça parte dela, calculada nos termos do número
anterior.
3. É lícito ao doador, no
acto da doação, renunciar no todo ou em parte ao direito de dispor da terça
parte da herança.
ARTIGO 1703º
(Caducidade dos pactos
sucessórios)
1. A instituição e o legado
contratuais em favor de qualquer dos esposados caducam não só nos casos
previstos no artigo 1760º, mas ainda no caso de o donatário falecer antes do
doador.
2. Se, porém, a doação por
morte for feita por terceiro, não caduca pelo predecesso do donatário, quando
ao doador sobrevivam descendentes legítimos daquele, nascidos do casamento, os
quais serão chamados a suceder nos bens doados, em lugar do donatário.
ARTIGO 1704º
(Disposições de
esposados a favor de terceiros, com carácter testamentário)
A instituição de herdeiro e
a nomeação de legatário feitas por algum dos esposados na convenção antenupcial
em favor de pessoas indeterminadas, ou em favor de pessoa certa e determinada que
não intervenha no acto como aceitante, têm valor meramente testamentário, e não
produzem qualquer efeito se a convenção caducar.
ARTIGO 1705º
(Disposições por morte a
favor de terceiro, com carácter contratual)
1. À instituição de
herdeiro e à nomeação de legatário feitas por qualquer dos esposados em favor
de pessoa certa e determinada que intervenha como aceitante na convenção
antenupcial é aplicável o disposto nos artigos 1701º e 1702º, sem prejuízo da
sua ineficácia se a convenção caducar.
2. Pode, todavia, a
instituição ou nomeação ser livremente revogada, se o disponente a tiver feito
com reserva dessa faculdade.
3. A irrevogabilidade da
disposição não a isenta do regime geral de revogação das doações por ingratidão
do donatário nem da redução por inoficiosidade.
4. As liberalidades a que
este artigo se refere caducam, se o donatário falecer antes do doador.
ARTIGO 1706º
(Correspectividade das
disposições por morte a favor de terceiros)
1. Se ambos os esposados
instituírem terceiros seus herdeiros, ou fizerem legados em seu benefício, e
ficar consignado na convenção antenupcial o carácter correspectivo das duas
disposições, a invalidade ou revogação de uma das disposições produz a
ineficácia da outra.
2. Desde que uma das
disposições comece a produzir os seus efeitos, a outra já não pode ser revogada
ou alterada, excepto se o beneficiário da primeira renúnciar a ela, restituindo
quanto por força dela haja recebido.
ARTIGO 1707º
(Revogabilidade das
cláusulas de reversão ou fideicomissárias)
As cláusulas de reversão ou
fideicomissárias previstas no nº 2 do artigo 1700º são revogáveis livremente e
a todo tempo pelo autor da liberalidade.
ARTIGO 1708º
(Capacidade para
celebrar convenções antenupciais)
1. Têm capacidade para
celebrar convenções antenupciais aqueles que têm capacidade para contrair
casamento.
2. Aos menores, bem como
aos interditos ou inabilitados, só é permitido celebrar convenções antenupciais
com autorização dos respectivos representantes legais.
ARTIGO 1709º
(Anulabilidade por falta
de autorização)
A anulabilidade da
convenção antenupcial por falta de autorização só pode ser invocada pelo
incapaz, pelos seus herdeiros, ou por aqueles a quem competir concedê-la,
dentro do prazo de um ano a contar da celebração do casamento, considerando-se a
anulabilidade sanada se o casamento vier a ser celebrado depois de findar a
incapacidade.
ARTIGO 1710º
(Forma das convenções
antenupciais)
As convenções antenupciais
só são válidas se forem celebradas por escritura pública ou por auto lavrado
perante o conservador do registo civil.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1711º
(Publicidade das
convenções antenupciais)
1. As convenções
antenupciais só produzem efeitos em relação a terceiros depois de registadas.
2. Os herdeiros dos
cônjuges e dos demais outorgantes da escritura não são considerados terceiros.
3. O registo da convenção
não dispensa o registo predial relativo aos factos a ele sujeitos.
ARTIGO 1712º
(Revogação ou
modificação da convenção antenupcial antes da celebração do casamento)
1. A convenção antenupcial
é livremente revogável ou modificável até à celebração do casamento, desde que
na revogação ou modificação consintam todas as pessoas que nela outorgaram ou
os respectivos herdeiros.
2. O novo acordo está
sujeito aos requisitos de forma e publicidade estabelecidos nos artigos
antecedentes.
3. A falta de intervenção
de alguma das pessoas que outorgaram na primeira convenção, ou dos respectivos
herdeiros, apenas tem como efeito facultar àquelas ou a estes o direito de
resolver as cláusulas que lhes digam respeito.
ARTIGO 1713º
(Convenções sob condição
ou a termo)
1. É válida a convenção sob
condição ou a termo.
2. Em relação a terceiros,
o preenchimento da condição não tem efeito retroactivo.
ARTIGO 1714º
(Imutabilidade das
convenções antenupciais e do regime de bens resultantes da lei)
1. Fora dos casos previstos
na lei, não é permitido alterar, depois da celebração do casamento, nem as
convenções antenupciais nem os regimes de bens legalmente fixados.
2. Consideram-se abrangidos
pelas proibições do número anterior os contratos de compra e venda e sociedade
entre os cônjuges, excepto quando estes se encontrem separados judicialmente de
pessoas e bens.
3. É lícita, contudo, a
participação dos dois cônjuges na mesma sociedade de capitais, bem como a dação
em cumprimento feita pelo cônjuge devedor ao seu consorte.
ARTIGO 1715º
(Excepções ao princípio
da imutabilidade)
1. São admitidas alterações
ao regime de bens:
a) Pela revogação das
disposições mencionadas no artigo 1700º, nos casos e sob a forma em que é
permitida pelos artigos 1701º a 1707º;
b) Pela simples separação
judicial de bens;
c) Pela separação judicial
de pessoas e bens;
d) Em todos os demais
casos, previstos na lei, de separação de bens na vigência da sociedade
conjugal.
2. Às alterações da
convenção antenupcial ou do regime legal de bens previstas no número anterior é
aplicável o disposto no artigo 1711º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1716º
(Caducidade das
convenções antenupciais)
A convenção caduca, se o
casamento não for celebrado dentro de um ano, ou se, tendo-o sido, vier a ser
declarado nulo ou anulado, salvo o disposto em matéria de casamento putativo.
SECÇÃO IV
Regimes de bens
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1717º
(Regime de bens
supletivo)
Na falta de convenção
antenupcial, ou no caso de caducidade, invalidade ou ineficácia da convenção, o
casamento considera-se celebrado sob o regime da comunhão de adquiridos.
ARTIGO 1718º
(Remissão genérica para
uma lei estrangeira ou revogada, ou para usos e costumes locais)
O regime de bens do
casamento não pode ser fixado, no todo ou em parte, por simples remissão
genérica para uma lei estrangeira, para um preceito revogado, ou para usos e
costumes locais.
ARTIGO 1719º
(Partilha segundo
regimes não convencionados)
1. É permitido aos
esposados convencionar, para o caso de dissolução do casamento por morte de um
dos cônjuges, quando haja descendentes comuns, que a partilha dos bens se faça
segundo o regime da comunhão geral, seja qual for o regime adoptado.
2. O disposto no número
anterior não prejudica os direitos de terceiro na liquidação do passivo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1720º
(Regime imperativo da
separação de bens)
1. Consideram-se sempre
contraídos sob o regime da separação de bens:
a) O casamento celebrado
sem precedência do processo de publicações;
b) O casamento celebrado
por quem tenha completado sessenta anos de idade.
2. O disposto no número
anterior não obsta a que os nubentes façam entre si doações.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Regime da comunhão de
adquiridos
ARTIGO 1721º
(Normas aplicáveis)
Se o regime de bens
adoptado pelos esposados, ou aplicado supletivamente, for o da comunhão de
adquiridos, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes.
ARTIGO 1722º
(Bens próprios)
1. São considerados
próprios dos cônjuges:
a) Os bens que cada um
deles tiver ao tempo da celebração do casamento;
b) Os bens que lhes
advierem depois do casamento por sucessão ou doação;
c) Os bens adquiridos na
constância do matrimónio por virtude de direito próprio anterior.
2. Consideram-se, entre
outros, adquiridos por virtude de direito próprio anterior, sem prejuízo da
compensação eventualmente devida ao património comum:
a) Os bens adquiridos em
consequência de direitos anteriores ao casamento sobre patrimónios ilíquidos
partilhados depois dele;
b) Os bens adquiridos por
usucapião fundada em posse que tenha o seu início antes do casamento;
c) Os bens comprados antes
do casamento com reserva de propriedade;
d) Os bens adquiridos no
exercício de direito de preferência fundado em situação já existente à data do
casamento.
ARTIGO 1723º
(Bens sub-rogados no
lugar de bens próprios)
Conservam a qualidade de
bens próprios:
a) Os bens sub-rogados no
lugar de bens próprios de um dos cônjuges, por meio de troca directa;
b) O preço dos bens
próprios alienados;
c) Os bens adquiridos ou as
benfeitorias feitas com dinheiro ou valores próprios de um dos cônjuges, desde
que a proveniência do dinheiro ou valores seja devidamente mencionada no
documento de aquisição, ou em documento equivalente, com intervenção de ambos
os cônjuges.
ARTIGO 1724º
(Bens integrados na
comunhão)
Fazem parte da comunhão:
a) O produto do trabalho
dos cônjuges;
b) Os bens adquiridos pelos
cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam exceptuados por lei.
ARTIGO 1725º
(Presunção de
comunicabilidade)
Quando haja dúvidas sobre a
comunicabilidade dos bens móveis, estes consideram-se comuns.
ARTIGO 1726º
(Bens adquiridos em
parte com dinheiro ou bens próprios e noutra parte com dinheiro ou bens comuns)
1. Os bens adquiridos em
parte com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e noutra parte com
dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa das duas
prestações.
2. Fica, porém, sempre
salva a compensação devida pelo património comum aos patrimónios próprios dos
cônjuges, ou por estes àquele, no momento da dissolução e partilha da comunhão.
ARTIGO 1727º
(Aquisição de bens
indivisos já pertencentes em parte a um dos cônjuges)
A parte adquirida em bens
indivisos pelo cônjuge que deles for comproprietário fora da comunhão reverte
igualmente para o seu património próprio, sem prejuízo da compensação devida ao
património comum pelas somas prestadas para a respectiva aquisição.
ARTIGO 1728º
(Bens adquiridos por
virtude da titularidade de bens próprios)
1. Consideram-se próprios
os bens adquiridos por virtude da titularidade de bens próprios, que não possam
considerar-se como frutos destes, sem prejuízo da compensação eventualmente
devida ao património comum.
2. São designadamente
considerados bens próprios, por força do disposto no número antecedente:
a) As acessões;
b) Os materiais resultantes
da demolição ou destruição de bens;
c) A parte do tesouro
adquirida pelo cônjuge na qualidade de proprietário;
d) Os prémios de amortização
de títulos de crédito ou de outros valores mobiliários próprios de um dos
cônjuges, bem como os títulos ou valores adquiridos por virtude de um direito
de subscrição àqueles inerente.
ARTIGO 1729º
(Bens doados ou deixados
em favor da comunhão)
1. Os bens havidos por um
dos cônjuges por meio de doação ou deixa testamentária de terceiro entram na
comunhão, se o doador ou testador assim o tiver determinado; entende-se que
essa é a vontade do doador ou testador, quando a liberalidade for feita em favor
dos dois cônjuges conjuntamente.
2. O disposto no número
anterior não abrange as doações e deixas testamentárias que integrem a legítima
do donatário.
ARTIGO 1730º
(Participação dos
cônjuges no património comum)
1. Os cônjuges participam
por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer estipulação
em sentido diverso.
2. A regra da metade não
impede que cada um dos cônjuges faça em favor de terceiro doações ou deixas por
conta da sua meação nos bens comuns, nos termos permitidos por lei.
ARTIGO 1731º
(Instrumentos de
trabalho)
Se os instrumentos de
trabalho de cada um dos cônjuges tiverem entrado no património comum por força
do regime de bens, o cônjuge que deles necessite para o exercício da sua
profissão tem direito a ser neles encabeçado no momento da partilha.
SUBSECÇÃO III
Regime da comunhão geral
ARTIGO 1732º
(Estipulação do regime)
Se o regime de bens
adoptado pelos cônjuges for o da comunhão geral, o património comum é
constituido por todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, que não sejam
exceptuados por lei.
ARTIGO 1733º
(Bens incomunicáveis)
1. São exceptuados da
comunhão:
a) Os bens doados ou
deixados, ainda que por conta da legítima, com a cláusula de
incomunicabilidade;
b) Os bens doados ou
deixados com a cláusula de reversão ou fideicomissária, a não ser que a
cláusula tenha caducado;
c) o usufruto, o uso ou
habitação, e demais direitos estritamente pessoais;
d) As indemnizações devidas
por factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges ou contra os
seus bens próprios;
e) Os seguros vencidos em
favor da pessoa de cada um dos cônjuges ou para cobertura de riscos sofridos
por bens próprios;
f) Os vestidos, roupas e
outros objectos de uso pessoal e exclusivo de cada um dos cônjuges, bem como os
seus diplomas e a sua correspondência;
g) As recordações de
família de diminuto valor económico.
2. A incomunicabilidade dos
bens não abrange os respectivos frutos nem o valor das benfeitorias úteis.
ARTIGO 1734º
(Disposições aplicáveis)
São aplicáveis à comunhão
geral de bens, com as necessárias adaptações, as disposições relativas à
comunhão de adquiridos.
SUBSECÇÃO IV
Regime da separação
ARTIGO 1735º
(Domínio da separação)
Se o regime de bens imposto
por lei ou adoptado pelos esposados for o da separação, cada um deles conserva
o domínio e fruição de todos os seus bens presentes e futuros, podendo dispor
deles livremente.
ARTIGO 1736º
(Prova da propriedade
dos bens)
1. É lícito aos esposados
estipular, na convenção antenupcial, cláusulas de presunção sobre a propriedade
dos móveis, com eficácia extensiva a terceiros, mas sem prejuízo de prova em
contrário.
2. Quando haja dúvidas
sobre a propriedade exclusiva de um dos cônjuges, os bens móveis ter-se-ão como
pertencentes em compropriedade a ambos os cônjuges.
ARTIGO 1737º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO V
Regime dotal
ARTIGOS 1738º A 1752º
(Revogados pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO X
Doações para casamento e
entre casados
SECÇÃO I
Doações para casamento
ARTIGO 1753º
(Noção e normas
aplicáveis)
1. Doação para casamento é
a doação feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista do seu casamento.
2. Às doações para
casamento são aplicáveis as disposições da presente secção e, subsidiariamente,
as dos artigos 940º a 979º.
ARTIGO 1754º
(Espécies)
As doações para casamento
podem ser feitas por um dos esposados ao outro, pelos dois reciprocamente, ou
por terceiro a um ou a ambos os esposados.
ARTIGO 1755º
(Regime)
1. As doações entre vivos
produzem os seus efeitos a partir da celebração do casamento, salvo estipulação
em contrário.
2. As doações que hajam de
produzir os seus efeitos por morte do doador são havidas como pactos
sucessórios e, como tais, estão sujeitas ao disposto nos artigos 1701º a 1703º,
sem prejuízo do preceituado nos artigos seguintes.
ARTIGO 1756º
(Forma)
1. As doações para
casamento só podem ser feitas na convenção antenupcial.
2. A inobservância do
disposto no número anterior importa, quanto às doações por morte, a sua
nulidade, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 946º, e, quanto às doações
em vida, a inaplicabilidade do regime especial desta secção.
ARTIGO 1757º
(Incomunicabilidade dos
bens doados pelos esposados)
Salvo estipulação em
contrário, os bens doados por um esposado ao outro consideram-se próprios do
donatário, seja qual for o regime matrimonial.
ARTIGO 1758º
(Revogação)
As doações entre esposados
não são revogáveis por mútuo consentimento dos contraentes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1759º
(Redução por
inoficiosidade)
As doações para casamento
estão sujeitas a redução por inoficiosidade, nos termos gerais.
ARTIGO 1760º
(Caducidade)
1. As doações para
casamento caducam:
a) Se o casamento não for
celebrado dentro de um ano, ou se, tendo-o sido, vier a ser declarado nulo ou
anulado, salvo o disposto em matéria de casamento putativo;
b) Se ocorrer divórcio ou
separação judicial de pessoas e bens por culpa do donatário, se este for
considerado único ou principal culpado.
2. Se a doação tiver sido
feita por terceiro a ambos os esposados ou os bens doados tiverem entrado na
comunhão, e um dos cônjuges for declarado único ou principal culpado no
divórcio ou separação, a caducidade atinge apenas a parte dele.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Doações entre casados
ARTIGO 1761º
(Disposições aplicáveis)
As doações entre casados
regem-se pelas disposições desta secção e, subsidiariamente, pelas regras dos
artigos 940º a 979º.
ARTIGO 1762º
(Regime imperativo da
separação de bens)
É nula a doação entre
casados, se vigorar imperativamente entre os cônjuges o regime da separação de
bens.
ARTIGO 1763º
(Forma)
1. A doação de coisas
móveis, ainda que acompanhada da tradição da coisa, deve constar de documento
escrito.
2. Os cônjuges não podem
fazer doações recíprocas no mesmo acto.
3. O disposto no número
anterior não é aplicável às reservas de usufruto nem às rendas vitalícias a
favor do sobrevivente, estipuladas, umas e outras, em doação dos cônjuges a
terceiro.
ARTIGO 1764º
(Objecto e
incomunicabilidade dos bens doados)
1. Só podem ser doados bens
próprios do doador.
2. Os bens doados não se
comunicam, seja qual for o regime matrimonial.
ARTIGO 1765º
(Livre revogabilidade)
1. As doações entre casados
podem a todo o tempo ser revogadas pelo doador, sem que lhe seja lícito
renunciar a este direito.
2. A faculdade de revogação
não se transmite aos herdeiros do doador.
ARTIGO 1766º
(Caducidade)
1. A doação entre casados
caduca:
a) Falecendo o donatário
antes do doador, salvo se este confirmar a doação nos três meses subsequentes à
morte daquele;
b) Se o casamento vier a
ser declarado nulo ou anulado, sem prejuízo do disposto em matéria de casamento
putativo;
c) Ocorrendo divórcio ou
separação judicial de pessoas e bens por culpa do donatário, se este for
considerado único ou principal culpado.
2. A confirmação a que se
refere a alínea a) do número anterior deve revestir a forma exigida para a
doação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO XI
Simples separação
judicial de bens
ARTIGO 1767º
(Fundamento da
separação)
Qualquer dos cônjuges pode
requerer a simples separação judicial de bens quando estiver em perigo de
perder o que é seu pela má administração do outro cônjuge.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1768º
(Carácter litigioso da
separação)
A separação só pode ser
decretada em acção intentada por um dos cônjuges contra o outro.
(Redacção do Dec-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1769º
(Legitimidade)
1. Só tem legitimidade para
a acção de separação o cônjuge lesado ou, estando ele interdito, o seu
representante legal, ouvido o conselho de família.
2. Se o representante legal
do cônjuge lesado for o outro cônjuge, a acção só pode ser intentada, em nome
daquele, por algum parente na linha recta ou até ao terceiro grau da linha
colateral.
3. Se o cônjuge lesado
estiver inabilitado, a acção pode ser intentada por ele, ou pelo curador com
autorização judicial.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1770º
(Efeitos)
Após o trânsito em julgado
da sentença que decretar a separação judicial de bens, o regime matrimonial,
sem prejuízo do disposto em matéria de registo, passa a ser o da separação,
procedendo-se à partilha do património comum como se o casamento tivesse sido
dissolvido; a partilha pode fazer-se extrajudicialmente ou por inventário
judicial.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1771º
(Irrevogabilidade)
A simples separação
judicial de bens é irrevogável.
ARTIGO 1772º
(Separação de bens com
outros fundamentos)
O disposto nos dois artigos
anteriores é aplicável a todos os casos, previstos na lei, de separação de bens
na vigência da sociedade conjugal.
CAPÍTULO XII
Divórcio e separação
judicial de pessoas e bens
SECÇÃO I
Divórcio
SUBSECÇÃO I
Diposições gerais
ARTIGO 1773º
(Modalidades)
1. O divórcio pode ser por
mútuo consentimento ou litigioso.
2. O divórcio por mútuo
consentimento pode ser requerido por ambos os cônjuges, de comum acordo, no
tribunal ou na conservatória do registo civil se, neste caso, o casal não tiver
filhos menores ou, havendo-os, o exercício do respectivo poder paternal se
mostrar já judicialmente regulado.
3. O divórcio litigioso é
requerido no tribunal por um dos cônjuges contra o outro, com algum dos
fundamentos previstos nos artigos 1779º e 1781º.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1774º
(Tentativa de
conciliação; conversão do divórcio litigioso em divórcio por mútuo
consentimento)
1. No processo de divórcio
haverá sempre uma tentativa de conciliação dos cônjuges.
2. Se, no processo de
divórcio litigioso, a tentativa de conciliação não resultar, o juiz procurará
obter o acordo dos cônjuges para o divórcio por mútuo consentimento; obtido o
acordo ou tendo os cônjuges, em qualquer altura do processo, optado por essa
modalidade do divórcio, seguir-se-ão os termos do processo de divórcio por
mútuo consentimento, com as necessárias adaptações.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11
SUBSECÇÃO II
Divórcio por mútuo
consentimento
ARTIGO 1775º
(Requisitos)
1. Só podem requerer o
divórcio por mútuo consentimento os cônjuges que forem casados há mais de três
anos.
2. Os cônjuges não têm de
revelar a causa do divórcio, mas devem acordar sobre a prestação de alimentos
ao cônjuge que deles careça, o exercício do poder paternal relativamente aos
filhos menores e o destino da casa de morada da família.
3. Os cônjuges devem
acordar ainda sobre o regime que vigorará, no período da pendência do processo,
quanto à prestação de alimentos, ao exercício do poder paternal e à utilização
da casa de morada de família.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1776º
(Primeira conferência)
1. Recebido o requerimento,
o juíz convocará os cônjuges para uma conferência em que tentará conciliá-los;
se a conciliação não for possível, adverti-los-á de que deverão renovar o
pedido de divórcio após um período de reflexão de três meses, a contar da data
da conferência, e dentro do ano subsequente à mesma data, sob pena de o pedido
ficar sem efeito.
2. O juiz deve apreciar na
conferência os acordos a que se refere o nº 2 do artigo anterior, convidando os
cônjuges a alterá-los se esses acordos não acautelarem suficientemente os
interesses de algum deles ou dos filhos; deve ainda homologar os acordos
provisórios previstos no nº 3 do mesmo artigo, podendo alterá-los, ouvidos os
cônjuges, quando o interesse dos filhos o exigir.
3. Se os cônjuges
persistirem no seu propósito, o dever de coabitação fica suspenso a partir da
conferência e qualquer deles pode requerer arrolamento dos seus bens próprios e
dos bens comuns.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1777º
(Segunda conferência)
Se os cônjuges renovarem o
pedido de divórcio nos termos do nº 1 do artigo anterior, o juíz covocá-los-á
para uma segunda conferência, em que tentará conciliá-los; pode ainda o juíz
marcar prazo aos cônjuges para alterarem os acordos previstos no nº 2 do artigo
1775º, sob pena de o pedido ficar sem efeito.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1778º
(Sentença)
A sentença que decrete o
divórcio por mútuo consentimento homologará os acordos referidos no nº 2 do
artigo 1775º; se, porém, esses acordos não acautelarem suficientemente os
interesses de um dos cônjuges ou dos filhos, a homologação deve ser recusada e
o pedido de divórcio indeferido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1778º-A
(Divórcio decretado pelo
conservador)
1. É aplicável ao divórcio
por mútuo consentimento decretado pelo conservador do registo civil, com as
necessárias adaptações, o disposto na presente subsecção.
2. As decisões proferidas
nestes termos produzem os mesmos efeitos das sentenças judiciais sobre idêntica
matéria.
(Aditado pelo Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
SUBSECÇÃO III
Divórcio litigioso
ARTIGO 1779º
(Violação culposa dos
deveres conjugais)
1. Qualquer dos cônjuges
pode requerer o divórcio se o outro violar culposamente os deveres conjugais,
quando a violação, pela sua gravidade ou reiteração, comprometa a possibilidade
da vida em comum.
2. Na apreciação da
gravidade dos factos invocados, deve o tribunal tomar em conta, nomeadamente, a
culpa que possa ser imputada ao requerente e o grau de educação e sensibilidade
moral dos cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1780º
(Exclusão do direito de
requerer o divórcio)
O cônjuge não pode obter o
divórcio, nos termos do artigo anterior:
a) Se tiver instigado o
outro a praticar o facto invocado como fundamento do pedido ou tiver
intencionalmente criado condições propícias à sua verificação;
b) Se houver revelado pelo
seu comportamento posterior, designadamente por perdão, expresso ou tácito, não
considerar o acto praticado como impeditivo da vida em comum.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1781º
(Ruptura da vida em
comum)
São ainda fundamentos do
divórcio litigioso:
a) A separação de facto por
seis anos consecutivos;
b) A ausência, sem que do
ausente haja notícias, por tempo não inferior a quatro anos;
c) A alteração das
faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de seis anos e, pela
sua gravidade, comprometa a possibilidade da vida em comum.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1782º
(Separação de facto)
1. Entende-se que há
separação de facto, para os efeitos da alínea a) do artigo anterior, quando não
existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um
deles, o propósito de não a restabelecer.
2. Na acção de divórcio com
fundamento em separação de facto, o juíz deve declarar a culpa dos cônjuges,
quando a haja, nos termos do artigo 1787º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1783º
(Ausência)
É aplicável ao divórcio
decretado com fundamento em ausência o disposto no nº 2 do artigo anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1784º
(Alteração das
faculdades mentais)
O pedido formulado com base
na alínea c) do artigo 1781º deve ser indeferido quando seja de presumir que o
divórcio agrave consideravelmente o estado mental do réu.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1785º
(Legitimidade)
1. Só tem legitimidade para
intentar acção de divórcio, nos termos do artigo 1779º, o cônjuge ofendido ou,
estando este interdito, o seu representante legal, com autorização do conselho
de família; quando o representante legal seja o outro cônjuge, a acção pode ser
intentada, em nome do ofendido, por qualquer parente deste na linha recta ou
até ao terceiro grau da linha colateral, se for igualmente autorizado pelo
conselho de família.
2. O divórcio pode ser
requerido por qualquer dos cônjuges com o fundamento da alínea a) do artigo
1781º, com os fundamentos das alíneas b) e c) do mesmo artigo, só pode ser
requerido pelo cônjuge que invoca a ausência ou a alteração das faculdades
mentais do outro.
3. O direito ao divórcio
não se transmite por morte, mas a acção pode ser continuada pelos herdeiros do
autor para efeitos patrimoniais, nomeadamente os decorrentes da declaração
prevista no artigo 1787º, se o autor falecer na pendência da causa; para os
mesmos efeitos, pode a acção prosseguir contra os herdeiros do réu.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1786º
(Caducidade da acção)
1. O direito ao divórcio
caduca no prazo de dois anos, a contar da data em que o cônjuge ofendido ou o
seu representante legal teve conhecimento do facto susceptível de fundamentar o
pedido.
2. O prazo de caducidade
corre separadamente em relação a cada um dos factos; tratando-se de facto
continuado, só corre a partir da data em que o facto tiver cessado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1787º
(Declaração do cônjuge
culpado)
1. Se houver culpa de um ou
de ambos os cônjuges, assim o declarará a sentença; sendo a culpa de um dos
cônjuges consideravelmente superior à do outro, a sentença deve declarar ainda
qual deles é o principal culpado.
2. O disposto no número anterior
é aplicável mesmo que o réu não tenha deduzido reconvenção ou já tenha
decorrido, relativamente aos factos alegados, o prazo referido no artigo 1786º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO IV
Efeitos do divórcio
ARTIGO 1788º
(Princípio geral)
O divórcio dissolve o
casamento e tem juridicamente os mesmos efeitos da dissolução por morte, salvas
as exepções consagradas na lei.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1789º
(Data em que se produzem
os efeitos do divórcio)
1. Os efeitos do divórcio
produzem-se a partir do trânsito em julgado da respectiva sentença, mas
retrotraem-se à data da proposição da acção quanto às relações patrimoniais
entre os cônjuges.
2. Se a falta de coabitação
entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que
os efeitos do divórcio se retrotraiam à data, que a sentença fixará, em que a
coabitação tenha cessado por culpa exclusiva ou predominante do outro.
3. Os efeitos patrimoniais
do divórcio só podem ser opostos a terceiros a partir da data do registo da
sentença.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1790º
(Partilha)
O cônjuge declarado único
ou principal culpado não pode na partilha receber mais do que receberia se o
casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1791º
(Benefícios que os
cônjuges tenham recebido ou hajam de receber)
1. O cônjuge declarado
único ou principal culpado perde todos os benefícios recebidos ou que haja de
receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em
consideração do estado de casado, quer a estipulação seja anterior quer
posterior à celebração do casamento.
2. O cônjuge inocente ou
que não seja o principal culpado conserva todos os benefícios recebidos ou que
haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, ainda que tenham sido
estipulados com cláusula de reciprocidade; pode renunciar a esses benefícios
por declaração unilateral de vontade, mas, havendo filhos do casamento, a
renúncia só é permitida em favor destes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1792º
(Reparação de danos não
patrimoniais)
1. O cônjuge declarado
único ou principal culpado e, bem assim, o cônjuge que pediu o divórcio com o
fundamento da alínea c) do artigo 1781º, devem reparar os danos não
patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do casamento.
2. O pedido de indemnização
deve ser deduzido na própria acção de divórcio.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1793º
(Casa de morada da
família)
1. Pode o tribunal dar de
arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada da
família, quer essa seja comum quer própria de outro, considerando,
nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos
do casal.
2. O arrendamento previsto
no número anterior fica sujeito às regras do arrendamento para habitação, mas o
tribunal pode definir as condições do contrato, ouvidos os cônjuges, e fazer
caducar o arrendamento, a requerimento do senhorio, quando circunstâncias supervenientes
o justifiquem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Separação judicial de
pessoas e bens
ARTIGO 1794º
(Remissão)
Sem prejuízo dos preceitos
desta secção, é aplicável à separação judicial de pessoas e bens, com as
necessárias adaptações, o disposto quanto ao divórcio na secção anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º
(Reconvenção)
1. A separação judicial de
pessoas e bens pode ser pedida em reconvenção, mesmo que o autor tenha pedido o
divórcio; tendo o autor pedido a separação de pessoas e bens, pode igualmente o
réu pedir o divórcio em reconvenção.
2. Nos casos previstos no
número anterior, a sentença deve decretar o divórcio se o pedido da acção e o
da reconvenção procederem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-A
(Efeitos)
A separação judicial de
pessoas e bens não dissolve o vínculo conjugal, mas extingue os deveres de
coabitação e assistência, sem prejuízo do direito a alimentos; relativamente
aos bens, a separação produz os efeitos que produziria a dissolução do
casamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-B
(Termo da separação)
A separação judicial de
pessoas e bens termina pela reconciliação dos cônjuges ou pela dissolução do
casamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-C
(Reconciliação)
1. Os cônjuges podem a todo
o tempo restabelecer a vida em comum e o exercício pleno dos direitos e deveres
conjugais.
2. A reconciliação pode
fazer-se por termo no processo de separação ou por escritura pública, e está sujeita
a homologação judicial, devendo a sentença ser oficiosamente registada.
3. Quando tenha corrido os
seus termos na conservatória do registo civil, a reconcialiação faz-se por
termo no processo de separação e está sujeita a homologação do conservador
respectivo, devendo a decisão ser oficiosamente registada.
4. Os efeitos da
reconciliação produzem-se a partir da homologação desta, sem prejuízo da
aplicação, com as necessárias adaptações, do disposto nos artigos 1669º e
1670º.
(Redacção do Dec-Lei 163/95,
de 13-7)
ARTIGO 1795º-D
(Conversão da separação
em divórcio)
1. Decorridos dois anos
sobre o trânsito em julgado da sentença que tiver decretado a separação
judicial de pessoas e bens, litigiosa ou por mútuo consentimento, sem que os
cônjuges se tenham reconciliado, qualquer deles pode requerer que a separação
seja convertida em divórcio.
2. Se a conversão for
requerida por ambos os cônjuges, não é necessário o decurso do prazo referido
no número anterior.
3. A convenção pode ser
requerida por qualquer dos cônjuges, independentemente do prazo do nº 1 deste
artigo, se o outro cometer adultério depois da separação, sendo aplicável neste
caso, o artigo 1780º.
4. A sentença que converta
a separação em divórcio não pode alterar o que tiver sido decidido sobre a
culpa dos cônjuges, nos termos do artigo 1787º, no processo de separação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
TÍTULO III
DA FILIAÇÃO
CAPÍTULO I
Estabelecimento da
filiação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1796º
(Estabelecimento da
filiação)
1. Relativamente à mãe, a
filiação resulta do facto do nascimento e estabelece-se nos termos dos artigos
1803º a 1825º.
2. A paternidade presume-se
em relação ao marido da mãe e, nos casos de filiação fora do casamento,
estabelece-se pelo reconhecimento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1797º
(Atendibilidade da
filiação)
1. Os poderes e deveres
emergentes da filiação ou do parentesco nela fundado só são atendíveis se a
filiação se encontrar legalmente estabelecida.
2. O estabelecimento da
filiação tem, todavia, eficácia retroactiva.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1798º
(Concepção)
O momento da concepção do
filho é fixado, para os efeitos legais, dentro dos primeiros cento e vinte dias
dos trezentos que precederem o seu nascimento, salvas as excepções dos artigos
seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1799º
(Gravidez anterior)
1. Se dentro dos trezentos
dias anteriores ao nascimento tiver sido interrompida ou completada outra
gravidez, não são considerados para a determinação do momento da concepção os
dias que tiverem decorrido até à interrupção da gravidez ou ao parto.
2. A prova da interrupção
de outra gravidez, não havendo registo do facto, só pode ser feita em acção
intentada por qualquer interessado ou pelo Ministério Público especialmente
para esse fim.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1800º
(Fixação judicial da
concepção)
1. É admitida acção
judicial destinada a fixar a data provável da concepção dentro do período
referido no artigo 1798º, ou a provar que o período de gestação do filho foi
inferior a cento e oitenta dias ou superior a trezentos.
2. A acção pode ser
proposta por qualquer interessado ou pelo Ministério Público; se for julgada
procedente, deve o tribunal fixar, em qualquer dos casos referidos no número
anterior, a data provável da concepção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1801º
(Exames de sangue e
outros métodos científicos)
Nas acções relativas à
filiação são admitidos como meios de prova os exames de sangue e quaisquer
outros métodos cientificamente comprovados.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1802º
(Prova da filiação)
Salvo nos casos
especificados na lei, a prova da filiação só pode fazer-se pela forma
estabelecida nas leis do registo civil.
(Redacção do De.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Estabelecimento da
maternidade
SUBSECÇÃO I
Declaração de
maternidade
ARTIGO 1803º
(Menção da maternidade)
1. Aquele que declarar o
nascimento deve, sempre que possa, identificar a mãe do registando.
2. A maternidade indicada é
mencionada no registo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1804º
(Nascimento ocorrido há
menos de um ano)
1. No caso de declaração de
nascimento ocorrido há menos de um ano, a maternidade indicada considera-se
estabelecida.
2. Lavrado o registo, deve
o conteúdo do assento ser comunicado à mãe do registado sempre que possível,
mediante notificação pessoal, salvo se a declaração tiver sido feita por ela ou
pelo marido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1805º
(Nascimento ocorrido há
um ano ou mais)
1. No caso de declaração de
nascimento ocorrido há um ano ou mais, a maternidade indicada considera-se
estabelecida se a mãe for o declarante, estiver presente no acto ou nele se
achar representada por procurador com poderes especiais.
2. Fora dos casos previstos
no número anterior, a pessoa indicada como mãe será notificada pessoalmente
para, no prazo de quinze dias, vir declarar se confirma a maternidade, sob a
cominação de o filho ser havido como seu; o facto da notificação e a confirmação
são averbados ao registo do nascimento.
3. Se a pretensa mãe negar
a maternidade ou não puder ser notificada, a menção da maternidade fica sem
efeito.
4. Das certidões extraídas
do registo de nascimento não pode constar qualquer referência à menção que
tenha ficado sem efeito nem aos averbamentos que lhe respeitem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1806º
(Registo omisso quanto à
maternidade)
1. A mãe pode fazer a
declaração de maternidade se o registo for omisso quanto a esta, salvo se se
tratar de filho nascido ou concebido na constância do matrimónio e existir
perfilhação por pessoa diferente do marido.
2. Quando a mãe possa fazer
a declaração de maternidade, qualquer das pessoas a quem compete fazer a
declaração do nascimento tem a faculdade de identificar a mãe do registado,
sendo aplicável o disposto nos artigos 1803º a 1805º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1807º
(Impugnação da
maternidade)
Se a maternidade
estabelecida nos termos dos artigos anteriores não for a verdadeira, pode a
todo o tempo ser impugnada em juízo pela pessoa declarada como mãe, pelo
registado, por quem tiver interesse moral ou patrimonial na procedência da
acção ou pelo Ministério Público.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Averiguação oficiosa
ARTIGO 1808º
(Averiguação oficiosa da
maternidade)
1. Sempre que a maternidade
não esteja mencionada no registo do nascimento deve o funcionário remeter ao
tribunal certidão integral do registo e cópia do auto de declarações, se as
houver, a fim de se averiguar oficiosamente a maternidade.
2. O tribunal deve proceder
às diligências necessárias para identificar a mãe; se por qualquer modo chegar
ao seu conhecimento a identidade da pretensa mãe, deve ouvi-la em declarações,
que serão reduzidas a auto.
3. Se a pretensa mãe
confirmar a maternidade, será lavrado termo e remetida certidão para
averbamento à repartição competente para o registo.
4. Se a maternidade não for
confirmada mas o tribunal concluir pela existência de provas seguras que abonem
a viabilidade da acção de investigação, ordenará a remessa do processo ao
agente do Ministério Público junto do tribunal competente, a fim de a acção ser
proposta.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1809º
(Casos em que não é
admitida a averiguação oficiosa da maternidade)
A acção a que se refere o
artigo anterior não pode ser intentada:
a) Se, existindo
perfilhação, a pretensa mãe e o perfilhante forem parentes ou afins em linha
recta ou parentes no segundo grau da linha colateral;
b) Se tiverem decorrido
dois anos sobre a data do nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1810º
(Filho nascido ou
concebido na constância do matrimónio)
Se, em consequência do
disposto no artigo 1808º, o tribunal concluir pela existência de provas seguras
de que o filho nasceu ou foi concebido na constância do matrimónio da pretensa
mãe, ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do
tribunal competente a fim de ser intentada a acção a que se refere o artigo
1822º, neste caso é aplicável o disposto na alínea b) do artigo anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1811º
(Valor probatório das
declarações prestadas)
Sem prejuízo do disposto no
nº 3 do artigo 1808º, as declarações prestadas durante o processo a que se
refere o artigo 1808º não implicam presunção de maternidade nem constituem
sequer princípio de prova.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1812º
(Carácter secreto da
instrução)
A instrução do processo é
secreta e será conduzida por forma a evitar ofensa ao pudor ou dignidade das
pessoas.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1813º
(Improcedência da acção
oficiosa)
A improcedência da acção
oficiosa não obsta a que seja intentada nova acção de investigação de
maternidade, ainda que fundada nos mesmos factos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO III
Reconhecimento judicial
ARTIGO 1814º
(Investigação de
maternidade)
Quando não resulte de
declaração, nos termos dos artigos anteriores, a maternidade pode ser
reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho para esse efeito.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1815º
(Caso em que não é
admitido o reconhecimento)
Não é admissível o
reconhecimento de maternidade em contrário da que conste do registo do
nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1816º
(Prova da maternidade)
1. Na acção de investigação
de maternidade o filho deve provar que nasceu da pretensa mãe.
2. A maternidade
presume-se:
a) Quando o filho houver
sido reputado e tratado como tal pela pretensa mãe e reputado como filho também
pelo público;
b) Quando exista carta ou
outro escrito no qual a pretensa mãe declare inequivocamente a sua maternidade.
3. A presunção considera-se
ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1817º
(Prazo para a proposição
da acção)
1. A acção de investigação
de maternidade só pode ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos
dois primeiros anos posteriores à sua maioridade ou emancipação.
2. Se não for possível
estabelecer a maternidade em consequência do disposto no artigo 1815º, a acção
pode ser proposta no ano seguinte à rectificação, declaração de nulidade ou
cancelamento do registo inibitório, contanto que a remoção do obstáculo tenha sido
requerida até ao termo do prazo estabelecido no número anterior, se para tal o
investigante tiver legitimidade.
3. Se a acção se fundar em
escrito no qual a pretensa mãe declare inequivocamente a maternidade, pode ser
intentada nos seis meses posteriores à data em que o autor conheceu ou devia
ter conhecido o conteúdo do escrito.
4. Se o investigante for
tratado como filho pela pretensa mãe, a acção pode ser proposta dentro do prazo
de um ano, a contar da data em que cessar aquele tratamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1818º
(Prossecução e
transmissão da acção)
O cônjuge não separado
judicialmente de pessoas e bens ou os descendentes do filho podem prosseguir na
acção, se este falecer na pendência da causa; mas só podem propô-la se o filho,
sem a haver intentado, morrer antes de terminar o prazo em que o podia fazer.
ARTIGO 1819º
(Legitimidade passiva)
1. A acção deve ser
proposta contra a pretensa mãe, se esta tiver falecido, contra o cônjuge
sobrevivo não separado judicialmente de pessoas e bens e também,
sucessivamente, contra os descendentes, ascendentes ou irmãos; na falta destas
pessoas, será nomeado curador especial.
2. Quando existam herdeiros
ou legatários cujos direitos sejam atingidos pela procedência da acção, esta
não produzirá efeitos contra eles se não tiverem sido também demandados.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1820º
(Coligação de
investigantes)
Na acção de investigação de
maternidade é permitida a coligação de investigantes em relação ao mesmo
pretenso progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1821º
(Alimentos provisórios)
O filho menor, interdito ou
inabilitado tem direito a alimentos provisórios desde a proposição da acção,
contanto que o tribunal considere provável o reconhecimento da maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1822º
(Filho nascido ou
concebido na constância do matrimónio)
1. Se se tratar de filho
nascido ou concebido na constância do matrimónio da pretensa mãe, a acção de
investigação deve ser intentada também contra o marido e, se existir
perfilhação, ainda contra o perfilhante.
2. Durante a menoridade do
filho a acção pode ser intentada pelo marido da pretensa mãe; neste caso deverá
sê-lo contra a pretensa mãe e contra o filho e, se existir perfilhação, também
contra o perfilhante.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1823º
(Impugnação da presunção
de paternidade)
1. Na acção a que se refere
o artigo anterior pode ser sempre impugnada a presunção de paternidade do
marido da mãe.
2. Se o filho tiver sido
perfilhado por pessoa diferente do marido da mãe, a perfilhação só prevalecerá
se for afastada, nos termos do número anterior, a presunção de paternidade.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1824º
(Estabelecimento da
maternidade a pedido da mãe)
1. Se se tratar de filho
nascido ou concebido na constância do matrimónio e existir perfilhação por
pessoa diferente do marido da mãe, pode esta requerer ao tribunal que declare a
maternidade.
2. No caso referido no
número anterior é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos
1822º e 1823º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1825º
(Legitimidade em caso de
falecimento do autor ou réus)
Em caso de falecimento do
autor ou dos réus nas acções a que se referem os artigos 1822º a 1824º, é
aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1818º e 1819º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Estabelecimento da
paternidade
SUBSECÇÃO I
Presunção de paternidade
ARTIGO 1826º
(Presunção de
paternidade)
1. Presume-se que o filho
nascido ou concebido na constância do matrimónio da mãe tem como pai o marido
da mãe.
2. O momento da dissolução
do casamento por divórcio ou da sua anulação é o do trânsito em julgado da
respectiva sentença; o casamento católico, porém, só se considera nulo ou
dissolvido por dispensa a partir do registo da sentença proferida pelas
autoridades eclesiásticas.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1827º
(Casamento putativo)
1. A anulação do casamento
civil, ainda que contraído de má fé por ambos os cônjuges, não exclui a
presunção de paternidade.
2. A declaração de nulidade
do casamento católico, transcrito no registo civil, também não exclui essa
presunção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1828º
(Filhos concebidos antes
do casamento)
Relativamente ao filho
nascido dentro dos cento e oitenta dias posteriores à celebração do casamento,
cessa a presunção estabelecida no artigo 1826º se a mãe ou o marido declararem
no acto do registo do nascimento que o marido não é o pai.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1829º
(Filhos concebidos
depois de finda a coabitação)
1. Cessa a presunção de
paternidade se o nascimento do filho ocorrer passados trezentos dias depois de
finda a coabitação dos cônjuges, nos termos do número seguinte.
2. Considera-se finda a
coabitação dos cônjuges:
a) Na data da primeira
conferência, tratando-se de divórcio ou de separação por mútuo consentimento;
b) Na data da citação do
réu para a acção de divórcio ou separação litigiosa, ou na data que a sentença
fixar como a da cessação da coabitação;
c) Na data em que deixou de
haver notícias do marido, conforme decisão proferida em acção de nomeação de
curador provisório, justificação de ausência ou declaração de morte presumida.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1830º
(Reinício da presunção
de paternidade)
Para o efeito do disposto
no nº 1 do artigo 1826º, são equiparados a novo casamento:
a) A reconciliação dos
cônjuges separados judicialmente de pessoas e bens;
b) O regresso do ausente;
c) O trânsito em julgado da
sentença que, sem ter decretado o divórcio ou separação judicial de pessoas e
bens, pôs termo ao respectivo processo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1831º
(Renascimento da
presunção de paternidade)
1. Quando o início do
período legal da concepção seja anterior ao trânsito em julgado da sentença
proferida nas acções a que se referem as alíneas a) e b) do nº 2 do artigo
1829º, renasce a presunção de paternidade se, em acção intentada por um dos
cônjuges ou pelo filho, se provar que no período legal da concepção existiram
relações entre os cônjuges, que tornam verosímil a paternidade do marido ou que
o filho, na ocasião do nascimento, beneficiou de posse de estado relativamente
a ambos os cônjuges.
2. Existe posse de estado
relativamente a ambos os cônjuges quando se verifiquem, cumulativamente, os
seguintes requisitos:
a) Ser a pessoa reputada e
tratada como filho por ambos os cônjuges;
b) Ser reputada como tal
nas relações sociais, especialmente nas respectivas famílias.
3. Se existir perfilhação,
na acção a que se refere o nº 1, deve ser igualmente demandado o perfilhante.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1832º
(Não indicação da
paternidade do marido)
1. A mulher casada pode
fazer a declaração do nascimento com a indicação de que o filho não é do
marido.
2. Cessa a presunção de
paternidade no caso previsto no número anterior, se for averbada ao registo
declaração de que na ocasião do nascimento o filho não beneficiou de posse de
estado, nos termos do nº 2 do artigo precedente, relativamente a ambos os
cônjuges.
3. A menção da paternidade
do marido da mãe será feita oficiosamente se, decorridos 60 dias sobre a data
em que foi lavrado o registo, a mãe não provar que pediu a declaração a que
alude o nº 2 ou se o pedido for indeferido.
4. Sem prejuízo do disposto
no nº 1, não são admissíveis no registo de nascimento menções que contrariem a
presunção de paternidade enquanto esta não cessar.
5. Se a mãe fizer a
declaração prevista no nº 1, o poder paternal só caberá ao marido quando for
averbada ao registo a menção da sua paternidade.
6. Quando a presunção de
paternidade houver cessado nos termos do nº 2, é aplicável o disposto no artigo
1831º.
(Redacção do Dec-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1833º
(Declaração de
inexistência de posse de estado)
A declaração de
inexistência de posse de estado a que se refere o nº 2 do artigo anterior é
proferida em processo especial e os seus efeitos restringem-se ao disposto
naquele preceito.
(Redacção do Dec.-Lei
163/95, de 13-7)
ARTIGO 1834º
(Dupla presunção de
paternidade)
1. Se o filho nasceu depois
de a mãe ter contraído novo casamento sem que o primeiro se achasse dissolvido
ou dentro dos trezentos dias após a sua dissolução, presume-se que o pai é o
segundo marido.
2. Julgada procedente a
acção de impugnação de paternidade, renasce a presunção relativa ao anterior
marido da mãe.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1835º
(Menção obrigatória da
paternidade)
1. A paternidade presumida
nos termos dos artigos anteriores constará obrigatóriamente do registo do
nascimento do filho, não sendo admitidas menções que a contrariem, salvo o
disposto nos artigos 1828º e 1832º.
2. Se o registo do
casamento dos pais só vier a ser efectuado depois do registo do nascimento, e deste
não constar a paternidade do marido da mãe, será a paternidade mencionada
oficiosamente.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1836º
(Rectificação do
registo)
1. Se contra o disposto na
lei não se fizer menção da paternidade do filho nascido de mulher casada, pode
a todo o tempo qualquer interessado, o Ministério Público ou o funcionário
competente promover a rectificação do registo.
2. De igual faculdade gozam
as mesmas pessoas quando tenha sido registado como filho do marido da mãe quem
não beneficie de presunção de paternidade
(Redacção do Decr.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1837º
(Rectificação,
declaração de nulidade ou cancelamento do registo)
Se for rectificado,
declarado nulo ou cancelado qualquer registo por falsidade ou qualquer outra causa
e, em consequência da rectificação, declaração de nulidade ou cancelamento, o
filho deixar de ser havido como filho Do marido da mãe ou passar a beneficiar
da presunção de paternidade relativamente a este, será lavrado oficiosamente o
respectivo averbamento, se não tiver sido ordenado pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1838º
(Impugnação da
paternidade)
A paternidade presumida nos
termos do artigo 1826º não pode ser impugnada fora dos casos previstos nos
artigos seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1839º
(Fundamento e
legitimidade)
1. A paternidade do filho
pode ser impugnada pelo marido da mãe, por esta, pelo filho ou, nos termos do
artigo 1841º, pelo Ministério Público.
2. Na acção o autor deve
provar que, de acordo com as circunstâncias, a paternidade do marido da mãe é
manifestamente improvável.
3. Não é permitida a
impugnação de paternidade com fundamento em inseminação artificial ao cônjuge
que nela consentiu.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1840º
(Impugnação da
paternidade do filho concebido antes do matrimónio)
1. Independentemente da
prova a que se refere o nº 2 do artigo anterior, podem ainda a mãe ou o marido
impugnar a paternidade do filho nascido dentro dos cento e oitenta dias posteriores
à celebração do casamento, excepto:
a) Se o marido, antes de
casar, teve conhecimento da gravidez da mulher;
b) Se, estando,
pessoalmente presente ou representado por procurador com poderes especiais, o
marido consentiu que o filho fosse declarado seu no registo do nascimento;
c) Se por qualquer outra
forma o marido reconheceu o filho como seu.
2. Cessa o disposto na
alínea a) do número anterior se o casamento for anulado por falta de vontade,
ou por coação moral exercida contra o marido; cessa ainda o disposto nas
alíneas b) e c) quando se prove ter sido o consentimento ou reconhecimento
viciado por erro sobre as circunstâncias que tenham contribuído decisivamente
para o convencimento da paternidade, ou extorquido por coação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1841º
(Acção do Ministério
Público)
1. A acção de impugnação de
paternidade pode ser proposta pelo Ministério Público a requerimento de quem se
declarar pai do filho, se for reconhecida pelo tribunal a viabilidade do
pedido.
2. O requerimento deve ser
dirigido ao tribunal no prazo de sessenta dias a contar da data em que a
paternidade do marido da mãe conste no registo.
3. O tribunal procederá às
diligências necessárias para averiguar a viabilidade da acção, depois de ouvir,
sempre que possível, a mãe e o marido.
4. Se concluir pela
viabilidade da acção, o tribunal ordenará a remessa do processo ao agente do
Ministério Público junto do tribunal competente para a acção de impugnação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1842º
(Prazos)
1. A acção de impugnação de
paternidade pode ser intentada:
a) Pelo marido, no prazo de
dois anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa
concluir-se a sua não paternidade;
b) Pela mãe, dentro dos
dois anos posteriores ao nascimento;
c) Pelo filho, até um ano
depois de haver atingido a maioridade ou de ter sido emancipado, ou
posteriormente, dentro de um ano a contar da data em que teve conhecimento de
circunstâncias de que possa concluir-se não ser filho do marido da mãe.
2. Se o registo for omisso
quanto à maternidade, os prazos a que se referem as alíneas a) e c) do número
anterior contam-se a partir do estabelecimento da maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1843º
(Impugnação antecipada)
1. Se o registo for omisso
quanto à maternidade, a acção de impugnação pode ser intentada pelo marido da
pretensa mãe no prazo de seis meses a contar do dia em que soube do nascimento.
2. O decurso do prazo a que
se refere o número anterior não impede o marido de intentar acção de
impugnação, nos termos gerais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1844º
(Prossecução e
transmissão da acção)
1. Se o titular do direito
de impugnar a paternidade falecer no decurso da acção, ou sem a haver
intentado, mas antes de findar o prazo estabelecido nos artigos 1842º e 1843º,
têm legitimidade para nela prosseguir ou para a intentar:
a) No caso de morte do
presumido pai, o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens que não
seja a mãe do filho, os descendentes e ascendentes;
b) No caso de morte da mãe,
os descendentes e ascendentes;
c) No caso de morte do
filho, o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e os
descendentes.
2. O direito de impugnação
conferido às pessoas mencionadas no número anterior caduca se a acção não for
proposta no prazo de noventa dias a contar:
a) Da morte do marido ou da
mãe, ou do nascimento de filho póstumo, no caso das alíneas a) e b);
b) Da morte do filho, no
caso da alínea c).
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1845º
(Ausência)
No caso de ausência
justificada do titular do direito de impugnar a paternidade, a acção a que se
refere o artigo 1839º pode ser intentada pelas pessoas referidas no artigo
anterior, no prazo de cento e oitenta dias a contar do trânsito em julgado da
sentença.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1846º
(Legitimidade passiva)
1. Na acção de impugnação
de paternidade devem ser demandados a mãe, o filho e o presumido pai quando
nela não figurem como autores.
2. No caso da morte da mãe,
do filho ou do presumido pai, a acção deve ser intentada ou prosseguir contra
as pessoas referidas no artigo 1844º, devendo, na falta destas, ser nomeado um
curador especial; se, porém, existirem herdeiros ou legatários cujos direitos
possam ser atingidos pela procedência do pedido, a acção não produzirá efeitos
contra eles se não tiverem sido também demandados.
3. Quando o filho for menor
não emancipado, o tribunal nomear-lhe-á curador especial.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Reconhecimento de
paternidade
Divisão I
Disposições gerais
ARTIGO 1847º
(Formas de
reconhecimento)
O reconhecimento do filho
nascido ou concebido fora do matrimónio efectua-se por perfilhação ou decisão
judicial em acção de investigação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1848º
(Casos em que não é
admitido o reconhecimento)
1. Não é admitido o
reconhecimento em contrário da filiação que conste do registo de nascimento
enquanto este não for rectificado, declarado nulo ou cancelado.
2. O disposto no número
anterior não invalida a perfilhação feita por algumas das formas mencionadas
nas alíneas b), c) e d) do artigo 1853º, embora ela não produza efeitos
enquanto não puder ser registada.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
Divisão II
Perfilhação
ARTIGO 1849º
(Carácter pessoal e
livre da perfilhação)
A perfilhação é acto
pessoal e livre; pode, contudo, ser feita por intermédio de procurador com
poderes especiais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1850º
(Capacidade)
1. Têm capacidade para
perfilhar os indivíduos com mais de dezasseis anos, se não estiverem interditos
por anomalia psíquica ou não forem notoriamente dementes no momento da
perfilhação.
2. Os menores, os
interditos não compreendidos no número anterior e os inabilitados não necessitam,
para perfilhar, de autorização dos pais, tutores ou curadores.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1851º
(Maternidade não
declarada)
Não obsta à perfilhação o
facto de a maternidade do perfilhando não se encontrar declarada no registo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1852º
(Conteúdo defeso)
1. O acto de perfilhação
não comporta cláusulas que limitem ou modifiquem os efeitos que lhe são
atribuídos por lei, nem admite condição ou termo.
2. As cláusulas ou
declarações proibidas não invalidam a perfilhação, mas têm-se por não escritas.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1853º
(Forma)
A perfilhação pode
fazer-se:
a) Por declaração prestada
perante o funcionário do registo civil;
b) Por testamento;
c) Por escritura pública;
d) Por termo lavrado em
juízo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1854º
(Tempo da perfilhação)
A perfilhação pode ser
feita a todo o tempo, antes ou depois do nascimento do filho ou depois da morte
deste.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1855º
(Perfilhação de
nascituro)
A perfilhação de nascituro
só é válida se for posterior à concepção e o perfilhante identificar a mãe.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1856º
(Perfilhação de filho
falecido)
A perfilhação posterior à
morte do filho só produz efeitos em favor dos seus descendentes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1857º
(Perfilhação de maiores)
1. A perfilhação de filho
maior ou emancipado, ou de filho pré-defunto de quem vivam descendentes maiores
ou emancipados só produz efeitos se aquele ou estes, ou, tratando-se de
interditos, os respectivos representantes, derem o seu assentimento.
2. O assentimento pode ser
dado antes ou depois da perfilhação, ainda que o perfilhante tenha falecido,
por alguma das seguintes formas:
a) Por declaração prestada
perante o funcionário do registo civil, averbada no assento de nascimento, e no
de perfilhação, se existir;
b) Por documento autêntico
ou autenticado;
c) Por termo lavrado em
juízo no processo em que haja sido feita a perfilhação.
3. O registo da perfilhação
é considerado secreto até ser prestado o assentimento necessário e, sem
prejuízo do disposto no número seguinte, só pode ser invocado para instrução do
processo preliminar de publicações ou em acção de nulidade ou anulação de
casamento.
4. Qualquer interessado tem
o direito de requerer judicialmente a notificação pessoal do perfilhando, dos
seus descendentes ou dos seus representantes legais, para declararem, no prazo
de trinta dias, se dão o seu assentimento à perfilhação, considerando-se esta
aceite no caso de falta de resposta e sendo cancelado o registo no caso de
recusa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1858º
(Irrevogabilidade)
A perfilhação é irrevogável
e, quando feita em testamento, não é prejudicada pela revogação deste.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1859º
(Impugnação)
1. A perfilhação que não
corresponda à verdade é impugnável em juízo mesmo depois da morte do
perfilhado.
2. A acção pode ser
intentada a todo o tempo, pelo perfilhante, pelo perfilhado, ainda que haja
consentido na perfilhação, por qualquer outra pessoa que tenha interesse moral
ou patrimonial na sua procedência ou pelo Ministério Público.
3. A mãe ou o filho, quando
autores, só terão de provar que o perfilhante não é o pai se este demonstrar
ser verosímel que coabitou com a mãe do perfilhado no período de concepção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1860º
(Anulação por erro ou
coacção)
1. A perfilhação é anulável
judicialmente a requerimento do perfilhante quando viciada por erro ou coacção
moral.
2. Só é relevante o erro
sobre circunstâncias que tenham contribuído decisivamente para o convencimento
da paternidade.
3. A acção de anulação
caduca no prazo de um ano, a contar do momento em que o perfilhante teve
conhecimento do erro ou que cessou a coacção, salvo se ele for menor não
emancipado ou interdito por anomalia psíquica; neste caso, a acção não caduca
sem ter decorrido um ano sobre a maioridade, emancipação ou levantamento da
interdição.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1861º
(Anulação por
incapacidade)
1. A perfilhação é anulável
por incapacidade do perfilhante a requerimento deste ou de seus pais ou tutor.
2. A acção pode ser
intentada dentro de um ano, contado:
a) Da data da perfilhação,
quando intentada pelos pais ou tutor;
b) Da maioridade ou
emancipação, quando intentada pelo que perfilhou antes da idade exigida por
lei;
c) Do termo da
incapacidade, quando intentada por quem perfilhou estando interdito por
anomalia psíquica ou notoriamente demente.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1862º
(Morte do perfilhante)
Se o perfilhante falecer
sem haver intentado a acção de anulação ou no decurso dela, têm legitimidade
para a intentar no ano seguinte à sua morte, ou nela prosseguir, os
descendentes ou ascendentes do perfilhante e todos os que mostrem ter sido
prejudicados nos seus direitos sucessórios por efeito da perfilhação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1863º
(Perfilhação posterior a
investigação judicial)
A perfilhação feita depois
de intentada em juízo acção de investigação de paternidade contra pessoa
diferente do perfilhante fica sem efeito, e o respectivo registo deve ser
cancelado, se a acção for julgada procedente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
DIVISÃO III
Averiguação oficiosa da
paternidade
ARTIGO 1864º
(Paternidade
desconhecida)
Sempre que seja lavrado
registo de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, deve o
funcionário remeter ao tribunal certidão integral do registo, a fim de se
averiguar oficiosamente a identidade do pai.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1865º
(Averiguação oficiosa)
1. Sempre que possível, o
tribunal ouvirá a mãe acerca da paternidade que atribui ao filho.2. Se a mãe
indicar quem é o pai ou por outro meio chegar ao conhecimento do tribunal a
identidade do pretenso progenitor, será este também ouvido.
3. No caso de o pretenso
progenitor confirmar a paternidade, será lavrado termo de perfilhação e
remetida certidão para averbamento à repartição competente para o registo.
4. Se o presumido pai negar
ou se recusar a confirmar a paternidade, o tribunal procederá às diligências
necessárias para averiguar a viabilidade da acção de investigação de
paternidade.
5. Se o tribunal concluir pela
existência de provas seguras da paternidade, ordenará a remessa do processo ao
agente do Ministério Público junto do tribunal competente, a fim de ser
intentada a acção de investigação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1866º
(Casos em que não é
admitida a averiguação oficiosa da paternidade)
A acção a que se refere o
artigo anterior não pode ser intentada:
a) Se a mãe e o pretenso
pai forem parentes ou afins em linha recta ou parentes no segundo grau da linha
colateral;
b) Se tiverem decorrido
dois anos sobre a data do nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1867º
(Investigação com base
em processo crime)
Quando em processo crime se
considere provada a cópula em termos de constituir fundamento para a
investigação da paternidade e se mostre que a ofendida teve um filho em
condições de o período legal da concepção abranger a época do crime, deve o
Ministério Público instaurar a correspondente acção de investigação,
independentemente do prazo estabelecido na alínea b) do artigo 1866º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1868º
(Remissão)
É aplicável à acção
oficiosa de investigação de paternidade, com as necessárias adaptações, o
disposto nos artigos 1811º, 1812º e 1813º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
DIVISÃO IV
Reconhecimento judicial
ARTIGO 1869º
(Investigação da
paternidade)
A paternidade pode ser
reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho se a maternidade já se
achar estabelecida ou for pedido conjuntamente o reconhecimento de uma e outra.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1870º
(Legitimidade da mãe
menor)
A mãe menor tem
legitimidade para intentar a acção em representação do filho sem necessidade de
autorização dos pais, mas é sempre representada na causa por curador especial
nomeado pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1871º
(Presunção)
1. A paternidade
presume-se:
a) Quando o filho houver
sido reputado e tratado como tal pelo pretenso pai e reputado como filho também
pelo público;
b) Quando exista carta ou
outro escrito no qual o pretenso pai declare inequivocamente a sua paternidade;
c) Quando, durante o
período legal da concepção, tenha existido comunhão duradoura de vida em
condições análogas às dos cônjuges ou concubinato duradouro entre a mãe e o pretenso
pai;
d) Quando o pretenso pai
tenha seduzido a mãe, no período legal da concepção, se esta era virgem e menor
no momento em que foi seduzida, ou se o consentimento dela foi obtido por meio
de promessa de casamento, abuso de confiança ou abuso de autoridade.
2. A presunção considera-se
ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1872º
(Coligação de
investigantes)
Na acção de investigação de
paternidade é permitida a coligação de investigantes filhos da mesma mãe, em
relação ao mesmo pretenso progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1873º
(Remissão)
É aplicável à acção de
investigação de paternidade, com as necessárias adaptações, o disposto nos
artigos 1817º a 1819º e 1821º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO II
Efeitos da filiação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1874º
(Deveres de pais e
filhos)
1. Pais e filhos devem-se
mutuamente respeito, auxílio e assistência.
2. O dever de assistência
compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida
em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida
familiar.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1875º
(Nome do filho)
1. O filho usará apelidos
do pai e da mãe ou só de um deles.
2. A escolha do nome
próprio e dos apelidos do filho menor pertence aos pais; na falta de acordo
decidirá o juíz, de harmonia com o interesse do filho.
3. Se a maternidade ou
paternidade forem estabelecidas posteriormente ao registo do nascimento, os
apelidos do filho poderão ser alterados nos termos dos números anteriores.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1876º
(Atribuição dos apelidos
do marido da mãe)
1. Quando a paternidade se
não encontre estabelecida, poderão ser atribuídos ao filho menor apelidos do
marido da mãe se esta e o marido declararem, perante o funcionário do registo
civil, ser essa a sua vontade.
2. Nos dois anos
posteriores à maioridade ou à emancipação o filho pode requerer que sejam
eliminados do seu nome os apelidos do marido da mãe.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Poder paternal
SUBSECÇÃO I
Princípios gerais
ARTIGO 1877º
(Duração do poder
paternal)
Os filhos estão sujeitos ao
poder paternal até à maioridade ou emancipação.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1878º
(Conteúdo do poder
paternal)
1. Compete aos pais, no
interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu
sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e
administrar os seus bens.
2. Os filhos devem
obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem
ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e
reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1879º
(Despesas com o
sustento, segurança, saúde e educação dos filhos)
Os pais ficam desobrigados
de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua
segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de
suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1880º
(Despesas com os filhos
maiores ou emancipados)
Se no momento em que
atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua
formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o número
anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e
pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1881º
(Poder de representação)
1. O poder de representação
compreende o exercício de todos os direitos e o cumprimento de todas as
obrigações do filho, exceptuados os actos puramente pessoais, aqueles que o
menor tem o direito de praticar pessoal e livremente e os actos respeitantes a
bens cuja administração não pertença aos pais.
2. Se houver conflito de
interesses cuja resolução dependa de autoridade pública, entre qualquer dos
pais e o filho sujeito ao poder paternal, ou entre os filhos, ainda que, neste
caso, algum deles seja maior, são os menores representados por um ou mais
curadores especiais nomeados pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1882º
(Irrenunciabilidade)
Os pais não podem renúnciar
ao poder paternal nem a qualquer dos direitos que ele especialmente lhes
confere, sem prejuízo do que neste código se dispõe acerca da adopção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1883º
(Filho concebido fora do
matrimónio)
O pai ou a mãe não pode
introduzir no lar conjugal o filho concebido na constância do matrimónio que
não seja filho do seu cônjuge, sem consentimento deste.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1884º
(Alimentos à mãe)
1. O pai não unido pelo matrimónio
à mãe do filho é obrigado, desde a data do estabelecimento de paternidade, a
prestar-lhe alimentos relativos ao período da gravidez e ao primeiro ano de
vida do filho, sem prejuízo das indemnizações a que por lei ela tenha direito.
2. A mãe pode pedir os
alimentos na acção de investigação de paternidade e tem direito a alimentos
provisórios se a acção foi proposta antes de decorrido o prazo a que se refere
o número anterior, desde que o tribunal considere provável o reconhecimento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Poder paternal
relativamente à pessoa dos filhos
ARTIGO 1885º
(Educação)
1. Cabe aos pais, de acordo
com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento físico, intelectual e
moral dos filhos.
2. Os pais devem proporcionar
aos filhos, em especial aos diminuídos física e mentalmente, adequada instrução
geral e profissional, correspondente, na medida do possível, às aptidões e
inclinações de cada um.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1886º
(Educação religiosa)
Pertence aos pais decidir
sobre a educação religiosa dos filhos menores de dezasseis anos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1887º
(Abandono do lar)
1. Os menores não podem
abandonar a casa paterna ou aquela que os pais lhes destinaram, nem dela ser
retirados.
2. Se a abandonarem ou dela
forem retirados; qualquer dos pais e, em caso de urgência, as pessoas a quem
eles tenham confiado o filho podem reclamá-lo, recorrendo, se for necessário,
ao tribunal ou à autoridade competente.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1887º-A
(Convívio com irmãos e
ascendentes)
Os pais não podem
injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes.
(Aditado pela Lei 84/95, de
31-8)
SUBSECÇÃO III
Poder paternal
relativamente aos bens dos filhos
ARTIGO 1888º
(Exclusão da
administração)
1. Os pais não têm a
administração:
a) Dos bens do filho que
procedam de sucessão da qual os pais tenham sido excluídos por indignidade ou
deserdação;
b) Dos bens que tenham
advindo ao filho por doação ou sucessão contra a vontade dos pais;
c) Dos bens deixados ou
doados ao filho com exclusão da administração dos pais.
d) Dos bens adquiridos pelo
filho maior de dezasseis anos pelo seu trabalho.
2. A exclusão da
administração, nos termos da alínea c) do número anterior, é permitida mesmo
relativamente a bens que caibam ao filho a título de legítima.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1889º
(Actos cuja validade
depende de autorização do tribunal)
1. Como representantes do
filho não podem os pais, sem autorização do tribunal:
a) Alienar ou onerar bens,
salvo tratando-se de alienação onerosa de coisas susceptíveis de perda ou
deterioração:
b) Votar, nas assembleias
gerais das sociedades, deliberações que importem a sua dissolução;
c) Adquirir estabelecimento
comercial ou industrial ou continuar a exploração do que o filho haja recebido
por sucessão ou doação;
d) Entrar em sociedade em
nome colectivo ou em comandita simples ou por acções;
e) Contrair obrigações
cambiárias ou resultantes de qualquer título transmissível por endosso;
f) Garantir ou assumir
dívidas alheias;
g) Contrair empréstimos;
h) Contrair obrigações cujo
cumprimento se deva verificar depois da maioridade;
i) Ceder direitos de
crédito;
j) Repudiar herança ou
legado;
l) Aceitar herança, doação
ou legado com encargos, ou convencionar partilha extrajudicial;
m) Locar bens, por prazo
superior a seis anos;
n) Convencionar ou requerer
em juízo a divisão de coisa comum ou a liquidação e partilha de patrimónios
sociais;
o) Negociar transacção ou
comprometer-se em árbitros relativamente a actos referidos nas alíneas
anteriores, ou negociar concordata com os credores.
2. Não se considera
abrangida na restrição da alínea a) do número anterior a aplicação de dinheiro
ou capitais do menor na aquisição de bens.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 1890º
(Aceitação e rejeição de
liberalidades)
1. Se ao filho for deixada
herança ou legado, ou for feita proposta de doação que necessite de ser aceite,
devem os pais aceitar a liberalidade, se o puderem fazer legalmente, ou
requerer ao tribunal, no prazo de trinta dias, autorização para aceitar ou
rejeitar.
2. Se, decorrido aquele
prazo sobre a abertura da sucessão ou sobre a proposta de doação, os pais nada
tiverem providenciado, pode o filho ou qualquer dos seus parentes, o Ministério
Público, o doador ou algum interessado nos bens deixados requerer ao tribunal a
notificação dos pais para darem cumprimento ao disposto no número anterior,
dentro do prazo que lhes for assinado.
3. Se os pais nada
declararem dentro do prazo fixado, a liberalidade tem-se por aceite, salvo se o
tribunal julgar mais conveniente para o menor a rejeição.
4. No processo em que os
pais requeiram autorização judicial para aceitar a herança, quando dela
necessitem, poderão requerer autorização para convencionar a respectiva
partilha extrajudicial, bem como a nomeação de curador especial para nela
outorgar, em representação do menor, quando com ele concorram à sucessão ou a
ela concorram vários incapazes por eles representados.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 1891º
(Nomeação de curador
especial)
1. Se o menor não tiver
quem legalmente o represente, qualquer das pessoas mencionadas no nº 2 do
artigo anterior tem legitimidade para requerer ao tribunal a nomeação de um
curador especial para os efeitos do disposto no nº 1 do mesmo artigo.
2. Quando o tribunal
recusar autorização aos pais para rejeitarem a liberalidade, será também
nomeado oficiosamente um curador para o efeito da sua aceitação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 1892º
(Proibição de adquirir
bens do filho)
1. Sem autorização do
tribunal não podem os pais tomar de arrendamento ou adquirir, directamente ou
por interposta pessoa, ainda que em hasta pública, bens ou direitos do filho
sujeito ao poder paternal, nem tornar-se cessionários de créditos ou outros
direitos contra este, excepto nos casos de sub-rogação legal, de licitação em
processo de inventário ou de outorga em partilha judicialmente autorizada.
2. Entende-se que a
aquisição é feita por interposta pessoa nos casos referidos no nº 2 do artigo
579º.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 1893º
(Actos anuláveis)
1. Os actos praticados
pelos pais em contravenção do disposto nos artigos 1889º e 1892º são anuláveis
a requerimento do filho, até um ano depois de atingir a maioridade ou ser
emancipado, ou, se ele entretanto falecer, a pedido dos seus herdeiros,
excluídos os próprios pais responsáveis, no prazo de um ano a contar da morte
do filho.
2. A anulação pode ser
requerida depois de findar o prazo se o filho ou seus herdeiros mostrarem que
só tiveram conhecimento do acto impugnado nos seis meses anteriores à
proposição da acção.
3. A acção de anulação pode
também ser intentada pelas pessoas com legitimidade para requerer a inibição do
poder paternal, contanto que o façam no ano seguinte à prática dos actos
impugnados e antes de o menor atingir a maioridade ou ser emancipado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1894º
(Confirmação dos actos
pelo tribunal)
O tribunal pode confirmar
os actos praticados pelos pais sem a necessária autorização.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1895º
(Bens cuja propriedade
pertence aos pais)
1. Pertence aos pais a
propriedade dos bens que o filho menor, vivendo em sua companhia, produza por
trabalho prestado aos seus progenitores e com meios ou capitais pertencentes a
estes.
2. Os pais devem dar ao
filho parte nos bens produzidos ou por outra forma compensá-lo do seu trabalho;
o cumprimento deste dever não pode, todavia, ser judicialmente exigido.
(Redacção do Dec-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1896º
(Rendimento dos bens do
filho)
1. Os pais podem utilizar
os rendimentos dos bens do filho para satisfazerem as despesas com o sustento,
segurança, saúde e educação deste, bem como, dentro de justos limites, com
outras necessidades da vida familiar.
2. No caso de só um dos
pais exercer o poder paternal, a ele pertence a utilização dos rendimentos do
filho, nos termos do número anterior.
3. A utilização de
rendimentos de bens que caibam ao filho a título de legítima não pode ser
excluída pelo doador ou testador.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1897º
(Exercício da
administração)
Os pais devem administrar
os bens dos filhos com o mesmo cuidado com que administram os seus.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1898º
(Prestação de caução)
1. Sem prejuízo do disposto
no artigo 1920º, os pais não são obrigados a prestar caução como
administradores dos bens do filho, excepto quando a este couberem valores
móveis e o tribunal, considerando o valor dos bens, o julgue necessário, a
pedido das pessoas com legitimidade para a acção de inibição do exercício do
poder paternal.
2. Se os pais não prestarem
a caução que lhes for exigida é aplicável o disposto no artigo 1470º.
(Redacção do Dec-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1899º
(Dispensa de prestação
de contas)
Os pais não são obrigados a
prestar contas da sua administração, sem prejuízo do disposto no artigo 1920º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1900º
(Fim da administração)
1. Os pais devem entregar
ao filho, logo que este atinja a maioridade ou seja emancipado, todos os bens
que lhe pertençam; quando por outro motivo cesse o poder paternal ou a
administração, devem os bens ser entregues ao representante legal do filho.
2. Os móveis devem ser
restituídos no estado em que se encontrarem; não existindo, pagarão os pais o
respectivo valor, excepto se houverem sido consumidos em uso comum ao filho ou
tiverem perecido por causa não imputável aos progenitores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
SUBSECÇÃO IV
Exercício do poder
paternal
ARTIGO 1901º
(Poder paternal na
constância do matrimónio)
1. Na constância do
matrimónio o exercício do poder paternal pertence a ambos os pais.
2. Os pais exercem o poder
paternal de comum acordo e, se este faltar em questões de particular
importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que tentará a
conciliação; se esta não for possível, o tribunal ouvirá, antes de decidir, o
filho maior de catorze anos, salvo quando circunstâncias ponderosas o
desaconselhem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1902º
(Actos praticados por um
dos pais)
1. Se um dos pais praticar
acto que integre o exercício do poder paternal, presume-se que age de acordo
com o outro, salvo quando a lei expressamente exija o consentimento de ambos os
progenitores ou se trate de acto de particular importância; a falta de acordo
não é oponível a terceiro de boa fé.
2. O terceiro deve
recusar-se a intervir no acto praticado por um dos cônjuges quando, nos termos
do número anterior, não se presuma o acordo do outro cônjuge ou quando conheça
a oposição deste.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1903º
(Impedimento de um dos
pais)
Quando um dos pais não
puder exercer o poder paternal por ausência, incapacidade ou outro impedimento,
caberá esse exercício unicamente ao outro progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1904º
(Viuvez)
Dissolvido o casamento por
morte de um dos cônjuges, o poder paternal pertence ao sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1905º
(Divórcio, separação
judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento)
1. Nos casos de divórcio,
separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do
casamento, o destino do filho, os alimentos a este devidos e forma de os
prestar serão regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação do tribunal;
a homologação será recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor,
incluindo o interesse deste em manter com aquele progenitor a quem não seja
confiado uma relação de grande proximidade.
2. Na falta de acordo, o
Tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter
uma relação de grande proximidade com o progenitor a quem não seja confiado,
podendo a sua guarda caber a qualquer dos pais, ou, quando se verifique alguma
das circunstâncias previstas no artigo 1918º, a terceira pessoa ou
estabelecimento de reeducação ou assistência.
(Redacção da Lei 84/95, de
31-8)
ARTIGO 1906º
(Exercício do poder
paternal em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do
casamento)
1. O poder paternal é
exercido pelo progenitor a quem o filho foi confiado.
2. Os pais podem, todavia,
acordar, nos termos do nº 1 do artigo anterior, o exercício em comum do poder
paternal, decidindo as questões relativas à vida do filho em condições
idênticas às que vigoram para tal efeito na constância do matrimónio.
3. Os pais podem ainda
acordar, nos termos do nº 1 do artigo anterior, que determinados assuntos sejam
resolvidos por acordo de ambos os pais ou que a administração dos bens do filho
seja assumida pelo progenitor a quem o menor tenha sido confiado.
4. Ao progenitor que não
exerça o poder paternal assiste o poder de vigiar a educação e as condições de
vida do filho.
(Redacção da Lei 84/95, de
31-8)
ARTIGO 1907º
(Exercício do poder
paternal quando o filho é confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência)
1. Quando o filho seja
confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência,
cabem a estes os poderes e deveres dos pais que forem exigidos pelo adequado
desempenho das suas funções.
2. O tribunal decidirá a
qual dos progenitores compete o exercício do poder paternal na parte não
prejudicada pelo disposto no número anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1908º
(Sobrevivência do
progenitor a quem o filho não foi confiado)
Quando se verifique alguma
das circunstâncias previstas no artigo 1918º, pode o tribunal, ao regular o
exercício do poder paternal, decidir que, se falecer o progenitor a quem o
menor for entregue, a guarda não passe para o sobrevivo; o tribunal designará
então a pessoa a quem, provisoriamente, o menor será confiado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1909º
(Separação de facto)
As disposições dos artigos
1905º a 1908º são aplicáveis aos cônjuges separados de facto.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1910º
(Filiação estabelecida
apenas quanto a um dos progenitores)
Se a filiação de menor nascido
fora do casamento se encontrar estabelecida apenas quanto a um dos
progenitores, a este pertence o poder paternal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1911º
(Filiação estabelecida
quanto a ambos os progenitores não unidos pelo matrimónio)
1. Quando a filiação se
encontre estabelecida relativamente a ambos os pais e estes não tenham
contraído o matrimónio após o nascimento do menor, o exercício do poder
paternal pertence ao progenitor que tiver a guarda do filho.
2. Para os efeitos do número
anterior presume-se que a mãe tem a guarda do filho; esta presunção só é
ilidível judicialmente.
3. Se os progenitores
conviverem maritalmente, o exercício do poder paternal pertence a ambos quando
declarem, perante o funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade; é
aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos
1901º a 1904º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1912º
(Regulação do exercício
do poder paternal)
É aplicável ao caso
previsto no artigo anterior, com as necessárias adaptações, o disposto nos
artigos 1904º a 1907º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO V
Inibição e limitações ao
exercício do poder paternal
ARTIGO 1913º
(Inibição de pleno
direito)
1. Consideram-se de pleno
direito inibidos do exercício do poder paternal:
a) Os condenados
definitivamente por crime a que a lei atribua esse efeito;
b) Os interditos e os
inabilitados por anomalia psíquica;
c) Os ausentes, desde a
nomeação do curador provisório.
2. Consideram-se de pleno
direito inibidos de representar o filho e administrar os seus bens os menores
não emancipados e os interditos e inabilitados não referidos na alínea b) do
número anterior
3. As decisões judiciais
que importem inibição do exercício do poder paternal são comunicadas, logo que
transitem em julgado, ao tribunal competente, a fim de serem tomadas as
providências que no caso couberem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1914º
(Cessação da inibição)
A inibição de pleno direito
do exercício do poder paternal cessa pelo levantamento da interdição ou
inabilitação e pelo termo da curadoria.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1915º
(Inibição do exercício
do poder paternal)
1. A requerimento do
Ministério Público, de qualquer parente do menor ou de pessoa a cuja guarda ele
esteja confiado, de facto ou de direito, pode o tribunal decretar a inibição do
exercício do poder paternal quando qualquer dos pais infrinja culposamente os
deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes, ou quando, por inexperiência,
enfermidade, ausência ou outras razões, não se mostre em condições de cumprir
aqueles deveres.
2. A inibição pode ser
total ou limitar-se à representação e administração dos bens dos filhos; pode
abranger ambos os progenitores ou apenas um deles e referir-se a todos os
filhos ou apenas a algum ou alguns.
3. Salvo decisão em
contrário, os efeitos da inibição que abranja todos os filhos estendem-se aos
que nascerem depois de decretada.
(Redacção do Dec.-Lei nº
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1916º
(Levantamento da
inibição)
1. A inibição do exercício
do poder paternal decretada pelo tribunal será levantada quando cessem as
causas que lhe deram origem.
2. O levantamento pode ser
pedido pelo Ministério Público, a todo o tempo, ou por qualquer dos pais,
passado um ano sobre o trânsito em julgado da sentença de inibição ou da que
houver desatendido outro pedido de levantamento.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1917º
(Alimentos)
A inibição do exercício do
poder paternal em nenhum caso isenta os pais do dever de alimentarem o filho.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1918º
(Perigo para a
segurança, saúde, formação moral e educação do filho)
Quando a segurança, a
saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontrem em perigo e não
seja caso de inibição do exercício do poder paternal, pode o tribunal, a
requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas indicadas no nº 1
do artigo 1915º, decretar as providências adequadas, designadamente confiá-lo a
terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1919º
(Exercício do poder
paternal enquanto se mantiver a providência)
1. Quando tiver sido
decretada alguma das providências referidas no artigo anterior, os pais conservam
o exercício do poder paternal em tudo o que com ela se não mostre
inconciliável.
2. Se o menor tiver sido
confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência,
será estabelecido um regime de visitas aos pais, a menos que, excepcionalmente,
o interesse do filho o desaconselhe.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º
(Protecção dos bens do
filho)
1. Quando a má
administração ponha em perigo o património do filho e não seja caso de inibição
do exercício do poder paternal, pode o tribunal, a requerimento do Ministério
Público ou de qualquer parente, decretar as providências que julgue adequadas.
2. Atendendo em especial ao
valor dos bens, pode nomeadamente o tribunal exigir a prestação de contas e de
informações sobre a administração e estado do património do filho e, quando
estas providências não sejam suficientes, a prestação de caução.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º-A
(Revogação ou alteração
de decisões)
As decisões que decretem
providências ao abrigo do disposto nos artigos 1918º a 1920º podem ser
revogadas ou alteradas a todo o tempo pelo tribunal que as proferiu, a
requerimento do Ministério Público ou de qualquer dos pais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO VI
Registo das decisões
relativas ao poder paternal
ARTIGO 1920º-B
(Obrigatoriedade do
registo)
Serão oficiosamente
comunicadas à repartição do registo civil competente a fim de serem registadas:
a) As decisões que regulem
o exercício do poder paternal ou homologuem acordo sobre esse exercício;
b) As decisões que
homologuem a reconciliação de cônjuges judicialmente separados de pessoas e
bens;
c) As decisões que façam
cessar a regulação do poder paternal em caso de reconciliação de cônjuges
separados de facto;
d) As decisões que importem
a inibição do exercício do poder paternal, o suspendam provisoriamente ou
estabeleçam providências limitativas desse poder.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º-C
(Consequência da falta
do registo)
As decisões judiciais a que
se refere o artigo anterior não podem ser invocadas contra terceiro de boa fé
enquanto se não mostre efectuado o registo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Meios de suprir o poder
paternal
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1921º
(Menores sujeitos a
tutela)
1. O menor está
obrigatoriamente sujeito a tutela:
a) Se os pais houverem
falecido;
b) Se estiverem inibidos do
poder paternal quanto à regência da pessoa do filho;
c) Se estiverem há mais de
seis meses impedidos de facto de exercer o poder paternal;
d) Se forem incógnitos.
2. Havendo impedimento de
facto dos pais, deve o Ministério Público tomar as providências necessárias à
defesa do menor, independentemente do decurso do prazo referido na alínea c) de
número anterior, podendo para o efeito promover a nomeação de pessoa que, em
nome do menor, celebre os negócios jurídicos que sejam urgentes ou de que
resulte manifesto proveito para este.
ARTIGO 1922º
(Administração de bens)
Será instituido o regime de
administração de bens do menor previsto nos artigos 1967º e seguintes:
a) Quando os pais tenham
sido apenas excluídos, inibidos ou suspensos da administração de todos os bens
do incapaz ou de alguns deles, se por outro título se não encontrar designado o
administrador;
b) Quando a entidade competente
para designar o tutor confie a outrem, no todo ou em parte, a administração dos
bens do menor.
ARTIGO 1923º
(Carácter oficioso da
tutela e da administração)
1. Sempre que o menor se
encontre numa das situações previstas nos artigos anteriores, deve o tribunal
de menores promover oficiosamente a instauração da tutela ou da administração
de bens.
2. Qualquer autoridade
administrativa ou judicial, bem como os funcionários do registo civil, que no
exercício do cargo tenham conhecimento de tais situações devem comunicar o
facto ao tribunal competente.
ARTIGO 1924º
(Órgãos da tutela e da
administração)
1. A tutela é exercida por
um tutor e pelo conselho de família.
2. A administração de bens
é exercida por um ou mais administradores e, se estiver instaurada a tutela,
pelo conselho de família.
ARTIGO 1925º
(Atribuições do tribunal
de menores)
1. Tanto a tutela como a
administração de bens são exercidas sob a vigilância do tribunal de menores.
2. Ao tribunal de menores,
além de outras atribuições fixadas na lei, compete ainda, conforme os casos,
confirmar ou designar os tutores, administradores de bens e vogais do conselho
de família.
ARTIGO 1926º
(Obrigatoriedade das
funções tutelares)
Os cargos de tutor,
administrador de bens e vogal do conselho de família são obrigatórios, não
podendo ninguém ser deles escusado senão nos casos expressos na lei.
SUBSECÇÃO II
Tutela
DIVISÃO I
Designação do tutor
ARTIGO 1927º
(Pessoas a quem compete
a tutela)
O cargo de tutor recairá
sobre a pessoa designada pelos pais ou pelo tribunal de menores.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1928º
(Tutor designado pelos
pais)
1. Os pais podem nomear
tutor ao filho menor para o caso de virem a falecer ou se tornarem incapazes;
se apenas um dos progenitores exercer o poder paternal, a ele pertencerá esse
poder.
2. Quando, falecido um dos
progenitores que houver nomeado tutor ao filho menor, lhe sobreviver o outro, a
designação considera-se eficaz se não for revogada por este no exercício do
poder paternal.
3. A designação do tutor e
respectiva revogação só têm validade sendo feitas em testamento ou em documento
autêntico ou autenticado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1929º
(Designação de vários
tutores)
Quando, nos termos do
artigo anterior, tiver sido designado mais de um tutor para o mesmo filho,
recairá a tutela em cada um dos designados segundo a ordem da designação,
quando a precedência entre eles não for de outro modo especificada.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1930º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 1931º
(Tutor designado pelo
tribunal)
1. Quando os pais não
tenham designado tutor ou este não haja sido confirmado, compete ao tribunal de
menores, ouvido o conselho de família, nomear o tutor de entre os parentes ou
afins do menor ou de entre as pessoas que de facto tenham cuidado ou estejam a
cuidar do menor ou tenham por ele demonstrado afeição.
2. Antes de proceder à
nomeação de tutor, deve o tribunal ouvir o menor que tenha completado catorze
anos.
(Redacção do Dec-Lei nº
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1932º
(Tutela de vários
irmãos)
A tutela respeitante a dois
irmãos caberá, sempre que possível, a um só tutor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1933º
(Quem não pode ser
tutor)
1. Não podem ser tutores:
a) Os menores não emancipados,
os interditos e os inabilitados;
b) Os notoriamente
dementes, ainda que não estejam interditos ou inabilitados;
c) As pessoas de mau
procedimento ou que não tenham modo de vida conhecido;
d) Os que tiverem sido
inibidos ou se encontrarem total ou parcialmente suspensos do poder paternal;
e) Os que tiverem sido
removidos ou se encontrarem suspensos de outra tutela ou do cargo de vogal de
conselho de família por falta de cumprimento das respectivas obrigações;
f) Os divorciados e os
separados judicialmente de pessoas e bens por sua culpa;
g) Os que tenham demanda
pendente com o menor ou com seus pais, ou a tenham tido há menos de cinco anos;
h) Aquele cujos pais,
filhos ou cônjuges tenham, ou hajam tido há menos de cinco anos, demanda com o
menor ou seus pais;
i) Os que sejam inimigos
pessoais do menor ou dos seus pais;
j) Os que tenham sido
excluídos pelo pai ou mãe do menor, nos mesmos termos em que qualquer deles
pode designar tutor;
l) Os magistrados judiciais
ou de Ministério Público que exerçam funções na comarca do domicílio do menor
ou na da situação dos seus bens.
2. Os inabilitados por
prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os inibidos ou suspensos
do poder paternal ou removidos da tutela, quanto à administração de bens, podem
ser nomeados tutores, desde que sejam apenas encarregados da guarda e regência
da pessoa do menor.
ARTIGO 1934º
(Escusa da tutela)
1. Podem escusar-se da
tutela:
a) O Presidente da
República e os membros do governo;
b) Os bispos e sacerdotes
que tenham cura de almas, bem como os religiosos que vivam em comunidade;
c) Os militares em serviço
activo;
d) Os que residam fora da
comarca onde o menor tem a maior parte dos bens, salvo se a tutela compreender
apenas a regência da pessoa do menor, ou os bens deste forem de reduzido valor;
e) Os que tiverem mais de
três descendentes a seu cargo;
f) Os que exerçam outra
tutela ou curatela;
g) Os que tenham mais de
sessenta e cinco anos;
h) Os que não sejam
parentes ou afins em linha recta do menor, ou seus colaterais até ao quarto
grau;
i) Os que, em virtude de
doença, ocupações profissionais absorventes ou carência de meios económicos,
não possam exercer a tutela sem grave incómodo ou prejuízo.
2. O que for escusado da
tutela pode ser compelido a aceitá-la, desde que cesse o motivo da escusa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
DIVISÃO II
Direitos e obrigações do
tutor
ARTIGO 1935º
(Princípios gerais)
1. O tutor tem os mesmos
direitos e obrigações dos pais, com as modificações e restrições constantes dos
artigos seguintes.
2. O tutor deve exercer a
tutela com a diligência de um bom pai de família.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1936º
(Rendimentos dos bens do
pupilo)
O tutor só pode utilizar os
rendimentos dos bens do pupilo no sustento e educação deste e na administração
dos seus bens.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1937º
(Actos proibidos ao
tutor)
É vedado ao tutor:
a) Dispor a título gratuito
dos bens do menor;
b) Tomar de arrendamento ou
adquirir, directamente ou por interposta pessoa, ainda que seja em hasta
pública, bens ou direitos do menor, ou tornar-se cessionário de créditos ou
outros direitos contra ele, excepto nos casos de sub-rogação legal, de
licitação em processo de inventário ou de outorga em partilha judicialmente
autorizada;
c) Celebrar em nome do
pupilo contratos que o obriguem pessoalmente a praticar certos actos, excepto
quando as obrigações contraídas sejam necessárias à sua educação,
estabelecimento ou ocupação;
d) Receber do pupilo,
directamente ou por interposta pessoa, quaisquer liberalidades, por acto entre
vivos ou por morte, se tiverem sido feitas depois da sua designação e antes da
aprovação das respectivas contas, sem prejuízo do disposto para as deixas
testamentárias no nº 3 do artigo 2192º.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 1938º
(Actos dependentes da
autorização do tribunal)
1. O tutor, como
representante do pupilo, necessita de autorização do tribunal:
a) Para praticar qualquer
dos actos mencionados no nº 1 do artigo 1889º;
b) Para adquirir bens,
móveis ou imóveis, como aplicação de capitais do menor;
c) Para aceitar herança,
doação ou legado, ou convencionar partilha extrajudicial;
d) Para contrair ou solver
obrigações, salvo quando respeitem a alimentos do menor ou se mostrem
necessárias à administração do seu património;
e) Para intentar acções,
salvas as destinadas à cobrança de prestações periódicas e aquelas cuja demora
possa causar prejuízo;
f) Para continuar a
exploração de estabelecimento comercial ou industrial que o menor haja recebido
por sucessão ou doação.
2. O tribunal não concederá
a autorização que lhe seja pedida sem previamente ouvir o conselho de família.
3. O disposto no nº 1 não
prejudica o que é especialmente determinado em relação aos actos praticados em
processo de inventário.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 1939º
(Nulidade dos actos
praticados pelo tutor)
1. São nulos os actos
praticados pelo tutor em contravenção do disposto no artigo 1937º; a nulidade
não pode, porém, ser invocada pelo tutor ou seus herdeiros nem pela interposta
pessoa de quem ele se tenha servido.
2. A nulidade é sanável
mediante confirmação do pupilo, depois de maior ou emancipado, mas somente
enquanto não for declarada por sentença com trânsito em julgado.
ARTIGO 1940º
(Outras sanções)
1. Os actos practicados
pelo tutor em contravenção do disposto nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo
1938º podem ser anulados oficiosamente pelo tribunal durante a menoridade do
pupilo, ou a requerimento de qualquer vogal do conselho de família ou do
próprio pupilo, até cinco anos após a sua maioridade ou emancipação.
2. Os herdeiros do pupilo
podem também requerer a anulação, desde que o façam antes de decorrido igual
período sobre o falecimento .
3. Se o tutor intentar
alguma acção em contravenção do disposto na alínea e) do nº 1 do artigo 1938º,
deve o tribunal ordenar oficiosamente a suspensão da instância, depois da
citação, até que seja concedida a autorização necessária.
4. Se o tutor continuar a
explorar, sem autorização, o estabelecimento comercial ou industrial do pupilo,
é pessoalmente responsável por todos os danos, ainda que acidentais,
resultantes da exploração.
ARTIGO 1941º
(Confirmação dos actos
pelo tribunal)
O tribunal de menores,
ouvido o conselho de família, pode confirmar os actos praticados pelo tutor sem
a necessária autorização.
ARTIGO 1942º
(Remuneração do tutor)
1. O tutor tem direito a
ser remunerado.
2. Se a remuneração não
tiver sido fixada pelos pais do menor no acto de designação do tutor, será
arbitrada pelo tribunal de menores, ouvido o conselho de família, não podendo,
em qualquer caso, exceder a décima parte dos rendimentos líquidos dos bens do
menor.
ARTIGO 1943º
(Relação dos bens do
menor)
1. O tutor é obrigado a
apresentar uma relação do activo e do passivo do pupilo dentro do prazo que lhe
for fixado pelo tribunal de menores.
2. Se o tutor for credor do
menor, mas não tiver relacionado o respectivo crédito, não lhe é licíto exigir
o cumprimento durante a tutela, salvo provando que à data da apresentação da
relação ignorava a existência da dívida.
ARTIGO 1944º
(Obrigação de prestar
contas)
1. O tutor é obrigado a
prestar contas ao tribunal de menores quando cessar a sua gerência ou, durante
ela, sempre que o tribunal o exigir.
2. Sendo as contas
prestadas no termo da gerência, o tribunal ouvirá o ex-pupilo ou os seus
herdeiros, se tiver terminado a tutela; no caso contrário, será ouvido o novo
tutor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1945º
(Responsabilidade do
tutor)
1. O tutor é responsável
pelo prejuízo que por dolo ou culpa causar ao pupilo.
2. Quando à vista das
contas o tutor ficar alcançado, a importância do alcance vence os juros legais
desde a aprovação daquelas, se os não vencer por outra causa desde data
anterior.
ARTIGO 1946º
(Direito do tutor a ser
indemnizado)
1. Serão abonadas ao tutor
as despesas que legalmente haja feito, ainda que delas, sem culpa sua, nenhum
proveito tenha provindo ao menor.
2. O saldo a favor do tutor
é satisfeito pelos primeiros rendimentos do menor; ocorrendo, porém, despesas
urgentes, de forma que o tutor se não possa inteirar, vence juros o saldo, se
não se prover de outro modo ao pronto pagamento da dívida.
ARTIGO 1947º
(Contestação das contas
aprovadas)
A aprovação das contas não
impede que elas sejam judicialmente impugnadas pelo pupilo nos dois anos
subsequentes à maioridade ou emancipação, ou pelos seus herdeiros dentro do
mesmo prazo, a contar do falecimento do pupilo, se este falecer antes de
decorrido o prazo que lhe seria concedido se fosse vivo.
DIVISÃO III
Remoção e exoneração do
tutor
ARTIGO 1948º
(Remoção do tutor)
Pode ser removido da
tutela:
a) O tutor que falte ao
cumprimento dos deveres próprios do cargo ou revele inaptidão para o seu
exercício;
b) O tutor que por facto
superveniente à investidura no cargo se constitua nalguma das situações que
impediriam a sua nomeação.
ARTIGO 1949º
(Acção de remoção)
A remoção do tutor é
decretada pelo tribunal de menores, ouvido o conselho de família, a
requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor, ou da pessoa a
cuja guarda este esteja confiado de facto ou de direito.
ARTIGO 1950º
(Exoneração do tutor)
O tutor pode, a seu pedido,
ser exonerado do cargo pelo tribunal de menores:
a) Se sobrevier alguma das
causas de escusa;
b) Ao fim de três anos, nos
casos em que o tutor se podia ter escusado a aceitar o cargo, se subsistir a
causa da escusa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
DIVISÃO IV
Conselho de família
ARTIGO 1951º
(Constituição)
O conselho de família é
constituído por dois vogais, escolhidos nos termos do artigo seguinte, e pelo
agente do Ministério Público, que preside.
ARTIGO 1952º
(Escolha dos vogais)
1. Os vogais do conselho de
família são escolhidos entre os parentes ou afins do menor, tomando em conta,
nomeadamente, a proximidade do grau, as relações de amizade, as aptidões, a
idade, o lugar de residência e o interesse manifestado pela pessoa do menor.
2. Na falta de parentes ou
afins que possam ser designados nos termos do número anterior, cabe ao tribunal
escolher os vogais de entre os amigos dos pais, vizinhos ou outras pessoas que
possam interessar-se pelo menor.
3. Sempre que possível, um
dos vogais do conselho de família pertencerá ou representará a linha paterna e
o outro a linha materna do menor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1953º
(Incapacidade. Escusa)
1. É aplicável aos vogais
do conselho de família o disposto nos artigos 1933º e 1934º.
2. É ainda fundamento de
escusa o facto de o vogal designado residir fora do território continental ou
da ilha adjacente em que o menor tiver residência habitual.
ARTIGO 1954º
(Atribuições)
Pertence ao conselho de
família vigiar o modo por que são desempenhadas as funções do tutor e exercer
as demais atribuições que a lei especialmente lhe confere.
ARTIGO 1955º
(Protutor)
1. A fiscalização da acção
do tutor é exercida com carácter permanente por um dos vogais do conselho de
família, denominado protutor.
2. O protutor deve, sempre
que possível, representar a linha de parentesco diversa da do tutor.
3. Se o tutor for irmão
germano do menor ou cônjuge de irmão germano, ou se ambos os vogais do conselho
de família pertencerem à mesma linha de parentesco ou não pertencerem a nenhuma
delas, cabe ao tribunal a escolha do protutor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1956º
(Outras funções do
protutor)
Além de fiscalizar a acção
do tutor, compete ao protutor:
a) Cooperar com o tutor no
exercício das funções tutelares, podendo encarregar-se da administração de
certos bens do menor nas condições estabelecidas pelo conselho de família e com
o acordo do tutor;
b) Substituir o tutor nas
suas faltas e impedimentos, passando, nesse caso, a servir de protutor o outro
vogal do conselho de família;
c) Representar o menor em
juízo ou fora dele, quando os seus interesses estejam em oposição com os do
tutor e o tribunal não haja nomeado curador especial.
ARTIGO 1957º
(Convocação do conselho)
1. O conselho de família é
convocado por determinação do tribunal ou do Ministério Público, ou a
requerimento de um dos vogais, do tutor, do administrador de bens, de qualquer
parente do menor, ou do próprio menor, quando tiver mais de dezasseis anos.
2. A convocação indicará o
objecto principal da reunião e será enviada a cada um dos vogais com oito dias
de antecedência.
3. Faltando algum dos
vogais, o conselho será convocado para outro dia; se de novo faltar algum dos
vogais, as deliberações serão tomadas pelo Ministério Público, ouvido o outro
vogal, quando esteja presente.
4. A falta injustificada às
reuniões do conselho de família torna o faltoso responsável pelos danos que o
menor venha a sofrer.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1958º
(Funcionamento)
1. Os vogais do conselho de
família são obrigados a comparecer pessoalmente.
2. O conselho de família
pode deliberar que às suas reuniões ou a alguma delas assista o tutor, o
administrador de bens, qualquer parente do menor, o próprio menor, ou ainda
pessoa estranha à família cujo parecer seja útil; mas, em qualquer caso, só os
vogais do conselho têm voto.
3. De igual faculdade goza
o Ministério Público.
ARTIGO 1959º
(Gratuidade das funções)
O exercício do cargo de
vogal do conselho de família é gratuito.
ARTIGO 1960º
(Remoção e exoneração)
São aplicáveis aos vogais
do conselho de família, com as necessárias adaptações, as disposições relativas
à remoção e exoneração do tutor.
DIVISÃO V
Termo da tutela
ARTIGO 1961º
(Quando termina)
A tutela termina:
a) Pela maioridade, salvo o
disposto no artigo 131º;
b) Pela emancipação, salvo
o disposto no artigo 1649º;
c) Pela adopção;
d) Pelo termo da inibição
do poder paternal;
e) Pela cessação do
impedimento dos pais;
f) Pelo estabelecimento da
maternidade ou paternidade.
(Redacção do Dec-Lei
496/77, de 25-11)
DIVISÃO VI
Tutela de menores
confiados a estabelecimentos de educação ou assistência
ARTIGO 1962º
(Exercício da tutela)
1. Quando não exista pessoa
em condições de exercer a tutela, o menor é confiado à assistência pública, nos
termos da respectiva legislação, exercendo as funções de tutor o director do
estabelecimento público ou particular, onde tenha sido internado.
2. Neste caso, não existe
conselho de família nem é nomeado protutor.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGOS 1963º A 1966º
(Revogados pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO III
Administração de bens
ARTIGO 1967º
(Designação do
administrador)
Quando haja lugar à
instituição da administração de bens do menor nos termos do artigo 1922º, são
aplicáveis à designação do administrador as disposições relativas à nomeação do
tutor, salvo o preceituado nos artigos seguintes.
ARTIGO 1968º
(Designação por terceiro)
Ao autor de doação ou deixa
em benefício de menor é lícita a designação de administrador, mas só com
relação aos bens compreendidos na liberalidade.
ARTIGO 1969º
(Pluralidade de
administradores)
1. Tendo os pais ou
terceiro designado vários administradores e tendo sido determinados os bens
cuja administração compete a cada um deles, não é aplicável o critério da
preferência pela ordem da designação.
2. O tribunal de menores
pode também designar vários administradores, determinando os bens que a cada um
compete administrar.
ARTIGO 1970º
(Quem não pode ser
administrador)
Além das pessoas que a lei
impede de serem tutores, não podem ser administradores:
a) Os inabilitados por
prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os inibidos ou suspensos
do poder paternal ou removidos da tutela quanto à administração de bens;
b) Os condenados como
autores ou cúmplices dos crimes de furto, roubo, burla, abuso de confiança,
falência ou insolvência fraudulenta e, em geral, de crimes dolosos contra a
propriedade.
ARTIGO 1971º
(Direitos e deveres do
administrador)
1. No âmbito da sua
administração, o administrador tem os direitos e deveres do tutor.
2. O administrador é o
representante legal do menor nos actos relativos aos bens cuja administração
lhe pertença.
3. O administrador deve
abonar aos pais ou tutor, por força dos rendimentos dos bens, as importâncias
necessárias aos alimentos do menor.
4. As divergências entre o
administrador e os pais ou tutor são decididas pelo tribunal de menores, ouvido
o conselho de família, se o houver.
ARTIGO 1972º
(Remoção e exoneração.
Termo da administração)
São aplicáveis ao
administrador, com as necessárias adaptações, as disposições relativas à
remoção e exoneração do tutor e ao termo da tutela.
TÍTULO IV
DA ADOPÇÃO
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1973º
(Constituição)
1. O vínculo da adopção
constitui-se por sentença judicial.
2. O processo será
instruído com um inquérito, que deverá incidir, nomeadamente, sobre a
personalidade e a saúde do adoptante e do adoptando, a idoneidade do adoptante
para criar e educar o adoptando, a situação familiar e económica do adoptante e
as razões determinantes do pedido de adopção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25 de Novembro)
ARTIGO 1974º
(Requisitos gerais)
1. A adopção apenas será
decretada quando apresente reais vantagens para o adoptando, se funde em
motivos legítimos, não envolva sacrifício injusto para os outros filhos do
adoptante e seja razoável supor que entre o adoptante e o adoptando se
estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação.
2. O adoptando deverá ter
estado ao cuidado do adoptante durante prazo suficiente para se poder avaliar
da conveniência da constituição do vínculo.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1975º
(Proibição de várias
adopções do mesmo adoptado)
Enquanto subsistir uma
adopção não pode constituir-se outra quanto ao mesmo adoptado, excepto se os
adoptantes forem casados um com o outro.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1976º
(Adopção pelo tutor ou
administrador legal de bens)
O tutor ou administrador
legal de bens só pode adoptar o menor depois de aprovadas as contas da tutela
ou administração de bens e saldada a sua responsabilidade.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1977º
(Espécies de adopção)
1. A adopção é plena ou
restrita, consoante a extensão dos seus efeitos.
2. A adopção restrita pode
a todo o tempo, a requerimento dos adoptantes, ser convertida em adopção plena,
desde que se verifiquem os requisitos para esta exigidos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1978º
(Confiança com vista a
futura adopção)
1. Com vista a futura
adopção, o tribunal pode confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a
instituição em qualquer das situações seguintes:
a) Se o menor for filho de
pais incógnitos ou falecidos;
b) Se tiver havido
consentimento prévio para a adopção;
c) Se os pais tiverem
abandonado o menor;
d) Se os pais, por acção ou
omissão, puserem em perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação
do menor em termos que, pela sua gravidade, comprometam seriamente os vínculos
afectivos próprios da filiação;
e) Se os pais do menor
acolhido por um particular ou por uma instituição tiverem revelado manifesto
desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente os vínculos
afectivos próprios da filiação, durante, pelo menos, os seis meses que
precederam o pedido de confiança.
2. A confiança com
fundamento nas situações previstas nas alíneas c), d) e e) do número anterior
não pode ser decidida se o menor se encontrar a viver com ascendente, colateral
até ao 3º grau ou tutor e a seu cargo, salvo se aqueles familiares ou o tutor
puserem em perigo, de forma grave, a segurança, a saúde, a formação moral ou a
educação do menor ou se o tribunal concluir que a situação não é adequada a
assegurar suficientemente o interesse do menor.
3. Têm legitimidade para
requerer a confiança judicial do menor o Ministério Público, o organismo de
segurança social da área da residência do menor, a pessoa a quem o menor tenha
sido administrativamente confiado e o director do estabelecimento público ou a
direcção da instituição particular que o tenha acolhido.
(Redacção do Dec-Lei
185/93, de 22-5)
CAPÍTULO II
Adopção plena
ARTIGO 1979º
(Quem pode adoptar
plenamente)
1. Podem adoptar plenamente
duas pessoas casadas há mais de quatro anos e não separadas judicialmente de
pessoas e bens ou de facto, se ambas tiverem mais de 25 anos.
2. Pode ainda adoptar
plenamente quem tiver mais de 30 anos ou, se o adoptando for filho do cônjuge
do adoptante, mais de 25.
3. Só pode adoptar plenamente
quem não tiver mais de 50 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado,
salvo se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1980º
(Quem pode ser adoptado
plenamente)
1. Podem ser adoptados plenamente
os menores filhos do cônjuge do adoptante e aqueles que tenham sido confiados,
judicial ou administrativamente, ao adoptante.
2. O adoptando deve ter
menos de 15 anos à data da petição judicial de adopção; poderá, no entanto, ser
adoptado quem, a essa data, tenha menos de 18 anos e não se encontre
emancipado, quando, desde idade não superior a 15 anos, tenha sido confiado aos
adoptantes ou a um deles ou quando for filho do cônjuge do adoptante.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1981º
(Consentimento para a
adopção)
1. É necessário para a
adopção o consentimento:
a) Do adoptando maior de
catorze anos;
b) Do cônjuge do adoptante
não separado judicialmente de pessoas e bens;
c) Dos pais do adoptando,
ainda que menores e mesmo que não exerçam o poder paternal, desde que não tenha
havido confiança judicial.
2. No caso previsto no nº 2
do artigo 1978º não é exigido o consentimento dos pais, mas é necessário o do
parente aí referido ou do tutor, salvo se tiver sido decidida a confiança
judicial do menor.
3. O tribunal pode
dispensar o consentimento das pessoas que o deveriam prestar nos termos dos
números anteriores, se estiverem privadas do uso das faculdades mentais ou se
por qualquer outra razão houver grave dificuldade em as ouvir.
4. O tribunal poderá ainda
dispensar o consentimento das pessoas referidas na alínea c) do nº 1 e no nº 2
quando se verificar alguma das situações que, nos termos das alíneas c), d) e
e) do nº 1 e do nº 2 do artigo 1978º, permitiriam a confiança judicial.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1982º
(Forma e tempo do
consentimento)
1. O consentimento
reportar-se-á inequivocamente à adopção plena e será prestado perante o juíz,
que deve esclarecer o declarante sobre o significado e os efeitos do acto.
2. O consentimento dos pais
pode ser prestado independentemente da instauração do processo de adopção se o
adoptando tiver sido acolhido por alguém que pretenda adoptá-lo ou em
estabelecimento público ou particular, não sendo necessária a identificação do
futuro adoptante.
3. A mãe não pode dar o seu
consentimento antes de decorridas seis semanas após o parto.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1983º
(Revogação e caducidade
do consentimento)
1. O consentimento prestado
nos termos do nº 2 do artigo anterior poderá ser revogado no prazo de dois
meses; decorrido este prazo só é revogável enquanto o menor não se encontrar
acolhido por alguém que pretenda adoptá-lo.
2. A revogação será feita
por termo no processo ou por documento autêntico ou autenticado junto ao mesmo.
3. O consentimento caduca
se, no prazo de três anos, o menor não tiver sido adoptado nem confiado
judicial ou administrativamente com vista a futura adopção.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1984º
(Audição obrigatória)
O juíz deverá ouvir:
a) Os filhos do adoptante
maiores de 14 anos;
b) Os ascendentes ou, na
sua falta, os irmãos maiores do progenitor falecido, se o adoptando for filho
do cônjuge do adoptante e o seu consentimento não for necessário, salvo se
estiverem privados das faculdades mentais ou se, por qualquer outra razão,
houver grave dificuldade em os ouvir.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1985º
(Segredo da identidade)
1. A identidade do
adoptante não pode ser revelada aos pais naturais do adoptado, salvo se aquele
declarar expressamente que não se opõe a essa revelação.
2. Os pais naturais do
adoptado podem opor-se, mediante declaração expressa, a que a sua identidade
seja revelada ao adoptante.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1986º
(Efeitos)
1. Pela adopção plena o
adoptado adquire a situação de filho do adoptante e integra-se com os seus
descendentes na família deste, extinguindo-se as relações familiares entre o
adoptado e os seus ascendentes e colaterais naturais, sem prejuízo do disposto
quanto a impedimentos matrimoniais nos artigos 1602º a 1604º.
2. Se um dos cônjuges
adopta o filho do outro mantêm-se as relações entre o adoptado e o cônjuge do
adoptante e os respectivos parentes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1987º
(Estabelecimento e prova
da filiação natural)
Depois de decretada a
adopção plena não é possível estabelecer a filiação natural do adoptado nem
fazer a prova dessa filiação fora do processo preliminar de publicações.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1988º
(Nome próprio e apelidos
do adoptado)
1. O adoptado perde os seus
apelidos de origem, sendo o seu novo nome constituído, com as necessárias
adaptações, nos termos do artigo 1875º.
2. A pedido do adoptante,
pode o tribunal, excepcionalmente, modificar o nome próprio do menor, se a
modificação salvaguardar o seu interesse, nomeadamente o direito à identidade
pessoal, e favorecer a integração na família.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1989º
(Irrevogabilidade da
adopção plena)
A adopção plena não é
revogável nem sequer por acordo do adoptante e do adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1990º
(Revisão da sentença)
1. A sentença que tiver
decretado a adopção só é susceptível de revisão:
a) Se tiver faltado o
consentimento do adoptante ou dos pais do adoptado, quando necessário e não
dispensado;
b) Se o consentimento dos
pais do adoptado tiver sido indevidamente dispensado, por não se verificarem as
condições do nº 3 do artigo 1981º;
c) Se o consentimento do
adoptante tiver sido viciado por erro desculpável e essencial sobre a pessoa do
adoptado;
d) Se o consentimento do
adoptante ou dos pais do adoptado tiver sido determinado por coacção moral,
contanto que seja grave o mal com que eles foram ilicitamente ameaçados e
justificado o receio da sua consumação;
e) Se tiver faltado o
consentimento do adoptado, quando necessário.
2. O erro só se considera
essencial quando for de presumir que o conhecimento da realidade excluiria
razoavelmente a vontade de adoptar.
3. A revisão não será,
contudo, concedida quando os interesses do adoptado possam ser
consideravelmente afectados, salvo se razões invocadas pelo adoptante
imperiosamente o exigirem.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1991º
(Legitimidade e prazo
para a revisão)
1. A revisão nos termos do
nº 1 do artigo anterior pode ser pedida:
a) No caso das alíneas a) e
b), pelas pessoas cujo consentimento faltou, no prazo de seis meses a contar da
data em que tiveram conhecimento da adopção;
b) No caso das alíneas c) e
d), pelas pessoas cujo consentimento foi viciado, dentro dos seis meses
subsequentes à cessação do vício;
c) No caso da alínea e),
pelo adoptado, até seis meses a contar da data em que ele atingiu a maioridade
ou foi emancipado.
2. No caso das alíneas a) e
b) do número anterior, o pedido de revisão não poderá ser deduzido decorridos
três anos sobre a data do trânsito em julgado da sentença que tiver decretado a
adopção.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO III
Adopção restrita
ARTIGO 1992º
(Quem pode adoptar
restritamente)
1. Pode adoptar
restritamente quem tiver mais de 25 anos.
2. Só pode adoptar
restritamente quem não tiver mais de 50 anos à data em que o menor lhe tenha
sido confiado, salvo se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante.
(Redacção do Dec.-Lei
185/93, de 22-5)
ARTIGO 1993º
(Disposições aplicáveis)
1. É aplicável à adopção
restrita, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1980º a 1984º,
1990º e 1991º.
2. Se o consentimento dos
pais do adoptando tiver sido prestado nos termos do nº 2 do artigo 1982º e dele
não resultar inequivocamente qual o tipo de adopção para que foi concedido,
entender-se-á que o foi para a adopção restrita.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1994º
(O adoptado e a família
natural)
O adoptado conserva todos
os direitos e deveres em relação à família natural, salvas as restrições
estabelecidas na lei.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1995º
(Apelidos do adoptado)
O juíz poderá atribuir ao
adoptado, a requerimento do adoptante, apelidos deste, compondo um novo nome em
que figurem um ou mais apelidos da família natural.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1996º
(Direitos sucessórios e
prestação de alimentos)
O adoptado, ou seus
descendentes, e os parentes do adoptante não são herdeiros legítimos ou
legitimários uns dos outros, nem ficam reciprocamente vinculados à prestação de
alimentos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1997º
(Poder paternal)
Cabe exclusivamente ao
adoptante, ou ao adoptante e ao seu cônjuge, se este for pai ou mãe do
adoptado, o exercício do poder paternal, com todos os direitos e obrigações dos
pais, salvo o disposto no artigo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1998º
(Rendimentos dos bens do
adoptado)
O adoptante só poderá
despender dos rendimentos dos bens do adoptado a quantia que o tribunal fixar
para alimentos deste.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 1999º
(Direitos sucessórios)
1. O adoptado não é
herdeiro legitimário do adoptante, nem este daquele.
2. O adoptado e, por
direito de representação, os seus descendentes são chamados à sucessão como
herdeiros legítimos do adoptante, na falta de cônjuge, descendentes ou
ascendentes.
3. O adoptante é chamado à
sucessão como herdeiro legítimo do adoptado ou de seus descendentes, na falta
de cônjuge, descendentes, ascendentes, irmãos e sobrinhos do falecido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2000º
(Alimentos)
1. O adoptado ou os seus
descendentes são obrigados a prestar alimentos ao adoptante, na falta de
cônjuge, descendentes ou ascendentes em condições de satisfazer esse encargo.
2. O adoptante considera-se
ascendente em primeiro grau do adoptado para efeitos da obrigação de lhe
prestar alimentos, precedendo os pais naturais na ordem estabelecida no nº 1 do
artigo 2009º; o adoptante não precede, no entanto, o progenitor do adoptado com
quem seja casado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2001º
(Reconhecimento
superveniente)
Os efeitos da adopção não
são prejudicados pelo facto de vir a ser estabelecida a filiação natural do
adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º
(Relação dos bens do
adoptado)
1. Nos trinta dias
subsequentes à notificação da sentença que decretar a adopção, o adoptante deve
apresentar no tribunal, se este o julgar necessário, relação dos bens do
adoptado.
2. Sempre que o adoptado,
sendo menor ou incapaz, adquira novos bens ou haja sub-rogação dos existentes,
pode o tribunal exigir que seja apresentada relação complementar.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-A
(Prestação de contas
pelo adoptante)
O adoptante deve prestar
contas da sua administração sempre que o tribunal lho exija a requerimento do
Ministério Público, dos pais naturais ou do próprio adoptado, até dois anos
depois de atingir a maioridade ou ter sido emancipado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-B
(Revogação)
A adopção é revogável a
requerimento do adoptante ou do adoptado, quando se verifique alguma das
ocorrências que justificam a deserdação dos herdeiros legitimários.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-C
(Revogação a
requerimento de outras pessoas)
Sendo o adoptado menor, a
revogação da adopção pode ser decretada a pedido dos pais naturais, do
Ministério Público ou da pessoa a cujo cuidado estava o adoptado antes da
adopção, quando se verifique alguma das seguintes circunstâncias:
a) Deixar o adoptante de
cumprir os deveres inerentes ao poder paternal.
b) Tornar-se a adopção, por
qualquer causa, inconveniente para a educação ou os interesses do adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-D
(Efeitos da revogação)
1. Os efeitos da adopção
cessam com o trânsito em julgado da sentença que a revogue.
2. Se, no caso de a
revogação ser pedida pelo adoptante ou pelo adoptado, a sentença transitar em
julgado depois da morte do requerente, o adoptado e seus ascendentes, ou o
adoptante, conforme os casos, haver-se-ão por excluídos da sucessão legítima ou
testamentária, de quem requereu a revogação, e devolverão aos herdeiros os bens
recebidos e os sub-rogados no lugar destes, sem prejuízo das disposições
testamentárias do requerente posteriores ao pedido de revogação.
3. A doação feita ao
adoptado ou a seus descendentes pelo adoptante, ou a este pelo adoptado, caduca
no caso de a revogação ter sido pedida, respectivamente, pelo adoptante ou pelo
adoptado, excepto se o doador, depois de pedida a revogação, confirmar a
liberalidade por documento autêntico ou autenticado.
(Redacção do Dec.-Lei nº
496/77, de 25-11)
TÍTULO V
DOS ALIMENTOS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2003º
(Noção)
1. Por alimentos entende-se
tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.
2. Os alimentos compreendem
também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor.
ARTIGO 2004º
(Medida dos alimentos)
1. Os alimentos serão
proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade
daquele que houver de recebê-los.
2. Na fixação dos alimentos
atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.
ARTIGO 2005º
(Modo de os prestar)
1. Os alimentos devem ser
fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição
legal em contrário, ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de
excepção.
2. Se, porém, aquele que
for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode prestar como pensão, mas
tão-somente em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados.
ARTIGO 2006º
(Desde quando são
devidos)
Os alimentos são devidos
desde a proposição da acção ou, estando já fixados pelo tribunal ou por acordo,
desde o momento em que o devedor se constituíu em mora, sem prejuízo no
disposto no artigo 2273º.
ARTIGO 2007º
(Alimentos provisórios)
1. Enquanto se não fixarem
definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a requerimento do alimentando,
ou oficiosamente se este for menor, conceder alimentos provisórios, que serão
taxados segundo o seu prudente arbítrio.
2. Não há lugar, em caso
algum, à restituição dos alimentos provisórios recebidos.
ARTIGO 2008º
(Indisponibilidade e
impenhorabilidade)
1. O direito a alimentos
não pode ser renunciado ou cedido, bem que estes possam deixar de ser pedidos e
possam renunciar-se as prestações vencidas.
2. O crédito de alimentos
não é penhorável, e o obrigado não pode livrar-se por meio de compensação,
ainda que se trate de prestações já vencidas.
ARTIGO 2009º
(Pessoas obrigadas a
alimentos)
1. Estão vinculados à
prestação de alimentos, pela ordem indicada:
a) O cônjuge ou o
ex-cônjuge;
b) Os descendentes;
c) Os ascendentes;
d) Os irmãos;
e) Os tios, durante a
menoridade do alimentando;
f) O padrasto e a madrasta,
relativamente a enteados menores que estejam, ou estivessem no momento da morte
do cônjuge, a cargo deste.
2 . Entre as pessoas
designadas nas alíneas b) e c) do número anterior, a obrigação defere-se
segundo a ordem da sucessão legítima.
3. Se algum dos vinculados
não puder prestar os alimentos ou não puder saldar integralmente a sua
responsabilidade, o encargo recai sobre os onerados subsequentes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2010º
(Pluralidade de
vinculados)
1. Sendo várias as pessoas
vinculadas à prestação de alimentos, respondem todas na proporção das suas
quotas como herdeiros legítimos do alimentando.
2. Se alguma das pessoas
assim oneradas não puder satisfazer a parte que lhe cabe, o encargo recai sobre
as restantes.
ARTIGO 2011º
(Doações)
1. Se o alimentando tiver
disposto de bens por doação, as pessoas designadas nos artigos anteriores não
são obrigadas à prestação de alimentos, na medida em que os bens doados pudessem
assegurar ao doador meios de subsistência.
2. Neste caso, a obrigação
alimentar recai, no todo ou em parte, sobre o donatário ou donatários, segundo
a proporção do valor dos bens doados; esta obrigação transmite-se aos herdeiros
do donatário.
ARTIGO 2012º
(Alteração dos alimentos
fixados)
Se, depois de fixados os
alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as circunstâncias
determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados ser
reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas serem
obrigadas a prestá-los.
ARTIGO 2013º
(Cessação da obrigação
alimentar)
1. A obrigação de prestar
alimentos cessa:
a) Pela morte do obrigado
ou alimentado;
b) Quando aquele que os
presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os recebe deixe de
precisar deles;
c) Quando o credor viole
gravemente os seus deveres para com o obrigado.
2. A morte do obrigado ou a
impossibilidade de este continuar a prestar alimentos não priva o alimentado de
exercer o seu direito em relação a outros, igual ou sucessivamente onerados.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2014º
(Outras obrigações
alimentares)
1. À obrigação alimentar
que tenha por fonte um negócio jurídico são aplicáveis, com as necessárias
correcções, as disposições deste capítulo, desde que não estejam em oposição
com a vontade manifestada ou com disposições especiais da lei.
2. As disposições deste
capítulo são ainda aplicáveis a todos os outros casos de obrigação alimentar
imposta por lei, na medida em que possam ajustar-se aos respectivos preceitos.
CAPÍTULO II
Disposições especiais
ARTIGO 2015º
(Obrigação alimentar
relativamente a cônjuges)
Na vigência da sociedade
conjugal, os cônjuges são reciprocamente obrigados à prestação de alimentos,
nos termos do artigo 1675º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2016º
(Divórcio e separação
judicial de pessoas e bens)
1. Têm direito a alimentos,
em caso de divórcio:
a) O cônjuge não
considerado culpado ou, quando haja culpa de ambos, não considerado principal
culpado na sentença de divórcio, se este tiver sido decretado com fundamento no
artigo 1779º ou nas alíneas a) ou b) do artigo 1781º;
b) O cônjuge réu, se o
divórcio tiver sido decretado com fundamento na alínea c) do artigo 1781º;
c) Qualquer dos cônjuges se
o divórcio tiver sido decretado por mútuo consentimento ou se, tratando-se de
divórcio litigioso, ambos forem considerados igualmente culpados.
2. Excepcionalmente, pode o
tribunal, por motivos de equidade, conceder alimentos ao cônjuge que a eles não
teria direito, nos termos do número anterior, considerando, em particular, a
duração do casamento e a colaboração prestada por esse cônjuge à economia do
casal.
3. Na fixação do montante
dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a idade e estado de saúde dos
cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o
tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus
rendimentos e proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam
sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do
que os presta.
4. O disposto nos números
anteriores é aplicável ao caso de ter sido decretada a separação judicial de
pessoas e bens.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2017º
(Casamento declarado
nulo ou anulado)
Tendo sido declarado nulo
ou anulado o casamento, o cônjuge de boa fé conserva o direito a alimentos após
o trânsito em julgado ou o averbamento da decisão respectiva.
ARTIGO 2018º
(Apanágio do cônjuge
sobrevivo)
1. Falecendo um dos
cônjuges, o viúvo tem direito a ser alimentado pelos rendimentos dos bens
deixados pelo falecido.
2. São obrigados, neste
caso, à prestação dos alimentos os herdeiros ou legatários a quem tenham sido
transmitidos os bens, segundo a proporção do respectivo valor.
3. O apanágio deve ser
registado, quando onere coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo.
ARTIGO 2019º
(Cessação da obrigação
alimentar)
Em todos os casos referidos
nos artigos anteriores, cessa o direito a alimentos se o alimentado contrair
novo casamento, ou se tornar indigno do benefício pelo seu comportamento moral.
ARTIGO 2020º
(União de facto)
1. Aquele que, no momento
da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens,
vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, tem
direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos
termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º.
2. O direito a que se
refere o número precedente caduca se não for exercido nos dois anos subsequentes
à data da morte do autor da sucessão.
3. É aplicável ao caso
previsto neste artigo, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo
anterior.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2021º A 2023º
(Revogados pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
LIVRO V
DIREITO DAS SUCESSÕES
TÍTULO I
DAS SUCESSÕES EM GERAL
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2024º
(Noção)
Diz-se sucessão o
chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas
patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a
esta pertenciam.
ARTIGO 2025º
(Objecto da sucessão)
1. Não constituem objecto
de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por morte do
respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei.
2. Podem também
extinguir-se à morte do titular, por vontade deste, os direitos renunciáveis.
ARTIGO 2026º
(Títulos de vocação
sucessória)
A sucessão é deferida por
lei, testamento ou contrato.
ARTIGO 2027º
(Espécies de sucessão
legal)
A sucessão legal é legítima
ou legitimária, conforme possa ou não ser afastada pela vontade do seu autor.
ARTIGO 2028º
(Sucessão contratual)
1. Há sucessão contratual
quando, por contrato, alguém renúncia à sucessão de pessoa viva, ou dispõe da
sua própria sucessão ou da sucessão de terceiro ainda não aberta.
2. Os contratos sucessórios
apenas são admitidos nos casos previstos na lei, sendo nulos todos os demais,
sem prejuízo no disposto no nº 2 do artigo 946º.
ARTIGO 2029º
(Partilha em vida)
1. Não é havido por
sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem
reserva de usufruto, de todos os seus bens ou parte deles a algum ou alguns dos
presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os
donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que
proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.
2. Se sobrevier ou se
tornar conhecido outro presumido herdeiro legitimário, pode este exigir que lhe
seja composta em dinheiro a parte correspondente.
3. As tornas em dinheiro,
quando não sejam logo efectuados os pagamentos, estão sujeitas a actualização
nos termos gerais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2030º
(Espécie de sucessores)
1. Os sucessores são
herdeiros ou legatários.
2. Diz-se herdeiro o que
sucede na totalidade ou numa quota do património do falecido e legatário o que
sucede em bens ou valores determinados.
3. É havido como herdeiro o
que sucede no remanescente dos bens do falecido, não havendo especificação
destes.
4. O usufrutuário, ainda
que o seu direito incida sobre a totalidade do património, é havido como
legatário.
5. A qualificação dada pelo
testador aos seus sucessores não lhes confere o título de herdeiro ou legatário
em contravenção do disposto nos números anteriores.
CAPÍTULO II
Abertura da sucessão e
chamamento dos herdeiros e legatários
SECÇÃO I
Abertura da sucessão
ARTIGO 2031º
(Momento e lugar)
A sucessão abre-se no
momento da morte do seu autor e no lugar do último domicílio dele.
ARTIGO 2032º
(Chamamento de herdeiros
e legatários)
1. Aberta a sucessão, serão
chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de
prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária
capacidade.
2. Se os primeiros
sucessíveis não quiserem ou não puderem aceitar, serão chamados os
subsequentes, e assim sucessivamente; a devolução a favor dos últimos
retrotrai-se ao momento da abertura da sucessão.
SECÇÃO II
Capacidade sucessória
ARTIGO 2033º
(Princípios gerais)
1. Têm capacidade
sucessória, além do Estado, todas as pessoas nascidas ou concebidas ao tempo da
abertura da sucessão, não exceptuadas por lei.
2. Na sucessão
testamentária ou contratual têm ainda capacidade:
a) Os nascituros não
concebidos, que sejam filhos de pessoa determinada, viva ao tempo da abertura
da sucessão;
b) As pessoas colectivas e
as sociedades.
ARTIGO 2034º
(Incapacidade por
indignidade)
Carecem de capacidade
sucessória, por motivo de indignidade:
a) O condenado como autor
ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o autor da
sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adoptante ou
adoptado;
b) O condenado por denúncia
caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas, relativamente a crime a
que corresponda pena de prisão superior a dois anos, qualquer que seja a sua
natureza;
c) O que por meio de dolo
ou coacção induziu o autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o
testamento, ou disso o impediu;
d) O que dolosamente
subtraíu, ocultou, inutilizou, falsificou ou suprimiu o testamento, antes ou
depois da morte do autor da sucessão, ou se aproveitou de algum desses factos.
ARTIGO 2035º
(Momento da condenação e
do crime)
1. A condenação a que se
referem as alíneas a) e b) do artigo anterior pode ser posterior à abertura da
sucessão, mas só o crime anterior releva para o efeito.
2. Estando dependente de
condição suspensiva a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário, é
relevante o crime cometido até à verificação da condição.
ARTIGO 2036º
(Declaração de
indignidade)
A acção destinada a obter a
declaração de indignidade pode ser intentada dentro do prazo de dois anos a
contar da abertura da sucessão, ou dentro de um ano a contar, quer da
condenação pelos crimes que a determinam, quer do conhecimento das causas de
indignidade previstas nas alíneas c) e d) do artigo 2034º.
ARTIGO 2037º
(Efeitos da indignidade)
1. Declarada a indignidade,
a devolução da sucessão ao indigno é havida como inexistente, sendo ele
considerado, para todos os efeitos, possuidor de má fé dos respectivos bens.
2. Na sucessão legal, a
capacidade do indigno não prejudica o direito de representação dos seus
descendentes.
ARTIGO 2038º
(Reabilitação do
indigno)
1. O que tiver incorrido em
indignidade, mesmo que esta já tenha sido judicialmente declarada, readquire a
capacidade sucessória, se o autor da sucessão expressamente o reabilitar em
testamento ou escritura pública.
2. Não havendo reabilitação
expressa, mas sendo o indigno contemplado em testamento quando o testador já
conhecia a causa da indignidade, pode ele suceder dentro dos limites da disposição
testamentária
SECÇÃO III
Direito de representação
ARTIGO 2039º
(Noção)
Dá-se a representação
sucessória, quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a
ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado.
ARTIGO 2040º
(Âmbito da
representação)
A representação tanto se dá
na sucessão legal como na testamentária, mas com as restrições constantes dos
artigos seguintes.
ARTIGO 2041º
(Representação na
sucessão testamentária)
1. Gozam do direito de
representação na sucessão testamentária os descendentes do que faleceu antes do
testador ou do que repudiou a herança ou o legado, se não houver outra causa de
caducidade da vocação sucessória.
2. A representação não se
verifica:
a) Se tiver sido designado
substituto ao herdeiro ou legatário;
b) Em relação ao
fideicomissário, nos termos do nº 2 do artigo 2293º;
c) No legado de usufruto ou
de outro direito pessoal.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2042º
(Representação na
sucessão legal)
Na sucessão legal, a
representação tem sempre lugar, na linha recta, em benefício dos descendentes
de filho do autor da sucessão e, na linha colateral, em benefício dos
descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o
grau de parentesco.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2043º
(Representação nos casos
de repúdio e incapacidade)
Os descendentes representam
o seu ascendente, mesmo que tenham repudiado a sucessão destes ou sejam
incapazes em relação a ele.
ARTIGO 2044º
(Partilha)
1. Havendo representação,
cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo.
2. Do mesmo modo se
procederá para o efeito da subdivisão, quando a estirpe compreenda vários
ramos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2045º
(Extensão da
representação)
A representação tem lugar,
ainda que todos os membros das várias estirpes estejam, relativamente ao autor
da sucessão, no mesmo grau de parentesco, ou exista uma só estirpe.
CAPÍTULO III
Herança jacente
ARTIGO 2046º
(Noção)
Diz-se jacente a herança
aberta, mas ainda não aceita nem declarada vaga para o Estado.
ARTIGO 2047º
(Administração)
1. O sucessível chamado à
herança, se ainda não tiver aceitado nem repudiado, não está inibido de
providenciar acerca da administração dos bens, se do retardamento das
providências puderem resultar prejuízos.
2. Sendo vários os
herdeiros, é lícito a qualquer deles praticar os actos urgentes de
administração; mas, se houver oposição de algum, prevalece a vontade do maior
número.
3. O disposto neste artigo
não prejudica a possibilidade de nomeação de curador à herança.
ARTIGO 2048º
(Curador da herança
jacente)
1. Quando se torne
necessário, para evitar a perda ou deterioração dos bens, por não haver quem
legalmente os administre, o tribunal nomeará curador à herança jacente, a
requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado.
2. À curadoria da herança é
aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto sobre a curadoria
provisória dos bens do ausente.
3. A curadoria termina logo
que cessem as razões que a determinaram.
ARTIGO 2049º
(Notificação dos
herdeiros)
1. Se o sucessível chamado
à herança, sendo conhecido, a não aceitar nem a repudiar dentro dos quinze dias
seguintes, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer
interessado, mandá-lo notificar para, no prazo que lhe for fixado, declarar se
a aceita ou repudia.
2. Na falta de declaração
de aceitação, ou não sendo apresentado documento legal de repúdio dentro do
prazo fixado, a herança tem-se por aceite
3. Se o notificado repudiar
a herança, serão notificados, sem prejuízo do disposto no artigo 2067º, os
herdeiros imediatos, e assim sucessivamente até não haver quem prefira a
sucessão do Estado.
CAPÍTULO IV
Aceitação da herança
ARTIGO 2050º
(Efeitos)
1. O domínio e posse dos
bens da herança adquirem-se pela aceitação, independentemente da sua apreensão
material.
2. Os efeitos da aceitação
retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão.
ARTIGO 2051º
(Pluralidade de
sucessíveis)
Sendo vários os
sucessíveis, pode a herança ser aceita por algum ou alguns deles e repudiada
pelos restantes.
ARTIGO 2052º
(Espécies de aceitação)
1. A herança pode ser
aceita pura e simplesmente ou a benefício de inventário.
2. Têm-se como não escritas
as cláusulas testamentárias que, directa ou indirectamente, imponham uma ou
outra espécie de aceitação.
ARTIGO 2053º
(Aceitação a benefício
de inventário)
A aceitação a benefício de
inventário faz-se requerendo inventário judicial, nos termos da lei de
processo, ou intervindo em inventário pendente.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 2054º
(Aceitação sob condição,
a termo ou parcial)
1. A herança não pode ser
aceita sob condição nem a termo.
2. A herança também não
pode ser aceita só em parte, salvo o disposto no artigo seguinte.
ARTIGO 2055º
(Devolução testamentária
e legal)
1. Se alguém é chamado à
herança, simultânea ou sucessivamente, por testamento e por lei, e a aceita ou
repudia por um dos títulos, entende-se que a aceita ou repudia igualmente pelo
outro; mas pode aceitá-la ou repudiá-la pelo primeiro, não obstante a ter
repudiado ou aceitado pelo segundo, se ao tempo ignorava a existência do
testamento.
2. O sucessível legitimário
que também é chamado à herança por testamento pode repudiá-la quanto à quota
disponível e aceitá-la quanto à legítima.
ARTIGO 2056º
(Formas de aceitação)
1. A aceitação pode ser
expressa ou tácita.
2. A aceitação é havida
como expressa quando nalgum documento escrito o sucessível chamado à herança
declara aceitá-la ou assume o título de herdeiro com a intenção de a adquirir.
3. Os actos de
administração praticados pelo sucessível não implicam aceitação tácita da
herança.
ARTIGO 2057º
(Caso de aceitação
tácita)
1. Não importa aceitação a
alienação da herança, quando feita gratuitamente em benefício de todos aqueles
a quem ela caberia se o alienante a repudiasse.
2. Entende-se, porém, que
aceita a herança e a aliena aquele que declara renunciar a ela, se o faz a
favor apenas de algum ou alguns dos sucessíveis que seriam chamados na sua
falta.
ARTIGO 2058º
(Transmissão)
1. Se o sucessível chamado
à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado, transmite-se aos seus
herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.
2. A transmissão só se
verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o que os não impede de
repudiar, querendo, a herança a que este fora chamado.
ARTIGO 2059º
(Caducidade)
1. O direito de aceitar a
herança caduca ao fim de dez anos, contados desde que o sucessível tem
conhecimento de haver sido a ela chamado.
2. No caso de instituição
sob condição suspensiva, o prazo conta-se a partir do conhecimento da
verificação da condição; no caso de substituição fideicomissária, a partir do
conhecimento da morte do fiduciário ou da extinção da pessoa colectiva.
ARTIGO 2060º
(Anulação por dolo ou
coacção)
A aceitação da herança é
anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.
ARTIGO 2061º
(Irrevogabilidade)
A aceitação é irrevogável.
CAPÍTULO V
Repúdio da herança
ARTIGO 2062º
(Efeitos do repúdio)
Os efeitos do repúdio da
herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como
não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação.
ARTIGO 2063º
(Forma)
O repúdio está sujeito à
forma exigida para a alienação da herança.
ARTIGO 2064º
(Repúdio sob condição, a
termo ou parcial)
1. A herança não pode ser
repudiada sob condição nem a termo.
2. A herança também não
pode ser repudiada só em parte salvo o disposto no artigo 2055º.
ARTIGO 2065º
(Anulação por dolo ou
coacção)
O repúdio da herança é
anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.
ARTIGO 2066º
(Irrevogabilidade)
O repúdio é irrevogável.
ARTIGO 2067º
(Sub-rogação dos
credores)
1. Os credores do
repudiante podem aceitar a herança em nome dele, nos termos dos artigos 606º e
seguintes.
2. A aceitação deve
efectuar-se no prazo de seis meses, a contar do conhecimento do repúdio.
3. Pagos os credores do
repudiante, o remanescente da herança não aproveita a este, mas aos herdeiros
imediatos.
CAPÍTULO VI
Encargos da herança
ARTIGO 2068º
(Responsabilidade da
herança)
A herança responde pelas
despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos encargos com a
testamentaria, administração e liquidação do património hereditário, pelo
pagamento das dívidas do falecido e pelo cumprimento dos legados.
ARTIGO 2069º
(Âmbito da herança)
Fazem parte da herança:
a) Os bens sub-rogados no
lugar de bens da herança por meio de troca directa;
b) O preço dos alienados;
c) Os bens adquiridos com
dinheiro ou valores da herança, desde que a proveniência do dinheiro ou valores
seja devidamente mencionada no documento de aquisição;
d) Os frutos percebidos até
à partilha.
ARTIGO 2070º
(Preferências)
1. Os credores da herança e
os legatários gozam de preferência sobre os credores pessoais do herdeiro, e os
primeiros sobre os segundos.
2. Os encargos da herança
são satisfeitos segundo a ordem por que vêm indicados no artigo 2068º.
3. As preferências
mantêm-se nos cinco anos subsequentes à abertura da sucessão ou à constituição
da dívida, se esta é posterior, ainda que a herança tenha sido partilhada; e
prevalecem mesmo quando algum credor preterido tenha adquirido garantia real
sobre os bens hereditários.
ARTIGO 2071º
(Responsabilidade do
herdeiro)
1. Sendo a herança aceita a
benefício de inventário, só respondem pelos encargos respectivos os bens
inventariados, salvo se os credores ou legatários provarem a existência de
outros bens.
2. Sendo a herança aceita
pura e simplesmente, a responsabilidade pelos encargos também não excede o
valor dos bens herdados, mas incumbe, neste caso, ao herdeiro provar que na
herança não existem valores suficientes para cumprimento dos encargos.
ARTIGO 2072º
(Responsabilidade do
usufrutuário)
1. O usufrutuário da
totalidade ou de uma quota do património do falecido pode adiantar as somas
necessárias, conforme os bens que usufruir, para cumprimento dos encargos da
herança, ficando com o direito de exigir dos herdeiros, findo o usufruto, a
restituição sem juros das quantias que despendeu.
2. Se o usufrutuário não
fizer o adiantamento das somas necessárias, podem os herdeiros exigir que dos
bens usufruídos se vendam os necessários para cumprimento dos encargos, ou
pagá-los com dinheiro seu, ficando neste último caso, com o direito de haver do
usufrutuário os juros correspondentes.
ARTIGO 2073º
(Legado de alimentos ou
pensão vitalícia)
1. O usufrutuário da
totalidade do património do falecido é obrigado a cumprir por inteiro o legado
de alimentos ou pensão vitalícia.
2. Incidindo o usufruto
sobre uma quota-parte do património, o usufrutuário só em proporção dessa quota
é obrigado a contribuir para o cumprimento do legado de alimentos ou pensão
vitalícia.
3. O usufrutuário de coisas
determinadas não é obrigado a contribuir para os sobreditos alimentos ou
pensão, se o encargo lhe não tiver sido imposto expressamente.
ARTIGO 2074º
(Direitos e obrigações
do herdeiro em relação à herança)
1. O herdeiro conserva, em
relação à herança, até à sua integral liquidação e partilha, todos os direitos
e obrigações que tinha para com o falecido, à excepção dos que se extinguem por
efeito da morte deste.
2. São imputadas na quota
do herdeiro as quantias em dinheiro de que ele é devedor à herança.
3. Se houver necessidade de
fazer valer em juízo os direitos e obrigações do herdeiro, e este for o cabeça-de-casal,
será nomeado à herança, para esse fim, um curador especial.
CAPÍTULO VII
Petição da herança
ARTIGO 2075º
(Acção de petição)
1. O herdeiro pode pedir
judicialmente o reconhecimento da sua qualidade sucessória, e a consequente
restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, contra quem os
possua como herdeiro, ou por outro título, ou mesmo sem título.
2. A acção pode ser
intentada a todo o tempo, sem prejuízo da aplicação das regras da usucapião
relativamente a cada uma das coisas possuídas, e do disposto no artigo 2059º.
ARTIGO 2076º
(Alienação a favor de
terceiro)
1. Se o possuidor de bens
da herança tiver disposto deles, no todo ou em parte, a favor de terceiro, a
acção de petição pode ser também proposta contra o adquirente, sem prejuízo da
responsabilidade do disponente pelo valor dos bens alienados.
2. A acção não procede,
porém, contra terceiro que haja adquirido do herdeiro aparente, por título
oneroso e de boa fé, bens determinados ou quaisquer direitos sobre eles; neste
caso, estando também de boa fé, o alienante é apenas responsável segundo as
regras do enriquecimento sem causa.
3. Diz-se herdeiro aparente
aquele que é reputado herdeiro por força de erro comum ou geral.
ARTIGO 2077º
(Cumprimento de legados)
1. Se o testamento for declarado
nulo ou anulado depois do cumprimento de legados feito em boa fé, fica o
suposto herdeiro quite para com o verdadeiro herdeiro entregando-lhe o
remanescente da herança, sem prejuízo do direito deste último contra o
legatário.
2. A precedente disposição
é extensiva aos legados com encargos.
ARTIGO 2078º
(Exercício da acção por
um só herdeiro)
1. Sendo vários os
herdeiros, qualquer deles tem legitimidade para pedir separadamente a
totalidade dos bens em poder do demandado, sem que este possa opor-lhe que tais
bens lhe não pertencem por inteiro.
2. O disposto no número
anterior não prejudica o direito que assiste ao cabeça-de-casal de pedir a
entrega dos bens que deva administrar, nos termos do capítulo seguinte.
CAPÍTULO VIII
Administração da herança
ARTIGO 2079º
(Cabeça-de-casal)
A administração da herança,
até à sua liquidação e partilha, pertence ao cabeça-de-casal.
ARTIGO 2080º
(A quem incumbe o cargo)
1. O cargo de
cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge sobrevivo,
não separado judicialmente de pessoas e bens, se for herdeiro ou tiver meação
nos bens do casal;
b) Ao testamenteiro, salvo
declaração do testador em contrário;
c) Aos parentes que sejam
herdeiros legais;
d) Aos herdeiros
testamentários.
2. De entre os parentes que
sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em grau.
3. De entre os herdeiros
legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os herdeiros testamentários,
preferem os que viviam com o falecido há pelo menos um ano à data da morte.
4. Em igualdade de circunstâncias,
prefere o herdeiro mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2081º
(Herança distribuída em
legados)
Tendo sido distribuído em
legados todo o património hereditário, servirá de cabeça-de-casal, em
substituição dos herdeiros, o legatário mais beneficiado; em igualdade de
circunstâncias, preferirá o mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2082º
(Incapacidade da pessoa
designada)
1. Se o cônjuge, o herdeiro
ou legatário que tiver preferência for incapaz, exercerá as funções de
cabeça-de-casal o seu representante legal.
2. O curador é tido como
representante do inabilitado para o efeito do número anterior.
ARTIGO 2083º
(Designação pelo
tribunal)
Se todas as pessoas
referidas nos artigos anteriores se escusarem ou forem removidas, é o
cabeça-de-casal designado pelo tribunal, oficiosamente, a requerimento de
qualquer
interessado, ou a pedido do
Ministério Público nos inventários em que tenha intervenção principal.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 2084º
(Designação por acordo)
As regras dos artigos
precedentes não são imperativas; por acordo de todos os interessados, e do
Ministério Público, nos casos em que tenha intervenção principal, podem
entregar-se a administração da herança e o exercício das demais funções de
cabeça-de-casal a qualquer outra pessoa.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 2085º
(Escusa)
1. O cabeça-de-casal pode a
todo o tempo escusar-se do cargo:
a) Se tiver mais de setenta
anos de idade;
b) Se estiver
impossibilitado, por doença, de exercer convenientemente as funções;
c) Se residir fora da
comarca cujo tribunal é competente para o inventário;
d) Se o exercício das
funções de cabeça-de-casal for incompatível com o desempenho de cargo público
que exerça.
2. O disposto neste artigo
não prejudica a liberdade de aceitação da testamentaria e consequente exercício
das funções de cabeça-de-casal.
ARTIGO 2086º
(Remoção do
cabeça-de-casal)
1. O cabeça-de-casal pode
ser removido, sem prejuízo das demais sanções que no caso couberem:
a) se dolosamente ocultou a
existência de bens pertencentes à herança ou de doações feitas pelo falecido,
ou se, também dolosamente, denunciou doações ou encargos inexistentes;
b) Se não administrar o
património hereditário com prudência e zelo;
c) Se não cumpriu no
inventário os deveres que a lei de processo lhe impuser;
d) Se revelar incompetência
para o exercício do cargo.
2. Tem legitimidade para
pedir a remoção qualquer interessado, ou o Ministério Público, quando tenha
intervenção principal.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 2087º
(Bens sujeitos à
administração do cabeça-de-casal)
1. O cabeça-de-casal
administra os bens próprios do falecido e, tendo este sido casado em regime de
comunhão, os bens comuns do casal.
2. Os bens doados em vida
pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser
administrados pelo donatário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2088º
(Entrega de bens)
1. O cabeça-de-casal pode
pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar e que
estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções possessórias a fim de
ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído.
2. O exercício das acções
possessórias cabe igualmente aos herdeiros ou a terceiro contra o
cabeça-de-casal.
ARTIGO 2089º
(Cobrança de dívidas)
O cabeça-de-casal pode
cobrar as dívidas activas da herança, quando a cobrança possa perigar com a
demora ou o pagamento seja feito espontaneamente.
ARTIGO 2090º
(Venda de bens e
satisfação de encargos)
1. O cabeça-de-casal deve
vender os frutos ou outros bens deterioráveis, podendo aplicar o produto na
satisfação das despesas do funeral e sufrágios, bem como no cumprimento dos
encargos da administração.
2. Para satisfazer as
despesas do funeral e sufrágios, bem como os encargos da administração, pode o
cabeça-de-casal vender os frutos não deterioráveis, na medida do que for
necessário.
ARTIGO 2091º
(Exercício de outros
direitos)
1. Fora dos casos
declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 2078º,
os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos
os herdeiros ou contra todos os herdeiros.
2. O disposto no número
anterior não prejudica os direitos que tenham sido atribuídos pelo testador ao
testamenteiro nos termos dos artigos 2327º e 2328º, sendo o testamenteiro
cabeça-de-casal.
ARTIGO 2092º
(Entrega de rendimentos)
Qualquer dos herdeiros ou o
cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça-de-casal distribua por
todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem necessários,
mesmo nessa parte, para satisfação de encargos da administração.
ARTIGO 2093º
(Prestação de contas)
1. O cabeça-de-casal deve
prestar contas anualmente.
2. Nas contas entram como
despesas ou rendimentos, entregues pelo cabeça-de-casal aos herdeiros ou ao
cônjuge meeiro nos termos do artigo anterior, e bem assim o juro do que haja
gasto à sua custa na satisfação de encargos da administração.
3. Havendo saldo positivo,
é distribuído pelos interessados, segundo o seu direito, depois de deduzida a
quantia necessária para os encargos do novo ano.
ARTIGO 2094º
(Gratuidade do cargo)
O cargo de cabeça-de-casal
é gratuito, sem prejuízo do disposto no artigo 2333º, se for exercido pelo
testamenteiro.
ARTIGO 2095º
(Intransmissibilidade)
O cargo de cabeça-de-casal
não é transmissível em vida nem por morte.
ARTIGO 2096º
(Sonegação de bens)
1. O herdeiro que sonegar
bens da herança, ocultando dolosamente a sua existência, seja ou não
cabeça-de-casal, perde em benefício dos co-herdeiros o direito que possa ter a
qualquer parte dos bens sonegados, além de incorrer nas mais sanções que forem
aplicáveis.
2. O que sonegar bens da
herança é considerado mero detentor desses bens.
CAPÍTULO IX
Liquidação da herança
ARTIGO 2097º
(Responsabilidade da
herança indivisa)
Os bens da herança indivisa
respondem colectivamente pela satisfação dos respectivos encargos.
ARTIGO 2098º
(Pagamento dos encargos
após a partilha)
1. Efectuada a partilha,
cada herdeiro só responde pelos encargos em proporção da quota que lhe tenha
cabido na herança.
2. Podem, todavia, os
herdeiros deliberar que o pagamento se faça à custa de dinheiro ou outros bens
separados para esse efeito, ou que fique a cargo de algum ou alguns deles.
3. A deliberação obriga os
credores e os legatários; mas, se uns ou outros não puderem ser pagos
integralmente nos sobreditos termos, têm recurso contra os outros bens ou
contra os outros herdeiros, nos termos gerais.
ARTIGO 2099º
(Remição de direitos de
terceiro)
Se existirem direitos de
terceiro, de natureza remível, sobre determinados bens da herança, e houver
nesta dinheiro suficiente, pode qualquer dos co-herdeiros ou o cônjuge meeiro
exigir que esses direitos sejam remidos antes de efectuada a partilha.
ARTIGO 2100º
(Pagamento dos direitos
de terceiro)
1. Entrando os bens na
partilha com os direitos referidos no artigo anterior, descontar-se-á neles o
valor desses direitos, que serão suportados exclusivamente pelo interessado a
quem os bens couberem.
2. Se não se fizer tal
desconto, o interessado que pagar a remição tem regresso contra os outros pela
parte que a cada um tocar, em proporção do seu quinhão; mas, em caso de
insolvência de algum deles, é a sua parte repartida entre todos
proporcionalmente.
CAPÍTULO X
Partilha da herança
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 2101º
(Direito de exigir
partilha)
1. Qualquer co-herdeiro ou
o cônjuge meeiro tem o direito de exigir partilha quando lhe aprouver.
2. Não pode renunciar-se ao
direito de partilhar, mas pode convencionar-se que o património se conserve
indiviso por certo prazo, que não exceda cinco anos; é lícito renovar este
prazo, uma ou mais vezes, por nova convenção.
ARTIGO 2102º
(Forma)
1. A partilha pode fazer-se
extrajudicialmente, quando houver acordo de todos os interessados, ou por
inventário judicial nos termos prescritos na lei de processo.
2. Procede-se ainda a
inventário judicial quando o Ministério Público o requeira, por entender que o
interesse do incapaz a quem a herança é deferida implica aceitação
beneficiária, e ainda nos casos em que algum dos herdeiros não possa, por
motivo de ausência em parte incerta ou de incapacidade de facto permanente,
outorgar em partilha extrajudicial.
(Redacção do Dec.-Lei
227/94, de 8-9)
ARTIGO 2103º
(Interessado único)
Havendo um único interessado,
o inventário a que haja de proceder-se nos termos do nº 2 do artigo anterior
tem apenas por fim relacionar os bens e, eventualmente, servir de base à
liquidação da herança.
SECÇÃO II
Atribuições
preferenciais
(Aditada pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2103º-A
(Direito de habitação da
casa de morada da família e direito de uso do recheio)
1. O cônjuge sobrevivo tem
direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no direito de habitação da
casa de morada da família e no direito de uso do respectivo recheio, devendo
tornas aos co-herdeiros se o valor recebido exceder o da sua parte sucessória e
meação, se a houver.
2. Salvo nos casos
previstos no nº 2 do artigo 1093º, caducam os direitos atribuídos no número
anterior se o cônjuge não habitar a casa por prazo superior a um ano.
3. A pedido dos
proprietários, pode o tribunal, quando o considere justificado, impor ao
cônjuge a obrigação de prestar caução.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2103º-B
(Direitos sobre o
recheio)
Se a casa de morada da
família não fizer parte da herança, observar-se-á, com as necessárias
adaptações, o disposto no artigo anterior relativamente ao recheio.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2103º-C
(Noção de recheio)
Para os efeitos do disposto
nos artigos anteriores, considera-se recheio o mobiliário e demais objectos ou
utensílios destinados ao cómodo, serviço e ornamentação da casa.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Colação
ARTIGO 2104º
(Noção)
1. Os descendentes que
pretendem entrar na sucessão do ascendente devem restituir à massa da herança,
para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados por este:
esta restituição tem o nome de colação.
2. São havidas como doação,
para efeitos de colação, as despesas referidas no artigo 2110º.
ARTIGO 2105º
(Descendentes sujeitos à
colação)
Só estão sujeitos à colação
os descendentes que eram à data da doação presuntivos herdeiros legitimários do
doador.
ARTIGO 2106º
(Sobre quem recai a
obrigação)
A obrigação de conferir
recai sobre o donatário, se vier a suceder ao doador, ou sobre os seus
representantes, ainda que estes não hajam tirado benefício da liberalidade.
ARTIGO 2107º
(Doações feitas a
cônjuges)
1. Não estão sujeitos a
colação os bens ou valores doados ao cônjuge do presuntivo herdeiro
legitimário.
2. Se a doação tiver sido
feita a ambos os cônjuges, fica sujeita a colação apenas a parte do que for
presuntivo herdeiro.
3. A doação não se
considera feita a ambos os cônjuges só porque entre eles vigora o regime da
comunhão geral.
ARTIGO 2108º
(Como se efectua a
conferência)
1. A colação faz-se pela
imputação do valor da doação ou da importância das despesas na quota
hereditária, ou pela restituição dos próprios bens doados, se houver acordo de
todos os herdeiros.
2. Se não houver na herança
bens suficientes para igualar todos os herdeiros, nem por isso são reduzidas as
doações, salvo se houver inoficiosidade.
ARTIGO 2109º
(Valor dos bens doados)
1. O valor dos bens doados
é o que eles tiveram à data da abertura da sucessão.
2. Se tiverem sido doados
bens que o donatário consumiu, alienou ou onerou, ou que pereceram por sua
culpa, atende-se ao valor que esses bens teriam na data da abertura da
sucessão, se não fossem consumidos, alienados ou onerados, ou não tivessem
perecido.
3. A doação em dinheiro,
bem como os encargos em dinheiro que a oneraram e foram cumpridos pelo
donatário, são actualizados nos termos do artigo 551º.
ARTIGO 2110º
(Despesas sujeitas e não
sujeitas a colação)
1. Está sujeito a colação
tudo quanto o falecido tiver despendido gratuitamente em proveito dos
descendentes.
2. Exceptuam-se as despesas
com o casamento, alimentos, estabelecimento e colocação dos descendentes, na
medida em que se harmonizem com os usos e com a condição social e económica do
falecido.
ARTIGO 2111º
(Frutos)
Os frutos da coisa doada
sujeita a colação, percebidos desde a abertura da sucessão, devem ser
conferidos.
ARTIGO 2112º
(Perda da coisa doada)
Não é objecto de colação a
coisa doada que tiver perecido em vida do autor da sucessão por facto não
imputável ao donatário.
ARTIGO 2113º
(Dispensa da colação)
1. A colação pode ser
dispensada pelo doador no acto da doação ou posteriormente.
2. Se a doação tiver sido
acompanhada de alguma formalidade externa, só pela mesma forma, ou por testamento,
pode ser dispensada a colação.
3. A colação presume-se
sempre dispensada nas doações manuais e nas doações remuneratórias.
ARTIGO 2114º
(Imputação na quota
disponível)
1. Não havendo lugar à
colação, a doação é imputada na quota disponível.
2. Se, porém, não houver
lugar à colação pelo facto de o donatário repudiar a herança sem ter
descendentes que o representem, a doação é imputada na quota indisponível.
ARTIGO 2115º
(Benfeitorias nos bens
doados)
O donatário é equiparado,
quanto a benfeitorias, ao possuidor de boa fé, sendo-lhe aplicável, com as
necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1273º e seguintes.
ARTIGO 2116º
(Deteriorações)
O donatário responde pelas
deteriorações que culposamente tenha causado nos bens doados.
ARTIGO 2117º
(Doação de bens comuns)
1. Sendo a doação de bens
comuns feita por ambos os cônjuges, conferir-se-á metade por morte de cada um
deles.
2. O valor de cada uma das
metades é o que ela tiver ao tempo da abertura da sucessão respectiva.
ARTIGO 2118º
(Ónus real)
1. A eventual redução das
doações sujeitas a colação constitui um ónus real.
2. Não pode fazer-se o
registo de doação de bens imóveis sujeita a colação sem se efectuar,
simultaneamente, o registo do ónus.
SECÇÃO IV
Efeitos da partilha
ARTIGO 2119º
(Retroactividade da
partilha)
Feita a partilha, cada um
dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único dos
bens que lhe foram atribuídos, sem prejuízo do disposto quanto a frutos.
ARTIGO 2120º
(Entrega de documentos)
1. Finda a partilha, são
entregues a cada um dos co-herdeiros os documentos relativos aos bens que lhe
couberem.
2. Os documentos relativos
aos bens atribuídos a dois ou mais herdeiros são entregues ao que neles tiver
maior parte, com obrigação de os apresentar aos outros interessados, nos termos
gerais.
3. Os documentos relativos
a toda a herança ficam em poder do co-herdeiro que os interessados escolherem,
ou que o tribunal nomear na falta de acordo, com igual obrigação de os
apresentar aos outros interessados.
SECÇÃO V
Impugnação da partilha
ARTIGO 2121º
(Fundamento da
impugnação)
A partilha extrajudicial só
é impugnável nos casos em que o sejam os contratos.
ARTIGO 2122º
(Partilha adicional)
A omissão de bens da
herança não determina a nulidade da partilha, mas apenas a partilha adicional
dos bens omitidos.
ARTIGO 2123º
(Partilha de bens não
pertencentes à herança)
1. Se tiver recaído sobre
bens não pertencentes à herança, a partilha é nula nessa parte, sendo-lhe
aplicável, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do disposto no número
seguinte, o preceituado acerca da venda de bens alheios.
2. Aquele a quem sejam
atribuídos os bens alheios é indemnizado pelos co-herdeiros na proporção dos
respectivos quinhões hereditários; se, porém, algum dos co-herdeiros estiver
insolvente, respondem os demais pela sua parte, na mesma proporção.
CAPÍTULO XI
Alienação de herança
ARTIGO 2124º
(Disposições aplicáveis)
A alienação de herança ou
de quinhão hereditário está sujeita às disposições reguladoras do negócio
jurídico que lhe der causa, salvo o preceituado nos artigos seguintes.
ARTIGO 2125º
(Objecto)
1. Todo o benefício
resultante da caducidade de um legado, encargo ou fideicomisso se presume
transmitido com a herança ou quota hereditária.
2. A parte hereditária
devolvida ao alienante, depois da alienação, em consequência de fideicomisso ou
do direito de acrescer, presume-se excluída da disposição.
3. Presume-se igualmente
excluídos da alienação os diplomas e a correspondência do falecido, bem como as
recordações de família de diminuto valor económico.
ARTIGO 2126º
(Forma)
1. A alienação de herança
ou de quinhão hereditário será feita por escritura pública, se existirem bens
cuja alienação deva ser feita por essa forma.
2. Fora do caso previsto no
número anterior, a alienação deve constar de documento particular.
ARTIGO 2127º
(Alienação de coisa
alheia)
O que aliena uma herança ou
quinhão hereditário sem especificação de bens só responde pela alienação de
coisa alheia se não vier a ser reconhecido como herdeiro.
ARTIGO 2128º
(Sucessão nos encargos)
O adquirente de herança ou
de quinhão hereditário sucede nos encargos respectivos; mas o alienante
responde solidariamente por esses encargos, salvo o direito de haver do
adquirente o reembolso total do que assim houver despendido.
ARTIGO 2129º
(Indemnizações)
1. O alienante por título
oneroso que tiver disposto de bens da herança é obrigado a entregar o
respectivo valor ao adquirente.
2. O adquirente a título
oneroso ou gratuito é obrigado a reembolsar o alienante do que este tiver
despendido na satisfação dos encargos da herança e a pagar-lhe o que a herança
lhe dever.
3. As disposições dos
números anteriores são supletivas.
ARTIGO 2130º
(Direito de preferência)
1. Quando seja vendido ou
dado em cumprimento a estranhos um quinhão hereditário, os co-herdeiros gozam
do direito de preferência nos termos em que este direito assiste aos
comproprietários.
2. O prazo, porém, para o
exercício do direito, havendo comunicação para a preferência, é de dois meses.
TÍTULO II
DA SUCESSÃO LEGÍTIMA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2131º
(Abertura da sucessão
legítima)
Se o falecido não tiver
disposto válida e eficazmente, no todo ou em parte, dos bens de que podia
dispor para depois da morte, são chamados à sucessão desses bens os seus
herdeiros legítimos.
ARTIGO 2132º
(Categoria de herdeiros
legítimos)
São herdeiros legítimos o
cônjuge, os parentes e o Estado, pela ordem e segundo as regras constantes do
presente título.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2133º
(Classes de sucessíveis)
1. A ordem por que são
chamados os herdeiros, sem prejuízo do disposto no título da adopção, é a
seguinte:
a) Cônjuge e descendentes;
b) Cônjuge e ascendentes;
c) Irmãos e seus
descendentes;
d) Outros colaterais até ao
quarto grau;
e) Estado.
2. O cônjuge sobrevivo
integra a primeira classe de sucessíveis, salvo se o autor da sucessão falecer
sem descendentes e deixar ascendentes, caso em que integra a segunda classe.
3. O cônjuge não é chamado
à herança se à data da morte do autor da sucessão se encontrar divorciado ou
separado judicialmente de pessoas e bens, por sentença que já tenha transitado
ou venha a transitar em julgado, ou ainda se a sentença de divórcio ou
separação vier a ser proferida posteriormente àquela data, nos termos do nº 3
do artigo 1785º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2134º
(Preferência de classes)
Os herdeiros de cada uma
das classes de sucessíveis preferem aos das classes imediatas.
ARTIGO 2135º
(Preferência de graus de
parentesco)
Dentro de cada classe os
parentes de grau mais próximo preferem aos de grau mais afastado.
ARTIGO 2136º
(Sucessão por cabeça)
Os parentes de cada classe
sucedem por cabeça ou em partes iguais, salvas as excepções previstas neste
código.
ARTIGO 2137º
(Ineficácia do
chamamento)
1. Se os sucessíveis da
mesma classe chamados simultaneamente à herança não puderem ou não quiserem
aceitar, são chamados os imediatos sucessores.
2. Se, porém, apenas algum
ou alguns dos sucessíveis não puderem ou não quiserem aceitar, a sua parte
acrescerá à dos outros sucessíveis da mesma classe que com eles concorram à
herança, sem prejuízo do disposto no artigo 2143º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2138º
(Direito de
representação)
O disposto nos três artigos
anteriores não prejudica o direito de representação, nos casos em que este tem
lugar.
CAPÍTULO II
Sucessão do cônjuge e
dos descendentes
(Epígrafe introduzida pelo
Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2139º
(Regras gerais)
1. A partilha entre o
cônjuge e os filhos faz-se por cabeça, dividindo-se a herança em tantas partes
quantos forem os herdeiros; a quota do cônjuge, porém, não pode ser inferior a
uma quarta parte da herança.
2. Se o autor da sucessão
não deixar cônjuge sobrevivo, a herança divide-se pelos filhos em partes
iguais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2140º
(Descendentes do segundo
grau e seguintes)
Os descendentes dos filhos
que não puderem ou não quiserem aceitar a herança são chamados à sucessão nos
termos do artigo 2042º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2141º
(Sucessão do cônjuge, na
falta de descendentes)
Na falta de descendentes
sucede o cônjuge, sem prejuízo do disposto no capítulo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO III
Sucessão do cônjuge e
dos ascendentes
ARTIGO 2142º
(Regras gerais)
1. Se não houver
descendentes e o autor da sucessão deixar cônjuge e ascendentes, ao cônjuge
pertencerão duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte da herança.
2. Na falta de cônjuge, os
ascendentes são chamados à totalidade da herança.
3. A partilha entre os
ascendentes, nos casos previstos nos números anteriores, faz-se segundo as
regras dos artigos 2135º e 2136º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2143º
(Acrescer)
Se algum ou alguns dos
ascendentes não puderem ou não quiserem aceitar, no caso previsto no nº 1 do
artigo anterior, a sua parte acresce à dos outros ascendentes que concorram à
sucessão; se estes não existirem, acrescerá à do cônjuge sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2144º
(Sucessão do cônjuge, na
falta de descendentes e ascendentes)
Na falta de descendentes e
ascendentes, o cônjuge é chamado à totalidade da herança.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO IV
Sucessão dos irmãos e
seus descendentes
ARTIGO 2145º
(Regra geral)
Na falta de cônjuge,
descendentes e ascendentes, são chamados à sucessão os irmãos e,
representativamente, os descendentes destes.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2146º
(Irmãos germanos e
unilaterais)
Concorrendo à sucessão
irmãos germanos e irmãos consanguíneos ou uterinos, o quinhão de cada um dos
irmãos germanos, ou dos descendentes que os representem, é igual ao dobro do
quinhão de cada um dos outros.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO V
Sucessão dos outros
colaterais
ARTIGO 2147º
(Outros colaterais até
ao quarto grau)
Na falta de herdeiros das
classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes colaterais até ao
quarto grau, preferindo sempre os mais próximos.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2148º
(Duplo parentesco)
A partilha faz-se por
cabeça, mesmo que algum dos chamados à sucessão seja duplamente parente do
falecido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2149º A 2151º
(Revogados pelos Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
CAPÍTULO VI
Sucessão do Estado
ARTIGO 2152º
(Chamamento do Estado)
Na falta de cônjuge e de
todos os parentes sucessíveis, é chamado à herança o Estado.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2153º
(Direitos e obrigações
do Estado)
O Estado tem, relativamente
à herança, os mesmos direitos e obrigações de qualquer outro herdeiro.
ARTIGO 2154º
(Desnecessidade de
aceitação e impossibilidade de repúdio)
A aquisição da herança pelo
Estado, como sucessor legítimo, opera-se de direito, sem necessidade de
aceitação, não podendo o Estado repudiá-la.
ARTIGO 2155º
(Declaração de herança
vaga)
Reconhecida judicialmente a
inexistência de outros sucessíveis legítimos, a herança é declarada vaga para o
Estado nos termos das leis de processo.
TÍTULO III
DA SUCESSÃO LEGITIMÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2156º
(Legítima)
Entende-se por legítima a
porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada
aos herdeiros legitimários.
ARTIGO 2157º
(Herdeiros legitimários)
São herdeiros legitimários
o cônjuge, os descendentes e os ascendentes, pela ordem e segundo as regras
estabelecidas para a sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2158º
(Legítima do cônjuge)
A legítima do cônjuge, se
não concorrer com descendentes nem ascendentes, é de metade da herança.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2159º
(Legítima do cônjuge e
dos filhos)
1. A legítima do cônjuge e
dos filhos, em caso de concurso, é de dois terços da herança.
2. Não havendo cônjuge
sobrevivo, a legítima dos filhos é de metade ou dois terços da herança, conforme
exista um só filho ou existam dois ou mais.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2160º
(Legítima dos
descendentes do segundo grau e seguintes)
Os descendentes do segundo
grau e seguintes têm direito à legítima que caberia ao seu ascendente, sendo a
parte de cada um fixada nos termos prescritos para a sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2161º
(Legítima do cônjuge e
dos ascendentes)
1. A legítima do cônjuge e
dos ascendentes, em caso de concurso, é de dois terços da herança.
2. Se o autor da sucessão
não deixar descendentes nem cônjuge sobrevivo, a legítima dos ascendentes é de
metade ou de um terço da herança, conforme forem chamados os pais ou os
ascendentes do segundo grau e seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 2162º
(Cálculo da legítima)
1. Para o cálculo da
legítima, deve atender-se ao valor dos bens existentes no património do autor
da sucessão à data da sua morte, ao valor dos bens doados, às despesas sujeitas
a colação e às dívidas da herança.
2. Não é atendido para o
cálculo da legítima o valor dos bens que, nos termos do artigo 2112º, não são
objecto de colação.
ARTIGO 2163º
(Proibição de encargos)
O testador não pode impor
encargos sobre a legítima, nem designar os bens que a devem preencher, contra a
vontade do herdeiro.
ARTIGO 2164º
(Cautela sociniana)
Se, porém, o testador
deixar usufruto ou constituir pensão vitalícia que atinja a legítima, podem os
herdeiros legitimários cumprir o legado ou entregar ao legatário tão-somente a
quota disponível.
ARTIGO 2165º
(Legado em substituição
da legítima)
1. Pode o autor da sucessão
deixar um legado ao herdeiro legitimário em substituição da legítima.
2. A aceitação do legado
implica a perda do dinheiro à legítima, assim como a aceitação da legítima
envolve a perda do dinheiro ao legado.
3. Se o herdeiro,
notificado nos termos do nº 1 do artigo 2049º, nada declarar, ter-se-á por
aceito o legado.
4. O legado deixado em
substituição da legítima é imputado na quota indisponível do autor da sucessão;
mas, se exceder o valor da legítima do herdeiro, é imputado pelo excesso, na
quota disponível.
ARTIGO 2166º
(Deserdação)
1. O autor da sucessão pode
em testamento, com expressa declaração da causa, deserdar o herdeiro
legitimário, privando-o da legítima, quando se verifique alguma das seguintes
ocorrências:
a) Ter sido o sucessível
condenado por algum crime doloso cometido contra a pessoa, bens ou honra do
autor da sucessão, ou do seu cônjuge, ou algum descendente, ascendente,
adoptante ou adoptado, desde que ao crime corresponda pena superior a seis
meses de prisão;
b) Ter sido o sucessível
condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas;
c) Ter o sucessível, sem
justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge os devidos
alimentos.
2. O deserdado é equiparado
ao indigno para todos os efeitos legais.
ARTIGO 2167º
(Impugnação da
deserdação)
A acção de impugnação da
deserdação, com fundamento na inexistência da causa invocada, caduca ao fim de
dois anos a contar da abertura do testamento.
CAPÍTULO II
Redução de liberalidades
ARTIGO 2168º
(Liberalidades
inoficiosas)
Dizem-se inoficiosas as
liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos herdeiros
legitimários.
ARTIGO 2169º
(Redução)
As liberalidades inoficiosas
são redutíveis, a requerimento dos herdeiros legitimários ou dos seus
sucessores, em tanto quanto for necessário para que a legítima seja preenchida.
ARTIGO 2170º
(Proibição da renúncia)
Não é permitida em vida do
autor da sucessão a renúncia ao direito de reduzir as liberalidades.
ARTIGO 2171º
(Ordem da redução)
A redução abrange em
primeiro lugar as disposições testamentárias a título de herança, em segundo
lugar os legados, e por último as liberalidades que hajam sido feitas em vida
do autor da sucessão.
ARTIGO 2172º
(Redução das disposições
testamentárias)
1. Se bastar a redução das
disposições testamentárias, será feita proporcionalmente, tanto no caso de
deixas a título de herança como a título de legado.
2. No caso, porém, de o
testador ter declarado que determinadas disposições devem produzir efeito de
preferência a outras, as primeiras só serão reduzidas se o valor integral das
restantes não for suficiente para o preenchimento da legítima.
3. Gozam de igual
preferência as deixas remuneratórias.
ARTIGO 2173º
(Redução de
liberalidades feitas em vida)
1. Se for necessário
recorrer às liberalidades feitas em vida, começar-se-á pela última, no todo ou
em parte; se isso não bastar, passar-se-á à imediata; e assim sucessivamente.
2. Havendo diversas
liberalidades feitas no mesmo acto ou na mesma data, a redução será feita entre
elas rateadamente, salvo se alguma delas for remuneratória, porque a essa é
aplicável o disposto no nº 3 do artigo anterior.
ARTIGO 2174º
(Termos em que se
efectua a redução)
1. Quando os bens legados
ou doados são divisíveis, a redução faz-se separando deles a parte necessária
para preencher a legítima.
2. Sendo os bens
indivisíveis, se a importância da redução exceder metade do valor dos bens,
estes pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário ou
donatário haverá o resto em dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem
integralmente ao legatário ou donatário, tendo este de pagar em dinheiro ao
herdeiro legitimário a importância da redução.
3. A reposição de aquilo
que se despendeu gratuitamente a favor dos herdeiros legitimários, em
consequência da redução, é feita igualmente em dinheiro.
ARTIGO 2175º
(Perecimento ou
alienação dos bens doados)
Se os bens doados tiverem
perecido por qualquer causa ou tiverem sido alienados ou onerados, o donatário
ou os seus sucessores são responsáveis pelo preenchimento da legítima em
dinheiro, até ao valor desses bens.
ARTIGO 2176º
(Insolvência do
responsável)
Nos casos previstos no
artigo anterior e no nº 3 do artigo 2174º, a insolvência daqueles que, segundo
a ordem estabelecida, devem suportar o encargo da redução não determina a
responsabilidade dos outros.
ARTIGO 2177º
(Frutos e benfeitorias)
O donatário é considerado,
quanto a frutos e benfeitorias, possuidor de boa fé até à data do pedido de
redução.
ARTIGO 2178º
(Prazo para a redução)
A acção de redução de
liberalidades inoficiosas caduca dentro de dois anos, a contar da aceitação da
herança pelo herdeiro legitimário.
TÍTULO IV
DA SUCESSÃO
TESTAMENTÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2179º
(Noção de testamento)
1. Diz-se testamento o acto
unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de
todos os seus bens ou de parte deles.
2. As disposições de
carácter não patrimonial que a lei permite inserir no testamento são válidas se
fizerem parte de um acto revestido de forma testamentária, ainda que nele não
figurem disposições de carácter patrimonial.
ARTIGO 2180º
(Expressão da vontade do
testador)
É nulo o testamento em que
o testador não tenha exprimido cumprida e claramente a sua vontade, mas apenas
por sinais ou monossílabos, em resposta a perguntas que lhe fossem feitas.
ARTIGO 2181º
(Testamento de mão
comum)
Não podem testar no mesmo
acto duas ou mais pessoas, quer em proveito recíproco, quer em favor de
terceiro.
ARTIGO 2182º
(Carácter pessoal do
testamento)
1. O testamento é acto
pessoal, insusceptível de ser feito por meio de representante ou de ficar
dependente do arbítrio de outrem, quer pelo que toca à instituição de herdeiros
ou nomeação de legatários, quer pelo que respeita ao objecto da herança ou do
legado, quer pelo que pertence ao cumprimento ou não cumprimento das suas
disposições.
2. O testador pode,
todavia, cometer a terceiro:
a) A repartição da herança
ou do legado, quando institua ou nomeie uma generalidade de pessoas;
b) A nomeação do legatário
de entre pessoas por aquele determinadas.
3. Nos casos previstos no
número antecedente, qualquer interessado tem a faculdade de requerer ao
tribunal a fixação de um prazo para a repartição da herança ou do legado ou
nomeação do legatário, sob a cominação, no primeiro caso, de a repartição
pertencer à pessoa designada para o efeito pelo tribunal e, no segundo, de a
distribuição do legado ser feita por igual pelas pessoas que o testador tenha
determinado.
ARTIGO 2183º
(Escolha do legado pelo
onerado, pelo legatário ou por terceiro)
1. O testador pode deixar a
escolha da coisa legada à justa apreciação do onerado, do legatário ou de
terceiro, desde que indique o fim do legado e o género ou espécie em que ele se
contém.
2. É aplicável a este caso,
com as necessárias adaptações, o disposto no nº 3 do artigo anterior.
ARTIGO 2184º
(Testamento «per
relationem»)
É nula a disposição que
dependa de instruções ou recomendações feitas a outrem secretamente, ou se
reporte a documentos não autênticos, ou não escritos e assinados pelo testador
com data anterior à data do testamento ou contemporânea desta.
ARTIGO 2185º
(Disposições a favor de
pessoas incertas)
É igualmente nula a
disposição feita a favor de pessoa incerta que por algum modo se não possa
tornar certa.
ARTIGO 2186º
(Fim contrário à lei ou
à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes)
É nula a disposição
testamentária, quando da interpretação do testamento resulte que foi
essencialmente determinada por um fim contrário à lei ou à ordem pública, ou
ofensivo dos bons costumes.
ARTIGO 2187º
(Interpretação dos
testamentos)
1. Na interpretação das
disposições testamentárias observar-se-á o que parecer mais ajustado com a
vontade do testador, conforme o contexto do testamento.
2. É admitida prova
complementar, mas não surtirá qualquer efeito a vontade do testador que não
tenha no contexto um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente
expressa.
CAPÍTULO II
Capacidade testamentária
ARTIGO 2188º
(Princípio geral)
Podem testar todos os
indivíduos que a lei não declare incapazes de o fazer.
ARTIGO 2189º
(Incapacidade)
São incapazes de testar:
a) Os menores não
emancipados;
b) Os interditos por
anomalia psíquica.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2190º
(Sanção)
O testamento feito por
incapazes é nulo.
ARTIGO 2191º
(Momento da determinação
da capacidade)
A capacidade do testador
determina-se pela data do testamento.
CAPÍTULO III
Casos de
indisponibilidade relativa
ARTIGO 2192º
(Tutor, curador,
administrador legal de bens e protutor)
1. É nula a disposição
feita por interdito ou inabilitado a favor do seu tutor, curador ou
administrador legal de bens, ainda que estejam aprovadas as respectivas contas.
2. É igualmente nula a
disposição a favor do protutor, se este, na data em que o testamento foi feito,
substituía qualquer das pessoas designadas no número anterior.
3. É, porém, válida a
disposição a favor das mesmas pessoas, quando se trate de descendentes,
ascendentes, colaterais até ao terceiro grau ou cônjuge do testador.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2193º
(Revogado pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2194º
(Médicos, enfermeiros e
sacerdotes)
É nula a disposição a favor
do médico ou enfermeiro que tratar do testador, ou do sacerdote que lhe prestar
assistência espiritual, se o testamento for feito durante a doença e o seu
autor vier a falecer dela
ARTIGO 2195º
(Excepções)
A nulidade estabelecida no
artigo anterior não abrange:
a) Os legados
remuneratórios de serviços recebidos pelo doente;
b) As disposições a favor
das pessoas designadas no nº 3 do artigo 2192º.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2196º
(Cúmplice do testador
adúltero)
1. É nula a disposição a
favor da pessoa com quem o testador casado cometeu adultério.
2. Não se aplica o preceito
do número anterior:
a) Se o casamento já estava
dissolvido, ou os cônjuges estavam separados judicialmente de pessoas e bens ou
separados de facto há mais de seis anos, à data da abertura da sucessão;
b) Se a disposição se
limitar a assegurar alimentos ao beneficiário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2197º
(Intervenientes no
testamento)
É nula a disposição a favor
do notário ou entidade com funções notariais que lavrou o testamento público ou
aprovou o testamento cerrado, ou a favor da pessoa que escreveu este, ou das
testemunhas, abonadores ou intérpretes que intervierem no testamento ou na sua
aprovação.
ARTIGO 2198º
(Interpostas pessoas)
1. São nulas as disposições
referidas nos artigos anteriores, quando feitas por meio de interposta pessoa.
2. Consideram-se
interpostas pessoas as designadas no nº 2 do artigo 579º.
CAPÍTULO IV
Falta e vícios da
vontade
ARTIGO 2199º
(Incapacidade acidental)
É anulável o testamento
feito por quem se encontrava incapacitado de entender o sentido da sua
declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por qualquer causa,
ainda que transitória.
ARTIGO 2200º
(Simulação)
É anulável a disposição
feita aparentemente a favor de pessoa designada no testamento, mas que, na
realidade, e por acordo com essa pessoa, vise a beneficiar outra.
ARTIGO 2201º
(Erro, dolo e coacção)
É também anulável a
disposição testamentária determinada por erro, dolo ou coacção.
ARTIGO 2202º
(Erro sobre os motivos)
O erro, de facto ou de direito,
que recaia sobre o motivo da disposição testamentária só é causa de anulação
quando resultar do próprio testamento que o testador não teria feito a
disposição se conhecesse a falsidade do motivo.
ARTIGO 2203º
(Erro na indicação da
pessoa ou dos bens)
Se o testador tiver
indicado erroneamente a pessoa do herdeiro ou do legatário, ou dos bens que são
objecto da disposição, mas da interpretação do testamento for possível concluir
a que pessoa ou bens ele pretendia referir-se, a disposição vale relativamente
a esta pessoa ou a estes bens.
CAPÍTULO V
Forma do testamento
SECÇÃO I
Formas comuns
ARTIGO 2204º
(Indicação)
As formas comuns do
testamento são o testamento público e o testamento cerrado.
ARTIGO 2205º
(Testamento público)
É público o testamento
escrito por notário no seu livro de notas.
ARTIGO 2206º
(Testamento cerrado)
1. O testamento diz-se
cerrado, quando é escrito e assinado pelo testador ou por outra pessoa a seu
rogo, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por este assinado.
2. O testador só pode
deixar de assinar o testamento cerrado quando não saiba ou não possa fazê-lo,
ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por que o não assina.
3. A pessoa que assina o
testamento deve rubricar as folhas que não contenham a sua assinatura.
4. O testamento cerrado
deve ser aprovado por notário, nos termos da lei do notariado.
5. A violação do disposto
nos números anteriores importa nulidade do testamento.
ARTIGO 2207º
(Data do testamento
cerrado)
A data da aprovação do
testamento cerrado é havida como data do testamento para todos os efeitos
legais.
ARTIGO 2208º
(Inabilidade para fazer
testamento cerrado)
Os que não sabem ou não
podem ler são inábeis para dispor em testamento cerrado.
ARTIGO 2209º
(Conservação e
apresentação do testamento cerrado)
1. O testador pode
conservar o testamento cerrado em seu poder, cometê-lo à guarda de terceiro ou
depositá-lo em qualquer repartição notarial.
2. A pessoa que tiver em
seu poder o testamento é obrigada a apresentá-lo ao notário em cuja área o documento
se encontre, dentro de três dias contados desde o conhecimento do falecimento
do testador; se o não fizer, incorre em responsabilidade pelos danos a que der
causa, sem prejuízo da sanção especial da alínea d) do artigo 2034º.
SECÇÃO II
Formas especiais
ARTIGO 2210º
(Testamento de militares
e pessoas equiparadas)
Os militares, bem como os
civis ao serviço das forças armadas, podem testar pela forma declarada nos
artigos seguintes, quando se encontrem em campanha ou aquartelados fora do
País, ou ainda dentro do País mas em lugares com os quais estejam interrompidas
as comunicações e onde não exista notário, e também quando se encontrem
prisioneiros do inimigo.
ARTIGO 2211º
(Testamento militar
público)
1. O militar, ou o civil a
ele equiparado, declarará a sua vontade na presença do comandante da respectiva
unidade independente ou força isolada e de duas testemunhas.
2. Se o comandante quiser
fazer testamento, tomará o seu lugar quem deva substituí-lo.
3. O testamento, depois de
escrito, datado e lido em voz alta pelo comandante, será assinado pelo
testador, pelas testemunhas, e pelo mesmo comandante;se o testador ou as
testemunhas não puderem assinar, declarar-se-á o motivo porque o não fazem.
ARTIGO 2212º
(Testamento militar
cerrado)
1. Se o militar, ou o civil
a ele equiparado, souber e puder escrever, pode fazer o testamento por seu
próprio punho.
2. Escrito e assinado o
testamento pelo testador, este apresentá-lo-á ao comandante, na presença de
duas testemunhas, declarando que exprime a sua última vontade; o comandante,
sem o ler, escreverá no testamento a declaração datada de que ele lhe foi
apresentado, sendo essa declaração assinada tanto pelas testemunhas como pelo
comandante.
3. Se o testador o
solicitar, o comandante, ainda na presença das testemunhas, coserá e lacrará o
testamento, exarando na face exterior da folha que servir de invólucro uma nota
com a designação da pessoa a quem pertencer o testamento ali contido.
4. É aplicável a esta
espécie de testamento o que fica disposto no nº 2 do artigo antecedente.
ARTIGO 2213º
(Formalidades
complementares)
1. O testamento feito na
conformidade dos artigos anteriores será depositado pelas autoridades militares
na repartição ou em alguma das repartições notariais do lugar do domicílio ou
da última residência do testador.
2. Falecendo o testador
antes de findar a causa que o impedia de testar nas formas comuns, será a sua
morte anunciada no jornal oficial, com designação da repartição notarial onde o
testamento se encontra depositado.
ARTIGO 2214º
(Testamento feito a
bordo de navio)
Qualquer pessoa pode fazer
testamento a bordo de navio de guerra ou de navio mercante, em viagem por mar,
nos termos declarados nos artigos seguintes.
ARTIGO 2215º
(Formalidades do
testamento marítimo)
O testamento feito a bordo
de navio deve obedecer ao preceituado nos artigos 2211º ou 2212º, competindo ao
comandante do navio a função que neles é atribuída ao comandante da unidade
independente ou força isolada.
ARTIGO 2216º
(Duplicado, registo e
guarda do testamento)
O testamento marítimo é
feito em duplicado, registado no diário de navegação e guardado entre os
documentos de bordo.
ARTIGO 2217º
(Entrega do testamento)
1. Se o navio entrar em
algum porto estrangeiro onde exista autoridade consular portuguesa, deve o
comandante entregar a essa autoridade um dos exemplares do testamento e cópia
do registo feito no diário de navegação.
2. Aportando o navio a
território português, entregará o comandante à autoridade marítima do lugar o
outro exemplar do testamento, ou fará entrega de ambos, se nenhum foi
depositado nos termos do número anterior, além de cópia do registo.
3. Em qualquer dos casos
declarados no presente artigo, o comandante cobrará recibo da entrega e
averbá-lo-á no diário de navegação, à margem do registo do testamento.
ARTIGO 2218º
(Termo de entrega e
depósito do testamento)
1. A autoridade consular ou
militar lavrará termo de entrega do testamento, logo que esta lhe seja feita, e
fá-lo-á depositar na repartição ou em alguma das repartições notariais do lugar
do domicílio ou da última residência do testador.
2. É aplicável a este caso
o disposto no nº 2 do artigo 2213º.
ARTIGO 2219º
(Testamento feito a
bordo de aeronave)
O disposto nos artigos
2214º a 2218º é aplicável, com as necessárias adaptações, ao testamento feito
em viagem a bordo de aeronave.
ARTIGO 2220º
(Testamento feito em
caso de calamidade pública)
1. Se qualquer pessoa
estiver inibida de socorrer-se das formas comuns de testamento, por se
encontrar em lugar onde grasse epidemia ou por outro motivo de calamidade
pública, pode testar perante algum notário, ,juíz ou sacerdote, com observância
das formalidades prescritas nos artigos 2211º ou 2212º.
2. O testamento será
depositado, logo que seja possível, na repartição notarial ou em alguma das
repartições notariais do lugar onde foi feito.
ARTIGO 2221º
(Idoneidade das
testemunhas, abonadores ou intérpretes; incapacidades)
1. Não pode ser testemunha,
abonador ou intérprete em qualquer dos testamentos regulados na presente secção
quem está impedido de o ser nos documentos autênticos extra-oficiais.
2. É extensivo aos mesmos
testamentos, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 2197º.
ARTIGO 2222º
(Prazo de eficácia)
1. O testamento celebrado
por alguma das formas especiais previstas na presente secção fica sem efeito
decorridos dois meses sobre a cessação da causa que impedia o testador de
testar segundo as formas comuns.
2. Se no decurso deste
prazo o testador for colocado de novo em circunstâncias impeditivas, o prazo é
interrompido devendo começar a contar-se por inteiro a partir da cessação das
novas circunstâncias.
3. A entidade perante quem
for feito o testamento deve esclarecer o testador acerca do disposto no nº 1,
fazendo menção do facto no próprio testamento; a falta de cumprimento deste
preceito não determina a nulidade do acto.
ARTIGO 2223º
(Testamento feito por
português em país estrangeiro)
O testamento feito por
cidadão português em país estrangeiro com observância da lei estrangeira
competente só produz efeitos em Portugal se tiver sido observada uma forma
solene na sua feitura ou aprovação.
CAPÍTULO VI
Conteúdo do testamento
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 2224º
(Disposições a favor da
alma)
1. É válida a disposição a
favor da alma, quando o testador designe os bens que devem ser utilizados para
esse fim ou quando seja possível determinar a quantia necessária para tal
efeito.
2. A disposição a favor da
alma constitui encargo que recai sobre o herdeiro ou legatário.
ARTIGO 2225º
(Disposição a favor de
uma generalidade de pessoas)
A disposição a favor de uma
generalidade de pessoas, sem qualquer outra indicação, considera-se feita a
favor das existentes no lugar em que o testador tinha o seu domicílio à data da
morte.
ARTIGO 2226º
(Disposições a favor de
parentes ou herdeiros legítimos)
1. A disposição a favor dos
parentes do testador ou de terceiro, sem designação de quais sejam,
considera-se feita a favor dos que seriam chamados por lei à sucessão, na data
da morte do testador, sendo a herança ou legado distribuído segundo as regras
da sucessão legítima.
2. De igual forma se
procederá, se forem designados como sucessores os herdeiros legítimos do
testador ou de terceiro, ou certa categoria de parentes.
ARTIGO 2227º
(Designação individual e
colectiva dos sucessores)
Se o testador designar
certos sucessores individualmente e outros colectivamente, são estes havidos
por individualmente designados.
ARTIGO 2228º
(Designação de certa
pessoa e seus filhos)
Se o testador chamar à
sucessão certa pessoa e seus filhos, entende-se que são todos designados simultaneamente,
nos termos do artigo anterior, e não sucessivamente.
SECÇÃO II
Disposições
condicionais, a termo e modais
ARTIGO 2229º
(Diposições
condicionais)
O testador pode sujeitar a
instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário a condição suspensiva ou
resolutiva, com as limitações dos artigos seguintes.
ARTIGO 2230º
(Condições impossíveis,
contrárias à lei ou à ordem pública ou ofensivas dos bons costumes)
1. A condição física ou
legalmente impossível considera-se não escrita e não prejudica o herdeiro ou
legatário, salvo declaração do testador em contrário.
2. A condição contrária à
lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes, tem-se igualmente por
não escrita, ainda que o testador haja declarado o contrário, salvo o disposto
no artigo 2186º.
ARTIGO 2231º
(Condição captatória)
É nula a disposição feita
sob condição de que o herdeiro ou legatário faça igualmente em seu testamento
alguma disposição a favor do testador ou de outrem.
ARTIGO 2232º
(Condições contrárias à
lei)
Consideram-se contrárias à
lei a condição de residir ou não residir em certo prédio ou local, de conviver
ou não conviver com certa pessoa, de não fazer testamento, de não transmitir a
determinada pessoa os bens deixados ou de os não partilhar ou dividir, de não
requerer inventário, de tomar ou deixar de tomar o estado eclesiástico ou
determinada profissão e as cláusulas semelhantes.
ARTIGO 2233º
(Condição de casar ou
não casar)
1. É também contrária à lei
a condição de que o herdeiro ou legatário celebre ou deixe de celebrar
casamento.
2. É, todavia, válida a
deixa de usufruto, uso, habitação, pensão ou outra prestação contínua ou
periódica para produzir efeito enquanto durar o estado de solteiro ou viúvo do
legatário.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2234º
(Condição de não dar ou
não fazer)
Se a herança ou legado for
deixado sob condição de o herdeiro ou legatário não dar certa coisa ou não
praticar certo acto por tempo indeterminado, a disposição considera-se feita
sob condição resolutiva, a não ser que o contrário resulte do testamento.
ARTIGO 2235º
(Obrigação de
preferência)
O testador pode impor ao
legatário a obrigação de dar preferência a certa pessoa na venda da coisa
legada ou na realização de outro contrato, nos termos prescritos para os pactos
de preferência.
ARTIGO 2236º
(Prestação de caução)
1. Em caso de disposição
testamentária sujeita a condição resolutiva, o tribunal pode impor ao herdeiro
ou legatário a obrigação de prestar caução no interesse daqueles a favor de
quem a herança ou legado será deferido no caso de a condição se verificar.
2. Do mesmo modo, em caso
de legado dependente de condição suspensiva ou termo inicial, o tribunal pode
impor àquele que deva satisfazer o legado a obrigação de prestar caução no
interesse do legatário.
3. O testador pode
dispensar a prestação de caução em qualquer dos casos previstos nos números
anteriores.
ARTIGO 2237º
(Administração da
herança ou legado)
1. Se o herdeiro for
instituído sob condição suspensiva, é posta a herança em administração, até que
a condição se cumpra ou haja a certeza de que não pode cumprir-se.
2. Também é posta em
administração a herança ou legado durante a pendência da condição ou do termo,
se não prestar caução aquele a quem for exigida nos termos do artigo anterior.
ARTIGO 2238º
(A quem pertence a
administração)
1. No caso de herança sob
condição suspensiva, a administração pertence ao próprio herdeiro condicional
e, se ele a não aceitar, ao seu substituto; se não existir substituto ou este
também a não aceitar, a administração pertence ao co-herdeiro ou co-herdeiros
incondicionais, quando entre eles e o co-herdeiro condicional houver direito de
acrescer, e, na sua falta, ao herdeiro legítimo presumido.
2. Não sendo prestada a
caução prevista no artigo 2236º, a administração da herança ou legado compete
àquele em cujo interesse a caução devia ser prestada.
3. Contudo, em qualquer dos
casos previstos no presente artigo, o tribunal pode providenciar de outro modo,
se ocorrer justo motivo.
ARTIGO 2239º
(Regime da
administração)
Sem prejuízo do disposto
nos artigos anteriores, os administradores da herança ou legado estão sujeitos
às regras aplicáveis ao curador provisório dos bens do ausente, com as
necessárias adaptações.
ARTIGO 2240º
(Administração da
herança ou legado a favor de nascituro)
1. O disposto nos artigos
2237º a 2239º é aplicável à herança deixada a nascituro não concebido, filho de
pessoa viva; mas a esta pessoa ou, se ela for incapaz, ao seu representante
legal pertence a representação do nascituro em tudo o que não seja inerente à
administração da herança ou do legado.
2. Se o herdeiro ou
legatário estiver concebido, a administração da herança ou do legado compete a
quem administraria os seus bens se ele já tivesse nascido.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2241º
(Administração do
cabeça-de-casal)
As disposições dos artigos
antecedentes não prejudicam os poderes de administração do cabeça-de-casal.
ARTIGO 2242º
(Retroactividade da
condição)
1. Os efeitos do
preenchimento da condição retrotraem-se à data da morte do testador,
considerando-se não escritas as declarações testamentárias em contrário.
2. É aplicável quanto ao
regime da retroactividade o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 277º.
ARTIGO 2243º
(Termo inicial ou final)
1. O testador pode sujeitar
a nomeação do legatário a termo inicial; mas este apenas suspende a execução da
disposição, não impedindo que o nomeado adquira direito ao legado.
2. A declaração de termo
inicial na instituição de herdeiro, e bem assim a declaração de termo final
tanto na instituição de herdeiro como na nomeação de legatário, têm-se por não
escritas, excepto, quanto a esta nomeação, se a disposição versar sobre direito
temporário.
ARTIGO 2244º
(Encargos)
Tanto a instituição de
herdeiro como a nomeação de legatário podem ser sujeitas a encargos.
ARTIGO 2245º
(Encargos impossíveis,
contrários à lei ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes)
É aplicável aos encargos
impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons
costumes, o disposto no artigo 2230º.
ARTIGO 2246º
(Prestação de caução)
O tribunal, quando o
considere justificado e o testador não tenha disposto coisa diversa, pode impor
ao herdeiro ou legatário onerado pelos encargos a obrigação de prestar caução.
ARTIGO 2247º
(Cumprimento dos
encargos)
No caso de o herdeiro ou
legatário não satisfazer os encargos, a qualquer interessado é lícito exigir o
seu cumprimento.
ARTIGO 2248º
(Resolução da disposição
testamentária)
1. Qualquer interessado
pode também pedir a resolução da disposição testamentária pelo não cumprimento
do encargo, se o testador assim houver determinado, ou se for lícito concluir
do testamento que a disposição não teria sido mantida sem o cumprimento do
encargo.
2. Sendo resolvida a
disposição, o encargo deve ser cumprido, nas mesmas condições, pelo
beneficiário da resolução, salvo se outra coisa resultar do testamento ou da
natureza da disposição.
3. O direito de resolução
caduca passados cinco anos sobre a mora no cumprimento do encargo e, em
qualquer caso, decorridos vinte anos sobre a abertura da sucessão.
SECÇÃO III
Legados
ARTIGO 2249º
(Aceitação e repúdio do
legado)
É extensivo aos legados, no
que lhes for aplicável, e com as necessárias adaptações, o disposto sobre a
aceitação e repúdio da herança.
ARTIGO 2250º
(Indivisibilidade da vocação)
1. O legatário não pode
aceitar um legado em parte e repudiá-lo noutra parte; mas pode aceitar um
legado e repudiar outro, contanto que este último não seja onerado por encargos
impostos pelo testador.
2. O herdeiro que seja ao
mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a herança e repudiar o legado
ou de aceitar o legado e repudiar a herança, mas também só no caso de a deixa
repudiada não estar sujeita a encargos.
ARTIGO 2251º
(Legado de coisa
pertencente ao onerado ou a terceiro)
1. É nulo o legado de coisa
pertencente ao sucessor onerado com o encargo ou a terceiro, salvo se do
testamento se depreender que o testador sabia que não lhe pertencia a coisa
legada.
2. Neste último caso, o
sucessor que tenha aceitado a disposição feita em seu benefício é obrigado a
adquirir a coisa e a transmiti-la ao legatário ou a proporcionar-lhe por outro
modo a sua aquisição, ou, não sendo isso possível, a pagar-lhe o valor dela; e
é igualmente obrigado a transmitir-lhe a coisa, se ela lhe pertencer.
3. Se a coisa legada, que
não pertencia ao testador no momento da feitura do testamento, se tiver depois
tornado sua por qualquer título, tem efeito a disposição relativa a ela, como
se ao tempo do testamento pertencesse ao testador.
4. Se o legado recair sobre
coisa de algum dos co-herdeiros, são os outros obrigados a satisfazer-lhe, em
dinheiro ou em bens da herança, a parte que lhes toca no valor dela,
proporcionalmente aos seus quinhões hereditários, salvo diversa declaração do
testador.
ARTIGO 2252º
(Legado de coisa
pertencente só em parte ao testador)
1. Se o testador legar uma
coisa que não lhe pertença por inteiro, o legado vale apenas em relação à parte
que lhe pertencer, salvo se do testamento resultar que o testador sabia não lhe
pertencer a totalidade da coisa, pois, nesse caso, observar-se-á, quanto ao
restante, o preceituado no artigo anterior.
2. As regras do número
anterior não prejudicam o disposto no artigo 1685º quanto à deixa de coisa
certa e determinada do património comum dos cônjuges.
ARTIGO 2253º
(Legado de coisa
genérica)
É válido o legado de coisa
indeterminada de certo género, ainda que nenhuma coisa deste género se
encontrasse no património do testador à data do testamento e nenhuma aí se
encontre à data da sua morte, salvo se o testador fizer a declaração prevista
no artigo seguinte.
ARTIGO 2254º
(Legado de coisa não
existente no espólio do testador)
1. Se o testador legar
coisa determinada, ou coisa indeterminada de certo género, com a declaração de
que aquela coisa ou este género existe no seu património, mas se assim não
suceder ao tempo da sua morte, é nulo o legado.
2. Se a coisa ou género
mencionado na disposição se encontrar no património do testador ao tempo da sua
morte, mas não na quantidade legada, haverá o legatário o que existir.
ARTIGO 2255º
(Legado de coisa
existente em lugar determinado)
O legado de coisa existente
em lugar determinado só pode ter efeito até onde chegue a quantidade que aí se
achar à data da abertura da sucessão, excepto se a coisa, habitualmente
guardada nesse lugar, tiver sido de lá removida, no todo ou em parte, a título
transitório.
ARTIGO 2256º
(Legado de coisa
pertencente ao próprio legatário)
1. É nulo o legado de coisa
que à data do testamento pertencia ao próprio legatário, se também lhe
pertencer à data da abertura da sucessão.
2. O legado, é porém,
válido se à data da abertura da sucessão a coisa pertencia ao testador; e
também o é, se a esse tempo pertencia ao sucessor onerado com o legado ou a
terceiro e do testamento resultar que a deixa foi feita na previsão deste
facto.
3. É aplicável, neste
último caso, o disposto nos nº 2 e 4 do artigo 2251º.
ARTIGO 2257º
(Legado de coisa
adquirida pelo legatário)
1. Se depois da feitura do
testamento o legatário adquirir do testador, por título oneroso ou gratuito, a
coisa que tiver sido objecto do legado, este não produz efeito.
2. O legado também não
produz efeito se, após o testamento, o legatário adquirir a coisa, por título
gratuito, do sucessor onerado ou de terceiro; se a adquirir por título oneroso,
pode pedir o que houver desembolsado, quando do testamento resulte que o
testador sabia não lhe pertencer a coisa legada.
ARTIGO 2258º
(Legado de usufruto)
A deixa de usufruto, na
falta de indicação em contrário, considera-se feita vitaliciamente; se o
beneficiário for uma pessoa colectiva, terá a duração de trinta anos.
ARTIGO 2259º
(Legado para pagamento
de dívida)
1. Se o testador legar
certa coisa ou certa soma como por ele devida ao legatário, é válido o legado,
ainda que a soma ou coisa não fosse realmente devida, salvo sendo o legatário
incapaz de a haver por sucessão.
2. O legado fica, todavia,
sem efeito, se o testador, sendo devedor ao tempo da feitura do testamento,
cumprir a obrigação posteriormente.
ARTIGO 2260º
(Legado a favor do
credor)
O legado feito a favor de
um credor, mas sem que o testador refira a sua dívida, não se considera
destinado a satisfazer essa dívida.
ARTIGO 2261º
(Legado de crédito)
1. O legado de um crédito
só produz efeito em relação à parte que subsista ao tempo da morte do testador.
2. O herdeiro satisfará a
disposição entregando ao legatário os títulos respeitantes ao crédito.
ARTIGO 2262º
(Legado da totalidade
dos créditos)
Se o testador legar a
totalidade dos seus créditos, deve entender-se, em caso de dúvida, que o legado
só compreende os créditos em dinheiro, excluídos os depósitos bancários e os
títulos ao portador ou nominativos.
ARTIGO 2263º
(Legado do recheio de
uma casa)
Sendo legado o recheio de
uma casa ou o dinheiro nela existente, não se entende, no silêncio do testador,
que são também legados os créditos, ainda que na casa se encontrem os
documentos respectivos.
ARTIGO 2264º
(Pré-legado)
O legado a favor de um dos
co-herdeiros, e a cargo de toda a herança, vale por inteiro.
ARTIGO 2265º
(Obrigação de prestação
do legado)
1. Na falta de disposição
em contrário, o cumprimento do legado incumbe aos herdeiros.
2. O testador pode,
todavia, impor o cumprimento só a algum ou alguns dos herdeiros, ou a algum ou
alguns dos legatários.
3. Os herdeiros ou
legatários sobre quem recaia o encargo ficam a ele sujeitos em proporção dos
respectivos quinhões hereditários ou dos respectivos legados, se o testador não
tiver estabelecido proporção diversa.
ARTIGO 2266º
(Cumprimento do legado
de coisa genérica)
1. Quando o legado for de
coisa indeterminada pertencente a certo género, cabe a escolha dela a quem deva
prestá-la, excepto se o testador tiver atribuído a escolha ao próprio legatário
ou a terceiro.
2. No silêncio do testador,
a escolha recairá sobre coisas existentes na herança, salvo se não se encontrar
nenhuma do género considerado e o legado for válido nos termos do artigo 2253º;
o legatário pode escolher a coisa melhor, a não ser que a escolha verse sobre
coisas não existentes na heraça.
3. As regras dos artigos
400º e 542º são aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao legado de coisa
genérica, quando não estejam em oposição com o disposto nos números
antecedentes.
ARTIGO 2267º
(Cumprimento dos legados
alternativos)
Os legados alternativos
estão sujeitos ao regime, devidamente adaptado, das obrigações alternativas.
ARTIGO 2268º
(Transmissão do direito
de escolha)
Tanto no legado de coisa
genérica como no legado alternativo, se a escolha pertencer ao sucessor onerado
ou ao legatário, e um ou outro falecer sem a ter efectuado, transmite-se esse
direito aos seus herdeiros.
ARTIGO 2269º
(Extensão do legado)
1. Na falta de declaração
do testador sobre a extensão do legado, entende-se que ele abrange as
benfeitorias e partes integrantes.
2. O legado de prédio
rústico ou urbano, ou do conjunto de prédios rústicos ou urbanos que constituam
uma unidade económica, abrange, no silêncio do testador, as construções nele
feitas, anteriores ou posteriores ao testamento, e bem assim as aquisições
posteriores que se tenham integrado na mesma unidade, sem prejuízo do disposto
no nº 2 do artigo 2316º.
ARTIGO 2270º
(Entrega do legado)
Na falta de declaração do
testador sobre a entrega do legado, esta deve ser feita no lugar em que a coisa
legada se encontrava ao tempo da morte do testador e no prazo de um ano a
contar dessa data, salvo se por facto não imputável ao onerado se tornar
impossível o cumprimento dentro desse prazo; se, porém, o legado consistir em
dinheiro ou em coisa genérica que não exista na herança, a entrega deve ser
feita no lugar onde se abrir a sucessão, dentro do mesmo prazo.
ARTIGO 2271º
(Frutos)
Não havendo declaração do
testador sobre os frutos da coisa legada, o legatário tem direito aos frutos
desde a morte do testador, com exepção dos percebidos adiantamente pelo autor
da sucessão; se, todavia, o legado consistir em dinheiro ou em coisa não
pertencente à herança, os frutos só são devidos a partir da mora de quem deva
satisfazê-lo.
ARTIGO 2272º
(Legado de coisa
onerada)
1. Se a coisa legada
estiver onerada com alguma servidão ou outro encargo que lhe seja inerente,
passa com o mesmo encargo ao legatário.
2. Havendo foros ou outras
prestações atrasadas, serão pagas por conta da herança; e por conta dela serão
pagas ainda as dívidas asseguradas por hipotecas ou outra garantia real
constituída sobre coisa legada.
ARTIGO 2273º
(Legado de prestação
periódica)
1. Se o testador legar
qualquer prestação periódica, o primeiro período corre desde a sua morte, tendo
o legatário o direito a toda a prestação respeitante a cada período, ainda que
faleça no seu decurso.
2. O disposto no número
anterior é aplicável ao legado de alimentos, mesmo que estes só venham a ser
fixados depois da morte do testador.
3. O legado só é exigível
no termo do período correspondente, salvo se for a título de alimentos, pois,
nesse caso, é devido a partir do início de cada período.
ARTIGO 2274º
(Legado deixado a um
menor)
O legado deixado a um menor
para quando atingir a maioridade não pode ser por ele exigido antes desse
tempo, ainda que seja emancipado.
ARTIGO 2275º
(Despesas com o
cumprimento do legado)
As despesas feitas com o
cumprimento do legado ficam a cargo de quem deva satisfazê-lo.
ARTIGO 2276º
(Encargos impostos ao
legatário)
1. O legatário responde
pelo cumprimento dos legados e dos outros encargos que lhe sejam impostos, mas
só dentro dos limites do valor da coisa legada.
2. Se o legatário com
encargo não receber todo o legado, é o encargo reduzido proporcionalmente e, se
a coisa legada for reivindicada por terceiro, pode o legatário reaver o que
houver pago.
ARTIGO 2277º
(Pagamento dos encargos
da herança pelos legatários)
Se a herança for toda
distribuída em legado, são os encargos dela suportados por todos os legatários
em proporção dos seus legados, excepto se o testador houver disposto outra
coisa.
ARTIGO 2278º
(Herança insuficiente
para pagamento dos legados)
Se os bens da herança não
chegarem para cobrir os legados, são estes pagos rateadamente; exceptuam-se os
legados remuneratórios, os quais são considerados como dívida da herança.
ARTIGO 2279º
(Reivindicação da coisa
legada)
O legatário pode
reivindicar de terceiro a coisa legada, contanto que esta seja certa e
determinada.
ARTIGO 2280º
(Legados pios)
Os legados pios são
regulados por legislação especial.
SECÇÃO IV
Substituições
SUBSECÇÃO I
Substituição directa
ARTIGO 2281º
(Noção)
1. O testador pode
substituir outra pessoa ao herdeiro instituído para o caso de este não poder ou
não querer aceitar a herança: é o que se chama substituição directa.
2. Se o testador previr só
um destes casos, entende-se ter querido abranger o outro, salvo declaração em
contrário.
ARTIGO 2282º
(Substituição plural)
Podem substituir-se várias
pessoas a uma só, ou uma só a várias.
ARTIGO 2283º
(Substituição recíproca)
1. O testador pode
determinar que os co-herdeiros se substituam reciprocamente.
2. Em tais casos se os
co-herdeiros tiverem sido instituídos em partes desiguais, respeitar-se-á, no
silêncio do testador, a mesma proporção na substituição.
3. Mas, se à substituição
não forem chamados todos os restantes instituídos, ou o for outra pessoa além
deles, e nada se declarar sobre a proporção respectiva, o quinhão vago será
repartido em partes iguais pelos substitutos.
ARTIGO 2284º
(Direitos e obrigações
dos substitutos)
Os substitutos sucedem nos
direitos e obrigações em que sucederiam os substituídos, excepto se outra for a
vontade do testador.
ARTIGO 2285º
(Substituição directa
nos legados)
1. O disposto na presente
subsecção é aplicável aos legados.
2. Quanto aos legatários
nomeados em relação ao mesmo objecto, seja ou não conjunta a nomeação, a
substituição recíproca considera-se feita, no silêncio do testador, na mesma
proporção em que foi feita a nomeação.
SUBSECÇÃO II
Substituição
fideicomissária
ARTIGO 2286º
(Noção)
Diz-se substituição
fideicomissária, ou fideicomisso, a disposição pela qual o testador impõe ao
herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por
sua morte, a favor de outrem; o herdeiro gravado com o encargo chama-se
fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da substituição.
ARTIGO 2287º
(Substituição plural)
Pode haver um só ou vários
fiduciários, assim como um ou vários fideicomissários.
ARTIGO 2288º
(Limite de validade)
São nulas as substituições
fideicomissárias em mais de um grau, ainda que a reversão da herança para o
fideicomissário esteja subordinada a um acontecimento futuro e incerto.
ARTIGO 2289º
(Nulidade da
substituição)
A nulidade da substituição
fideicomissária não envolve a nulidade da instituição ou da substituição
anterior; apenas se tem por não escrita a cláusula fideicomissária, salvo se o
contrário resultar do testamento.
ARTIGO 2290º
(Direitos e obrigações
do fiduciário)
1. O fiduciário tem o gozo
e a administração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2. São extensivas ao
fiduciário, no que não for incompatível com a natureza do fideicomisso, as
disposições legais relativas ao usufruto.
3. O caso julgado
constituído em acção relativa aos bens sujeitos ao fideicomisso não é oponível
ao fideicomissário se ele não interveio nela.
ARTIGO 2291º
(Alienação ou oneração
de bens)
1. Em caso de evidente
necessidade ou utilidade para os bens da substituição, pode o tribunal
autorizar, com as devidas cautelas, a alienação ou oneração dos bens sujeitos
ao fideicomisso.
2. Nas mesmas condições,
pode o tribunal autorizar a alienação ou oneração em caso de evidente
necessidade ou utilidade para o fiduciário, contanto que os interesses do
fideicomissário não sejam afectados.
ARTIGO 2292º
(Direitos dos credores
pessoais do fiduciário)
Os credores pessoais do
fiduciário não têm o direito de se pagar pelos bens sujeitos ao fideicomisso,
mas tão-somente pelos seus frutos.
ARTIGO 2293º
(Devolução da herança ao
fideicomissário)
1. A herança devolve-se ao
fideicomissário no momento da morte do fiduciário.
2. Se o fideicomissário não
puder ou não quiser aceitar a herança, fica sem efeito a substituição,e a
titularidade dos bens hereditários considera-se adquirida definitivamente pelo
fiduciário desde a morte do testador.
3. Não podendo ou não
querendo o fiduciário aceitar a herança, a substituição, no silêncio do
testamento, converte-se de fideicomissária em directa, dando-se a devolução da
herança a favor do fideicomissário, com efeito desde o óbito do testador.
ARTIGO 2294º
(Actos de disposição do
fideicomissário)
O fideicomissário não pode
aceitar ou repudiar a herança nem dispor dos bens respectivos, mesmo por título
oneroso, antes de ela lhe ser devolvida.
ARTIGO 2295º
(Fideicomissos
irregulares)
1. São havidas como
fideicomissárias:
a) As disposições pelas
quais o testador proíba o herdeiro de dispor dos bens hereditários, seja por
acto entre vivos, seja por acto de última vontade;
b) As disposições pelas
quais o testador chame alguém ao que restar da herança por morte do herdeiro;
c) As disposições pelas
quais o testador chame alguém aos bens deixados a uma pessoa colectiva, para o
caso de esta se extinguir.
2. No caso previsto na
alínea a) do número anterior, são havidos como fideicomissários os herdeiros
legítimos do fiduciário.
3. Aos fideicomissos
previstos neste artigo são aplicáveis as disposições dos artigos antecedentes;
mas, nos casos das alíneas b) e c) do nº 1, o fiduciário pode dispor dos bens
por acto entre vivos, independentemente de autorização judicial, se obtiver o
consentimento do fideicomissário.
ARTIGO 2296º
(Substituição
fideicomissária nos legados)
O disposto na presente
subsecção é aplicável aos legados.
SUBSECÇÃO III
Substituições pupilar e
quase-pupilar
ARTIGO 2297º
(Substituição pupilar)
1. O progenitor que não
estiver inibido total ou parcialmente do poder paternal tem a faculdade de
substituir aos filhos os herdeiros ou legatários que bem lhe aprouver, para o
caso de os mesmos filhos falecerem antes de perfazer os dezoito anos de idade:
é o que se chama substituição pupilar.
2. A substituição fica sem
efeito logo que o substituído perfaça os dezoito anos, ou se falecer deixando
descendentes ou ascendentes.
ARTIGO 2298º
(Substituição
quase-pupilar)
1. A disposição do artigo
anterior é aplicável, sem destinção de idade, ao caso de o filho ser incapaz de
testar em consequência de interdição por anomalia psíquica: é o que se chama
substituição quase-pupilar.
2. A substituição
quase-pupilar fica sem efeito logo que seja levantada a interdição, ou se o
substituto falecer deixando descendentes ou ascendentes.
ARTIGO 2299º
(Transformação da
substituição pupilar em quase-pupilar)
A substituição pupilar é
havida para todos os efeitos como quase-pupilar, se o menor for declarado
interdito por anomalia psíquica.
ARTIGO 2300º
(Bens que podem ser
abrangidos)
As substituições pupilar e
quase pupilar só podem abranger os bens que o substituído haja adquirido por
via do testador, embora a título de legítima.
SECÇÃO V
Direito de acrescer
ARTIGO 2301º
(Direito de acrescer
entre herdeiros)
1. Se dois ou mais
herdeiros forem instituídos em partes iguais na totalidade ou numa quota dos
bens, seja ou não conjunta a instituição, e algum deles não puder ou não quiser
aceitar a herança, acrescerá a sua parte à dos outros herdeiros instituídos na
totalidade ou na quota.
2. Se forem desiguais as
quotas dos herdeiros, a parte do que não pôde ou não quis aceitar é dividida
pelos outros, respeitando- se a proporção entre eles.
ARTIGO 2302º
(Direito de acrescer
entre legatários)
1. Há direito de acrescer
entre os legatários que tenham sido nomeados em relação ao mesmo objecto, seja
ou não conjunta a nomeação.
2. É aplicável, neste caso,
com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior.
ARTIGO 2303º
(Desoneração do encargo
do cumprimento do legado)
Não havendo direito de
acrescer entre os legatários, o objecto do legado é atribuído ao herdeiro ou
legatário onerado com o encargo do seu cumprimento, salvo se esse objecto
estiver genericamente compreendido noutro legado.
ARTIGO 2304º
(Casos em que o direito
de acrescer não tem lugar)
Não há lugar ao direito de
acrescer, se o testador tiver disposto outra coisa, se o legado tiver natureza
puramente pessoal ou se houver direito de representação.
ARTIGO 2305º
(Direito de acrescer
entre usufrutuários)
É aplicável ao direito de
acrescer entre usufrutuários o disposto nos artigos 1442º e 2302º.
ARTIGO 2306º
(Aquisição da parte
acrescida)
A aquisição da parte
acrescida dá-se por força da lei, sem necessidade de aceitação do beneficiário,
que não pode repudiar separadamente essa parte, excepto quando sobre ela
recaiam encargos especiais impostos pelo testador; neste caso, sendo objecto de
repúdio, a porção acrescida reverte para a pessoa ou pessoas a favor de quem os
encargos hajam sido constituídos.
ARTIGO 2307º
(Efeitos do direito de
acrescer)
Os herdeiros ou legatários
que houverem o acrescido sucedem nos mesmos direitos e obrigações, de natureza
não puramente pessoal, que caberiam àquele que não pôde ou não quis receber a
deixa.
CAPÍTULO VII
Nulidade, anulabilidade,
revogação e caducidade dos testamentos e disposições testamentárias
SECÇÃO I
Nulidade e anulabilidade
ARTIGO 2308º
(Caducidade da acção)
1. A acção de nulidade do
testamento ou de disposição testamentária caduca ao fim de dez anos, a contar
da data em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da
nulidade.
2. Sendo anulável o
testamento ou a disposição, a acção caduca ao fim de dois anos a contar da data
em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da
anulabilidade.
3. São aplicáveis, nestes casos,
as regras da suspensão e interrupção da prescrição.
ARTIGO 2309º
(Confirmação do
testamento)
Não pode prevalecer-se da
nulidade ou anulabilidade do testamento ou da disposição testamentária aquele
que a tiver confirmado.
ARTIGO 2310º
(Inadmissibilidade da
proibição de impugnar o testamento)
O testador não pode proibir
que seja impugnado o seu testamento nos casos em que haja nulidade ou
anulabilidade.
SECÇÃO II
Revogação e caducidade
(Epígrafe dada pelo
Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2311º
(Faculdade de revogação)
1. O testador não pode
renunciar à faculdade de revogar, no todo ou em parte, o seu testamento.
2. Tem-se por não escrita
qualquer cláusula que contrarie a faculdade de revogação.
ARTIGO 2312º
(Revogação expressa)
A revogação expressa do testamento
só pode fazer-se declarando o testador, noutro testamento ou em escritura
pública, que revoga no todo ou em parte o testamento anterior.
ARTIGO 2313º
(Revogação tácita)
1. O testamento posterior
que não revogue expressamente o anterior revogá-lo-á apenas na parte em que for
com ele incompatível.
2. Se aparecerem dois
testamentos da mesma data, sem que seja possível determinar qual foi o
posterior, e implicarem contradição, haver-se-ão por não escritas em ambos as
disposições contraditórias.
ARTIGO 2314º
(Revogação do testamento
revogatório)
1. A revogação expressa ou
tácita produz o seu efeito, ainda que o testamento revogatório seja por sua vez
revogado.
2. O testamento anterior
recobra, todavia, a sua força, se o testador, revogando o posterior, declarar
ser sua vontade que revivam as disposições do primeiro.
ARTIGO 2315º
(Inutilização do
testamento cerrado)
1. Se o testamento cerrado
aparecer dilacerado ou feito em pedaços, considerar-se-á revogado, excepto
quando se prove que o facto foi practicado por pessoa diversa do testador ou
que este não teve intenção de o revogar ou se encontrava privado do uso da
razão.
2. Presume-se que o facto
foi praticado por pessoa diversa do testador, se o testamento não se encontrava
no espólio deste à data da sua morte.
3. A simples obliteração ou
cancelamento do testamento, no todo ou em parte, ainda que com ressalva e
assinatura, não é havida como revogação, desde que possa ler-se a primitiva
disposição.
ARTIGO 2316º
(Alienação ou
transformação da coisa legada)
1. A alienação total ou
parcial da coisa legada implica revogação correlativa do legado; a revogação
surte o seu efeito, ainda que a alienação seja anulada por fundamento diverso
da falta ou vícios da vontade do alheador, ou ainda que este readquira por outro
modo a propriedade da coisa.
2. Implica, outrossim,
revogação do legado a tranformação da coisa em outra, com diferente forma e
denominação ou diversa natureza, quando a transformação seja feita pelo
testador.
3. É, porém, admissível a
prova de que o testador, ao alienar ou transformar a coisa, não quis revogar o
legado.
ARTIGO 2317º
(Casos de caducidade)
As disposições
testamentárias, quer se trate da instituição de herdeiro, quer da nomeação de
legatário, caducam, além de outros casos:
a) Se o instituído ou
nomeado falecer antes do testador, salvo havendo representação sucessória;
b) Se a instituição ou
nomeação estiver dependente de condição suspensiva e o sucessor falecer antes
de a condição se verificar;
c) Se o instituído ou
nomeado se tornar incapaz de adquirir a herança ou o legado;
d) Se o chamado à sucessão
era cônjuge do testador e à data da morte deste se encontravam divorciados ou
separados judicialmente de pessoas e bens ou o casamento tenha sido declarado
nulo ou anulado, por sentença já transitada ou que venha a transitar em
julgado, ou se vier a ser proferida, posteriormente àquela data, sentença de
divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou
anulação do casamento;
e) Se o chamado à sucessão
repúdiar a herança ou o legado, salvo havendo representação sucessória.
(Redacção do Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2318º e 2319º
(Revogados pelo Dec.-Lei
497/77, de 25-11)
CAPÍTULO VIII
Testamentaria
ARTIGO 2320º
(Noção)
O testador pode nomear uma
ou mais pessoas que fiquem encarregadas de vigiar o cumprimento do seu
testamento ou de o executar, no todo ou em parte: é o que se chama
testamentaria.
ARTIGO 2321º
(Quem pode ser nomeado
testamenteiro)
1. Só pode ser nomeado
testamenteiro o que tiver plena capacidade jurídica.
2. A nomeação pode recair
sobre um herdeiro ou legatário.
ARTIGO 2322º
(Aceitação ou recusa)
O nomeado pode aceitar ou
recusar a testamentaria.
ARTIGO 2323º
(Aceitação)
1. A aceitação da
testamentaria pode ser expressa ou tácita.
2. A testamentaria não pode
ser aceita sob condição, nem a termo, nem só em parte.
ARTIGO 2324º
(Recusa)
A recusa da testamentaria
faz-se por meio de declaração perante notário.
ARTIGO 2325º
(Atribuições do
testamenteiro)
O testamenteiro tem as
atribuições que o testador lhe conferir, dentro dos limites da lei.
ARTIGO 2326º
(Disposição supletiva)
Se o testador não
especificar as atribuições do testamenteiro, competirá a este:
a) Cuidar do funeral do
testador e pagar as despesas e sufrágios respectivos, conforme o que for
estabelecido no testamento ou, se nada se estabelecer, consoante os usos da
terra;
b) Vigiar a execução das
disposições testamentárias e sustentar, se for necessário, a sua validade em
juízo;
c) Exercer as funções de
cabeça-de-casal, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 2080º.
ARTIGO 2327º
(Cumprimento de legados
e outros encargos)
O testador pode encarregar
o testamenteiro do cumprimento dos legados e dos demais encargos da herança,
quando este seja cabeça-de-casal e não haja lugar a inventário obrigatório.
ARTIGO 2328º
(Venda de bens)
Para efeitos do disposto no artigo anterior, pode o testamenteiro ser
autorizado pelo testador a vender quaisquer bens da herança, móveis ou imóveis,
ou os que forem designados no testamento.
ARTIGO 2329º
(Pluralidade de testamenteiros)
1. Sendo vários os testamenteiros, consideram-se todos nomeados
conjuntamente, salvo se outra coisa tiver sido disposta pelo testador.
2. Caducando por qualquer causa a testamentaria em relação a algum dos
nomeados, continuam os restantes no exercício das respectivas funções.
3. Sendo os testamenteiros nomeados sucessivamente, cada um deles só é
chamado a aceitar ou recusar o cargo na falta do anterior.
ARTIGO 2330º
(Escusa do testamenteiro)
O nomeado que aceitou a testamentaria só pode ser dela escusado nos casos
previstos no nº 1 do artigo 2085º.
ARTIGO 2331º
(Remoção do testamenteiro e caducidade da testamentaria plural)
1. O testamenteiro pode ser judicialmente removido, a requerimento de
qualquer interessado, se não cumprir com prudência e zelo os deveres do seu
cargo ou mostrar incompetência no seu desempenho.
2. Se forem vários os testamenteiros nomeados conjuntamente e não houver
acordo entre eles sobre o exercício da testamentaria, podem ser removidos
todos, ou apenas algum ou alguns deles.
ARTIGO 2332º
(Prestação de contas)
1. O testamenteiro é obrigado a prestar contas anualmente.
2. Em caso de culpa,
responde o testamenteiro perante os herdeiros e legatários pelos danos a que
der causa.
ARTIGO 2333º
(Remuneração)
1. O cargo de testamenteiro
é gratuito, excepto se lhe for assinada pelo testador alguma retribuição.
2. O testamenteiro não tem
direito à retribuição assinada, ainda que atribuída sob a forma de legado, se
não aceitar a testamentaria ou for dela removido; se a testamentaria caducar
por qualquer outra causa, cabe-lhe apenas uma parte da retribuição proporcional
ao tempo em que exerceu as funções.
ARTIGO 2334º
(Intransmissibilidade)
A testamentaria não é
transmissível, em vida ou por morte, nem é delegável, bem que possa o
testamenteiro servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos termos
em que o procurador o pode fazer.